—– Se eu pudesse voltar atrás eu voltaria...


—– É tarde demais pra voltar atrás — Ela falou amargamente e as lágrimas encheram meus olhos.

...

Senti alguém me sacudir, e quando levantei os olhos vi que Peter estava ajoelhado na minha frente e suas mãos estavam tocando o meu rosto molhado.

Por impulso, eu inclinei o corpo e o abracei forte, e ele não falou nada, apenas correspondeu aquele abraço como se também necessitasse de um.

—– Olha a nossa mocinha sortuda aí — Uma voz interrompeu o nosso momento.

Peter se afastou e se levantou rapidamente, e eu limpei os vestígios de lágrimas que ainda estavam em meus olhos e sorri fraco pra o médico que me olhava com ternura.

—– Desculpe, atrapalhar o momento de vocês —  Ele olhou pra mim e para o Peter ao mesmo tempo.

—– Não atrapalhou não, doutor — Peter falou sério.

—– É, não era nada demais.

Se o Peter não faz questão de eternizar esse momento, eu também não.

—– Então me acompanhem, por favor —  Ele ordenou e nós acompanhamos os seus passos.

......

Depois de decorar centenas de quadradinhos na parede e de ver todas as revistas que estavam sobre a mesa, eu estava começando a ficar entediada com a demora do doutor.

E como eu não tinha uma boa garrafa de whisky pra secar, me contentei em roer as unhas.

No último dedo Peter segurou minha mão e eu olhei pra ele inquieta.

—– Ei, se acalme, ele já está voltando.

Seu olhar por um instante me acalmou e eu pude finalmente respirar fundo.

Depois de alguns minutos o médico voltou trazendo o resultado dos exames e mais medicamentos. O que era estranho, ninguém que sofre um simples acidente toma tantos remédios assim.

E mais estranho disso é que ele entregou para o Peter e não pra mim, e a amizade dos dois era bem notável.

—– É uma guerreira e tanto, Ana, seus exames não deram nenhuma alteração, mas você  ainda precisa tomar esses remédios para auxiliar na sua recuperação, Mais alguns dias e estará novinha em folha.

Mais alguns dias?

—– Obrigado doutor — Peter agradeceu apertando a mão dele e ambos se olharam de uma forma estranha.

Na volta pra casa, eu fiquei pensativa. Tudo bem que eu ainda não conseguia andar, mas não estava mais sentindo dor, então pra que mais remédios?

Peter abriu a porta do carro pra mim, e fez um movimento pra me pegar no colo, mas eu recusei.

—– Pode me dar a minha muleta por favor?  — Pedi sem olhar para ele.

Ele não se opôs à minha escolha, e foi até o porta malas e pegou a muleta e trouxe pra mim.

—– Obrigado — Agarrei a mesma, em seguida me apoiei nela

Fitei seus olhos verdes distraídos enquanto ele abria a porta, tentando adivinhar os seus pensamentos. Quais eram os segredos que poderiam estar por trás de alguém tão bom e humilde?

Como eu ainda não tinha firmeza nas pernas, precisei da ajuda dele para poder subir as escadas.

Ele me carregou no colo e me colocou cautelosamente em cima da cama, depois me olhou sorridente, e um pouco ofegante pelo esforço.

—– Mais alguns dias e não vai mais precisar que eu te carregue..

—– Poxa, será uma pena — Sorri fraco.

Olhei bem em seus olhos, mas ele desviou rapidamente.

—– Bom — Suspirou — Eu vou descer, se precisar de alguma coisa, grite.

Ele acariciou de leve o meu rosto e sorriu.

—– Fica bem.

—– Pode deixar.

Eu sou imensamente grata por tudo que ele fez por mim até agora, mas eu sei que tem algo errado com ele, eu posso sentir.

E não consigo ficar em paz com isso.

Peguei minha muleta e fui até o criado mudo, mas não havia nada além de poeira nele, e eu me lembro perfeitamente de ter visto alguns papéis quando eu fui pegar o perfume.

Estranho, eles terem sumido daqui.

Talvez ele não queira que eu saiba quem ele realmente é, mas eu vou descobrir.

DesilusãoOnde histórias criam vida. Descubra agora