Do Terceirão Para a Vida

Da AndresaRios

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Todo ano uma turma de ex alunos do ensino médio é convidada para participar do reality show Do Terceirão Para... Altro

SOBRE O TERCEIRÃO
LISTA DE CHAMADA
PRÓLOGO
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PILOTO

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Da AndresaRios

Nos deram apenas um dia para arrumarmos todas as nossas malas, nos despedir dos nossos familiares e seguir de volta para o estúdio. Ao contrário dos outros participantes, não pareceu uma tarefa difícil para mim. Já que não tenho família e a arte de arrumar malas, se tratando de mim, é basicamente jogar qualquer coisa que pareça útil até o limite do zíper, deixei tudo pronto em menos de uma hora. Não passava das três da tarde quando a minha melhor amiga, Priscila, tocou a campainha do meu apartamento, logo depois de eu lhe enviar um mensagem com um pedido de ajuda pré-viagem.

Ou como gosto de chamar: o alerta da mãe de pet.

— Ele come três vezes ao dia — começo a falar assim que abro a porta. Me sinto tão frenética que nem a cumprimento direito. — Cocô só fora de casa, à noite e pela manhã. Ele odeia dormir sozinho, então o deixe na sua cama? Se não der na cama, coloca uma almofada no chão, mas bem perto de você. Se ele chorar, o cubra com esse cobertor.

Enquanto ando pelo apartamento juntando as coisas de Todd, meu cão, ele fica me olhando atentamente. Não parece fazer ideia de que vou abandoná-lo, e me sinto culpada de pensar que sumirei por um ano. Mesmo com as visitas que temos direito a cada três meses, simulando férias, ainda é muito pouco para um cachorro. Espero que minha amiga seja uma boa mãe na minha ausência.

— Tereza, você tá estranha —  Priscila me faz parar.

Com o olhar atento dela me julgando, finalmente percebo que estou agindo como uma maluca. Até mesmo Todd saiu da sala, indo para debaixo da cama do meu quarto.

Respiro fundo.

Ando até o sofá e me jogo nele, encarando a TV desligada. Priscila faz o mesmo e, em silêncio, só me olhando daquele jeito acusador, pergunta qual é o problema.

— Lucas está lá.

Ela pensa um pouco.

— Você já sabia disso.

— É. Eu sabia. Mas olhar para ele de verdade... É muito mais difícil do que parece. Eu quase voei no pescoço dele, Pri. Foi preciso muito autocontrole.

— Você tá falando do cara que te deu um fora durante a sua formatura, logo depois de transar com a sua melhor amiga. Eu também iria querer voar no pescoço dele, Tereza. Ainda mais depois do desastre que aquela noite se tornou por causa do que ele fez. Lucas ferrou a formatura de todo mundo.

— Não é só isso — confesso.

Priscila fica me encarando, esperando que eu continue. Não quero falar, apesar de estar sentindo cada palavra entalada na garganta. Estou sufocando com elas há dez anos, desde aquela noite. Se eu soubesse, teria faltado à formatura. Me pouparia muito estresse. Dava para ter comprado um milhão de maços de cigarro com o dinheiro que gastei indo ao psicólogo por causa desse assunto.

— Tereza — Priscila se aproxima um pouco, em alerta. — Você ainda sente alguma coisa por ele?

A pergunta dela me pega de surpresa. Conheci Priscila logo que sai do colegial, na faculdade, quando o assunto Lucas e Eu ainda era recente. Ela sabe de todo o histórico problemático do meu namoro e término porque ficou meses ouvindo as minhas lamúrias. Se não fosse por ela, eu teria ligado para Lucas todas as noites dos primeiros dois anos de coração partido, e mais ainda nos oito anos seguintes, quando não consegui suportar o sucesso dele com a música.

É, eu confesso: queria que Lucas tivesse caído na amargura. Queria o pior para ele. Não pude evitar, por mais que tenha me esforçado, desejar que ele não fizesse sucesso, que acabasse se tornando um artista falido tocando em algum lugar que não era o seu sonho. Foi destruidor para mim quando o vi fazer sucesso com letras que escrevemos juntos.

