A culpa é do álcool

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Toda pessoa quando bêbada tem sua mania. Uns choram, outros riem, outros bebem ainda mais e ainda têm aqueles que sobem em mesas e terminam a noite semi nus. A minha mania é enviar mensagens para famosos. Humilhante? Sim, mas pelo menos ninguém vai ver. E mesmo se vissem, eu seria só mais uma nas milhares de mensagens que eles recebem diariamente. São cantores, atores, escritores, pessoas realmente famosas, com milhões de seguidores e que nunca, nem se eu quisesse, leriam minhas declarações. O que eu não previa era que essa mania me levasse tão longe.

Era uma sexta feira e, como toda sexta feira, era noite das garotas. Eu e Beatriz fomos até a casa da Cecília com algumas garrafas de vinho barato e que em poucas horas já estavam quase todas vazias. Na televisão, as imagens passaram de um filme adolescente para clipes de músicas nostálgicas e nós dançávamos como se ninguém estivesse olhando. Já estava quase no fim da madrugada quando terminamos a última garrafa.

— Quem termina? — disse Bia com a garrafa vindo da cozinha. Levantei a mão, eu nunca recusava bebida. 

— É isso, nunca mais eu vou beber. — disse Cissa jogada no sofá com a mão sobre a cabeça. — E dessa vez é sério.

— Você sempre diz isso. — retruquei.

— Mas dessa vez é verdade, pode anotar, nunca mais eu vou beber.

Eu e Bia rimos. Cecília podia ser muito certa sobre suas decisões, mas aquilo não passava de um blefe motivado por um mal estar que só o vinho proporciona. Comecei a arrumar os copos e as garrafas que se espalhavam pela sala cruzando algumas vezes com a gata de Cissa.

— Liz, você viu que o André postou stories? — gritou Bia.

— Deixe-me ver. — respondeu Cissa— Ele é gostoso mesmo né menina.

Voltei rapidamente para sala e peguei o celular de Bia. André era um ator bonito, educado, consciente, sensível, amoroso e eu sabia disso pelas redes sociais e pelas entrevistas. Eu era caídinha por ele desde seu primeiro papel numa novela infantil e quinze anos depois nada parecia ter mudado. Ele agora trabalhava em uma série internacional e continuava com o mesmo sorriso que me fazia derreter. 

Juntando as peças: eu, bêbada, vendo a foto daquele homem maravilhoso, não podia ter outra reação. Peguei o meu celular, pesquisei o nome dele, entrei na conversa em branco e comecei a pensar no que escrever. 

"Oiii, André" 

Será que três is é demais? Acho melhor mandar dois, pensei comigo.

"Oii, André! Tudo bem? Meu nome é Liz, eu te acompanho a alguns anos e queria dizer que você é lindo"

Pelo amor de Deus, Liz, você responde um email melhor do que isso, se esforça garota.

"Oii, André! Tudo bem? Meu nome é Liz, eu te acompanho a alguns anos e queria elogiar o seu trabalho, você entrega tudo com muita paixão e dedicação e cativa os espectadores de uma forma tão natural. Você é muito talentoso e eu te admiro muito!"

Eu teria vergonha de ser melosa assim, mas estava bêbada. 

Enviei. 

Cissa e Bia comentavam o perfil de alguém que estudamos junto e eu me juntei a elas. Ficamos ali até adormecermos e na tarde seguinte acordamos com uma puta ressaca. Bia e eu pegamos as coisas e fomos para casa. 

Cecília tinha dinheiro suficiente para ter um apartamento próprio e, depois de morar três anos comigo e com a Bia, era um livramento ela ter o próprio espaço. Ao mesmo tempo que sempre estávamos sempre juntas, ou seja, nós tínhamos dois apartamentos. 

Subimos o elevador exaustas. Nenhuma bebida dá mais ressaca que um vinho ruim. Só tequila, mas nesse caso, o que vem é a ressaca moral. Preparei um macarrão, enquanto a Bia tomava banho e depois de comermos, deitamos na minha cama e dormimos até o começo da noite. 

Acordei mais descansada, Bia ainda dormia o sonho das justas, peguei o celular e mandei mensagem perguntando como Cissa estava. Ela era a mais fraca quando o assunto era álcool. "Pra alguns é fraqueza, eu chamo de economia", era o que ela sempre dizia.

Entrei no Instagram e haviam três mensagens diretas. Apesar de saber que era quase impossível, eu ainda tinha uma pontinha de esperança que André me respondesse. As mensagens eram de uma amiga que eu havia compartilhado o trabalho, Cissa e a outra do André. Gelei. O André havia me respondido? Meu estomago borbulhou e entrei na conversa.

"Hahaha muito obrigado, eu acho 😅 você frequenta o clube? É que eu não lembro de ter visto você por lá..."

Clube? Que porra ele tá falando? Olhei a foto de perfil mais atentamente, claramente era um homem gostoso chamado André, mas não era O André. Entrei no perfil e haviam fotos de um homem sem camisa, de bebidas, vídeos dele rebolando em cima do palco e as pessoas jogando dinheiro.

— Beatriz, acorda. — ela murmurou alguma coisa enquanto eu chacoalhava ela com as mãos tremendo. — BEATRIZ CARALHO ACORDA, É SÉRIO.

— O que foi? — disse ela ainda sonolenta. Expliquei a história numa velocidade impressionante.— Então você não mandou mensagem pro André, você mandou mensagem pra um André que é um stripper?

— Eu não sei se ele é um stripper! — dei o celular para ela analisar o perfil.

— Ele é um stripper. — disse ela devolvendo o telefone e minhas mãos tremiam de nervoso. — Pensa pelo lado bom, ele é bonito e simpático. 

Ligamos para Cissa que atendeu depois de recusar a chamada três vezes.

— Eu estou lendo. — disse Cissa emburrada. 

— Liz mandou mensagem pra um stripper achando que era o André. — disse Bia.

— Você fez o que? — Cissa ria alto.

— A gente não sabe se ele é um stripper. — respondi.

 — Me manda o perfil dele. — Depois de passar os olhos Cissa olhava como se eu tivesse dado um golpe de sorte.— Ele é um stripper. O que você mandou pra ele? 

Mandei print das mensagens no nosso grupo e logo a risada voltou a tona e seria realmente engraçado se a protagonista dessa situação toda não fosse eu.

— "Você entrega tudo com muita paixão e dedicação e cativa os espectadores de uma forma tão natural"... — caçoou Cissa.

— Não esquece da parte que ela diz que admira o trabalho dele. — completou Bia.

— Dá pra vocês pararem? — minhas bochechas nunca haviam ficado tão quentes — Agora a merda já tá feita.

— O que você vai fazer agora? — perguntou Bia.

— Acho que vou responder. 

— Se você não responder, eu respondo por você. — disse Cissa— Finalmente conseguimos alguma coisa boa de cinco garrafas de vinho. 

Eu não sabia muito o que sentir. Estava envergonhada e nervosa, mas ao mesmo tempo parecia o destino me pregando uma peça e como uma otimista incurável, eu estava disposta a levar aquela história para frente.

Que o mundo vá à merda e outras expressõesDonde viven las historias. Descúbrelo ahora