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arifonseca

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Série Sentidos - Livro 3 Histórias independentes O que você faria se tudo à sua volta desmoronasse de repente... Еще

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❤ Capítulo 3
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arifonseca

Samuel

Tenho que dar o braço a torcer para a Agnes. Minha primeira impressão sobre ela é que seria nova demais para cuidar da minha mãe, fiquei preocupado com recomendações e sua experiência na área.

Já acompanhei um pouco do trabalho das outras três enfermeiras - de fato mais velhas e com currículo vasto -, porém, nenhuma delas deixou Dona Creuza tão animada e com apetite para comer.

Aposto que jamais iriam se prontificar a fazer algo além das suas funções. Minha mãe estava certa, a garota é espontânea.

Vejo-a se levantando para repetir o prato e não resisto a sorrir de novo. É praticamente um milagre isso acontecer duas vezes na mesmo noite.

Sorrir de verdade é bem raro agora.

— Uau, desse jeito vamos ter que pedir pra Agnes fazer creme de abóbora todo dia! — brinco, levando uma colherada na boca.

Está delicioso, também estou bem propenso a repetir. Tirando com minha mãe, em nenhuma outra ocasião desde que cheguei à fase adulta, comi comida caseira.

Ao contrário de Agnes, Isabela não gostava de cozinhar e nem sabia fazer um ovo frito. Vivíamos em restaurantes ou pedindo algo em casa.

Arqueio a sobrancelha, fitando o prato, e balanço discretamente a cabeça.

Por que estou comparando as duas?

— Seria um prazer cozinhar pra Dona Creuza. — A voz dela me obriga a sair do transe. — Se quiserem, deixo pronto vários pratos nos dias que vier. Só congelar que fica bom.

— Imagina! — Minha mãe exclama, sentando-se novamente ao meu lado. — Não precisa fazer isso querida, um cansaço desnecessário.

— Eu estava brincando — explico, ainda não entendendo de onde veio esse pensamento aleatório. — Você não tem obrigação nenhuma de cozinhar.

Costumo sempre falar olhando para meu interlocutor, mas nesse momento prefiro não encarar Agnes. Faz tempo que não entro nesse jogo ridículo de comparação.

Odeio isso, embora seja involuntário.

Aconteceu todas as vezes que meu corpo venceu a batalha e acabei transando, nesses últimos quatro anos. Foram poucas, ainda bem. A tristeza que fica no meu peito quando acaba é pior que a necessidade fisiológica.

As mulheres com as quais sai são exatamente como eu - somente procuram alívio. Escolho à dedo, fora do meu círculo social, porque não quero contato com nenhuma delas. Relacionamento está fora de cogitação para mim.

Acredito que só temos a chance de viver o amor uma vez na vida, ele não bate na mesma porta.

Já tive o meu.

— Eu sei que não tenho, mas adoraria. — Ela observa com carinho Dona Creuza e sorri, depois volta a atenção para mim. Dessa vez correspondo o contato. — Você está me pagando muito mais do que ganho no meu trabalho atual. Além disso, equiparou o salário de enfermagem, sendo que ainda sou técnica. De coração, eu ia adorar deixar a comida pronta.

Viro para minha mãe e trocamos um olhar de dúvida se isso não seria abusar dela. Dona Creuza acena com a cabeça em positivo, e entendo que podemos testar.

— Não deve ser uma obrigação, Agnes — reforço, fitando seus grandes olhos castanhos. — Só vamos aceitar se fizer quando puder. Os dias que estiver mais agitado, o restaurante faz a entrega aqui.

— Claro, como acharem melhor.

Minha mãe muda de assunto falando das sobrinhas gêmeas da garota e eu aproveito a deixa para espantar da minha mente qualquer resquício da comparação.

Não faz sentido nenhum pensar nisso agora, nem dar mais munição para a minha mente fodida.

Acabo sendo inserido na conversa e entro no meu modo educado, que presta atenção e responde, mas não necessariamente está ali presente. O tempo passa rápido e quando percebo, já são quase dez horas.

— Mãe, preciso ir — aviso, limpando a boca com o guardanapo. — Queria dar uma palavrinha com a senhora antes sobre a imobiliária.

Hoje encontrei uns contratos suspeitos no sistema. Tenho uma grande desconfiança e quero seu aval para investigar a fundo. Fiquei até tarde verificando informações para embasar nossa conversa, por isso, nem consegui chegar a tempo para o início do turno como fiz com as outras.

— Claro, filho. Vou rapidinho no banheiro e encontro você lá no quarto.

— Quer ajuda? — Agnes prontamente se oferece.

— Não, querida. Estou me sentindo bem melhor.

As duas sorriem e a garota se levanta, retirando os pratos da mesa. Vejo minha mãe se virar e decido auxiliar a enfermeira na arrumação enquanto vai ao banheiro.

— Não precisa lavar nada, viu?! — Deixo os copos que bebemos suco dentro da pia e percebo Agnes se retesar ao meu lado. Será que a assustei? — A Zélia vem amanhã cedo e limpa tudo.

— Ok. — Sua voz é quase um sussurro.

