— Só estava me perguntando se você era o mesmo gatinho do meu mundo.

— Eu não sou o gatinho de mundo algum. – ele falou rispidamente. — Sou único e eu sei quem sou. – ele me olhou com um pouco de desprezo, mas era um olhar típico de gato, como se eu fosse uma humana patética.

— Mas se você é o mesmo gato preto que existe no meu mundo, porque está tão diferente? – eu não poderia dizer exatamente qual diferença, mas aquele gato preto parecia mais arrogante que antes, mais sombrio, e ousaria dizer que até mais... maligno. No escuro, em alguns momentos parecia que ali existiam apenas dois olhos brilhantes flutuando.

— Cada mundo tem uma versão minha que merece, mas ainda sou o mesmo, e ainda estou disposto a lhe ajudar. – ele falou e parou de repente como se tivesse ouvido algo. Olhei ao redor, não existia nada além das casas e a rua escura a nossa frente. O gato preto voltou a caminhar e me olhou com aqueles olhos brilhantes. – Você sabe que posso andar em todos os mundos, eu faço o que eu quiser.

— Você não tem medo da Elzarella? – ele gargalhou, e aquilo foi uma cena um pouco sinistra já que gatos não riam. O gatinho preto estava diferente, talvez fosse influencia daquele mundo, ele parecia lindo, belo, uma cidade natalina, mas algo sombrio rastejava nas entranhas daquele mundo e daquela pequena cidadezinha.

— Aquela velhota só dá medo em criancinhas. – ele falou e me olhou novamente como se eu fosse a tal criancinha que ele estava se referindo.

— Não vi você fazendo alguma coisa quando ela estava acabando com a raça da Outra Mãe e levando seu filho, Rudy, de refém. – aquilo saiu involuntariamente, ainda sentia um arrepio ao mencionar o nome do Rudy, e ao mencionar o que aconteceu naquele dia.

O gato preto ficou em silencio, pensativo, comecei a pensar que talvez depois de tanto tempo, aquele gato preto seja mais gato do que humano, que todos aqueles sentimentos que um dia já existiram dentro dele simplesmente sumiram, ou talvez eu estivesse enganada, alguma coisa ele queria, ele tinha algum objetivo, talvez vingança.

— A Elzarella vai receber o que merece, e eu vou ajudar você com isso. – ele falou. — Ela está com seus pais, você sabia?

Meu coração gelou. O gato falando aquilo talvez soubesse onde meus pais estavam.

— Você sabe onde eles estão? – perguntei tentando conter a aflição.

O gato preto não respondeu, continuou caminhando tranquilamente na neve. Aproveitei para ficar em silencio também e comecei a pensar em Rudy, pensei se não estaria sendo injusta com ele e que agora definitivamente eu estava com Jack, e ele também estava com a Rowena, mas eu não podia deixar de sentir aquele leve aperto no peito ao lembrar como eu e ele era.

— Estamos quase chegando. – o gato preto falou me tirando daqueles pensamentos.

Olhei em frente e havia uma arvore enorme cercada por um lago congelado. O gato preto parou na borda do lago e olhou para baixo, fiquei ao lado dele e fiz o mesmo, mas não vi nada.

— Sabe, Coral, engraçado você mencionar o meu filho, Rudy. – o gato preto me encarou e sentou como se estivesse esperando alguma resposta minha. Mas eu não sabia exatamente o que falar diante daquilo. — Vocês deveriam ficar juntos. O Jack não é quem você imagina ser.

O gato preto realmente estava diferente, apesar de toda sua arrogância e superioridade, ele nunca agiria assim. Eu conhecia Jack. Algo dentro de mim gritava para que eu saísse correndo agora mesmo, e talvez conseguisse chegar à casa do Jack em segurança. Dei alguns passos para trás, mas o lago congelado estava em meus pés e comecei a sentir algo estalando, o gato preto me encarava com maldade, como se fosse me atacar.

— Você não é o mesmo gato preto do meu mundo. Quem é você? – perguntei.

O gato preto sorriu, os dentes e as garras pareciam um pouco maiores.

— VOCÊ NÃO PODE FICAR COM O JACK. – a voz que vinha do gato agora era esganiçada e assustadora, ele repetia aquilo enquanto aproximava-se de mim mais e mais. Meu pé entrou no lago e o gelo começou a trincar ainda mais. O gato preto parecia um monstro, algo tão ruim que assustaria até o espirito mais corajoso.

— VOCÊ NÃO PODE FICAR COM O JACK. VOCÊ NUNCA VAI ENCONTRAR SEUS PAIS. – o gato preto falava de uma forma tão esganiçada que baba começava a escorrer de sua boca e seu olhar naquele momento era de alguém que estava prestes a me devorar. E então, ele saltou em cima de mim e tudo ficou escuro.

Saltei da cama como se estivesse levando um choque e Jack que estava ao meu lado segurou meus braços tentando me acalmar. Meu coração estava acelerado e quase não conseguia respirar. Jack olhava fixo nos meus olhos e falava palavras que estavam distantes para mim.

— F-i-c-a-c-a-l-m-a! – ele falava suavemente ainda segurando meus braços. Seus olhos estavam arregalados de preocupação. Notei que ainda era noite e ainda estávamos no quarto. — Foi só um pesadelo, amor. – ele falou e então respirei fundo e consegui ficar calma.

Voltamos a nos deitar na cama e ele me abraçou forte. Olhei para seu rosto, ele ainda aparentava tão cansado, então me inclinei rapidamente para olhar a janela atrás dele, ele se virou e também olhou na mesma direção.

— Eu tive um sonho horrível com o gato preto. – falei.

Jack sorriu suavemente e beijou minha testa, seu sorriso era tão divertido que me fez ficar tranquila. Ele me abraçou forte novamente e fechou os olhos, mas antes de cair no sono, ele murmurou algumas palavras.

"Talvez hoje, em algum dos mundos, seja sexta-feira 13".

Adormeci pensando naquela frase, pensando no pesadelo que havia tido e com medo de ter novamente, mas também pensei no que poderia me aguardar amanhã, que poderia ser algo pior do que aquele pesadelo ou talvez melhor do que poderia imaginar. Mas, diante de tudo aquilo, Jack estava ao meu lado e naquele momento era tudo que importava.

"Quando você acordar eu vou te devorar"

A voz esganiçada ecoou profundamente em minha mente agora adormecida. 

Coral RosesWhere stories live. Discover now