Respiro fundo. Priscila ainda espera uma resposta e começa a ficar preocupada comigo.

— Eu sinto — a olho decididamente, juntando todas as mágoas que acumulei nos últimos anos — eu sinto ódio.

Pego um Uber até o estúdio onde o reality show é gravado. Não é um lugar muito movimentado porque fica longe do cenário de todas as outras novelas e programas mais interessantes. A cada edição de Do Terceirão Para a Vida a produção recria uma escola diferente, então precisa ser um espaço muito grande, que não atrapalhe o trabalho e o desenvolvimento de demais projetos.

Para ser bem sincera, eu me sinto em uma fazenda distante quando o carro passa pelo portão de entrada. Cada metro percorrido dentro do estúdio é repleto de árvores, e as estruturas fechadas onde os outros programas são gravados são bem rústicas. Para finalizar, a silhueta de São Paulo é quase imperceptível ao fundo, como um detalhe dramático, me fazendo sentir que estou fora da cidade.

Estou distraída demais com o cenário para perceber que chegamos. O carro para em frente a um prédio de cinco andares todo espelhado, bem diferente do restante do local, e eu desço já percebendo que alguns dos meus colegas chegaram também. Eles estão parados na escadaria como um grupo de escola em uma excursão, esperando pelo professor para começar o verdadeiro passeio dentro do prédio.

— Olha quem chegou!

Bruno, que é o primeiro a me ver, sempre gostou muito de mim e, para ser sincera, ele foi uma das únicas pessoas que não desejei socar nas últimas horas.

— Cadê o resto do pessoal? — noto que não tem nem metade da sala nesse grupo.

Maria Eduarda responde:

— Ainda não chegaram. Parece que alguns ficaram presos no trânsito — rolou os olhos. — Esse pessoal de fora precisa se programar melhor antes de entrar em São Paulo.

Eduarda até que está certa, apesar de eu saber que pontualidade e São Paulo na mesma frase é quase uma ironia. Olho ao redor, na direção do portão do estúdio. Acho que andamos uns dois quilômetros até chegarmos ao prédio principal, então não veremos o resto dos nossos colegas se aproximando quando finalmente resolverem parecer.

— Como vocês estão? — pergunta Pietro, de repente. Ele parece um pouco nervoso. — Conseguiram dormir?

Não combina com ele. Esse ar preocupado e bonzinho de quem está querendo empatizar com o resto dos colegas. Eu me lembro muito bem de quando ele mostrou fotos da namorada nua aos colegas, no último ano. Ele não sentia empatia naquela época. Pode ter mudado, mas não confio. Prefiro continuar o odiando. Faz bem aos meus princípios.

— Como um anjo — respondo com um sorriso seco. — E você? Dormiu com a consciência limpa?

Ele me olha um pouco confuso, mas então alguém também responde à sua pergunta e eu sou rapidamente esquecida. Muito típico dele. Pietro nunca deu muita bola para a garota emburrada do fundão da sala porque estava ocupado demais com as meninas mais bonitas, e parece que nada mudou. Com os músculos de alguém que passa o dia inteiro na academia e o cérebro de um cara que compartilha nudes da namorada, eu sinto pena de quem costumava dar bola para ele. Mereciam coisa melhor.

— O que está acontecendo ali?

Sigo o olhar de Maria, que estica o pescoço para olhar além de nós. Tem meia dúzia de seguranças correndo na direção da entrada do estúdio, falando naqueles rádios estranhos que vemos em filmes.

O grupo todo troca alguns olhares. Ninguém sabe o que pensar. Se teve algum problema, então deve ser relacionado a nós, certo? Mas não fizemos nada. Estamos parados no mesmo lugar desde que chegamos.

A nossa confusão acaba quando um carro começa a se aproximar. É daquele tipo que nem faz barulho quando anda, todo brilhoso e com rodas sem sujeira. Parece um carro de comercial de TV, ou de um vídeo clipe.

Reviro os olhos.

Ele não poderia ter vindo de Uber, como uma pessoa normal?

