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E então eu comecei a namorar.

Eu o conheci em uma reunião do trabalho e me apaixonei perdidamente. Ele era lindo, gentil, companheiro, divertido e o melhor de tudo, me amava.

Amava-me profundamente, eu sabia, não importava os desencontros, não importava que ele me deixasse esperando três horas, ou que não demonstrasse carinho, afeição, não importava que ele me ligasse quinze vezes no dia para saber onde eu estava e com quem eu estava, não importava que ele não me deixasse sair com as minhas amigas, não importava que ele ainda ouvisse os pais, os pais... quantos anos tínhamos? 30 anos e ele ainda era influenciado pelos pais. E os pais não me achavam boa reputação.

Nada era espontâneo, nada era por contra própria, mas ele me amava, ele fazia de tudo para estar comigo, só que... às vezes ele estava ocupado demais para estar. Ele me amava, eu tinha certeza. Certeza?

Datas são importantes para mim.

Quando completamos três anos de namoro, eu planejei um jantar no nosso restaurante favorito. No nosso? No dele. No restaurante favorito dele. Comprei alianças e seu perfume favorito.

E então eu esperei, por uma, duas, três, quatro horas. Eu estava cansada. Encaminhei uma mensagem, mas ele não visualizou.

– Querido, aconteceu alguma coisa? Já cheguei faz quatro horas.

Ele nem fazia questão. Meu estômago revirou e eu desabei, não pude segurar as lágrimas que vieram para libertar toda a dor que eu estava sentindo, a dor de anos.

No fim, eu precisava tanto me sentir amada que inventei tudo que eu sabia dele. Eu não queria acreditar, mas fiz de uma mentira a verdade absoluta. Eu havia entrado naquele relacionamento porque me faltava amor, e eu queria, queria desesperadamente me sentir querida por alguém.

E eu já sabia disso, sim, não era uma reflexão recente, eu não havia chego àquela conclusão na mesa do jantar de comemoração dos nossos três anos de namoro. Não. Eu já sabia, desde o primeiro dia eu sabia, sabia que era mentira, mas eu insisti.

Eu precisava, desesperadamente, me sentir amada.

E então eu acreditei naquilo que eu queria acreditar. Acreditei que ele era bom e que ele me amava. Inventei que ele era gentil e divertido. Ele era perigoso e controlador. Mas ele me amava, não é?

Saí do restaurante desnorteada, e caminhei. As lágrimas tapavam minha visão e eu apenas me deixei guiar sem rumo.

Meu telefone começou a tocar e eu vi, era ele. Não atendi, eu queria me livrar daquilo e então arremessei o celular o mais longe que pude, e o vi sendo destruído por um carro. E assim, fiz com o perfume e as alianças.

Não consigo mais aturar a tempestade dentro do meu coração.

E então eu gritei, gritei com todo o ar que eu tinha em seus pulmões. Ajoelhei-me no chão e fiquei ali. Ninguém me impediu. Era como aquela vez. Quando as águas me chamaram.

Mas desta vez, ardia. Havia fogo e ardia muito. Era dolorido e eu só queria gritar e fugir de mim.

Fiquei ali por alguns minutos até que minha alma acalmasse meu corpo desorientado e meu coração destruído.

Era hora de partir.

Eu me levantei e voltei a andar, eu precisava ir pra casa. Mas, assim que passei por uma livraria, eu decidi mudar meus planos, eu quis, quis muito comer aquilo, eu não sabia exatamente o que era, mas o aroma que vinha daquele local era puro, doce e eu precisava dele.

– Seja bem vinda ao Empório filhos da lua. Sou Kim Namjoon, em que posso ajuda-la?

Por um momento eu me senti envergonhada, eu segui o aroma doce, mas aquilo era uma livraria, alguém realmente entraria ali só pela comida?

– Boa noite, gostaria de um livro.

Não, eu nem gostaria, e nem precisava de um. Confesso que à época meu ritmo de leitura não estava dos melhores, na verdade, ele nem existia, eu pouco lia.

