Capítulo Trinta e Um

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Pressionar a campainha de Fernando se tornou uma tarefa mais difícil do que Luana imaginou. Especialmente depois da discussão com seu eu interior.

Entrar no pátio não foi nenhum problema, usou o controle reserva para abrir e fechar o portão. Logo, estacionou o carro e desceu, pegando as coisas no banco de trás. Ajustou o vestido e os cabelos, caminhou até as escadas e subiu degrau por degrau com decisão, e então... Ficou apenas encarando a froga da porta, com a mão erguida, mas sem ir adiante.

Vai bater a covardia justamente agora, mulher?, sua consciência perguntou.

Luana trocou o peso do corpo de um pé para o outro.

— É claro que não, só estou analisando o que farei se ele abrir... Cumprimentar com um sorriso, como se nada houvesse acontecido? Me manter sincera e pedir desculpas de uma vez, antes que Fernando fale qualquer coisa?

Isso supondo que ele abrirá, muahahaha...

— Enquanto pessoas normais têm consciências que dão bons conselhos, ou ao menos são sérias e preocupadas, a minha é uma maldi... Bendita sarcástica e maléfica. Isso quando não fica fofocando nas horas vagas, mesmo não sendo chamada... — resmungou Luana, e então se ordenou a focar no que precisava ser feito: consertar as coisas com Fernando.

Tomando coragem, voltou a erguer a mão, que nem sabia ter se escondido atrás de suas costas. Pressionou a campainha com mais força do que o necessário e manteve o dedo nela por longos segundos. Estava arrependida, tudo bem, mas se Fernando ousasse não responder, a coisa ficaria feia.

Sua preocupação foi em vão.

Ele a atendeu em poucos segundos, certamente porque já se encontrava por ali, trabalhando na cozinha. Não falou nada, apenas lhe deu as costas e se afastou. Ao menos não fechou a porta em seu nariz.

Luana entrou e o acompanhou, encontrando o que o manteve ocupado pelas últimas horas. Havia uma panela no fogão, algo recém-batido na batedeira em um dos balcões e a geladeira com a porta escancarada. A lava-louças transbordava, assim como a pia e o balcão que a cercava. Metade da ilha da cozinha estava ocupada com utensílios sujos e a outra metade com farinha e uma massa bem fininha espalhada, o que a fez pensar que Fernando trabalhava em um apfelstrudel. Perto, duas bandejas de cookies de chocolate branco e, pelo cheiro, uma forma de brownie assava.

Quase sentiu que todo o seu trabalho culinário seria indesejado, não fosse o fato de que apenas coisas doces pareciam sair daquela fúria de cozinhar em que ele estava imerso.

Suspirou, deixou a bolsa no banquinho perto da porta e prendeu o cabelo. A bolsa térmica ela carregou até uma das banquetas e a depositou ali.

Fernando lavou as mãos e colocou as luvas novamente. Em momento algum a olhou, tampouco levantou a cabeça do seu trabalho de espalhar açúcar mascavo cuidadosamente sobre as fatias finas de maçã verde que seriam o recheio do apfelstrudel.

Luana também não se dignou a falar nada. O fato da cozinha estar uma bagunça era a mensagem clara e direta de que ele se encontrava perturbado pela briga dos dois mais cedo. Então deu uma empilhada na louça de um lado do balcão, catou o escorredor, a esponja e o detergente. Por fim, iniciou a longa e tediosa tarefa de limpar todos os apetrechos que não podiam ser colocados dentro da lava-louças.

Foi um serviço bem-vindo e ambos trabalharam em silêncio. Fernando parou de criar novos doces e se focou em terminar os que já tinha iniciado. Luana lavou e secou tudo o que ele depositava na pia para ela, espiando seu rosto sério de vez em quando. Não recebia qualquer olhar de volta, mas se contentou com o fato de que ao menos atuava como sua auxiliar sem ser enxotada.

Meu Adorável VizinhoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora