II.| No Gabinete do Diretor

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A caminhada infindável culminara na chegada a um elevador que, teimosamente, insistia em tardar-se noutros pisos. Exypnada, irritado, carregava por diversas vezes com força no botão do aparelho.

- Chamar o elevador repetidas vezes não vai fazê-lo descer mais depressa. A velocidade dos cabos é constante. - Informou uma voz na mente do jovem.

- Noemo! Pensei que tinhas entrado no teu "modo silêncio absoluto". - Ridicularizou o rapaz.

- Vim só avisar que, pelos meus cálculos, a porta abrirá em oito segundos.

- Tanto tempo! E ainda por cima já estou atrasado! - Resmungou subitamente um homem sisudo atrás do adolescente, consultando o relógio.

- Fique descansado. O elevador chegará em seis segundos. - Informou Exypnada, para espanto do outro impaciente. - Cinco, quatro, três, dois, um... E aqui está!

Os dois retângulos de metal afastaram-se com um tlintar no preciso momento em que o jovem acabara a contagem regressiva. A face do indivíduo mais velho enchia-se de admiração e perplexidade.

Alheio à expressão do outro, o rapaz encaminhou-se tranquilamente para o veículo que lhe poupava o esforço de subir a imensa escadaria do edifício da Investigar.

- Bem dizem que és a mente mais brilhante desta agência, miúdo. - Comentou o homem, já no ascensor.

O adolescente limitou-se a encolher os ombros. Eram comuns os elogios pela sua inteligência surpreendente e pela sua facilidade em prever com exatidão acontecimentos lógicos. Era capaz de analisar detalhadamente uma situação e optar pela escolha mais acertada. Equações infindáveis transformavam-se em meras continhas simples para Exy. Era invejável a velocidade do seu raciocínio.

O meio de transporte cessou a sua incansável subida eterna, abrindo uma greta para que os passageiros pudessem prosseguir a sua caminhada no prédio colossal. O jovem assim o fez, dobrando mais umas quantas esquinas na corrida disfarçada.

A porta estava estranhamente entreaberta, como se o Diretor esperasse a vinda urgente do agente que chamara.

- Entra, Exypnada. - Disse calorosamente o homem, vendo o receio estampado no rosto do recém-chegado.

O rapaz entrou amedrontado no pequeno gabinete, preenchido por uma secretária de tamanho excecional para o espaço da minúscula divisão. Papéis e arquivos recentemente remexidos, decorados com clipes coloridos, completavam o cenário.

- Sempre foste um dos agentes mais promissores. O tempo cumpriu a sua tarefa de demonstrá-lo. - Começou o Diretor. - Um miúdo que se escondia no seu quarto, agarrado ao computador portátil, de um dia para o outro, acendeu uma luz vermelha em todas as agências de serviços secretos. E como dita o nome deste grupo renomado de detetives, investigámos o tal rapazito e vimos nele capacidades que seriam incorporadas de bom grado na nossa organização. Um hacker brilhante tornou-se um investigador elementar.

- Eu não era um hacker. Nunca fui acusado de nenhum crime informático. - Contrapôs o jovem, mais incomodado por desconhecer as intenções do outro do que com a utilização daquele termo.

- Graças à Investigar, meu caro Exypnada. Nós fomos mais rápidos do que qualquer acusação. Livrámos-te dos problemas que aquelas entradas em sites altamente protegidos poderiam te causar.

- Nunca soube como é que me encontraram.

- Descobrir um endereço IP não é difícil. - Explicou o homem mais velho. - Difícil é aceder a todos aqueles documentos e mensagens encriptadas e conseguir traduzi-los para linguagem corrente, sem muitos conhecimentos de informática.

- Eu estava a tirar um curso na área da computação.

- Lamento, mas nenhum aluno do primeiro ano aprende a ser um pirata informático com o que lhe ensinam na faculdade. É preciso ser muito engenhoso e muitíssimo inteligente, ou não fosse o teu nome "esperteza". A única coisa que não entendo é o motivo pelo qual decidiste te revelar de um dia para o outro, eliminando todos as barreiras sofisticadas que utilizavas para que não fosses detetado.

