Capítulo 24 - Renato

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Renato

Era domingo de manhã e naquele final de semana eu resolvi não sair. Eu não estava com vontade de ter que fingir para todo mundo que nada me incomodava, sendo que tudo fazia com que eu me sentisse deslocado, mas mesmo que estivesse em casa e não havia colocado nenhuma gota de álcool na minha boca, eu não havia conseguido dormir. Por mais que eu estivesse morrendo de sono, era mais uma noite que eu havia passado em claro.

Me levantei e fui em direção ao banheiro procurar se havia alguns remédios que me fizessem dormir, mas todos que tinham eu já havia tomado das outras vezes que tinha tentado relaxar o corpo. Fechei a porta do espelho do banheiro com força em sinal de frustração. Dormir era algo natural do ser humano e eu não conseguia fazer aquilo.

Abri a porta do meu quarto e desci para a cozinha, onde eu sabia que minha mãe guardava os remédios fortes que ela usava contra a depressão que havia adquirido após o rompimento com o meu pai, eu sabia que não era recomendável tomar aqueles remédios sem prescrição médica, mas não tinha como errar, eu apenas precisava pegar um que ela utilizava para dormir.

Quando cheguei a cozinha um perfume suave de rosas encheu meu nariz delicadamente. Fazia tempo que eu não sentia aquele cheiro tão bom! Olhei para frente e para minha surpresa minha mãe estava em pé, suas roupas não estavam amassadas, seus cabelos estavam arrumados e era dela que vinha o perfume. Fazia tanto tempo que eu não via minha mãe arrumada! Ela sempre estava pelos cantos da casa, chorando e se lamentando, era uma luta enorme faze-la tomar banho ou trocar de roupas, e ao vê-la naquele estado, por mais que ainda existissem vestígios de tudo que havia acontecido, era algo muito bom e reconfortante.

-Mãe? -Ela se virou e olhou para mim sorrindo. -O que a senhora está fazendo acordada essa hora e desse jeito...? Está tão bonita!

Ela pareceu receosa, mas mesmo assim tomou coragem e falou:

-Seu pai me chamou para ir à igreja junto com ele, estou esperando porque ele vai vim me buscar para irmos juntos.

Na hora, tudo de bom que eu estava sentindo até aquele momento se desfez com a simples menção do meu pai. Eu sei que deveria considerar o fato de que a minha mãe estava vestida e parecia até confiante de que aquela igreja a ajudaria, mas nada disso vinha a minha cabeça, meus pensamentos apenas voavam com lembranças de quando aos poucos, meu pai foi se esquecendo da minha mãe, como aos poucos ele a destruiu. Ele não poderia fazer aquilo de novo, minha mãe não poderia ser iludida novamente.

-Como é que é?

-Vou para a igreja com o seu pai. -Ela falou mais firmemente.

-Mãe, para a igreja? Aquele lugar cheio de pessoas que só sabem pedir dinheiro? E com o meu pai? -Passei as mãos pelos meus cabelos soltando o ar dos meus pulmões. -A senhora se esqueceu de tudo que ele a fez passar?

-Não, Renato. Eu não esqueci, só que...

-Só que o quê, mãe? -A olhei enfurecido. -Quem ele pensa que é para chegar aqui e simplesmente te pedir desculpas como se não houvesse causado estrago algum! -Nesses momentos eu já gritava, mas eu não me importava, como minha mãe poderia ser tão idiota de acreditar nele novamente?

-Ele disse que essa igreja pode me ajudar. -Ela falou por mim e eu me calei. -Ele disse que muitas pessoas chegam lá com níveis de depressão até mesmo mais profundos do que o meu e são curadas!

-Mãe, acorda para a vida! -Gritei. -Isso é tudo conversa fiada! Aquelas pessoas são pagas para falarem aquelas coisas, se nem os psicólogos e seus remédios estão te curando, como eles sem conhecimento medicinal algum podem te ajudar?

-Eu não sei! -Ela gritou de volta, fazendo com que eu recuasse um passo para trás. -Mas eu não me importo, eu só preciso tentar! Eu não aguento mais, Renato! Tudo isso! Todos esses remédios, todos esses acompanhamentos, toda essa dor que está dentro de mim! Ela não é mais física, ela é na minha alma e eu só sei que a cada dia que se passa, dói mais! -Suas palavras se misturavam com lágrimas. -Eu não quero estar viva, não quero sofrer, quero ter a minha vida de volta! E se for preciso acreditar nesses homens, eu vou! Eu já tentei de tudo, já gastei milhares, ir na igreja não será nenhum esforço! -Sua voz era rouca e a campainha tocou.

-Deve ser seu pai. -Ela limpou as lagrimas, mas era visível que estivera chorando. -Eu vou indo, não irei demorar, mas se estiver com fome, pode tomar seu café sem mim. -Minha mãe passou por mim e sem olhar para trás foi até a porta e saiu.

Eu não tomei café e nem lembrei de pegar o remédio, toda aquela conversa havia me deixado atônito, fui para o meu quarto e liguei o chuveiro e entrei debaixo sem tirar a roupa do corpo. Fechei o box e os olhos e esperei que aquelas águas levassem tudo que eu estava sentindo, as lagrimas quentes eram um contraste com tudo aquilo e os segundos se tornaram minutos e meus soluços já eram altos para serem ouvidos, principalmente por mim.

Como eu era infeliz e egoísta, mas não conseguia imaginar minha mãe feliz com aquele caminho.

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