Cinco

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Ovos ✔
Bacon ✔
Pão ✔
Queijo ✔
Cenoura ✔
Leite ✔
Massa de tomate ✔

Silvana... Silvana? Não. Definitivamente não está na minha lista de compras!

Roberto tira o foco dos congelados e da pizza que será o nosso jantar, para dar atenção à pessoa de cabelo tingido na cor vinho, que nos cumprimenta. Não a suporto. Uma pessoa digna não partiria para cima do marido da melhor amiga sem nem dar tempo do defunto esfriar. Quando Mônica estava viva, ela já se insinuava. Depois que minha mãe morreu, tudo se agravou. Agora ela se entrega na cara dura. Assim como neste exato momento, em que o elogia, alegando que a velhice o está fazendo bem.

— Devemos combinar algo — diz com sua voz afetada. — Tem compromisso pra essa noite? — pergunta com um sorriso recheado de segundas intenções.

— Sim, ele tem — respondo por meu pai. — Aliás, podemos ir? Estou faminta.

— Ah, que ótimo! Por que não jantam lá em casa? Sexta é o dia em que faço meu famoso arroz de forno. Mônica amava...

— Não ouse falar da minha mãe! — rosno. Tanto seus olhos como os de Roberto se arregalam, e o último se despede apressado. Puxando-me pelo braço, me arrasta dali, vermelho de raiva. — Se for me corrigir, nem tente! — aviso.

— Perdeu o juízo, Olívia? Onde está a educação que sua mãe te deu?

— Eu deixo ela de lado cada vez que o senhor dá bola pra essa mulher!

— Não sabe do que fala.

— Só de aceitar as investidas dela já está dando corda, pai! — falo mais alto. — Não acredito que você estava sorrindo enquanto ela falava do "famoso arroz de forno" — digo, imitando a vozinha irritante. — Vamos embora! Terminamos as compras outro dia. Por favor! — imploro, sentindo o olhar de Silvana sobre nós. Ele suspira pesado.

— Isso é muito feio, mocinha. Não é assim que te ensinamos a agir!

— Está mesmo querendo me corrigir por te proteger daquela mulher? Parece que se esqueceu das vezes em que brigou com a mamãe por causa dela.

— Isso não é assunto pra se tratar dentro de um supermercado.

— Ótimo. Vamos pra casa, assamos a pizza e então conversamos — olho firme em seus olhos. — Se despeça dela, pai. Espero por você no caixa.

Acontece que Roberto e eu não conversamos quando chegamos. Ao invés disso, esperamos a pizza assar em cômodos separados, e quando pronta, comemos em silêncio enquanto assistimos a um programa de humor na sala.

Aparentemente, um homem solitário se deixa levar por qualquer afago. O que ninguém se lembra é que a mão que afaga é a mesma que apedreja, como diria Augusto dos Anjos. Silvana é astuta, mas não deixarei que isso ocorra. Aliás, durmo com um único pensamento em mente: se mamãe estivesse aqui, essa seria uma preocupação a menos. Pois Roberto não teria olhos para outra mulher que não fosse ela. Costumava ser o tipo de amor que eu queria para mim.

— Mais de dois anos, Olívia! — Ouço-o grunhir pela terceira vez. — Tenho o direito de conhecer um novo alguém. Acha que ela iria querer me ver sozinho e infeliz?

— Pai, não acho que, em plena manhã de sábado, eu mereça acordar ouvindo você me dizer que quer sair com novas pessoas...

— Não estou falando de Silva–

— Nem me lembre dessa! — interrompo-o rosnando. — Se ousasse cogitar a ideia de se juntar a essa mulher, teria que escolher entre ela ou eu!

— Está agindo como uma criança!

Entre Espinhos (DEGUSTAÇÃO)Kde žijí příběhy. Začni objevovat