Capítulo 82 - Helena

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Helena

Os dias se passaram, e com o novo emprego do Henrique conseguimos mudar de lugar.
Era um espaço menor, mais próximo do seu trabalho e da igreja, era apenas um cômodo com banheiro e lavanderia, mas era dele, um rapaz solteiro.
Henrique nunca havia me dito para ir embora, pelo contrário, ele deixava eu dormir na cama, enquanto estendia o colchão para dormir ao meu lado no chão.
A única vez que tentei tocar no assunto, ele levantou a mão e disse:
-Fique o tempo que precisar. Não é um hotel cinco estrelas, mas já não é um cômodo debaixo da casa do nosso tio.
Não agradeci, o orgulho era maior que as palavras, mas eu fazia tudo. Cozinhei, lavei, passei. Eu tinha prazer de estar com meu irmão, a mesma paz que eu sentia por estar perto da minha mãe, eu tinha ao estar perto dele.
Henrique havia saído para trabalhar, eu limpava o chão e colocava algumas flores de plástico no vaso quando o meu celular tocou.
Abri o WhatsApp, uma foto minha na porta da casa do Henrique. Parecia ser de dois dias atrás, com a camiseta rosa, embaixo, uma mensagem de Pablo:
-Tu demorou pra voltar, coisinha! Tive que vim atrás de tu!
-Ainda não consegui o valor. -Digitei trêmula.
-Pois de um jeito, se não, farei uma visitinha para seu irmãozinho lá na igrejinha dele. Faz tempo que eu não vou mesmo.
-Eu faço qualquer coisa, mas deixa meu irmão em paz!
-Te espero às oito na rodoviária, vamos voltar pro Rio.
Coloquei apenas um joinha, eu sabia que Pablo não me faria mal, eu precisava voltar para o Rio, continuar fazendo a única coisa que sabia fazer para poder conseguir arcar com toda aquela vida.
Nao era justo fingir que nada estava acontecendo, fingir que aquela era a minha vida, porque não era.
Esperei Henrique chegar a noite, eu já estava sentada, com a minha bolsa arrumada ao pé da cadeira.
-Boa noite, Helena! -Henrique sorriu me cumprimentando, quando colocou a sua mochila no pequeno sofá e reparou na minha:
-Você vai embora? -Ele se sentou na minha frente.
-Você sabe que uma hora dessas eu ia embora... Só tivemos alguns contratempos.
-Helena, você não precisa ir embora. Eu sei que aqui é apertado, mas eu não me importo de você ficar aqui.
-Eu preciso sim, Henrique. É sempre assim, eu venho, pego o que eu preciso e vou embora, você nem vê eu indo na maioria das vezes.
-Mas a gente não precisa ficar no mesmo círculo, podemos morar juntos, esperar o Heitor, ajudá-lo e ficarmos os três juntos como a mamãe queria!
-Mas essa não é a minha vida! -Me levantei frustrada. Meu irmão veio e me abraçou, mas eu me soltei de seus braços. -Eu vou embora, independente do que você falar.
-Você pode mudar de vida, sabe disso, não é?
-Nao começa! Não quero saber de Jesus, Henrique!
-Helena, por favor!
-Eu escutei durante toda a minha infância, eu fui pra igreja todos os dias quando eu era pequena e o que mudou? Olha como eu estou agora!
-Helena, nós dois sentamos juntos nas mesmas cadeirinhas. Ouvimos as mesmas histórias e palavras da Bíblia, cantamos as mesmas músicas, fizemos as mesmas orações, temos a mesma oportunidade todos os dias. Não sou melhor que você por escolher diferente.
-Henrique, você não entende? Deu certo para você? Maravilha! Mas isso não quer dizer nada!
Peguei minha mochila do chão.
-Helena, me escuta!
-Nao, por favor! -O afastei, sai e fechei a porta atrás de mim.
Chorei o caminho inteiro até a rodoviária. Como era difícil Henrique entender que aquele não era o meu caminho!
Sequei as lágrimas ao avistar Pablo de longe, ele se levantou e abriu um sorriso maldoso:
-Olha aí a minha gatinha, e pensar que eu tive que vim aqui em São Paulo pra te buscar, em, garotinha! -Ele forçou um beijo e eu só queria poder pelo menos uma vez ter a fé que meu irmão sempre havia tido.
Olhei para o céu e me lembrei de uma passagem que o pai pedia para Jesus fé.
-Senhor, eu creio... -Sussurrei. -Mas me ajude na minha falta de fé.
Daquele dia em diante eu passei pelos piores dias da minha vida, até o ponto de achar que não iria viver mais.
Mas mesmo longe, meu irmão nunca havia desistido da família dele, mesmo que seus olhos não estivessem vendo, ele cria que de alguma forma, suas orações nos protegia.
Graças a Deus, porque eu tinha alguém que orava por mim para que eu encontrasse o Caminho.
Porque se eu te falar, existem situações que não era mais para estar viva, e eu havia escapado.

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