19. Resgate

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Nina

Nas noites anteriores às visitas do Imperador, Nina precisava servir para sua senhora um chá escuro feito de uma erva malcheirosa e bolorenta. Assim, quando a manhã chegava, a consorte já se encontrava vitimada por um terrível estado de enjoo e tremor. Dado o escândalo dos Yohan, foi convocado um médico da cidade apenas para acompanhá-la, mas Alina havia ganhado o favor do homem com alguns dragões de ouro, de modo que ele sempre parecia disposto a mentir por ela. Nina não aprovava esse tipo de atitude, mas estava pouco interessada em se meter nas tramoias matrimoniais. Em nome do poder que ela agora desejava, era melhor fazer silêncio e guardar toda a informação para si.

Em verdade, desde a conversa com Heng, o coração de Nina se encontrava atado em um profundo estado de dualidade. Muitas vezes ela surpreendeu a si mesma girando o saquinho com a estranha erva da consorte em suas mãos, questionando-se sobre o que aconteceria se ela o entregasse para seu irmão. Ela sempre tratava de fazer sumir com essas ideias logo que elas surgiam, afinal não fazia sentido trair seus próprios objetivos. Ela sabia que também não havia sentido em trair sua própria amiga, mas Nina rapidamente aprendeu a minar seu remorso. Talvez Lana sequer fosse uma amiga. Era provável que ela fosse simplesmente uma mulher de nascimento baixo almejando a integração na nobreza através da amizade ou do casamento.

Mas você também não é assim?, a consciência de Nina retrucava incomodamente.

Eu sou muitas coisas, ela respondia.

Inclusive uma traidora!, sua mente insistia.

Aquela discussão interna nunca a abandonava e seu espírito estava constantemente mergulhado num estado de duelo. Inclusive naquele momento, em que ela ajudava Alina a desgrenhar seus cabelos antes que seu marido chegasse.

— Não devia consumir todas essas ervas, minha senhora. — Nina comentou com doçura. — Tenho o pressentimento de que elas fazem mal ao bebê, e é um crime terrível ferir um herdeiro imperial.

Mesmo abatido, o olhar de Alina carregava raiva quando se dirigiu para o rosto de Nina.

— Se me importasse seus pressentimentos eu teria te contratado como minha vidente pessoal e não como minha aia. — cortou Alina. — Além disso, essas ervas me foram dadas pelo próprio Príncipe Herdeiro e ele jamais me faria mal. Elas servem tão somente a um propósito e nada mais.

Nina não teve tempo para contra-argumentar. No mesmo instante ela foi interrompida por uma batida insistente na porta. O arauto real entrou, anunciou o Imperador, e saiu. Logo atrás dele apareceu a própria Majestade Imperial e Real, acompanhado por dois guardas e envergando uma expressão grave em seu rosto.

— Meu senhor... — Alina disse forçando uma voz fraca. — Eu me curvaria, mas minha situação não permite. — e apontou um dedo trêmulo para o balde cheio de vômito que estava do lado de sua cama.

O Imperador simplesmente gesticulou, indicando que aquilo não tinha relevância naquele momento.

— Me surpreende que você ainda esteja mal. — Gaja Navani disse com sua voz de trovão. — Nunca vi um veneno que tivesse efeitos tão longos.

Alina soltou um suspiro profundo e dolorido.

— O veneno feriu a semente em meu ventre, senhor, e todos sabem que quando o filho sofre a mãe também sofre. A dor que eu sinto é a dor da criança e o sofrimento que eu sofro é o mesmo sofrimento que ela sofre.

O Imperador franziu ainda mais o cenho.

— Se te faz mal, é provável que tudo que haja em seu ventre é um cadáver, senhora. — ele pontuou. — Chamarei outro médico, bem mais competente que aquele que agora te serve, e ele poderá nos dirá melhor a causa dos seus males.

O Despertar da FênixOnde as histórias ganham vida. Descobre agora