Kaii - Volume 2

Av MyLightNovel

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KAII História por Marcelo Revisão por Tany Isuzu Distribuição: My Light Novel - www.mylightnovel... Mer

PRÓLOGO
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
EPÍLOGO

CAPÍTULO 1

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Av MyLightNovel

          A garota ao meu lado, como das outras vezes, puxou um assunto completamente aleatório:

          — Hum... Você já ouviu falar de niilismo?

          Ela balançava as pernas pelo lado de fora das grades de proteção que cercavam o terraço da escola. Do ponto de vista de qualquer adulto ou professor, isso seria uma cena bem perigosa, mas como quase ninguém passava por lá, não parecia ser um problema.

          Também seria ruim, caso fosse um dia de aula comum, o fato de nós duas estarmos aqui enquanto a grande maioria dos alunos estão em sala, significava claramente que estávamos matando aula. Porém, como era uma das semanas de provas, ficar fora de sala era permitido desde que você já tenha terminado de fazê-las. O único fato estranho nisso é o de nós duas termos terminado em menos de uma hora.

          No meu caso, isso é justificado pelo fato das provas serem todas de múltipla escolha, então eu só preciso "chutar" e sair da sala, já que é quase certeza que vou conseguir uma pontuação alta graças ao meu "dom" de intuição.

          Porém, essa garota... Como é mesmo o nome dela? Bem, que seja... Ela me parecia completamente normal. Na verdade, a razão de nós duas estarmos aqui é apenas ao acaso. Aparentemente, tivemos a mesma ideia de lugar para passar o tempo até o fim das aulas.

          Assim, como você já deve imaginar, graças às nossas notas, eu e ela somos duas das alunas "top" da escola. Ela também está na minha classe, mas nós nunca conversamos antes, talvez, em parte, pelo fato dela não falar nada em sala de aula.

          — Ei... H-Hikari... cchi. — Ela hesitou por um momento, piscando seus grandes olhos castanho para mim.

          Eles tinham uma cor tão fraca, que eu até mesmo me perguntava se poderia os classificar como castanho, mas, bem, não importa, certo?

          — Hikaricchi — corrigiu, e então, acrescentou: — Você sabe o que é niilismo?

          Olhei em direção à garota de óculos que ainda brincava com as pernas no ar. Ela apoiou suavemente o corpo para trás e deixou seus longos cabelos caírem no chão. Eles ficavam presos apenas por uma fita branca, quase na ponta, o que dava uma sensação de que estava arrumado de forma errada.

          Ela parecia não saber se queria um rabo de cavalo, uma trança ou apenas deixar o cabelo solto.... Era, de certo modo, engraçado também...

          Eu me sentei ao seu lado e copiei seu movimento, passei as duas pernas por entre as grades e comecei a balançá-las enquanto olhava para uma pequena poça de água que se formava no chão devido a uma torneira que estava meio aberta.

          Forçando um sorriso, olhei para ela e disse:

          — Shiori! — Ainda bem que lembrei o nome no último instante. — Você vai mesmo me chamar assim? Nós só nos conhecemos há dois dias, eu não consegui convencer nem mesmo a Luna e a Minami, que moram comigo há mais de dois anos.

          — Hum... Err... S-Se... Se você quiser eu paro... — disse ela com o rosto vermelho de vergonha.

          — Imagina! — Segurei as mãos dela entre as minhas. — Você pode me chamar assim! Na verdade, por favor, me chame assim! Eu queria tanto encontrar alguém para poder me chamar por apelidos!

          — Err...

          — Sabe, o Ash não gosta muito que eu fique usando termos em japonês aqui. E nem mesmo a minha irmãzinha aceitou me chamar de Onee-san, na verdade, ela mal me chama pelo nome, ela sempre fica correndo de mim e, apesar de estarmos na mesma sala, ela não me deixa ir ou voltar da escola com ela... Bem, na verdade, isso seria mais culpa daquele idiota do Amato! — Apertei as mãos dela.

          O que forçou Shiori a soltar um pequeno grito de dor e me olhar com um certo pânico, entretanto, meus pensamentos estavam longes demais para notar algo.

