Capítulo 02 - Marcos

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Capítulo 02

Marcos

Clarice saltita em direção às Lojas Americanas e sorri para mim enquanto coloca vários doces na cestinha vermelha. Seu vestido curto de flores balança de uma forma muito sexy. Estar perto dela tem sido bem difícil. Já faz algum tempo que as coisas mudaram. Não vejo mais Clarice como amiga. Eu quero beijá-la. Desesperadamente. Quero segurar o seu cabelo e colocá-la contra a parede.

É estranho como a vida tem dessas coisas. Em um momento, você está satisfeito com a amizade; em outro, você quer mais. Devo admitir que sempre achei a Clarice muito bonita. Talvez o que eu esteja sentindo seja só uma atração momentânea. Espero que sim. Torço para que seja. Não quero colocar a nossa amizade em risco.

Caminho atrás dela pelos corredores da loja e quase consigo sentir o perfume doce que ela usa. Seus cabelos estão presos para cima, deixando as costas à mostra. Ela fica especialmente linda assim. Seja quem for que desenhou esse vestido, fez um bom trabalho. Pego alguns chocolates e três pacotes de Bala Fini, jogando-os na cestinha.

— Meu Deus, essas são as melhores! — Ela dá um gritinho.

— Não são?! — Sorrio.

— Você está muito calado hoje, Marcos — Clarice me acusa.

— Ah, só preocupação com a prova de controle digital — minto. — Não sei por que fui escolher fazer Engenharia.

— Nem eu. Mas não é nada que um bom filme não resolva...

Odeio filmes de comédia romântica. Mas aqui estou, a pedido dela, é claro. Acho que se ela me convidasse para ver o pior filme do mundo (aquela horrível tentativa de adaptação de A Lenda de Aang!) eu iria de bom grado. Tudo para passar um tempo a mais com ela.

Enquanto pegamos mais doces, sou tomado por uma sensação de medo. Sempre que damos um rolê, é com o nosso grupo de amigos — seja para ver um filme, jogar baralho ou ir a resenhas. Esta é a primeira vez que saímos sozinhos, eu e ela. E é de conhecimento comum que ir ao cinema... é quase um pacto implícito de "vamos nos beijar!". Talvez Clarice não tenha pensado assim. Para ela, somos amigos de faculdade. Só. A famosa friendzone.

Caminhamos em silêncio até a fila, aguardando a nossa vez de entrar na sala do cinema. Clarice sempre gosta de sentar na penúltima fileira, no canto direito. Eu sempre fico com as pernas espremidas — o que não aconteceria se a gente se sentasse na última fileira, bem em frente ao corredor. Acho que ela não entende o sofrimento de uma pessoa com quase um metro e noventa de altura.

Os trailers começam e Clarice já coloca vários chocolates na boca. É impressionante como tudo o que ela faz é fofo para mim. Tento desviar os meus pensamentos sobre o que está ou não na boca dela e pergunto:

— Cla, sobre o que é mesmo esse filme?

— Dois melhores amigos que são apaixonados um pelo outro, mas nunca confessaram. É baseado em uma história real daquela escritora lá, Tina Cari — ela sussurra.

— Ah...

Mordo o lado interno da minha bochecha. Tudo bem que filmes de comédia romântica são quase sempre sobre um casal improvável que acaba se apaixonando, mas... porra, que coincidência.

Enquanto os trailers passam, eu tento deixar meus braços imóveis e colados ao meu corpo. Qualquer toque em Clarice pode me denunciar. Ao mesmo tempo, uma vozinha encapetada faz com que eu me pergunte se ela espera um beijo. Afinal, ela me convidou para irmos ao cinema... sozinhos... É o pacto, né?

Os Mecanismos de Defesa do Coração [DEGUSTAÇÃO]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora