Capítulo 23 - O duelo pelo futuro

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Os outros felinos mal tiveram tempo de se entreolhar, perplexos, antes que o ligre continuasse:

-- Aceitarei minha derrota, mas não renuncio o trono. Ele é meu direito de nascença.

Imediatamente os felinos leais a Sirhan protestaram, mas aqueles do lado de Ekom responderam:

-- Sua majestade descende do rei.

-- Sirhan é mais velho – Kiala retrucou.

-- Um bastardo não tem direitos reais, não interessa a idade – um tigre rosnou. Ekom falou mais alto.

-- Só há uma forma de decidir. Os dois candidatos ao trono devem lutar até a morte num duelo.

Novamente protestos soaram de toda parte, que Ekom calou com seu rugido que mais parecia um trovão.

-- Essa é a lei de nossos ancestrais. Se não resolvermos assim, Xangô se destruirá em guerra. É isso que você quer, Sirhan?

O leão arreganhou os lábios. Todos foram pegos de surpresa pela tal rendição de Ekom, mas pedir uma briga de um contra um era estranho demais.

-- Eu aceito – Sirhan respondeu entredentes. Sahira exclamou:

-- Não faça isso, ele vai acabar com você.

-- Ela tem razão – Iana concordou – Ekom sabe que não pode vencer pela quantidade, por isso apelou para essa lei que ninguém se lembra mais. Se você aceitar, ele vai poder te matar sem nenhum obstáculo e continuar essa expansão de território.

-- Mas se eu não aceitar...

-- Podemos vencer se a batalha recomeçar – o líder guepardo gritou – Somos bem mais do que eles.

-- Você aceitaria isso, Sirhan? Mais sangue derramado em seu nome? – Ekom perguntou em deboche.

-- Eu já disse que aceito. Vamos logo – o leão pôs fim à conversa.

Ekom pediu que o duelo acontecesse perto do rio, o mesmo local onde ele matara os pais, e onde Sahira tentou enganá-lo. Todos os felinos acompanharam os candidatos a rei, tanto leões e tigres quanto onças, leopardos e guepardos.

Sef e Kiala estavam lado a lado na primeira fila para ver o duelo, mas Sahira subiu no alto de uma rocha pontuda, pouco mais baixa que um felino grande, dando uma visão mais ampla.

A briga começou debaixo de rugidos da plateia, principalmente os que torciam pelo ligre. Sahira, como a maioria dos que torciam por Sirhan, não conseguia se mexer de tanto nervosismo.

Ekom fez o primeiro movimento, avançado com tudo para cima de Sirhan, que desviou com um pulo e mordeu a pata traseira do ligre. Com um grito de dor, Ekom voltou-se para o leão e acertou-o na cabeça com a pata.

Sirhan caiu com força no chão, quase dentro do rio. Sahira arranhou a pedra sem perceber quando ele não se mexeu, e só respirou de novo ao vê-lo se levantar, meio cambaleante, e balançou a cabeça para clareá-la. Os guepardos urraram de alegria.

Mas Ekom não podia estar mais irritado por seu adversário não desistir. Atacou novamente e em vez de desviar, Sirhan avançou também, e os dois felinos colidiram num combate direto de mordidas.

Ekom golpeava a torto e a direito, aos poucos encurralando Sirhan contra o rio, e o leão por sua vez alternava ataques e desvios. Essa estratégia rendeu feridas profundas nas patas e no peito do ligre.

Num momento o leão pisou em falso na areia molhada e se desequilibrou. Ekom aproveitou a brecha, pôs as garras para fora e fez um arranhão profundo logo abaixo do ombro esquerdo de Sirhan.

Sahira gritou de susto, mas seu fraco miado não foi ouvido, abafado pelos rugidos dos felinos maiores. Sirhan agora mal conseguia se manter de pé, a pata esquerda praticamente inútil.

Ekom não se deu por satisfeito só com isso, apesar de seu adversário estar indefeso. Derrubou-o e deu uma sonora gargalhada.

-- Que rei poderoso você seria, Sirhan. Não vence nem uma briga com seu irmão mais novo.

Os felinos do lado dele soltaram risadas zombeteiras. Com uma risada de deboche, o ligre se afastou do oponente e começou a desfilar na frente dos expectadores, falando para Sirhan:

-- Se você fosse rei, não seria capaz de proteger nenhum de seus súditos – parou ao olhar para o lado, vendo Sirhan se levantar, trêmulo – Nossa, você ainda quer continuar? Estou impressionado com sua determinação, mas não pode lutar com a pata desse jeito.

-- Um verdadeiro rei não se deixa parar por causa de uma ferida, ainda mais quando tem um louco correndo pelo mundo e pondo inocentes em perigo.

O leão desviou o olhar de Ekom para Sahira enquanto falava, e o ligre percebeu isso. O rei estava mais perto da gata, e veio lentamente na direção dela.

-- Repito o que disse, Sirhan, você não manteria a segurança de ninguém no reino. Veja, não seria capaz de proteger nem mesmo o menor dos felinos.

Num movimento rápido ele avançou em Sahira. A gata agiu por impulso, fez uma mágica que jogou um punhado de areia no focinho de Ekom, e pulou em cima dele com as garras para fora, acertando seu olho esquerdo.

O ligre urrou e recuou um passo enquanto Sahira caía no chão a centímetros de distância de suas patas enormes. Ekom encarou a gata com seu olho intacto cheio de ódio e abriu a boca.

De repente Sirhan pulou nas costas dele e o mordeu na nuca, puxando sua cabeça para longe de Sahira. Onças, leopardos e guepardos urraram de alegria ao ver o ligre se desequilibrar e sair.

Sirhan ficou de pé com dificuldade, mas feliz por seu sucesso. Ekom se levantou e avançou no meio-irmão, e os dois rolaram até o rio, onde desapareceram debaixo d'água.

A Feiticeira de BastDove le storie prendono vita. Scoprilo ora