Finanças pessoais

12 0 0
                                    

Não, não vão aprender a ficar ricos. Na verdade, esta secção (acho demasiado humilde para chamar de capítulo) serve apenas para podermos chorar juntos, nós, os pobres. Nós, os que nos irritamos severamente com quem diz que o dinheiro não traz felicidade e que não é tudo na vida. Pois, se tivessem de escolher entre gastar 10€ em cerveja ou abastecer o depósito do carro, saberiam que a felicidade vem precisamente de poder ter as duas coisas, mesmo que isso implique ficar a zeros na conta. Porque o importante é aproveitar a vida e, para isso, é preciso dinheiro.

               Diga-se também, que nós, os pobres, na sua grande maioria, sabemos que somos pobres pela nossa péssima gestão financeira e definição de prioridades. Há pobres que não resistem a uma peça de roupa nova, calçado, decoração para a casa, carros ou colecções. Depois, há os pobres como eu, que não resistem a um belo e bem regado convívio. A comida (ou, como dizemos em Ansião, "o comer") não importa, mas, por favor, que não falte bebida. Somos aquele tipo de pobre que, quando vai a um jantar com amigos, num restaurante em que o preço é fixo e com tudo incluído, abdica da sobremesa para ter mais uma garrafa de vinho. Esta história é verídica e já o fiz. Pior, o dono do restaurante aceitou o acordo.

               Os pobres como eu tornam-se ricos depois de algumas cervejas. Pagamos mil trezentas e duas rodadas, mais umas grades e ainda pode acabar numa sangria. Enfim, ninguém nos pára, até porque somos amigos de toda a gente e queremos reconhecer e celebrar essas amizades. De repente, o mundo é nosso e somos pessoas cheias de posses que, no dia seguinte, nem conseguem ir ver em que estado ficou a carteira (se não a perdermos). E, quando temos de enfrentar essa situação extremamente dolorosa, ainda o fazemos com o espanto e admiração de um chamado "falso como Judas": "o quê? Como assim, gastei 30€ ontem?". Pois, amig@, para a próxima leva só umas moedas. E deixa o cartão multibanco em casa. Vais ver que preservas as tuas finanças até ao final do mês. Enfim, todos estes choques e emoções fortes tornam-se ainda piores se o jantar do dia anterior nos tiver caído mal, como sabem que costuma acontecer. Nem sempre os restaurantes cumprem as regras de higiene. Vocês sabem que é por isso que acordam com aquela má disposição e vontade de morrer.

Nós, os pobres, temos sempre mais mês do que salário. Um salário quinzenal talvez resolvesse muitos dos nossos problemas, mas penso que, por enquanto, essa hipótese não está em cima da mesa. No entanto, pensamos sempre que ter 30€ é ter ainda bastante dinheiro e que ainda vai dar para muitas coisas. E, na verdade, dá, desde que o carro tenha gasolina, que não se parta um dente e tenhamos de ir de urgência ao dentista, que o telemóvel não avarie ou que não nos apareça uma publicidade de um desconto espectacular naquelas sapatilhas que queríamos comprar há algum tempo. Se tudo estiver em conformidade, 30€ é suficiente para três semanas.

Sabem quando recebemos um dinheiro extra? Seja o subsídio de férias, um presente de um familiar abastado ou um prémio de raspadinha. Quando nós, os pobres, recebemos uma quantia maior do que a que estamos realmente habituados, o pensamento é sempre o mesmo: "vou poupar x, e gastar y para meu belo prazer. Nem toco no x, começo finalmente a ter uma poupança promissora". Arrisco-me a dizer que 99% dos pobres não cumpre este plano. E sabem porquê? Porque pobre que é pobre tem sempre o azar de aparecer uma despesa extra, principalmente quando parece que vamos passar alguns tempos mais confortáveis financeiramente. Geralmente é o carro, os electrodomésticos ou o telemóvel. E, relativamente aos electrodomésticos, já sabem que reza a lenda que, a partir do momento que um deles avaria, vão todos de seguida. Mas continuo a achar que isto só acontece aos pobres, porque os ricos nem precisam de uma avaria para comprar um novo.

Ainda pesquisei sobre o autor da frase que utilizei no início desta reflexão, sobre o facto de o dinheiro não trazer felicidade, mas não encontrei nada esclarecedor. Na verdade, acho que essa pessoa deve querer manter-se no anonimato. Tendo em conta a controvérsia e o risco de represálias, entendo perfeitamente. Só não posso é concordar com a frase, pronto. Façamos uma comparação: temos duas pessoas, uma pobre e uma rica. Ambas estão muito tristes, sozinhas, e basicamente não lhes apetece ver nem falar com ninguém durante algum tempo. A pessoa pobre precisa de continuar a conviver com os colegas de trabalho (sabe Deus, às vezes, o quanto não nos apetece fazer-lhes coisas, coisas que nem escrevo aqui para não ferir susceptibilidades e para não ofender quem gosta realmente dos seus colegas de trabalho), precisa de continuar a ir buscar os filhos à escola, assegurar as refeições e a limpeza da casa e, num meio pequeno, continua a cruzar-se com pessoas que são dispensáveis. Tudo isto, para poder pagar as contas e manter a vida de pobre sem passar necessidades. E a pessoa rica, perguntam vocês? A pessoa rica compra um bilhete urgente para Paris, em primeira classe, deixa todas as tarefas diárias entregues a alguém e isola-se num hotel de 5 estrelas, com pequeno almoço continental e serviço de quartos. Inicialmente planeia ficar 5 dias, mas decide depois ficar 15, pois precisa mesmo de descansar. Até pode ficar mais 1 mês, ou nunca mais voltar. Tudo depende do grau do problema. Pronto, realmente o dinheiro pode não trazer felicidade, porque não vai deixar a pessoa rica feliz de um momento para o outro. Mas leva-a a chorar a Paris. O que preferias?

30 sem uma linhaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora