Capítulo 9: O que existe em baixo da terra?

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  Fanny me deixou em casa e mesmo que por preocupação ou curiosidade de sua parte, eu não a deixei entrar. Talvez ela não estivesse preparada para encontrar uma casa de sapê.

  Quando cheguei em casa sentindo pouca dor, mas com minha mente queimando neurônios, não havia ninguém para piorar.

O vaso listrado que os meus pais ganharam de casamento estava na mesma mesinha de madeira.

Depois de anos morando neste humilde lugar, o vaso permanecia com a sua formosura. Peguei-o cuidadosamente. Era muito escorregadio e gelado. Não tinha nada lá dentro, além de escuridão e lacunas frias que cheiravam a incenso.

"Quem sabe, representasse o casamento dos meus pais, externamente um lindo vaso, entretanto dentro dele não sobreviveria nem mesmo o cacto primórdio da caatinga". Conclui depois de analisar o belo vaso.

Na imensidão daquele silêncio um barulho de algo sendo cavado fez meus olhos sobressaltar. A causa da quebra de sossego vinha do quintal, próximo ás minhas plantas que rego todas as manhãs, como mamãe sempre me ensinou.

  Para a minha surpresa era o papai que cavava, ou fazia o contrário. Não havia nada perto dele que indicasse que iria enterrar algo, afinal, quem em plena luz do dia começa a cavar?

 — O que está fazendo em casa uma hora dessa? — Perguntou meu pai percebendo minha presença antes que eu falasse. — Liberaram você mais cedo por causa do luto?

  Papai estava cansado. Pude perceber em seu olhar de quem ficou a noite toda virado e suas mãos tremiam sem parar, como sempre ficam quando ele fica horas sem comer.

  Não disse nada. Estava confusa observando a lambança que papai havia feito no quintal. Por que ele havia arrancado as plantas que eu plantei no verão passado? Ele não sabe o quanto foi difícil!

 — Você passou mal?

  Olhei para ele admirada. Imaginava que seria como aqueles filmes de ação, onde o prisioneiro foge e nenhum civil percebe.

Esqueci que nesse caso, o meu pai é o xerife da cidade, o que me faz lembrar o porquê de eu não conseguir esconder a minha saída repentina do hospício Revolution.

— O que sabe sobre Margot Slin? — Perguntei sem rodeios. Não queria ter que rememorar  o motivo da minha chegada. 

— Como? — Pela primeira vez  papai olhava em meus olhos desde que cheguei. — Por que tanta curiosidade sobre esse caso? Achei que isso era de interesse dos pais dela.

—Porque eu estudo com eles, ou já se esqueceu disso? E não são só os pais delas que estão de luto. Ela tinha amigos... Um namorado... —Infelizmente recordei que isso não era 100% verdade, já que Melissa havia dado um show de dramaturgia diante da escola inteira. Que vergonha!

— Não se preocupe que no momento certo as respostas apareceram e tudo fará sentido.

— Nada nesta cidade está fazendo sentido. — Pensei alto e meus olhos se alarmaram como os de meu pai.

"Isso era verdade. De dois dias pra cá, não tens reconhecido a cidade que pensou  conhecer na palma da mão". Confirmou minha consciência.

— Querida, existem coisas que não tem como concertar.

"Tudo tem um jeito". Automaticamente veio a voz da Dory em minha mente.

— Mas Margot não era qualquer moradora de Liana, pai. Ela era uma Slin!

— A infelicidade bate na porta de todo mundo, Anastácia. Veja só: se você saí toda madrugada, uma hora você encontrará a infelicidade. Pode ser que você a encontre de primeira, ou ela pode te vigiar durante meses e então agir. De um jeito ou de outro, coisas ruins irão acontecer conosco. Não importa o nosso sobrenome ou poder. A desgraça sempre vem.

  Fiquei tão concentrada na bagunça que estava aquele lugar, (que já foi um jardim um dia) ao ponto de não prestar atenção nas metáforas de ninar que meu pai tem a proeza de dizer todos os dias.

— É por isso que Mike irá estudar na sua escola a partir de amanhã. Essa oportunidade não bate duas vezes na casa dos Mendes. Ou será que bate? — Papai deu um sorriso forçado que me causou raiva.

  Lembrei-me da conversa que tive com Rebecca na lanchonete depois da aula. Infelizmente, depois do que aconteceu no bosque não consegui encontrar meu pai a noite e nem de manhã para discutirmos sobre o futuro de Mike.

— Eu não acredito que o senhor vai coloca-lo naquele manicômio! — Falei incrédula, mas conhecendo o meu pai eu sei que ele seria capaz de qualquer coisa quando o assunto é sobre o futuro de Mike.

— A escola Revolution é o melhor caminho para o Mike, na verdade, para vocês dois.

— Melhor para o Mike ou para o senhor? Já contou isso pra ele?

  — Para todos dessa família. Nós temos que manter nosso legado. E o seu irmão é menor de idade, e até onde está escrito na lei, eu sou responsável por ele, então a decisão é minha!

— Legado? Você já se perguntou qual é o verdadeiro sonho dele? — Senti uma ardência em meus olhos.

Mike ainda pode ser uma criança, mas não merece ter seu livre arbítrio violado.

— E você acha que eu escolhi ser xerife? Acha que escolhi tudo isso que já vivi? Não pedimos para nascer, Anastácia, as nossas ações são apenas consequências dessa infeliz dádiva.

— Se a mamãe estivesse aqui nada disso estaria acontecendo.

Essa era a minha maior certeza. Agora tudo fazia sentindo... Se mamãe ainda morasse conosco minha entrada naquele hospício e o futuro de Mike estariam salvos, e esse pesadelo não estaria se tornando realidade.

Pena que ela não continuou aturando o papai como essas famílias da Elite fazem.

— Não quero terminar como os Slin que não tiveram a chance de salvar sua filha. — Disse meu pai enxugando o que parecia ser uma lágrima. Nunca tinha o visto chorar antes. Por que estava tão emotivo? Esse não é o xerife que conheço.

— Não pode nos proteger para sempre. —Respondi friamente. — Eu parecia a mamãe. O mesmo jeito agressivo e livre de querer que tudo de certo à sua maneira.
Eu sinto a falta dela.

O telefone tocou no momento em que meu pai retirava algo do seu bolso. Eu não consegui ver a tempo o que era, mas parecia que ele queria entregar para mim. Largou a pá, e correu para atender, deixando-me sozinha com mais dúvidas e raiva.

  Aproximei do que se parecia ser uma cova. Não havia nada além de terra. O que me trouxe uma péssima lembrança de hoje. 

  Subi as escadas correndo em direção ao meu quarto. Angustiada, perguntava-me: o que papai procurava ou desenterrava? Poderia estar relacionado com o caso de Margot Slin?  Ou seria algo mais sério?

  Dúvidas e mais dúvidas que estavam se transformando em uma grande bola de neve.

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Liana Onde as histórias ganham vida. Descobre agora