22: Ultravioleta

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É tão atordoante não conseguir escrever sobre ti.

Sinto-me um escritor à beira da falência
preso entre arabescos fluorescentes de palavras que pulsam e vibram ao redor dos teus calcanhares
deslizam pelos teus cachos repletos de nós e pairam em torvelinhos estelares no Oceano Cósmico das tuas íris.

Tu és uma palavra nova no dicionário Aurélio, uma cor além do espectro visível acima da linha imaginária-ordinária do ultravioleta.
Gostas de deitar em gramas quaisquer, respeitar o caminho que as formigas traçam e ver desenhos nas nuvens.
Montas um universo inteiro de belezas e eflúvios, transbordando afeto na fala e nas pontas dos dedos
que usas para carimbar pontos de luz em cada canto que tuas mãos alcançam.

Eu te leio Clarice Lispector, Bukowski e Manoel de Barros no crepúsculo, pois tu ouves poesia como ninguém nunca ouviu no mundo
e tu me dizes
a respeito da significância das coisas, do barulho do sol, do planar sutil do vento.
Tu me contas teu desejo ocasional de ser árvore
mas tu não podes ser árvore, apesar da tua leveza ainda ser capaz de reverberar no balanço de cada uma das folhas
Porque és significante demais para ser até mesmo humano.
Tu és além.

És poesia como ninguém nunca foi. E a poesia está muito depois de nós.

A Arte de Comer e Derramar EstrelasWhere stories live. Discover now