O Que o Espelho Diz - A Rainh...

De MeewyWu

79K 8.7K 3.1K

Capa Atual: Foto de Alice Alinari, instagram: alice_alinari A Rainha da Beleza: O que o Espelho Diz. Bethany... Mai multe

Epígrafe
Prólogo
I - Alianças Diferentes
III - O Conselho Real
IV - Informação Vazada
V - Palácio de Verão e Vidro
VI - Chuva de Cristais
VII - Vidro Embaçado
VIII - Protetora de Paris
IX - Cavaleiro de Prata
X - Teia de Veludo Vermelho
XI - Carvão e Metal
XII - Ilusões Refletidas
XIII - Prismas
XIV - Retinta
XV - Sonhos de Marfim
XVI - Espadas de Madeira
XVII - Floresta de Esmeraldas
XVIII - Penas Prateadas
XIX - Corpos e Fantasmas
XX - Rios de Sangue
XXI - Palácio de Ferro
XXII - Cartas à Morte
XXIII - A espada vermelha
XXIV - Claro como Cristal
XXV - Coroa de Ossos
XXVI - Sapatos Brilhantes
XXVII - Segredo Americano
XXVIII - Posição Política
XXIX - Arte da Guerra
XXX - O Que o Espelho Diz
Epílogo
O Que o Espelho Diz - Por Meewy Wu
AESTHETICS

II - Um fantasma no Palácio

3K 331 115
De MeewyWu


Eles chegaram as dez. Não sei dizer quem eram eles, exatamente, por que o peso dos meus olhos me impediu de gravar seus rostos, tal como o sono me impediu de entender os nomes que gritavam um para os outros enquanto corriam de um lado para o outro em meu quarto, montando mesas e carregando roupas.

Todos vestiam branco. Como fantasmas, flutuando em volta da minha cama, abrindo e batendo a porta do quarto e do banheiro.

-O banho está pronto! – gritou alguém do banheiro, enquanto o barulho de água em algum lugar era cessado – Podem trazê-la.

Romeu miou incansavelmente, enquanto duas mãos me puxavam e me guiavam até meu próprio banheiro. Lá, eu fui despida e colocada na água quente. Dois pares de mãos me esfregavam, outro par pressionava a ponta dos dedos no meu couro cabeludo.

-É um grande dia, não é mesmo? – perguntou a dona dos dedos em meu cabelo para mim. Não me lembro de tê-la respondido. Eu fui arrancada da água quente e enfiada em um roupão quase transparente, o choque frio me forçando a realmente despertar a tempo de voltar para o quarto e notar a quantidade surpreendente de guardas ali.

Uma quantidade surpreendente de guardas enquanto eu atravessava o quarto em um roupão transparente.

-Nos deixem passar, seus bastardos infelizes – grunhiu Isabel do corredor, e pelas vozes tentando acalma-la todas as meninas deveriam estar ali. – Eu sou Isabel Venezza. Filha de Lorenzzo Venezza. Esposa de Dylan Bordeaux. Eu... Eu sou a sobrinha de Flora Venezza! Se a minha tia souber o modo como estão nos tratando, ela irá...

-O príncipe Fox nos deu ordens para que ninguém entre e ninguém saia do quarto até que ele libere – falou um dos guardas, duramente, e então começou a gaguejas – Senhorita Venezza, por favor... Senhorita feche sua blusa.

-O que está acontecendo?- ouvi Annie perguntar no corredor, enquanto era empurrada para uma cadeira e meus cabelos eram puxados com força – Isabel feche a droga da sua blusa. Eu sou a princesa Antoinette, e exijo que nos deixem passar.

Isabel ainda estava fechando o último dos botões da blusa, quando as quatro atravessaram a porta do quarto até mim. Tina vinha na frente, com Alicia carregando mais vestidos do que conseguia logo atrás dela. Annie e Isabel discutiam atrás delas, em voz baixa.

