❤ Capítulo 9

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Samuel

Tenho que dar o braço a torcer para a Agnes. Minha primeira impressão sobre ela é que seria nova demais para cuidar da minha mãe, fiquei preocupado com recomendações e sua experiência na área.

Já acompanhei um pouco do trabalho das outras três enfermeiras - de fato mais velhas e com currículo vasto -, porém, nenhuma delas deixou Dona Creuza tão animada e com apetite para comer.

Aposto que jamais iriam se prontificar a fazer algo além das suas funções. Minha mãe estava certa, a garota é espontânea.

Vejo-a se levantando para repetir o prato e não resisto a sorrir de novo. É praticamente um milagre isso acontecer duas vezes na mesmo noite.

Sorrir de verdade é bem raro agora.

— Uau, desse jeito vamos ter que pedir pra Agnes fazer creme de abóbora todo dia! — brinco, levando uma colherada na boca.

Está delicioso, também estou bem propenso a repetir. Tirando com minha mãe, em nenhuma outra ocasião desde que cheguei à fase adulta, comi comida caseira.

Ao contrário de Agnes, Isabela não gostava de cozinhar e nem sabia fazer um ovo frito. Vivíamos em restaurantes ou pedindo algo em casa.

Arqueio a sobrancelha, fitando o prato, e balanço discretamente a cabeça.

Por que estou comparando as duas?

— Seria um prazer cozinhar pra Dona Creuza. — A voz dela me obriga a sair do transe. — Se quiserem, deixo pronto vários pratos nos dias que vier. Só congelar que fica bom.

— Imagina! — Minha mãe exclama, sentando-se novamente ao meu lado. — Não precisa fazer isso querida, um cansaço desnecessário.

— Eu estava brincando — explico, ainda não entendendo de onde veio esse pensamento aleatório. — Você não tem obrigação nenhuma de cozinhar.

Costumo sempre falar olhando para meu interlocutor, mas nesse momento prefiro não encarar Agnes. Faz tempo que não entro nesse jogo ridículo de comparação.

Odeio isso, embora seja involuntário.

Aconteceu todas as vezes que meu corpo venceu a batalha e acabei transando, nesses últimos quatro anos. Foram poucas, ainda bem. A tristeza que fica no meu peito quando acaba é pior que a necessidade fisiológica.

As mulheres com as quais sai são exatamente como eu - somente procuram alívio. Escolho à dedo, fora do meu círculo social, porque não quero contato com nenhuma delas. Relacionamento está fora de cogitação para mim.

Acredito que só temos a chance de viver o amor uma vez na vida, ele não bate na mesma porta.

Já tive o meu.

— Eu sei que não tenho, mas adoraria. — Ela observa com carinho Dona Creuza e sorri, depois volta a atenção para mim. Dessa vez correspondo o contato. — Você está me pagando muito mais do que ganho no meu trabalho atual. Além disso, equiparou o salário de enfermagem, sendo que ainda sou técnica. De coração, eu ia adorar deixar a comida pronta.

Viro para minha mãe e trocamos um olhar de dúvida se isso não seria abusar dela. Dona Creuza acena com a cabeça em positivo, e entendo que podemos testar.

— Não deve ser uma obrigação, Agnes — reforço, fitando seus grandes olhos castanhos. — Só vamos aceitar se fizer quando puder. Os dias que estiver mais agitado, o restaurante faz a entrega aqui.

— Claro, como acharem melhor.

Minha mãe muda de assunto falando das sobrinhas gêmeas da garota e eu aproveito a deixa para espantar da minha mente qualquer resquício da comparação.

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