O carro para na nossa frente, e Lucas abre a porta traseira. Está usando blazer, óculos escuros e sapatos pretos. Ele sorri quando nos vê, e já começa a falar sobre a confusão com fãs na entrada do estúdio. Parece que alguém divulgou o horário que ele chegaria e alguns admiradores decidiram arriscar fotos.

— Porque se você não atrapalhar a gente em alguma coisa, então não é você — comento, com um sorriso irônico.

Ele tira os óculos escuros e me encara com aqueles grandes e irritantemente conhecidos olhos castanhos.

— Se eu bem sei, vocês só estão aqui por minha causa. Eu seria mais agradecida.

Eu sabia. A nossa turma sem graça do terceiro ano só foi escolhida para participar do programa por causa dele, o astro nacional preferido do momento. Acho que o odeio um pouco mais agora.

— Claro, vossa majestade. Demonstrarei a minha gratidão com mais afinco de agora em diante.

— Céus, eu tinha me esquecido de como era ficar perto deles — alguém comenta, e eu percebo que todo mundo observava a nossa discussão. — É tensão sexual pura.

Olho para o autor do comentário, percebendo que um dos Joões perdeu completamente a noção das coisas. Estou prestes a responder alguma coisa que não poderia ser exibida em rede nacional quando uma funcionária do estúdio aparece, pedindo a nossa atenção.

— Bom dia! Estarei explicando as regras e acompanhando vocês até o alojamento. Sou a Denise. Preciso que vocês venham comigo — instrui —, podem deixar as malas onde elas estão que as levaremos aos seus quartos.

Nós a obedecemos, e eu ando irritada atrás do grupo até a parte de dentro do prédio. O resto da nossa sala está sentada entre os diversos sofás da recepção, causando a maior bagunça. Não estavam atrasados, ao que parece. Mas tem gente com os pés sobre as mesas, copos de água e papéis de bala por toda a parte. Queria que tivessem chegado tarde e poupado o constrangimento.

Com todo mundo junto, somos guiados pelo estúdio através de cenários e funcionários de outros programas. Acho que em algum momento vejo alguém famoso, e mesmo sendo ignorada sinto certa euforia. Nunca vi ninguém famoso pessoalmente antes. É meio emocionante quando a mulher alta e maquiada passa pelo grupo e sorri até seus olhos pararem em mim.

— É aí, Lucas? — ela cumprimenta o homem ao meu lado, e toda a euforia some.

— Fala, Ivete!

Claro que Lucas não seria ignorado. Reviro os olhos. Não sei nem sei consigo disfarçar minha expressão de desgosto enquanto eles trocam poucas palavras, mas ignoro Lucas completamente quando Ivete vai embora.

— Posso te passar o telefone dela, se você quiser — ele coloca as mãos nos bolsos, muito irritante.

— Não. Obrigada. Pode enfiar o telefone no...

— Chegamos! — Denise anuncia, parando em frente a uma grande porta de duas divisões — Daqui em diante vocês estarão oficialmente dentro do Do Terceirão Para A Vida! Sejam muito bem vindos!

Todos os meus colegas ficam felizes e ansiosos, mas eu só consigo respirar bem fundo. Não me leve a mal, quero muito ficar milionária, mas toda vez que penso no tempo que vou passar ao lado dessas pessoas tenho certeza de que posso surtar.

Com um passo encorajador, começo a andar junto com o grupo quando Denise nos guia através da porta dupla. Acho que eu esperava alguma música triunfal ou luzes, mas tudo o que encontro é um corredor de plantas que acaba em um grande campo. Lá no fundo, vejo uma seleção de pequenos chalés, onde provavelmente ficaremos hospedados, e no meio deles uma espécie de área de lazer. É nesse local que o apresentador sempre conversa com os integrantes.

— Vocês lembram dos números da chamada de vocês? — pergunta a moça. A maioria diz que sim, mas alguns, como eu, não lembram. — Cada chalé tem um número também, e vocês vão se acomodar no equivalente ao da chamada.

Continuamos a seguindo, e paramos na área de lazer entre os alojamentos. Está sol, mas sinto frio. Estamos no começo do inverno, então fico pensando em como será um inferno passar frio nesses chalés, no meio do nada.