-O que é tudo isso? – perguntei, enquanto Alicia soltava os vestidos sobre a cama e elas se espalhavam pelo quarto.

-Fox irá anunciar que escolheu sua futura esposa – falou Tina, sentando em um banquinho próximo a mim – E apresentará você como futura rainha de toda Eurásia, Bethany. Isso é quase o mesmo do que receber o título de princesa, na frente de toda a população de Paris e de câmeras que transmitirão o anuncio para todo nosso território.

Respirei fundo – Isso precisa ser hoje?

-Deveria ter sido meses atrás – falou Alicia, com a voz exalando piedade – Mas Fox e Isabel tinham seu acordo, então...

-Este acordo, foi uma péssima ideia – Falou Isabel, jogando-se na cama com Romeu passando por cima dela – Todas as noticias sobre meu casamento serão esquecidas depois disto.

-Ao menos você escolheu se casar – murmurei. Por um minuto inteiro, senti que toda a sala parou e me observou enquanto eu me levantava – Eu tenho de sair daqui. Preciso respirar.

-Senhorita, o príncipe deu ordens diretas para não deixarmos que saísse em circunstancia alguma – outro guarda falou, barrando minha passagem. Parecia quase haver um pedido de desculpar em seus olhos – Por favor, não insista. Nossos empregos dependem disso.

Pressionei os lábios. Fox vinha sendo duro com aqueles homens, os colocando em turnos exaustivos e treinamentos cada vez mais desgastantes. E agora, sua paranoia os fazia me manter presa ali, mesmo que eles não acreditassem que deveriam.

-Não quero prejudicar ninguém – falei relutante – Podem me vigiar se quiserem. Só quero um pouco de ar fresco.

-É melhor se vestir antes, não Bethany? – sugeriu Tina, animadamente pulando para o lado da cama – Você destruiu o vestido que fiz para você ontem, mas faz semanas que estou costurando estes... Não consigo decidir qual o melhor para algo como um anuncio destes.

Eram cinco vestidos, como um arco Iris sobre a minha cama. Em qualquer outro dia, eu me sentiria honrada em vestir qualquer uma daquelas criações de Tina... Mas não naquela manhã.

-Você não tem nada em preto? – perguntei, sem olhar para ela, passando as costas das mãos por um vestido rosa brilhante. Ele me lembrava do vestido de Lilie quando morreu.

-Preto? – ela arfou – Bethany, eu não acho...

-É uma cor sóbria. Séria – falei, antes que ela pudesse me contestar – Não é o que deveriam esperar de uma rainha?

-Cinza, talvez? – Annie se intrometeu, distante – Estava fazendo um cinza para mim, Valenttina. Ele está pronto?

-Sim, acabei ele faz alguns dias... – ela parecia decepcionada – Posso ir busca-lo se quiser.

-Vá, por favor – Annie suspirou, e esperou que Tina saísse para me puxar para a cama, com as outras duas em minha volta – Tina acha que pode anima-la. Desculpe por isso. Sabe que pode desistir se quiser, não sabe?

Assenti – Eu sei. Só não parece certo, desistir. É como se eu olhasse por uma janela tudo que vi as pessoas sofrendo nessa nação e tivesse o poder de impedir isso e escolhesse dar as costas para elas. Para todas as pessoas que não tem culpa do seu irmão...

-Ninguém está lhe pedindo para salvar o mundo, Bethany – grunhiu Isabel, sentada no meu outro lado. – Use seu cérebro.

-Isabel está certa, você não precisa salvar ninguém – falou Alicia, ajoelhada com as mãos nos meus joelhos – Menos ainda se isso for lhe fazer infeliz.

-Não vou defender meu irmão – falou Annie, distante – Mas amor, é algo que exige tempo e disposição. Não preciso que ame Fox, Bethany. Mas está disposta a perdoa-lo um dia?

Perdoar Fox. A ideia era dolorosa. A ideia de um perdão, de um recomeço limpo, exigia talvez mais de mim do que de Fox – exigia minha sinceridade sobre coisas que eu era incapaz de admitir para mim mesma.

