Quando abro os meus olhos fito o teto. Agora que reparei que ele tem um papel de parede preto com várias pequenas estrelas.
Levo a mão à cabeça e quando me sento uma garota vestida de branco vem até minha direção e se ajoelha na cama.
— Quem... Quem é você? — Me encolho na cama.
— Uma fantasma.
— Uma fan...fan...fantasma?
— Sim.
— Você é uma fantasma? — Ela fala ao mesmo tempo em que eu.
— Mas fantasmas não existem! — Fala novamente junto comigo.
— Você vai me matar? — E de novo ela fala junto.
— Por que você está me imitando? — Adivinha? Ela fala ao mesmo momento que eu.
— Esse discurso já é manjado. Vocês precisam ter mais criatividade.
— Ma...mas o que quer comigo?
Ela se aproxima mais e dobra as pernas.
— Eu preciso de ajuda...
— O que...que... Eu...
— Se você não quiser tudo bem. — Ela suspira. — Ninguém nunca quis mesmo...
É estranho, mas após todo o susto eu já não sinto medo dela. Posso até dizer que me sinto bem...
Seu olho castanho é lindo. Combina perfeitamente com sua pele clara e seu cabelo também castanho, só que bem mais claro. Quase loiro, na verdade.
Meu Deus. Não acredito que estou admirando uma fantasma.
— Isso é loucura! — Mais uma vez ela fala junto comigo.
— Sim. Chegamos à segunda fase. Negação.
— Como assim?
— Das pessoas que vieram para essa casa, todas que me encontraram chegaram apenas a três fases. Medo. Negação. Loucura.
— Você sempre aparece para quem entra na casa?
— Só para quem me simpatizo. Que me dá esperanças.
— Como assim esperança? O que você quer de mim, exatamente?
Ela engatilha e vem para mais perto de mim. Encosta-se à cabeceira da cama e estica as pernas.
— Eu só queria... Evoluir. Sabe? — ela suspira. — Não é isso que deveria acontecer? Almas irem para outro plano ou sei lá o que.
— E por que você está aqui?
— Esse é o problema. Eu não me lembro de nada da minha vida terrena. Nem sei como vim parar aqui.
— Você só fica aqui dentro? Há quanto tempo? — Penso melhor no que falei — Eu só posso estar enlouquecendo. Estou falando com uma... fantasma?! Não é real. Estou louco. — Digo saindo da cama e em seguida do quarto. Mas ela me segue.
— Viu só? Chegamos à terceira fase. Agora é o momento que você me joga sal, achando que servirá de algo, eu apenas me entristecerei e então ficarei invisível. Daí amanhã você se muda. E nunca mais volta.
Eu a observo. É extremamente intrigante como eu já não sinto medo dela. Ao contrário do que sempre me contaram, estou frente a frente com uma fantasma que está conversando comigo ao invés de querer me matar ou me possuir.
Será que estou realmente maluco?
— Você também quer que eu suma?
O seu tom de voz é tão... Triste. Eu até sinto um aperto no peito.
— Você vai me machucar?
— Jamais! Eu só quero... Ajuda. — Diz parecendo frustrada.
— Eu só posso estar louco... — Digo quando percebo que estou prestes a ceder.
Pego uma jarra com água e coloco um pouco em um copo. Tomo tudo de uma só vez. O que me faz engasgar.
— Você está bem? — A fantasma se aproxima e põe a mão em meu ombro.
— Não me toca! — Grito me afastando.
— Grosso! — Ela diz desaparecendo. O que me faz derrubar o copo e o mesmo se estraçalhar no chão.
Fico um longo tempo tentando assimilar o que acabou de acontecer.
Eu realmente não consigo acreditar.
👻👻👻
Nem sei que horas caí no sono. Na verdade, nem sei como consegui dormir. A imagem daquela garota não saiu da minha mente. Até tive pesadelos com ela.
Me levanto da cama. Todo o meu corpo dói.
Tomo um banho e em seguida coloco uma roupa confortável. Afinal, hoje é domingo.
A cada vento ou barulho fico alarmado pensando que possa ser aquela fantasma. Mas não é. Ela simplesmente desapareceu.
Começo a desconfiar que fosse tudo invenção da minha cabeça.
👻👻👻
O dia passou rápido. Não fiz nada. Só fiquei estirado no sofá zapeando os canais e tentando tirar da cabeça o que aconteceu ontem à noite.
Quando vejo que já são vinte e duas horas desligo a TV e vou para o quarto.
Me atiro na cama e antes de deitar tiro a minha camisa. Hoje está um calor infernal. Deito e fico olhando para as pequenas estrelas do teto.
Sinto um ar gélido tocar minha pele fazendo com que todos os meus pelos se arrepiassem. Olho para o lado e lá está a garota deitada ao meu lado observando meu peitoral.
Tomo um susto, mas não digo nada. Prefiro crer na hipótese de que ela não me fará nenhum mal.
— Então você não foi embora...
— Eu acabei de me mudar.
— Então você vai me ajudar? — Ela senta-se, na velocidade da luz, junta suas mãos e olha para mim com brilho nos olhos. Ela é tão... Bonita. Nem parece um ser do além.
— Não disse isso. Disse que acabei de me mudar, então não quero ter o trabalho de voltar para a casa da minha mãe por enquanto.
— Era de se esperar... — Seu olhar se distanciou. Novamente a tristeza a rondava.
— Eu não tenho nada contra você, sabe?! Mas seria pedir muito você não deitar junto comigo? Eu não estou interessado em te ajudar. Procure um médium. Pai de Santo. Sei lá.
— Você não entende... Eles não podem me ajudar...
— Dá seus pulos. Agora me deixa dormir em paz. Será que é pedir muito?
Digo me virando de costas para ela e agarrando meu travesseiro.
— Ok. Tudo bem. Ou você me ajuda ou eu infernizarei seus dias aqui!
— Tenta a sorte.
👻👻👻
Essa fantasma levou mesmo sua promessa a sério. Minha semana foi um desastre.
Ela me seguiu para onde quer que eu fosse. E o pior é que ninguém além de mim a vê. Às vezes ela fazia coisas que me obrigava a falar com ela, fazendo as pessoas ao redor acharem que sou louco.
Na academia ela não me deixou em paz. Ficava alisando os bíceps dos caras. Fazia alguns objetos caírem. Na padaria ela derrubava coisas fazendo parecer que fui eu. Na faculdade fazia as folhas de anotações dos professores voarem e as aulas serem atrasadas. Em casa ela pulava no sofá ou na cama sem parar.
Não aguento mais. É enlouquecedor.
Na manhã de sábado levanto mais cedo e saio para a academia. Por enquanto a infeliz não apareceu.
Antes de entrar na academia a fantasma aparece me fazendo quase cair para trás.
Me recomponho e a ignoro.
Quando entro na academia vejo a loira linda que vi na padaria no sábado passado.
Ando um pouco indo em sua direção.
— Babaca, me espera eu...
A fantasma se calou me fazendo olhar para trás imediatamente.
Ela está atônita. Sua mão está na direção de onde normalmente fica o coração em seres humanos. E ela fixa o olhar em Lara.
— Ei, o que foi? — Sussurro para ela, morrendo de medo da gostosa me achar maluco.
— Não sei. Meu coração acelerou quando a vi... — Disse apontando o dedo indicador da mão direita para Lara.
— E desde quando fantasma tem coração? — sussurro e continuo indo em direção de um dos aparelhos.
A fantasma desaparece, o que me faz ficar aliviado, porém um pouquinho incomodado.
Assim que sair daqui eu vou procurar um exorcista...