– Desculpe. – Tentei pensar em uma cor clara, assim quem sabe minha aura não a preocupasse.

   – Não se desculpe. Todo mundo tem direito a uma aura escura de vez em quando. Mas aconteceu alguma coisa no trabalho?

   – Não.

   Depois de mais ou menos um minuto de silêncio, ela disse:

   – Você sabia que Harry levaria Kendall  lá hoje à noite?

  – Não. – Pensei no que eles estariam fazendo naquele instante. Ele a estaria beijando? Tocando? Fodendo? O ciúme, desconhecido e indesejado, se apossou de mim. O que eles fazem não é da sua conta.

   – Ela é tão simpática, mas… – Sua voz morreu, mas fiquei de orelha em pé. – Não sei se eles combinam. Tem alguma coisa errada. É como se estivessem se esforçando demais para dar certo.

   – Mmm.

   Gemma riu.

   – Agora só faz ruídos, é? Nem usa mais palavras? – Ela deu um tapinha na minha perna. – Coitadinho. Vou deixá-lo em paz.

   No início, agradeci por ter me deixado quieto, mas talvez eu devesse tê-la estimulado a continuar falando, porque meu cérebro estava preenchendo o silêncio com lembranças da voz do Harry, grave e rouca.

   Sua respiração rápida. Seus gemidos suplicantes. Será que ele estava gemendo assim com ela naquele momento? Estava dizendo a ela que queria mais? Estava mandando que ela gozasse como havia me mandado? Talvez.

    Talvez aquele fosse o seu comportamento padrão.

   Talvez ele até seguisse um roteiro. Depois de dizer um rápido “obrigado e boa noite” à Gemma, entrei pela porta principal e a tranquei atrás de mim. Todas as luzes estavam apagadas e a casa estava em silêncio total. Então congelei ao ouvir um som de gelo num copo vindo da sala de estar.

   Que estranho. Harry estava em casa? E sentado sozinho no escuro? Ou Kendall estava com ele?

   A última coisa que eu queria era interromper, mas, considerando a remota chance de que não fosse Harry, e sim algum tipo de invasor, parei na soleira da sala e espiei na escuridão. Pensei ter distinguido uma figura solitária sentada no sofá, mas meus olhos ainda estavam se acostumando à escuridão quando falou: – Entre.

   Era ele.

   – Não, obrigado.

   – Entre.

   As coisas têm sempre que ser do seu jeito, não é?

   Eu me odiei por fazer o que ele queria, mas entrei na sala. Ele se levantou, foi até o carrinho de bebidas que ficava perto da janela e despejou algo num copo. A luz cinza-prateada que passava pelas cortinas destacava sua silhueta, e seus ombros pareciam ainda mais largos do que eu me lembrava. Meu pau me traiu e tentou levantar.

   – Quer beber? – ele perguntou.

   – Não, obrigado. – Banquei o britânico tranquilo, porque sabia que isso o incomodaria. Ainda sem olhar na minha direção, ele levou o copo aos lábios.

i choose you.Where stories live. Discover now