E ainda assim...

-Estou – falei, antes que pudesse me perder em pensamentos. Isabel grunhiu algo em italiano, mas Annie apenas apertou a minha mão – Você faria isso?

-Fugi disto todas as vezes que tive a chance – ela falou, com um sorriso triste – Mas você não é como eu, Bethany.

Eu era. Eu também era uma princesa me escondendo.

-Valenttina! – exclamou Isabel, quando Tina voltou com o vestido – Pela rainha... Deixem-na passar, seus imbecis!

-Guardas! – Annie ordenou, enquanto eles davam espaço para Tina.

O vestido cinza era como a maioria dos vestidos de Annie. Justo na parte de cima, com uma saia esvoaçante em camadas. Este tinha mangas longas e justas e costas nuas, com uma cintura bem marcada.

-É perfeito – falei, ganhando um sorriso amarelo de Tina enquanto seis pessoas da equipe me ajudavam a me vestir.

-Bem, não é o que eu esperava, mas você está linda Bethany... – Tina sorriu, andando até a minha penteadeira – Tenho certeza que com algumas joias.

-Nã... – Comecei a protestar, quando ela bateu a primeira gaveta de volta, mas Isabel foi mais rápida do que eu.

-Você não vai ficar com toda a diversão Valenttina – falou Isabel, a empurrando e mexendo nas caixas de joias em cima da penteadeira – Além disso, eu sou melhor com joias do que você. Vocês, por que não estão secando o cabelo desta garota? Querem a futura rainha resfriada?

A equipe se entreolhou, assustada, me jogando em uma mesa montada e enrolando e alisando meus cabelos de todas as formas possíveis enquanto Isabel se divertia com as joias. Foi Alicia quem puxou meu cabelo para trás, e Annie quem pintou meu rosto.

Não era uma maquiagem de musa. Era uma linha fina sobre meus olhos, cílios grandes e lábios quase sem cor. Isabel deu dois beliscões nas minhas bochechas após jogar um colar de pedras negras em volta do meu pescoço.

E então eu estava pronta.

Enquanto seguíamos para a sacada onde o anuncio seria feito, Alicia me explicava que todas almoçaríamos quando tudo fosse resolvido. A porta da sacada deixava a luz entrar, e a quantidade de pessoas ali era uma dezena de vezes maior do que no meu quarto.

A Rainha Lenna estava ali, concentrada com Veronicca. Napho parecia distraído conversando com Nisha, que deu um olhar rápido para Annie antes de seguir a conversa. E sozinho no meio de tudo aquilo estava Fox. O príncipe herdeiro. O futuro o rei.

Meu futuro marido.

-Você está belíssima, Bethany – ele sorriu, curvando o pescoço para me cumprimentar.

Talvez nunca antes, eu tenha feito uma reverência tão perfeita – Obrigada, vossa alteza.

Eu conseguiria fazer isso, disse a mim mesma. Eu superaria a noite anterior e nós começaríamos de novo, como uma menina bonita que foi escolhida para ser rainha e teria que conhecer seu novo marido.

-Depois da cerimônia, talvez pudéssemos conversar sobre... – ele parou por um minuto – A noite passada.

Foi como se o gelo invernal de Paris entrasse inteiro nas minhas veias. Sim, eu passaria por aquilo. Mas eu não estava preparada para perdoar Fox.

-Não acho que tenha algo para ser conversado, alteza – respondi, duramente – Ainda mais quando meu estomago dói depois das horas sendo enfeitada para este espetáculo.

Se a rainha ou qualquer outra pessoa me ouviu, não demonstrou. Ela foi a primeira a sair na varanda, e sem saber o que havia sido dito, minutos depois nós a seguimos cada um por uma porta lateral.

Como iguais.