– Separamos o Empório em regiões, e não temática, então temos livros do Japão, Alemanha, Brasil, todos dividido por corredores. – Ele foi apontando para as prateleiras, eu me surpreendi com isso, era uma boa forma de repartição.

Ele pareceu perceber minha falta de interesse, ou, penso que achou que eu estivesse indecisa então decidiu me guiar pelos corredores me explicando um pouco mais e tomando a liberdade de me indicar livros lidos por ele.

Ao passar por um espelho eu me assustei.

Eu estava assim o tempo todo?

Meus olhos estavam vermelhos e inchados, a maquiagem escorrida e o cabelo todo desarrumado, e eu estava suja, tinha fuligem da rua em meu rosto. Patética. O que eu esperava? Eu me joguei no meio da calçada e fiquei deitada ali chorando.

Tentei me arrumar minimamente e continuei seguindo-o até que paramos em um setor curioso, havia uma estante com livros embalados, seu embrulho simples feito de papel kraft cobria o título e todo o restante do exemplar. Era um mistério.

– Se me permite dizer, acredito que este setor possa te agradar, sinto que a senhorita não esta procurando por algo em específico e estes aqui podem te surpreender.

Kim Namjoon pegou um dos livros e começou a explicar.

– Criamos esse projeto ontem, a senhorita seria a a responsável por inaugurá-lo. Tivemos a ideia porque acreditamos que o livro também pode escolher a pessoa, sabe? Parece um pouco bobo, mas uma energia pode te guiar a encontrar respostas. – Ele devolveu o livro na estante e me deixou sozinha.

Eu parecia precisar de respostas? Obviamente que sim.

E então eu me posicionei à frente da prateleira e fechei os olhos. Estiquei as mãos tateando cada exemplar, uma energia ele disse, uma energia vai me guiar.

Logo na terceira prateleira eu o senti. O livro havia me escolhido, pois, diferente de todos, esse queimava feito brasa em minhas mãos, mas o fogo não queimava, era como se afagasse minhas dores. E então, eu o escolhi também.

Me direcionei ao caixa e então eu vi aquilo que havia me atraído até o Empório. Eram brownies.

– Eu vou levar dois brownies também – Disse tirando a carteira da bolsa.

– Ótimas escolhas – Kim Namjoon riu. – Aqui está, volte sempre.

Caminhei por alguns minutos até chegar em uma pequena praça perto do Empório. Sentei-me e logo tirei um dos brownies da sacola. Fechei os olhos para poder aprecia-los, não sei vocês, mas só assim consigo sentir cada sabor explodindo em minha língua. E sim, foi exatamente como eu imaginei, era puro e doce.

Em seguida, retirei o livro.

Espero que você tenha as respostas que eu preciso.

Assim que puxei o barbante rosa que prendia o papel, o título se revelou.

Epiphany.

Kim Seokjin.

Eu saltei do banco quase derrubando o brownie das mãos.

– Kim Seokjin? – Eu gritei. Meu coração estava acelerado e meu rosto se iluminou em um sorriso. – Você de novo?

Eu me sentei novamente e acariciei o livro. A capa era simples, algumas gotas de chuva que pareciam ter sido desenhadas a mão preenchiam toda a frente. Virei o livro para ler a sinopse, afinal, nada sabia sobre a história.

Eu sou quem eu deveria amar nesse mundo
Esse meu eu brilhante, minha alma preciosa
Eu finalmente percebi isso, então eu me amo
Apesar de não ser perfeito, sou tão belo
Eu sou quem eu deveria amar.

Eram apenas estas palavras que repousavam brilhantes no verso do livro. Nada dizia sobre a história, mas muito dizia sobre mim. E foi assim que eu notei que de fato, aquele livro havia me escolhido por uma razão, nele eu encontraria as respostas.

Seokjin sempre tinha razão, eu enfim estava no caminho certo e tinha certeza disso.

A quintessência de SeokjinOnde as histórias ganham vida. Descobre agora