Sonhos Marcados

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" É na penumbra dos sonhos que realmente descobrimos quem somos."

Nathan acordou subitamente, ainda estava escuro e a janela do pequeno apartamento em que vivia estava aberta, jogando o frio do sereno da noite para dentro do quarto solitário. Morava sozinho em São Paulo há alguns anos, havia alugado um pequeno apartamento próximo à Praça da República. Devia ser aproximadamente 04 da manhã. Foi quando ele lembrou o que o fez acordar.

O Sonho...

O mesmo sonho que se repetia já há algum tempo.

Lá estava ela.

Linda...

Inalcançável...

Como podia ele, um homem, com seus 25 anos, se apaixonar por um mero sonho. Nunca havia visto o rosto dela em qualquer outro lugar que não fosse a sua mente, nunca, isso era uma certeza. Uma de suas maiores qualidades era a sua memória fotográfica.

E esse sonho sempre se repetia, quase todas as noites.

Lá estava ela.

Tão perto, mas tão longe...

Já havia procurado os melhores psicólogos e psiquiatras, mas nada e nem ninguém conseguia explicar o que acontecia com ele, explicar o porquê desse sonho se repetir. Tomou remédios, fez tratamentos, mas os sonhos sempre vinham. Tentou ioga, cromoterapia, artes marciais, música e qualquer outra coisa que seus amigos dissessem que era bom, faria relaxar e possivelmente dormir melhor, mas nada surtia efeito.

Os sonhos eram realmente perturbadores.

Tudo começou quando tinha 14 anos, e no início, ela não falava, não se mexia, parecia que algo a prendia e ela não conseguia se expressar, ficava lá, imóvel, como uma extremamente realista estátua de cera, a única coisa que confirmava que ela estava viva era o subir e descer lento de sua respiração. Nathan sempre tentava alcançá-la, mas nunca conseguia se aproximar o bastante, mesmo com a imensa necessidade de tê-la por perto, era impossível tocá-la. Quando tentava chegar perto dela e suas mãos quase tocavam a pele aveludada, o sonho se desvanecia, ele se perdia em uma névoa vertiginosa e ela sumia. Ele sempre acordava suado e com frio e muitas dessas vezes, chorava por não ter conseguido alcançá-la e trazê-la para perto de si.

Depois de alguns anos, os sonhos começaram a ficar mais frequentes, mais longos e com mais detalhes, incrivelmente verdadeiro e realista, ela já não estava mais aparentemente dormindo. Nathan, enquanto sonhava, já não tinha mais certeza do que era sonho ou realidade, e quando acordava ficava um bom tempo tentando colocar a cabeça no lugar. Em seus sonhos, já conseguia notar o verde de seus olhos, o castanho claro de seus cabelos, o avermelhado de suas bochechas, sentia a respiração e o hálito mentolado que saiam de seus lábios rosados e carnudos entreabertos. Ele tinha quase certeza de que já a conhecia. E mesmo ela estando próxima a ponto de conseguir ouvir a batida de seu coração, não conseguia alcançá-la, ela sempre estava distante de qualquer ação que ele tomasse, distante de qualquer direção que ele seguisse.

Ela estava sempre tão longe, mesmo estando tão perto.

O sonho de Nathan hoje foi diferente, talvez por isso tenha acordado na madrugada quase gritando.

Estava caminhando por uma planície, o ar estava frio e era rodeado por flores silvestres. Ele olhou para a direção do sol, e a viu deitada sobre uma cama de pedra, o vestido dela flutuava com a brisa leve que havia ali. Correu até ela, e sem pensar duas vezes a pegou pelas mãos e a abraçou. Nesse momento o sonho se desvaneceu, o mundo escureceu e sentiu seu corpo esquentar como se tivesse tocado o inferno com as suas mãos.

Nathan acordou suado, com o corpo queimando. Ele havia conseguido tocá-la, tinha conseguido abraçá-la, tinha enfim sentido o toque suave de sua pele macia.

Após levantar ainda sentia a sensação do sonho, quando seus dedos abraçaram o corpo que antes fora inalcançável e inatingível. Seu corpo havia entrado em estado de êxtase. Nunca havia sentido nada assim em sua vida.

Olhou o relógio novamente. 05:00, hora de trabalhar.

Tomou um banho frio para abrandar o calor que havia em seu peito, se preparou para o trabalho e saiu, quase derrubando o copo de café que tinha acabado de preparar. O caminho para o trabalho não era tão longe e Nathan preferia cobrir a distância a pé, assim poderia pensar na vida e lembrar dos estranhos acontecimentos em seus sonhos. Enquanto caminhava para o trabalho, tentava não esquecer aquela sensação. A sensação de alcançar o impossível, de vencer, a sensação de que algo em sua vida estava prestes a mudar.

Fazia quase 3 anos que Nathan estava estagnado no mesmo trabalho; profissão: Auxiliar Administrativo em uma consultoria em TI na Alameda Santos. Seus superiores já haviam prometido diversas promoções, mas nunca havia recebido nenhuma, não por falta de trabalho árduo ou competência, simplesmente achava que não tinha sorte, achava que não tinha nascido virado para a lua. E por uma sequência de fracassos na vida profissional e pessoal, parou de acreditar na vida, decidiu apenas manter a mesma vidinha medíocre e mais ou menos, trabalhar para pagar contas e fazer mais contas para pagar. Não tinha amigos, era uma pessoa muito reservada e as únicas mulheres com quem esteve foram as prostitutas do centro da cidade. Era o tipo de cara que não era o popular da Escola, mas tinha um bom coração.

E agora, querendo ou não, a pequena vidinha de Nathan irá mudar completamente.

COMPLETO - OS LEGADOS DO SOL E DA LUAOnde as histórias ganham vida. Descobre agora