A rainha Lenna saiu, enquanto Fox erguia uma mão fazendo todos se calarem para que ele pudesse ser ouvido. – É uma alegria imensa ver todos aqui, para celebrar comigo este que é apenas um dos dias mais felizes da minha vida. Como príncipe herdeiro, e futuro rei, eu, Fox Louis Parish, apresento a vocês, povo da Eurásia Bethany Keller, Musa de Paris e a partir deste momento, futura rainha.

Apertei os punhos. Ninguém havia me consultado sobre aquilo. Aquele era o sobrenome de Apolo. De Isis e Marian. Não o meu, eu nunca havia sido Bethany Keller por um dia sequer na minha vida.

-É incrível pensar que em todos os meus anos longe de Paris, eu precisei voltar para casa para encontrar a mais linda mulher deste reino – Fox continuou para o povo, enquanto eu por um minuto pensei quão fácil seria empurra-lo daquela sacada – Escolho Bethany não apenas como mulher, mas como rainha, pois sei que seu coração e mente estarão completamente voltados para o bem da eurásia, assim como o meu. Bethany gostaria de dizer algo? – perguntou Fox, com um sorriso calmo.

Annie me avisará que eu deveria fazer um discurso. Ainda sim, eu não estava preparada para aquilo – Eu... Eu agradeço pelas palavras gentis, vossa alteza. Nada que eu diga se compararia.

Dei as costas, entrando de volta no palácio. Eu precisava sair dali, mas enquanto eu tentava me afastar uma mão segurou meu cotovelo – Controle-se, Bethany.

-Me largue – grunhi para Napho.

Ele piscou surpreso, e então falou bem perto do meu ouvido – Achei que gostaria de saber que sua avó está assistindo.

-Bethany, você está bem? – ele perguntou, se aproximando.

Engoli em seco, controlando minha raiva. Então, quando ele me soltou, dei meia volta e voltei para a varanda, encarando o povo sob mim. Encarando as câmeras. Encarando minha avó, a avó que eu não conhecia, do outro lado do mundo.

Os repórteres, que começavam a guardar seus equipamentos, virarem-se tão rápido quanto a luz para mim, enquanto todos ali começavam a apontar para a varanda.

-Não fui criada para ser uma rainha – falei me apoiando no parapeito – No nosso mundo, cheio de coisas feias, não fui criada para acreditar que era bonita. Eu vi a beleza. Mas eu também vi a feiura da dor vinda do fogo, da espada e da fome. Eu precisei ter minha cidade queimada para entender quão inseguras as pessoas de Paris estavam. Precisei me tornar uma musa para entender quantas historias dolorosas a beleza da nossa nação escondia. Precisei que a morte me mostrasse quão desamparados e carentes de esperança estávamos.

Respirei fundo, sentindo as lágrimas encherem meus olhos – Eu vi os covardes se tornarem corajosos. E vi aqueles que pareciam corajosos, se mostrarem covardes. Eu não escolhi ser rainha – e enquanto encarava a câmera para qual dizia isso, eu imaginava encarar aquela mulher da foto – mas acho que, se isso estava além das minhas escolhas, o mínimo que eu devo a todos vocês é a promessa de que serei corajosa. E lutarei para que essa dor se torne apenas um fantasma na nossa história.

Silêncio. Então, de repente alguém começou a aplaudir, um a um, até que mesmo os repórteres haviam largado suas câmeras para fazê-lo. Eu não entendia, mas acenei para as crianças nos ombros de seus pais e sorri para eles.

Talvez eu não fosse capaz de amar Fox. Talvez eu não fosse como a rainha Lenna, que mantinha sua beleza e poder por seu marido e filho.

Mas pelo povo? Eu faria isso por eles.

-Bethany. Bethany, por favor, acorde! – Eu não sabia por que estava no meu antigo quarto no salão das musas, quando Annie entrou pela porta assustada – Tem uma garota... Um a garota que quer falar com você.

Eu nunca havia visto Annie tão fora de si. Ela estava mais do que amedrontava, estava completamente incoerente com sua postura e calma. Mesmo quando eu a vira irritada, nunca fora daquela forma.