— O interior de todos são iguais, então não há necessidade de escolha ou preferência. Todo dia teremos um café da manhã aqui fora e, se estiver chovendo, ele será levado até vocês nos chalés. Tem piscina, academia e biblioteca nos arredores. Os horários de funcionamento estão no quadro acima da cama de vocês. O colégio fica naquele prédio — indica algo entre as árvores — Cada andar está em um ponto do terreno, então o térreo fica à direita dos alojamentos e o primeiro à esquerda. Todas as manhãs, após o café, um carrinho do estúdio levará vocês até a sala de aula, onde o verdadeiro reality começará. Por aqui, teremos câmeras também, mas só assinantes do perfil pago vão ter acesso a essas imagens. O show mesmo, aberto ao público, é na sala de aula.

Eu tento processar tudo o que ela diz, mas é meio difícil.

— Temos algumas regras no programa, que também estão no folheto, mas as mais importantes são: nada de agressões físicas, sexo, palavras feias e uso de drogas durante o programa.

— Tira a Tereza daqui, então — alguém grita.

Eu só levanto o dedo do meio no ar, sem me importar em direcioná-lo a alguém em especial.

— Gestos assim também são proibidos — a moça informa.

Eu respiro bem fundo.

Prêmio milionário.

Foco.

— Vocês tem uma hora de internet por dia, depois disso desligaremos o Wi-Fi. Seus celulares podem ficar, mas tiramos os chips. Servirão apenas para fotos e o uso da rede do estúdio.

— E quanto a mim? — pergunta Lucas — Eu tenho fãs. E uma carreira. Não posso ficar tanto tempo off-line.

— Deveria ter pensado nisso antes de aceitar participar do programa — deixo escapar.

— Ela tem razão — concorda Denise, e eu passo a gostar muito dela. — Sem excessões a nenhuma regra aqui.

Lucas não parece nada contente, fechando a cara.

— E as férias? — Maria pergunta.

— A cada três meses vocês têm sete dias fora do programa.

— Certo.

— Podem se direcionar aos seus chalés, por favor. Peço que leiam com atenção o folheto com o restante das regras, porque elas são importantes. Tenham uma boa noite.

Denise fica sorrindo, apesar de não se mexer. Acima dela identifico um drone que provavelmente está fazendo a cobertura para o perfil pago. Perfeito. Nem dez minutos no programa e o comentário maldoso de um dos meus colegas já pode ter me deixado com fama de drogada, ninfomaníaca e desbocada.

Um rapaz passa muito jovem passa por cada um de nós, entregando as chaves dos nossos alojamentos. Como o meu número de chamada era um dos últimos, fico com o chalé 22. Pelo canto do olho, reparo que Lucas ficou com o 10. São bem longe um do outro, graças a Deus. Tudo o que eu não precisava era ter que dar de cara com ele todos os dias pela manhã.

Com o chaveiro laranja nas mãos, me afasto do grupo. Cada passo é um tom de volume mais baixo na conversa deles, e eu me sinto cada vez mais agradecida por não ter que ficar ouvindo as vozes desconexas em assuntos entediantes. Vou direto para o meu chalé, que sem câmeras e desconhecidos que um dia foram conhecidos é como o paraíso agora. Quero me isolar dentro dele e só sair quando esses 365 dias acabarem.

A primeira coisa que noto quando entro no alojamento é que a moça tinha razão: trouxeram as nossas malas para o chalé. A minha é uma Louis Vuitton que ganhei de uma cliente no ano passado. Consegui livrá-la de ter que dividir o dinheiro com o ex marido após o divórcio, e levando em consideração que era muito dinheiro, a mala não deve ter causado nenhum prejuízo. Aceitei por cortesia, e também porque eu não tinha uma mala para viajar com meu cachorro no final do ano. Foi bem útil.

Ando até a cama no centro do chalé e me jogo sobre ela. Acho que deitei em cima do folheto com as regras, mas estou com preguiça demais pra me movimentar. Só consigo encarar o teto de madeira extremamente lustrado por inúmeros minutos, respirando fundo.

Milhares de reais.

É nisso que preciso focar.

Mas antes, preciso conhecer as regras.

