A Sonhadora

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A música nos alto-falantes aumenta, conforme a canção entra no refrão. A coreografia se intensifica, se enchendo de entusiasmo. Se enchendo de alegria, uma alegria que contagia os fãs, ao redor do palco. A plateia vibra, pulando e cantando. Elas batem palma no ritmo da música. Alguns gritam, com suas bebidas na mão, outros berram o refrão, em busca de fazer parte daquilo.

Os holofotes dançam ao redor de Seraphine, que dança e canta livremente, a coreografia vindo a ela naturalmente. Afinal, tanto ensaio e tanto preparo faz com que seu corpo flua livremente pela coreografia duramente elaborada. Alguns dos fãs empurram as grandes, balançando elas, na tentativa de fazer suas mãos chegarem apenas um pouco mais perto da cantora no palco. É a última canção. Seraphine quer dar tudo de si nela. Quer encerrar tudo do melhor jeito possível.

Ela fecha os olhos e por um momento ela sente tudo aquilo. Toda aquela alegria. Toda aquela empolgação. Existem algumas vírgulas diferentes no meio dela, claro. Emoções e pessoas não são tão simples para ser coisas únicas. Deve e sempre haverá nuâncias. Elas, essas emoções, dançam e flutuam por entre várias outras.

Seraphine sempre pensa isso, como modo de apaziguar seu coração, só que a verdade é que a desarmonia incomoda ela, mas isso — a alegria que ela traz para Piltover e Zaun — é um avanço... Certo?

(E) Ninguém é perfeito — ela canta, segurando o microfone com ambas as mãos.

Ela engole a saliva, rapidamente. Abre os olhos, olhando para todas as pessoas que vieram a ver. De Zaun e Piltover. Mais Piltover que Zaun, infelizmente. O preço do ingresso é sempre algo difícil de discutir.

Você não precisa ser forte. — Seraphine leva a mão ao peito e então o estende, na direção do público. — Todo santo dia.

Ela continua cantando, tentando por cada pingo de emoção naqueles últimos versos. "A Sonhadora" é o nome da música. Uma das poucas que, hoje em dia, não tem algum dedo ou toque dos seus produtores. Músicas entregues para ela cantar, prontas. A cada álbum, se torna mais difícil lutar pela liberdade criativa. Afinal, precisa agradar os patrocinadores. Precisar agradar o público alvo. Seraphine entende isso, mas é sempre uma pedra em sua garganta.

A música termina, em um gran finale e o show acaba. Outro show acaba. Os aplausos tomam conta do lugar, com Seraphine sorrindo alegremente, acenando e se despedindo, conforme ela sai pela cortina dos fundos do palco.

As pessoas vão se dispersando, aos poucos. Nos bastidores, Seraphine murcha. Seus ombros caem e ela agarra a garrafa de água mais próxima. Sua garganta sente um alívio horroroso. Várias pessoas vem em cima dela. A equipe da produção, sua mãe, os produtores, demais músicos e dançarinas, vindo parabenizar ela.

— Excelente show, Seraphine! — alguém diz.

— Eu amei como você colocou sua alma naquelas coreografias, querida — outra pessoa comenta.

— Você agiu muito bem, filha — sua mãe fala, segurando sua mão.

— Outro show com casa cheia, hein? — outra pessoa pontua, falando bem alto.

— A platéia tava louca por você! — outra pessoa, que Seraphine tem certeza que nunca viu antes, conta.

Ela dá um risinho, que todos acham fofo, sem saber lidar com todos aqueles comentários e pessoas. É difícil. Lidar com todo aquele barulho. Não só o que eles dizem, mas o que eles sentem. Uma cacofonia. E tem coisas ruins ali. Ela sente vírgulas de inveja. De mentira. De elogios que vem não por admiração, mas por dever.

— Ei, vamos logo com isso, temos a sessão de "Meet and Greet" ainda. — Uma voz ecoa mais alto que as outras, calando as demais.

Quem diz aquilo é Joe Beatle, o produtor de Seraphine. Um sujeito abastado de Piltover, bastante renomado por lidar com outros músicos de Piltover. Quem "descobriu" Seraphine. Ela, por sua vez, termina de engolir outro gole de água. Está cansada. Não quer ir no Meet and Greet. Ela mesmo já disse que não gostava daquelas coisas. É impersonal. Aquilo não ajuda ninguém. Aquilo não é pelo que ela se tornou uma cantora. Queria trocar de roupa. Essa roupa é apertada. Às vezes pinica. E não é confortável.

Perfect PinkWhere stories live. Discover now