-Uma garota? – perguntei, me sentando. Olhei para mim mesma, eu havia até mesmo dormido de roupas – Que garota?

-Uma garota... Ela é... Ela é horrível – Annie arregalou os olhos, olhando para o corredor e gaguejando – Eu... Eu pedi para que você esperasse na sala. Ela está...

-É Bethany – falou a voz do outro lado do corredor. Congelei. Eu sabia que voz é ela – Eu já havia em estado pior de qualquer estado que ela esteja.

-Deixe-a entrar, Annie – falei ofegante. A garota cruzou a porta, e o mundo deixou de existir. Por que parada em minha frente estava Isis.

Mas aquela não era a Isis que eu conhecia. Aquela Isis tinha mais da metade do rosto completamente deformada, com tufos incoerentes de cabelo ruivo saindo do crânio igualmente queimado. Era como se todo seu corpo fosse coberto de mais partes derretidas do que completas, e toda a beleza dela havia sido consumida, como uma vela que terminará de se derreter.

-Bethany! – ela jogou os braços deformados em torno de mim, me apertando enquanto eu paralisada tentava lembrar meu corpo como reagir – Eu fiquei... Eu achei que todos tinham morrido. Eu acordei e não havia ninguém na cidade. Ninguém em lugar nenhum.

Ela chorava abraçada no meu corpo imóvel. – Isis... – Minha voz saiu rouca. Vazia. Eu não sabia o que pensar ou o que sentir.

-Então eu vi você. Eu vi você na televisão, tão linda – ela se afastou, segurando meu rosto entre suas mãos derretidas – Tão linda no palácio. Onde eu sempre sonhei. E você ia ser rainha...

Ela começou a gargalhar. Tentei me afastar, mas ela me segurou com mais força – Rainha Bethany! Você nunca quis ser rainha, e olhe só... Eu vi você e pensei: Poderia ter sido eu. Eu poderia ter sido salva e ter sido rainha. Como o mundo é engraçado Bethany.

-Isis?- franzi a testa. De repente, ela parecia estar realmente derretendo. Escorrendo com cera na minha frente.

-Por que você fez isso Bethany? Por que roubou isso de mim?- ela choramingou, com os olhos grandes e verdes me encarando de forma triste e raivosa – Por que você não me salvou? Você podia ter me impedido... Podia ter se oferecido para pegar a gargantilha para mim.

-Eu não... Você me empurrou – arfei me afastando das mãos dela. Ela era tão forte. Quando ela se tornará tão forte?

-É o que você diz para si mesma? – ela perguntou – É assim que dorme a noite? Admita Bethany, admita.

-O que? – perguntei, segurando as mãos dela e tentando puxa-las para longe – Me largue! Annie! Alicia! Ajudem-me!

-Você gostou de me ver morrer Bethany – ela gargalhou histérica – Gostou de me ver morrer e ter a vida que eu sonhei. E agora você vai ser rainha, Bethany... A Rainha da Beleza.

As mãos dela se soltaram de mim, enquanto ela derretia em uma poça grudenta no chão. Virei-me para o grande espelho de chão atrás de mim, mas não era eu quem estava nele. Era Isis, aquela Isis deformada.

-Pena que no espelho, você não é tão bonita assim – ela riu. Joguei o espelho no chão, deixando que ele se quebrasse, mas ela estava no espelho da penteadeira também – Você é só uma menina queimada igual a mim Rainha Bethany...

-Me deixe em paz, Isis! – gritei, jogando um porta joias nela. Um porta joias que havia se quebrado um mês atrás, quando eu jogará em Fox.

-Rainha Bethany, Rainha Bethany – ela seguiu repetindo em outro dos milhares de espelhos, em todos eles, até que fosse a única coisa na minha cabeça – Rainha Bethany. Rainha Bethany.

