Capítulo 05

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Fernando

Os plantões na clínica, na maioria das vezes, são tranquilos. Quando não temos pacientes internados, nem mesmo precisamos estar lá, basta estar pronto para atender qualquer emergência que surgir. Para isso, há um celular que deve ser carregado por aquele que está responsável naquela noite.

Já estou acostumado com essa rotina. Como Lúcio havia me explicado, eu fiquei com apenas um dia da escala — Juliano parece mesmo gostar de ficar na clínica à noite, e não vi motivo para argumentar.

Hoje cumpri o meu quarto plantão desde que comecei a trabalhar. E precisei ficar por lá, pois há dois pacientes em pós-operatórios que precisam de acompanhamento constante. Apesar de ser cansativo virar a noite, ao menos estou satisfeito por tudo ter transcorrido bem. Ambos estão estáveis e devem receber alta em poucos dias.

Voltei para a casa já passava das sete da manhã. Depois um banho, tomei meu café da manhã e me deitei para descansar. Quando alguém tem de ficar de plantão na clínica, não precisa trabalhar no dia seguinte, então planejo ficar o dia inteiro na cama, para recuperar as horas de sono perdidas.

Sou despertado com o barulho do interfone. Não sei quem pode ser a essa hora, já que não espero ninguém. Irritado por ter o meu sono interrompido, levanto-me arrastando os pés até a cozinha, onde se encontra o bendito aparelho.

— Eu preciso da sua ajuda. — A voz agoniada do outro lado da linha nem ao menos me cumprimenta.

— Lavínia? — Acho que ainda estou dormindo, porque levo um tempo para processar suas palavras.

Depois daquele dia em que conversamos na clínica, não voltamos a nos falar, por mais que eu quisesse. Não consigo tirá-la da cabeça, mas cheguei à conclusão de que não posso nem devo forçar uma situação. Eu a vi duas ou três vezes, quando ela estava saindo para o trabalho, mas o máximo de interação que consegui dela foi um sorriso tímido e aceno de cabeça como cumprimento. Ao menos não fingiu que não me conhecia. Considero isso um avanço.

E é justamente por isso que o fato de receber uma ligação sua a essa hora da manhã me deixa em alerta.

— Tem alguma coisa errada com o Alfredo! — Ela perde o controle e isso é o bastante para que eu desperte de vez.

— Tudo bem. Estou subindo.

Desligo o interfone e corro para o quarto. Visto a primeira bermuda que encontro, já que tenho o hábito de dormir apenas de cueca, e saio do apartamento sem nem ao menos trancar a porta. Subo o lance de escadas que nos separa e encontro Lavínia me aguardando no corredor. Ela veste o uniforme branco e seu cabelo curto está preso em um rabo de cavalo. Mesmo agitada, é sempre uma visão: a mulher mais linda que já conheci.

— Alfredo teve uma convulsão. — Ela tem lágrimas nos olhos e sacode as mãos, andando de um lado para o outro. Está muito nervosa, totalmente diferente da mulher centrada que vi das outras vezes. — Meu plantão demorou mais do que deveria e quando cheguei eu o encontrei se contorcendo no meio da sala. Eu sabia que tinha que ter saído no horário!

— Se acalme, Lavínia. — Aproximo-me e seguro seus braços, para que sua atenção se fixe em mim. Isso parece surtir efeito, pois ela ergue o olhar das minhas mãos para o meu rosto. — Eu preciso examiná-lo, tudo bem?

— Tá.

Ela entra e eu a sigo. Alfredo está deitado sobre sua caminha no meio da sala. Ele mal ergue a cabeça quando nos aproximamos, imagino que esteja muito cansado depois do ataque.

— Oi, amigo. — Sento-me ao seu lado e acaricio a sua cabeça. Ele está bem ofegante, e o examino da maneira que posso sem nenhum equipamento. Confiro suas pupilas e seus batimentos cardíacos. — Parece que a crise passou, mas é melhor levá-lo para a clínica, para fazermos alguns exames.

Me Deixa Ser Seu - DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora