Fabiana

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(Risos)

— Devem estar fazendo a maior algazarra...

(Porta abre)

— O quê que está acontecendo aqui?!

— Foi mal, Fessora...

— É, Fessora, é que tem gente que parece que esqueceu as origens.

(Risos)

— Como assim, Wesley?

— Sei lá, Fessora, pergunta para a Fabiana aí.

(Risos)

— Vem cá na minha mesa, Fabiana .

— Tudo bem, Prô...

— O quê aconteceu? Você está assim meio para baixo... E o que tem a ver, aquilo que o Wesley falou?

— Nada não, Fessora...

— Fala a verdade, Fabiana . Não minta para mim!

— Então... Depois que você saiu, o pessoal começou a bagunçar, conversar, etc. Aí eu tava no meu canto, porque eu não sou de conversar, e o Wesley e a turminha dele vieram falar comigo...

— E?

— Eles me perguntaram uma conta de Matemática e eu não soube responder.

— Eles estão te zuando por conta disso?

— É, Fessora... Mas eu também devia ser boa em Matemática...

— Ué, por quê?

— Ué, digo eu, Fessora... Olha para mim.

— Estou olhando, Fabiana, o quê que tem?

— Eu sou descendente de asiático... Eu deveria ser boa nisso.

— E quem disse?

— Ah... todo mundo. Tipo... todo mundo sabe que asiático é bom em Matemática... Que todo asiático tem que ser bom em Matemática...

— Fabiana ... Não liga para o que te disserem sobre isso. Você não é boa em Matemática, eu nunca fui boa em Física, mas e daí? Por acaso, agora tem regra até para o que nós somos bons ou não?

— De certa forma existe, Prô.

— Não, não existe!

— (...)

— Fabiana... Por acaso, só existem asiáticos que são matemáticos?

— Não...

— Exato! Nem todos alemães são viciados em cerveja, nem todo brasileiro ama samba e futebol, entre outros... esses padrões étnicos não representam a verdade. São estereótipos que não servem para uma construção da verdade, você que deve dizer o que vai ser ou não.

— Mas, então, por que todo mundo acha que eu tenho que ser boa em Matemática?

— Porque nossa sociedade construiu eles assim. Preconceituosos. E cabe a nós transformar isso... Por exemplo, qual sua matéria favorita?

— Eu amo Artes! Eu quero ser uma grande atriz.

— Então... Se você se tornar um ícone, uma atriz muito famosa, será que as pessoas ainda vão ver os asiáticos como "bons em somente Matemática"?

— Não...

— Então. Assim como você pode servir de exemplo para outras pessoas, você pode quebrar esse estereótipo preconceituoso sobre o assunto. E aí, as próximas gerações vão olhar para a Fabiana e dizer: "Eu posso ser o que eu quiser!".

— E eles podem...

— Mas você também tem que deixar claro isso, exaltar que não é porque tem descendência asiática, que você é boa nisso, que você é mais assim do que assado, etc.

— Mas será que alguém vai me escutar?

— Com a grande atriz que você vai ser, com os holofotes para você, claro que eles vão ouvir!

— Obrigada, Fessora, mas falta muito ainda para eu chegar lá...

— Você já tem a vontade, agora é só correr atrás.

— Esse negócio de herança é maior besteira, né?

— Sim! É importante olharmos para trás, para a gente olhar para onde estamos e tudo o que nossos antecedentes batalharam para nós estarmos aqui, onde estamos. Mas não significa que por termos essa "herança" sanguínea com eles, que nós seremos iguais a eles.

— Meu avô era matemático lá no Japão, mas meu pai nunca quis nada com isso.

— E nem tem sentido querer, cada um toma um sentido próprio para sua vida.

— Meu pai prefere mil vezes a nossa lojinha do que virar um matemático

(Risos)

— Eu espero que as vendas estejam indo bem.

— Sim, estão.

— E espero também, que você tenha colocado na sua cabeça aquilo que eu disse.

— Sim, Fessora... Valeu.

— Agora volta lá para o seu lugar...

— Tudo bem, Prô

— Hmmm... Onde eu tinha parado na chamada mesmo?

Faltou, Fessora.Onde as histórias ganham vida. Descobre agora