Abri a gaveta onde estavam os documentos que Napho me entregará. Estava vazia. Ela seguia, repetindo de novo e de novo – Rainha Bethany. Rainha Bethany.

-Cale a boca – gritei, tropeçando e caindo nos cacos do espelho – Cale a boca Isis. Por favor, me deixe em paz. Eu não queria nada disso, eu não queria...

-Rainha Bethany. Rainha Bethany. Rainha Bethany.

-Eu não consegui... Eu queria salvar você... – choraminguei, sentindo meus braços e pernas presos por cordas invisíveis. Eu não conseguia me mexer. Eu não conseguia respirar, eu...

-Rainha Bethany. Rainha Bethany. Rainha Bethany.

-Bethany! BETHANY!

-Bethany! BETHANY! - Dei um pulo, batendo contra um travesseiro e assustada encarando Isabel segurando ele em frente a minha cabeça. Ela olhou para o objeto e o jogou para o lado - Bem, acho que não preciso mais disso.

-Você ia me bater com um travesseiro?- perguntei, e ela deu os ombros. Acho que nunca havia me sentido tão feliz em ver Isabel Venezza, enquanto ela me encarava desconfiada.

-Eu estava ouvindo você gritar do meu quarto, o que estava sonhando? - ela perguntou, sentando na cama.

-Só... Um pesadelo - balancei a cabeça, secando algumas lágrimas que ainda estavam nas minhas bochechas - Um que pareceu bem real.

-Sei como é isso - ela suspirou, se levantando - Vou mandar trazerem algo para você comer, mas deveria se vestir se não quer se atrasar para a sua primeira reunião do conselho.

Olhei para o relógio. Ela estava certa. O único problema era que eu não sabia me vestir para uma reunião do conselho, e justamente quando eu pretendia levantar este assunto Isabel bateu a porta gritando coisas em italiano pelo corredor.

Eu mal terminara de me vestir quando ela voltou, brandindo para que soltassem uma bandeja na minha cama e para que eu me trocasse - Você está arrumada demais, Bethany! Não quer que eles pensem que você se importa...

-Mas eu me importo - constei, enquanto ela terminava a frase.

-... Com o que eles pensam da sua aparência - ela terminou - Você é a futura rainha. Você sabe que tem o poder e que todos chorariam por um sorriso seu mesmo se estiver de pantufas, agora... Calças jeans?

-Não vou trocar de roupa - falei, me encolhendo no casaco quente e fofo e tomando chocolate da bandeja na minha cama - Gosto dessas.

Ela ergueu as mãos - Como você quiser. Agora, coma mais rápido por que Veronicca estará aqui... - duas batidas a fizeram sorrir - Agora!

Gemi, enquanto ela abria a porta. Veronicca usava seu tailler, com um rabo de cavalo alto. Estava mais bem maquiada do que de costume, e me avaliou com cuidado – Está pronta, Bethany?

Assenti, engolindo o chocolate de uma única vez, ignorando minhas cordas vocais queimando.

-Isabel, você vai vestida... Assim? – ela inquiriu para o roupão de Isabel, fofo e de material negro com o brasão da família Bordeaux nas costas. Era grande para ela, tão largo nos ombros que precisava dobrar nas mangas para ela poder usar as mãos.

-Parece uma boa forma de lembra-los que além do assento de minha tia eu também ocupo o espaço de Dylan – ela deu os ombros, apontando para mim – A futura rainha é ela.

-Isabel... – Veronicca ergueu uma sobrancelha, enquanto Isabel tirava o roupão fazendo um bico. Ela estava pronta para o frio, apesar de tudo. Havia um casaco de couro negro, pouco mais curto do que o roupão com o mesmo brasão da família de Dylan em um broche dourado no peito. Embaixo, Isabel usava uma saia de lã vermelha e uma blusa de gola alta preta. Veronicca sorriu – assim está melhor.

Ela nos guiou pelos corredores, alguns passos à frente.

-Você explicou para ela como funciona uma reunião do conselho? – perguntou Veronicca para Isabel, desconfiada.

