Dois - Sargento Batti

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O terceiro sargento Batti caminhou em direção ao pátio, onde se concentravam um grande número de soldados da polícia militar. O comando geral mobilizou grande parte dos policiais da cidade, suspendendo inclusive as folgas. Batti não sabia o que iria acontecer, mas com tantos homens reunidos assim nunca era uma coisa boa.

— Olha essa coisa, parece plástico – um cabo “convencional”, com seus 23 anos, se queixava de um escudo tático que carregava.

— Por favor Natan, cresce – Batti repreendeu o cabo, que em sua vida privada também era seu irmão. Apenas na sua vida privada. No trabalho eles eram o sargento Batti do BOPE e o cabo Batti da Policia Militar. – Se vamos utilizar acrílico, no mínimo deve ser manifestação.

— Soube que está ocorrendo uma concentração na Quatro Jornadas. Parece coisa grande. Tem estudante e vagabundo para tudo quanto é lado.

— Start… — O sargento pensou em voz alta.

— Acha que é coisa dele?

— E quando não é? É por culpa dele que estamos aquartelados aqui no interior. O quanto antes este inferno acabar, melhor. O lugar do BOPE é na capital, e não reforçando a tropa de choque.

— Até parece que você prefere subir morro para tomar tiro de bandido – Natan foi ríspido em seu comentário, incomodando Murilo.

O sargento poderia dar uma série de respostas para o irmão, algumas delas nem um pouco educadas, mas Natan tinha razão. Depois das últimas semanas, é um milagre que ele ainda consiga ir trabalhar. Os gritos, e choros ainda estão vividos em sua mente. Ele ainda consegue se ver naquela viela, em estado atônito, com a face coberta de sangue e o fuzil com o cano ainda fumegante.

— Ei moças! – O capitão Matias, líder da unidade de Murilo, berrou para os irmãos. — Vão para a formação. Estamos partindo em um minuto.

Cada soldado foi em direção a formação de seu próprio batalhão. O sargento logo conduziu o seu pequeno grupo para uma caminhonete preta, adaptada para o transporte da guarnição, ostentando o intimidador sinal da caveira do BOPE.

Era um comboio composto por dez veículos do BOPE, cada um com seis homens na caçamba, e mais quatro na cabine. Eles iriam se unir a outras guarnições ao redor da Praça das Quatro Jornadas. Haviam também mais dois ônibus lotados de convencionais do batalhão de choque, dentre eles o irmão do sargento.

A medida que o comboio seguia seu caminho, Batti não pode deixar de pensar o quão ridículo era essa situação. Ele estava ali, cercados por irmãos de farda, treinados em combate de guerrilha urbana, aptos a matar qualquer ameaça. Mas que tipo de ameaça um grupo de estudantes poderiam representar? Tudo bem, não é incomum que manifestações saiam do controle e até coloque a integridade de terceiros em risco. Mas enviar a tropa de elite parece um exagero.

O Sargento Batti tentou ventilar esses pensamentos para longe. Ele não estava mais na capital. Seu papel ali era apenas auxiliar os convencionais a manterem a ordem. Ele sabia que aquela cidade não era o Rio de Janeiro e bastava manter a calma, que tudo iria dar certo e ninguém iria se machucar.

Ele não poderia estar mais errado.

Cordão Negro - (completo)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora