Sete mundos de Mariana

By RaphaelAlves

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Me vi sozinha envolta pelas sombras daquela floresta. Estava com frio, fome e medo. Então uma fraca explosão... More

Prólogo
O começo do fim.
Oceanos Profundos.
Tudo tem seu começo.
Mentiras

De volta ao passado.

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By RaphaelAlves


— Tudo vai ficar bem. – Isso foi tudo o que ele falou. João se aproximou e a abraçou. — O que quer fazer?

— O primeiro com quem temos que lidar é o Lucas, mas sinceramente, estou com medo. – Ela botou o rosto entre as mãos.

João era um homem alto, com barba por fazer, olhos claros e cabelos cacheados bem curtos. Vestia uma jaqueta de couro preta, uma camisa do ramones e uma calça jeans surrada, assim como uma bota preta. Mesmo dizendo suas características físicas tudo isso é apenas uma casca. Fora casado por treze anos até que se tornou viúvo em um acidente de carro, seu filho e ele foram os sobreviventes em um carro com seis pessoas. Havia se tornado Investigador Forense há apenas alguns anos, após extensos doutorados e graduações ao redor do país.

— Não tem problema, nós vamos contornar essa situação. Lucas tem que ter uma fonte, já pensou em ir lá no chalé? – indagou.

A regata que Helena botara hoje já desagradava o toque de sua pele que suou o dia inteiro, as marcas de expressões nunca estiveram tão presentes em seu rosto diante de toda essa preocupação. Sua mente dava volta em porquê Lucas faria isso, ou melhor, a mando de quem, e para que. Talvez Jason poderia dar uma luz, pensou, ele sempre foi o lado criativo. Ela riu, limpou o rosto e levantou-se para pegar qualquer bebida que visse pela frente.

— Não gostou da sugestão? – ele pareceu desapontado.

— Não... É que... – seu rosto nublou-se. Ela abriu a despensa e pegou um uísque de seu marido, nem havia sido aberto. Só falou após que colocou o gelo, uma generosa dose de uísque e um generoso gole. — João, vou ter que ser sincera. Mesmo você estando aqui, do meu lado. – Sua voz começou a embargar com o choro, mas ela o engoliu e engrossou a voz. — Mesmo com você aqui do meu lado, ainda só penso como meu marido pode me ajudar.

Ele respirou profundamente com os olhos fechados, aquele golpe fora forte, mas tudo bem, ele sabia sua parcela de culpa nisso tudo. Os dois haviam se conhecido em um restaurante em Gramados, que por coincidência também fora o local onde conhecera seu marido. Ela levou os relacionamentos até o ponto limite, onde teria que escolher um dos dois. Ela queria mais que tudo ficar com João, e ele sabia disso e desperdiçou a chance.

Lembrou-se do dia em que se despediram pela ultima vez, para se reencontrarem dez anos depois. Os dias molhados de novembro trazem nele a sensação de perca, assim como no dia que deixou a única pessoa que o amava ir embora nas mãos de outro homem.

— Me desculpe. – ela disse ao ver sua cara. — Eu não quero te magoar João... Mas se tudo der errado nessa história... Provavelmente eu irei embora com Jason para o interior, criar nossa filha.

— Filha? Como tem certeza?

— Um palpite.

— Tudo bem, sei que perdi minha chance anos atrás. Lembro-me da minha escolha. – ele juntou toda sua autopiedade em uma longa inspirada e foi-se embora do apartamento deixando-a sozinha.

Ela estava sozinha. Como sempre estivera em boa parte de sua vida, era uma garota crescida, sabia se cuidar. Mas ela não teria tempo pra esperar. Deu um último super gole no seu copo de uísque e foi tomar banho. Sua mente fervia em quem poderia lhe ajudar a descobrir quem poderia lhe dar uma lista mais detalhada de funcionários. Não havia ignorado João, apenas absorvera o pensamento e estivera trabalhando ele até agora.

Quando saiu do banheiro, viu que Jason já havia chegado, fora sua distração que não o ouvira chegar? De toda forma encontrou seu marido sentado na cama, com sua roupa social amarrotada após um dia cansativo. Seus cabelos castanho claros estavam colados em sua cabeça pelo suor, tinha barba por fazer.

— Jason! – ela sentou-se do seu lado.

— Boa noite princesa. – ele riu. — Meu carro morreu, tive que vir a pé do centro.

— Isso explica. – ela sorriu. — Por algum acaso você ainda tem contato do Augusto?

— Acho que sim, posso saber o porquê? – ele levantou uma sobrancelha. Jason era um pouco mais alto que Helena, seus cabelos costumavam ser loiros. Não tinha um corpo definido, era um homem normal com um rosto muito bonito, era como se tivesse sido esculpido. Tinha 29 anos, mas suas marcas de expressão o faziam parecer ter 38, havia sido fumante desde seus 14 anos.

— Se ele ainda mexer com programação ou algo do tipo ele ainda pode me ajudar em um caso que estou vendo. – falou casualmente. — Ele ainda mora naquele chalé? Lá no sul?

— Ah... – ele pegou o celular e confirmou a localização, assim como o dono, pelo próprio Google. — Sim, olha aqui. – Ele apontou. — O dono é Carlos Augusto Ambrósio.

— Ambrósio?

— Ele quis pegar da esposa.

Ela não respondeu, apenas foi arrumar-se. Jason foi tomar banho enquanto ela arrumava a mala, ele ainda não havia visto. Helena calculava quanta roupa teria que levar para uma viagem até o sul, ou seria melhor comprar no caminho? Tanto faz, pensou, colocou algumas peças de frio, caso precisasse de roupas mais leves compraria lá.

Assim que terminou de arrumar a mala discou para Anselmo Junior, um juiz que fora em épocas passadas seu colega de sala quando estudava direito. Já era tarde da noite, mas ele devia um ou dois favores a ela. Seu filho fora pego com treze quilos de maconha, ela teve que o liberar.

Porém deixou bem claro que não compactuaria mais com tal coisa, tinha a moral bem alinhada e que o preço a se pagar por aquele favor seria alto.

— Alô? – uma voz rouca do outro lado respondeu, provavelmente havia o acordado.

— Anselmo? Helena Martins aqui.

— Ah! Oi, Helena. Ah... já é um pouco tarde da noite, está precisando de algo?

— Sim, tenho uns favores a te pedir.

A noite era clara e as estrelas brilhavam o bastante para se ver formações celestiais, o carro ia a toda velocidade pelas rodovias que levavam ao sul. Uma música dos anos oitenta tocava no carro de Helena, em seu banco de trás haviam cinco malas, e no banco da frente um passageiro. Juiz Anselmo.

— Pronto pra fazer umas investigações Senhor Anselmo? – disse Helena animada após tomar duas latinhas de energético.

— Bom, se eu chegar vivo até lá. Não seria melhor você parar e descansar um pouco?

— Não tem como senhor... Você me fez liberar um adolescente carregando treze quilos de maconha, acho que você vai gostar de como estou retribuindo o favor, se bobear vai conseguir até um cargo no supremo. – disse em voz calma e sorridente.

— Posso saber com o que estamos lidando? – o descontentamento na sua voz fez Helena sorrir por dentro.

— Bom, até onde eu ousei pensar, estou pensando que estamos lidando com uma quadrilha pequena de agiotas, chantagistas e prováveis assassinos. – sua cabeça estava a mil pensando que tudo pode ter tido um começo há mais de cinco anos atrás, quando pela primeira vez encontrou-se com João naquele chalé, quase um retiro para reabilitação espiritual.

— E porque eu tenho que estar aqui?

— Bom, preciso que alguém emita meus mandados.

— Helena, sei que o que eu te pedi foi baixo e sujo, mas o garoto tinha dezessete anos e estava indo pra um caminho que nem nós sabíamos. Ele foi pra reabilitação depois do ocorrido. Mas eu não posso ficar emitindo mandados a torto e a direito! – seus lábios frouxos fizeram cair algumas gotas de saliva. Anselmo já era um homem velho, com cabelos ralos e barba branca. Vestia uma calça jeans reta da cor azul, um sapato allstar e uma blusa de manga longa.

— Calma senhor! Não vou precisar de mais que três. – disse sorrindo. — Se não tiver mais coisa para investigar esse caso estará acabado em duas semanas.

— Bom, espero que você esteja certa.

A noite deu lugar para uma manhã fria na estrada. Anselmo dormia com um grosso cobertor, o Jeep era grande, desceu totalmente o assento e dormia confortavelmente. Helena havia parado num pequeno hotel para caminhoneiros no meio da estrada. Fumava calmamente o que seria o último maço de sua vida, não poderia fumar na gravidez. Sentia medo do que estava vindo a seguir, teria que lutar e o estresse que ela teria que aguentar poderia fazer perder o bebê. Já sabia de todos os riscos, sua médica a aconselhou a tirar licença e só voltar a trabalhar quando o bebê estiver com um ano de idade.

Bom, teria de tomar cuidado, sua filha tinha de ser a prioridade, mas as coisas não podem continuar como estão. Helena não fazia ideia do que Lucas poderia fazer com esse poder nas mãos dele. Ela valorizava honra acima de tudo, ou quase tudo.

Acendeu um malboro e começou a lembrar-se do dia no chalé. Ela havia tido um mês horrível, teve várias brigas com Jason e o número de assassinatos pelo serial havia aumentado exponencialmente e continuado nesse ritmo desde então.

No primeiro dia de dezembro decidiu entrar para essa reabilitação para botar sua cabeça em ordem.

Flashback.

O dia havia começado limpo e com uma fina garoa. Jason não estava na cama, ela podia sentir o vazio ali do lado, já fazia uma semana que não conversavam. Ele passara a dormir na sala após a última briga que tiveram. Helena dissera que preferiria morrer a ficar do lado dele, ela havia descoberto algumas mensagens que ele enviara para uma garota há alguns meses atrás. A briga foi extensa e feia, mas ela não queria lembrar-se daquilo.

Levantou-se e foi tomar café da manhã, a mesa estava posta e o sofá vazio e desarrumado. Jason havia feito a sala de estar seu reduto pessoal, ele chegava tarde da noite e saía cedo para o ateliê, ele havia calculado sua rotina para não bater com a dela, ou seja, nunca se veriam durante o dia. Tomou sofregamente o café com pão e manteiga, sentia ondas de tristeza repentinas, e chorava sem motivo em horas mais estranhas. Esse era o efeito de se sentir traída, pensou.

Suas malas já estavam prontas e não se importou em tomar banho, apenas colocou um conjunto moletom e foi para o carro. Antes de liga-lo pensou seriamente no que estava fazendo. Nunca havia fugido de uma luta em sua vida, mas tentou encarar aquilo não como uma fuga, mas sim um tempo para esperar o barro secar, precisava botar a sua própria casa interior em ordem para conversar com Jason e decidir o que os dois fariam com o relacionamento.

— Sabe qual a semelhança entre espelhos e confiança, Helena? – perguntou para si mesma. — Você pode quebrar os dois, mas mesmo quando juntar os pedaços, ainda vai ver as merdas das rachaduras. – disse com desgosto em sua voz. Ela iria para o chalé.

Ela saiu pelas ruas de Belo Horizonte em direção ao norte, o chalé ficava em Fernando de Noronha, bem longe de tudo que conhecia, sem amigos, sem internet, sem seu marido... Sem seu marido, essa frase parecia estranha quando pensava, era como se tivesse um sneek peak do que é estar solteira após tantos anos casada, mas claro, não estava solteira.

Quando chegou já estava anoitecendo e a lua aparecia atrás de uma serra. O chalé estava bem iluminado, e o local era muito bem cuidado. Com uma gigantesca casa central e outras espalhadas pela propriedade. Helena conseguia ver as luzes bem ao longe dos casebres, todos a uma distância bem razoável entre os outros. Um homem veio indica-la onde estacionar.

Assim que saiu do carro e deu a primeira lufada de ar fresco sentiu-se renovada para a vida. O homem que veio ao seu encontro não era desconhecido, havia algo familiar em seu andar, mas estava escuro demais para ver quem era.

— Precisa de ajuda? – a voz era grossa mas continha certa suavidade, quase como um carinho.

— Tenho só duas malas. Obrigada. – disse com candura.

— Eu levo pra você. – assim que ele chegou mais perto seu rosto iluminou-se pela fraca luz da lua que foi permitida passar pelas nuvens grossas que encobriam o céu.

— João? – quando deu por si viu que ele estava já bem próximo, podia sentir seu cheiro. Lembrava-se muito bem daquele cheiro quando frequentava o sítio dos pais dele. Cheiro de casa.

— Olá Helena...

Ela sorriu inconscientemente ao ouvir a voz dele.

— Olá...

Seu coração, após muito tempo começou a bater forte. Sentia ele ribombar em seu peito toda vez que o olhava a olhar. Um sentimento tão forasteiro, que para ela já era desconhecido. Era uma estrangeira para esse sentimento, tinha os caminhos divididos, girava sem saber onde ir. E naquele instante seu corpo inflamou de segurança, acolhida como pelo fogo de uma fogueira em um dia frio. O abraço que eles deram foi intenso e longo, os dois aproveitando a essência um do outro após um longo tempo de seca, deixando todo aquele amor não falado inundar seus corpos.

E com um longo suspiro os dois se olharam, olharam-se infinitamente e beberam suas formas, contornos e jeitos, para nunca mais esquecerem.

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ME DESCULPEM! Depois de quase um ano e meio de hiato eu voltei com Sete mundos de Mariana! Espero que gostem desse capítulo, acho que da pra ter uma ideia de que todos eles erram ou já erraram, ou vão errar rs. 

Bom, é isto, até o próximo cap!

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