Isabel franziu a testa – Eu deveria fazer isto?

-Bethany, você sabe coo funciona uma reunião do conselho? – Veronicca se virou diretamente para mim, alisando minha manga.

-São pessoas sentadas em uma mesa, discutindo sobre... – balancei a cabeça, um pouco confusa – Tudo que for importante para a nação?

-Isso, é o que deveria ser uma reunião do conselho – ela olhou sobre o ombro antes de continuar – Na realidade, se torna uma briga de poder e um jogo de manipulação doentio. Lideres de todo o mundo, pessoas influentes, todos veem até nós para conseguir autorizações para seus projetos e políticas. Enquanto isso, os membros do conselho alfinetam uns aos outros em defesa ou renegação aos projetos. Membros do conselho que, por muitos estarem nos círculos de amigos de James Bordeaux, você consegue imaginar como agem.

-Como porcos – falou Isabel, e em vez de repreendê-la Veronicca apenas deu uma aceno em concordância.

O pesadelo voltou a minha cabeça, a voz de Isis ressoando no meu cérebro: "Rainha Bethany. Rainha Bethany. Rainha Bethany".

-E nós nãos podemos mudar o conselho? – perguntei, olhando para elas.

-Não é tão fácil, Bethany – Veronicca seguiu andando, fazendo sinal para que ficássemos perto dela – As pessoas do conselho estão lá por que séculos atrás, seus bisavôs serviram a Eurásia. Era um bom grupo, imagino, mas o poder que tinham atraíram casamentos gananciosos. Tudo que podemos fazer é esperar, geração pós-geração, que os filhos e filhas sejam melhores que seus pais e mães.

"Rainha Bethany. Rainha Bethany. Rainha Bethany".

-Se o conselho vota, o que a rainha faz? – perguntei, parando novamente – Eu vou ser rainha, Veronicca! De que isso importa, se todos os outros vão brigar e opinar e dar seus votos?

-A Rainha está acima do conselho, Bethany – Veronicca falou – Enquanto souber os momentos de se impor, a decisão final será a sua. Lenna teve de desistir de diversas coisas que acreditava para garantir que o irmão fosse expulso do palácio. Como rainha, você pode nomear alguém para representa-la em reuniões menores como a de hoje. Quando foi coroada, Lenna escolheu a mim.

-A Rainha não vai se juntar a nós? - perguntei, olhando em volta.

"Rainha Bethany. Rainha Bethany. Rainha Bethany".

Veronicca falou em voz baixa, sem se virar para nós - A rainha está resolvendo uma questão fora do palácio, Bethany. Então hoje... - ela respirou fundo, puxando o rabo de cavalo - Dentro desta sala, eu sou a rainha.

Respirei fundo, mandando meu cérebro calar a boca. Mandando a maldita Isis calar a boca. Naquela tarde, ao menos, Veronicca era a rainha.

Continuă lectura

O să-ți placă și

397 63 4
Allana faz da varanda de sua casa o castelo de seu universo privado. Ela espia a realidade enquanto mergulha em suas fantasias. Mas será que ela está...
81.8K 8.2K 16
Alyna Becker finalmente viu seu relógio do relacionamento apitar. O primeiro encontro com seu destinado não foi exatamente o que ela esperava, princ...
286K 22K 45
"𝖠𝗆𝗈𝗋, 𝗏𝗈𝖼ê 𝗇ã𝗈 é 𝖻𝗈𝗆 𝗉𝗋𝖺 𝗆𝗂𝗆, 𝗆𝖺𝗌 𝖾𝗎 𝗊𝗎𝖾𝗋𝗈 𝗏𝗈𝖼ê." Stella Asthen sente uma raiva inexplicável por Heydan Williams, o m...
104K 7.8K 29
📍Sicília - Itália Gina Pellegrine é uma menina doce e inocente criada sob educação religiosa, que conquista os olhares de todos aonde quer que pass...