Puxo o folheto já castigado pela minha bunda e o desamasso. Tem três páginas, cada uma destinada a um tópico. O primeiro, claro, são as regras: como a moça disse, não podemos bater em ninguém, nem transar com ninguém, nem falar palavrões. Também não podemos sair dos chalés após certo horário, fazer ligações, tirar fotos fora da escola e faltar aos cafés da manhã em grupo em dia de sol.

Ok. Acho que posso suportar. Pelo menos terei sete dias de liberdade para transar, xingar e socar quando a hora certa chegar, e isso deve ser o suficiente. Não é o fim do mundo... Apesar de que tem gente aqui que é incapaz de guardar o pau dentro das calças. Digo, se o Lucas não aguentou passar uma noite (mesmo que a de formatura), sem comer alguém, como ele sobreviverá todo esse tempo? Vai ser divertido observar. Aposto que ele ficará como aqueles viciados em abstinência.

O segundo tópico do folheto é sobre as regras escolares. Não podemos faltar às aulas, nem recusar fazer trabalhos em grupo; aos finais de semana podemos usufruir da área de lazer, da academia e do bar sem limites e hora para voltar. Nós recebemos pontos por tudo o que fazemos, e esses pontos são convertidos em dinheiro depois. Quanto mais fizermos, mais ganhamos, mas o milhão é um só: se eu fico com dez mil, o resto do grupo fica com novecentos e noventa; e se eu ficar um novecentos e noventa, o resto do grupo fica com dez mil.

Sempre fui uma ótima aluna, então não será problema. Saio daqui com pelo menos meio milhão.

Deixo o folheto de lado, prometendo a mim mesmo que terminarei de ler mais tarde. Continuo olhando para cima, mas o teto se torna tedioso. Minha cabeça dói, e meus pés também. Eu não deveria ter escolhido essa bota para passar o meu primeiro dia nesse inferno!

Levanto e vou até o banheiro, percebendo que deixaram todos os produtos de higiene necessários ao nosso dispor. As toalhas são tão limpas que eu vou ter dó de me enxugar nelas. O chuveiro é incrível! Daqueles de casal, bem grande. Posso morrer embaixo de um chuveiro desses sem nem reclamar.

Tiro a roupa deixo a água quente do chuveiro inebriar o banheiro. Posiciono a toalha onde eu consiga pegar com facilidade, prendo os cabelos em um coque alto e me enfio debaixo da água, sentindo todo o conforto de um bom banho me acalmar. Eu estava tão tensa que nem havia percebido que trincava o maxilar inconscientemente. E foi só o primeiro dia nesse lugar.

Saio do chuveiro, me olhando no espelho após passar uma das mãos sobre o vapor impregnado. Ainda me sinto bem, muito bonita, mas sei que em duas semanas, assim como os participantes anteriores, até a minha dignidade vai ter descido pelo ralo. É questão de tempo até alguém surtar aqui dentro, e eu tenho certeza de que serei a primeira a aparecer com os cabelos desgrenhados na sala de aula. Mas acho que está tudo bem, porque não vai ser muito diferente da Tereza do terceiro ano, e essa é a intenção, afinal.

Volto para casa quarto com uma toalha amarrado ao corpo e os cabelos já soltos. Pego a minha mala e a coloco sobre a cama, puxando o zíper. Já que ficaria bastante tempo, trouxe o meu pijama de flanela favorito, que é o mais confortável e quente de todos. Vou me enfiar nele e só acordar amanhã, se tudo der certo. Preciso estar bem descansada para enfrentar a escola amanhã.

Quando abro a mala, deixando a tampa cair para trás, tenho uma surpresa. Essa não é a minha mala. Eu não tenho essa quantidade ridícula de blazers e jaqueta a de couro, nem camisetas largas.

Só pode ser brincadeira.

Pego a outra mala que trouxe, e dentro o conteúdo ainda não é meu. Tem cuecas, escova de dente, gel de cabelo e... camisinhas.

Eu sei exatamente de quem são essas coisas.

Abro a porta do meu chalé, fecho o zíper das duas malas e as puxo para o lado de fora. Entre o meu chalé e o chalé número 10 fica a área de lazer, que possui um caminho de pedras sinuoso entre a grama. É difícil de puxar, mas estou sendo movida pelo ódio e não paro nem por um segundo, descansando só quando estou socando a porta de Lucas com os punhos fechados.

Em menos de segundo ele aparece, com os cabelos bagunçados e o rosto levemente corado. Minha certeza sobre ele também ter acabado de tomar banho se torna real quando baixo os olhos para a toalha amarrada em sua cintura.

Deus.

— Trocaram as nossas malas — digo em um tom muito grosseiro, levantando o rosto como se tivesse uma máquina mortífera sensível a olhares no abdômen dele.

Não era a minha intenção ser grossa, mas seria humilhante não conseguir disfarçar que estou lutando para manter os meus olhos em seu rosto, e não em outros lugares. Preciso que ele se preocupe com o meu temperamento o suficiente para não notar outras atitudes.

— É, eu vi.

O jeito como ele fala essas três palavras fazem uma sirene começar a ecoar dentro do meu cérebro.

Ele não ousaria...

Sem dizer uma palavra eu o empurro e ganho passagem para dentro do chalé. Lucas bate na parede e segura a toalha que quase me deu outras coisas para olhar nele, mas eu não ligo. Perco totalmente o interesse no abdômen sarado em prol do famoso fan service assim que vejo a minha mala aberta sobre a sua cama. Eu não acredito que ele fuxicou as minhas coisas!

Me viro para ele. Acho que estou parecendo um animal feroz, porque sinto a minha respiração muito pesada. Eu solto as malas dele no chão, que caem em um barulho oco, e puxo o ar para dentro dos pulmões.

— Por que você mexeu nas minhas coisas?

Ele se recupera do empurrão e se aproxima:

— Eu não sabia que eram suas! Aposto que mexeu nas minhas também.

Dou risada, me lembrando do que encontrei nelas.

— É, eu mexi, sim! Mas só porque não pude acreditar na sua cara de pau! Com quem pretende transar, Lucas? Porque é contra as regras.

Ele apenas sorri:

— Bom, eu não pretendia transar com ninguém, mas se você está oferecendo...

Lhe dou as costas, juntando as minhas coisas dentro da mala. As fecho de qualquer jeito, muito apressada, querendo sair daqui antes que eu seja desclassificada por quebrar a regra sobre agressões físicas. Não vou deixar que o Lucas me faça perder o prêmio.

Com um pouco de dificuldade, puxo as malas para o lado de fora. Lucas não faz nada, nem tenta ajudar, só fica parado me olhando, e eu nem arrisco checar se ele está rindo ou não. Seria demais. Eu com certeza desmancharia o sorriso com um soco.

— Tereza, espera.

Já estou do lado de fora, com as malas uma de cada lado do corpo. Em uma situação normal eu sentiria medo pela toalha perigosamente solta, mas não consigo pensar em nada além do fato de ele ter mudado o tom de voz para me chamar.

— O que foi? — rosno.

Ele está parado atrás da porta, com metade do corpo escondido pela madeira. Que inferno. Por que ele não era gostoso assim quando a gente namorava? Pelo menos teria valido um pouco mais a pena. Carregar um chifre deixado por um perdedor do colegial não é exatamente a maior das glórias, mas talvez eu não me sentisse tão na merda se me convencesse de que fiquei com ele porque ele era um gato.

Por um momento, Lucas some. Então, em um segundo, ele volta, com um sutiã meu na mão.

— Você esqueceu isso — diz.

É muito rápido: como estou com as duas mãos ocupadas pra impedi-lo, Lucas se aproxima e enrola o sutiã no meu pescoço.

Reviro os olhos.

— Eu vou conferir cada item dessa mala — aviso — E se estiver faltando algo, eu juro que volto aqui e quebro a sua cara.

— Mal posso esperar, Tereza.

Lhe dou as costas, sentindo o sutiã de renda pinicar no meu pescoço.

É bom que eu saia milionária desse lugar.

N/A:
O TERCEIRÃO VOLTOUUU!!
E aí? Estão gostando? Já tem um personagem preferido? Me contem tudo!
Beijão e até a próxima! Não se esqueçam de me seguir no Instagram para a gente falar do capítulo de hoje

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