- Nunca utilizei qualquer tipo de proteção que impedisse que o meu portátil fosse identificado. - Declarou o adolescente, convicto da veracidade da sua afirmação.

- Quando encontramos um hacker, regra geral, conseguimos observar a sua evolução. Começa por enganar os sistemas, entrar nuns quantos sites. Decerto que a sua carreira enquanto explorador das entranhas da Internet não se inicia com a descodificação de mensagens encriptadas.

No fundo, o agente conhecia parte da justificação que tanto o Diretor queria saber. O acidente mudara-o radicalmente. Dera-lhe uma nova vida. Noemosyne, em muitas das ocasiões, entregava a sua astúcia a Exypnada. A segunda personalidade do rapaz era a inteligência personificada.

No entanto, o jovem tinha a consciência de que esta era explicação pouco credível, na qual o seu superior jamais acreditaria, pelo que optou pelo silêncio.

- Bem, - Retomou o homem, vendo que não obteria nenhuma resposta do outro. - a verdade é que a Investigar tem muito a agradecer pela tua dedicação plena desde o dia em que te enviámos o convite e recebemos um "sim".

- Só fiz o que estava ao meu alcance para ajudar a agência. - Disse o detetive, não demonstrando qualquer resquício de vaidade.

- Mas eu não fiz tudo o que estava ao meu alcance para te agradecer. As tuas missões sempre decorreram numa sala qualquer neste edifício, trancado, em frente a um computador, investigando os mais complexos criminosos. Pois agora terás um processo do qual tomarás conta sozinho. Eu sei que consegues.

- Um processo? Sozinho? - Espantou-se o adolescente.

- Tem um pouco mais de autoconfiança, miúdo! És o cérebro deste edifício. És mais esperto que todos os agentes juntos. Além disso, o caso é perfeito para ti.

- Aceita, Exy! É a nossa grande oportunidade. Vamos ser o Sherlock Holmes! - A voz interior do rapaz decidira falar.

- Calado, meu caro Watson! - Sussurrou a personalidade principal, embora não lhe faltasse vontade para soltar um berro furioso.

- Não era "Elementar, meu caro Watson"? - Ironizou Noemosyne.

- Qual é o caso? - Exy questionou o Diretor.

- Uma empresa de inteligência artificial, que supostamente desenvolve softwares para bots de uso pessoal. Há suspeitas de que alguns desses programas já estejam em circulação e que sejam utilizados para o roubo de informações confidenciais de personalidades. E nós sabemos bem quais as intenções, Exypnada: furtos, assaltos e apoderação de fundos. Não é necessário que os indivíduos facultem os números dos seus cartões de crédito ou das suas contas bancárias para que o plano funcione. Os mínimos dados garantem a viabilidade do esquema: por exemplo, as horas em que conversam com estas tecnologias correspondem a horas em que nem estão a trabalhar nem a dormir. Já para não falar nas confidências que as pessoas gostam de fazer a estes sistemas de linguagem, que costumam ser bastante persuasivos e convincentes.

- Já há registo de alguma vítima?

- Até ao momento não, mas devemos atuar o quanto antes.

- Qual é o nome dessa tal empresa?

- Tecnologicar. - Informou o homem enquanto se preparava para tomar um café que acabara de sair de uma pequena máquina de cápsulas.

- Obrigado pela valiosa informação e pela sua confiança em nos entregar um caso de tão elevada importância, senhor do qual nunca saberei o nome porque é um detetive tão sofisticado que não confia em ninguém, ao ponto de se recusar a dizer como se chama a quem quer que seja. Portanto, conhecê-lo-ei sempre como "Diretor". Agradeço mais uma vez e agora agradeça-me a mim pelo que lhe vou dizer: não tome já esse café, a menos que queira queimar a língua. Está vinte e dois graus celsius acima da temperatura tolerável pela boca humana.

O Diretor, perplexo, olhou de soslaio para o rapaz que se encaminhava para a porta. Em seguida, mudou o seu campo de visão para a chávena, pensando se deveria beber aquele café ou não.

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