— Deu certo os horários de ônibus? — pergunto, tentando melhorar o clima que ficou diferente.

— Deu sim, fui em casa depois do trabalho e cheguei com folga. — Ela se afasta e vira de costas. — Falta confirmar o horário na parte da manhã.

— Que bom. Qualquer coisa me avisa.

— Ah, eu já ia me esquecendo. — Ela apressa o passo até uma bolsa guardada em cima do armário da cozinha e retira uma pasta de lá. — A enfermeira Elza pediu pra entregar o relatório do dia.

Pego a pasta personalizada com logo da agência e avisto uma planilha organizada por horários. Confirmo que, com Elza, minha mãe não comeu quase nada. Participei da primeira sessão de quimioterapia e estava ciente das reações que poderiam ser causadas. Ainda bem que não foi nada grave.

— É preciso usar algum tipo de uniforme e fazer esse relatório escrito? — Agnes pergunta, tímida.

— A roupa não, mera formalidade da agência. Mas o relatório eu gostaria. — Passo a mão no cabelo e solto um suspiro cansado. — Minha mãe tem a mania de não me contar as coisas pra poupar a preocupação.

— Coisa de mãe. — Ela também suspira, como se sofresse com o mesmo problema. — Vou providenciar o relatório diário.

— Não precisa ser tão detalhado desse jeito. — Balanço a pasta com dezenas de informações desnecessárias. —Quero saber o essencial, se ela passou mal, se teve reação com algum remédio, se não comeu, não dormiu... essas coisas.

— Pode deixar, amanhã entrego pra enfermeira do turno.

— Obrigado, Agnes. — Estendo a mão na sua direção e penso ter visto sua garganta subir e descer, tensa. Ela demora alguns segundos para corresponder o toque. — Agradeço muito por se dispor a fazer a comida e ser atenciosa com a minha mãe.

Não passou despercebido por mim como as duas sorriem toda hora uma para outra, tão à vontade. Fico mais tranquilo se Dona Creuza estiver com alguém que a faça se sentir bem.

— Não... não é nada — garante um pouco sem graça.

Despeço-me dela ignorando a curiosidade que quer analisar como reage quando minha mãe está perto e quando fica sozinha comigo.

Não viaja, Samuel!

Isso não tem importância nenhuma.

Estou cansado e imaginando coisas.

— Você acha que ele seria capaz? — minha mãe pergunta pela segunda vez, lendo com atenção os documentos que deixei na sua mão.

— Eu acho — admito, sincero.

Não gosto de esconder nada dela no que se refere a Mendonça Negócios Imobiliários porque é um patrimônio da sua família. Sua opinião é importante para definir o que deve ou não ser feito.

A tristeza no seu rosto, porém, eu tenho certeza que é mais pelo desgosto com Telso do que pelo nome da empresa.

Esse maldito não cansa de me decepcionar, se for verdade dessa vez vai pagar caro. Até hoje não engulo a forma planejada que conseguiu sua porcentagem na imobiliária sem nos dar margem para reagir.

Ele faz tudo milimetricamente calculado para se safar.

— José Paulo está pesquisando terrenos e galpões para a Supremac implantar o projeto social deles — explico, passando a mão no rosto. — Ele me mostrou no final da tarde umas opções bem em conta em um lugar chamado Jardim Flora. Estranhei ser um bairro de classe média-baixa porque de manhã estava fazendo um levantamento no sistema, sobre as regiões que mais nos trazem receita, e esse nome apareceu entre as 20 principais.

Aponto para o papel e mostro os valores de algumas propriedades que encontrei depois da conversa com o funcionário. As vendas intermediadas por nós no local, de dois anos para cá, parecem supervalorizadas.

— Não faz muito sentido — minha mãe comenta o mesmo que tenho pensado desde que vi os números. — Por que as pessoas estão comprando propriedades em um bairro inferior por um valor que daria pra investir em um local melhor?

— Também pensei isso, tem alguma coisa estranha e quero sua autorização pra investigar. — Encaro seus olhos verdes e vejo ali o medo de uma nova decepção com o homem que amou. — Foi pura coincidência ligar os pontos, mãe. Se não tivesse feito a pesquisa de manhã não teria desconfiado. São dezenas de bairros, até hoje não decorei todos, nem conheço tudo. Mas sinceramente acho que há um problema grande por trás desses dados.

Silêncio.

Ela não responde nada de imediato e fico aflito ao notar a tristeza evidente no seu rosto cansado. Parece até que já tem certeza do sofrimento que está por vir com mais um golpe.

— Pode ir a fundo nisso, filho. — A voz sai rouca, engasgada pelo choro reprimido.

Deixo um beijo carinhoso na sua testa e trago seu corpo franzino para perto do meu, abraçando-a forte.

Telso foi um pai de merda, um marido pior ainda e só sabe se aproveitar da empresa da minha mãe.

Se eu descobrir qualquer fraude dele, não vou hesitar nenhum segundo em mandá-lo para trás das grades. 

Eita, mais essa agora para a conta do Telso.

O que será que o homem tá armando?

Quinta tem mais e vamos conhecer o adorável irmão da Agnes. 

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