          — Ele sempre fica cercando ela como se fosse o seu dono, eu até tentei chamá-la para irmos no cinema, o Ash disse que pagava, mas ela negou de imediato dizendo que tinha que passar o dia com aquele imbecil. Acredita que ela ainda teve a cara de pau de dizer que tinha combinado de ver filmes com ele?

          — Hu...

          — Se não fossem as poucas palavras que trocamos dentro da sala, nós mal nos falaríamos, talvez tenha sido uma jogada de sorte cairmos na mesma classe... Eu, não, talvez possa ter sido, mas, bem... Os intervalos também são perdidos, aquela loira exibida fica grudada com a Liss o tempo todo.

          — Be...

          Shiori esboçou um pequeno sorriso enquanto tentava se soltar das minhas mãos.

          — M-Me desculpa! — disse eu.

          Droga, acabei fazendo de novo... O vício em acabar falando demais sem deixar as pessoas responderem....

          — N-Não se preocupa... — respondeu ela, um pouco tímida. — Na verdade, foi divertido ouvir você falar dela assim.

          Ela arrumou os óculos no rosto e começou a olhar também para poça d'água.

          — Você parece gostar mesmo da Liss, não é? — perguntou ela.

          — A-Ah sim, eu gosto... — respondi.

          — Eu não tenho irmãos, portanto não sei muito como é, mas parece ser divertido...

          — Diria que tem seus momentos... Por mais que eu não tenha vivido com ela desde o começo. Eu sempre tive a Minami para tomar conta, no começo ela foi a que mais demorou para me aceitar, ela sempre ficava disputando a atenção do Ash e às vezes até fazia algumas bagunças de propósito para que ele a notasse. Mas com o tempo, ela deixou de ter ciúmes e passou a me tratar como uma irmã também.

          — E a Luna?

          — Bem, ela sempre foi daquele jeito, meio desligada, então, tirando no primeiro dia, em que ela achou estranho eu ter aparecido, no geral ela me aceitou bem. Por mais que ela seja a mais velha, no final, quem cuida de nós duas é a Minami, então não tinha muito o que ela fazer sobre mim.

          — Eu sei que isso é um pouco indelicado, mas qual é a sua relação com elas? Nós vemos você ir e voltar com as duas, porém, como você acabou de dizer, elas não são suas irmãs, certo? Então sempre fica aquele clima de confusão na sala, ainda mais quando você chama a Liss de irmã.

          — Hum... Bem, é difícil de explicar... — respondi, sorrindo.

          — Entendo, tem certas coisas que é melhor não explicar, né?

          Essa era uma situação complicada, nem mesmo eu consigo definir direito tudo isso, os porquês de eu considerar a Liss como uma irmã, minha ligação com o Ash, e o que mais pode acontecer no futuro... Talvez, eu possa até saber, mas no momento, eu não quero ter que pensar nisso.

          — Mas então, H-Hikaricchi? — disse ela.

          Estou começando a gostar dessa garota, ela fica tão fofa falando meu nome assim.

          — O que foi, Shiori? — respondi um pouco empolgada.

          — Você sabe o que é niilismo? — perguntou ela mais uma vez.

          Essa garota... Ela é realmente insistente...

          — Minha primeira ideia foi sobre algo relacionado com aquele rio, mas acho que não é isso, né?

          — Não, não, com certeza, não é sobre o rio Nilo — disse ela. — É sobre aquela filosofia que nega o princípio de tudo.

          — Isso parece um pouco pessimista para mim.

          — Nem tanto... Na verdade, é apenas a ideia de que você não deve se apegar as coisas, e deixar que elas decidam sua vida, entendeu?

          Ela inclinou a cabeça para a direita, parecendo confusa com as próprias palavras.

          — Isso é meio confuso — disse enquanto brincava com os dedos da minha mão.

          — Certamente.

          Certamente? Acho que ninguém mais fala certamente hoje em dia...

          — Mas você pode tirar ideias interessante disso. — Ela continuou falando. — Por exemplo, se você pensar em um sentido universal... Principalmente em relação às noções de tempo... Você pode dizer que a ideia de presente não existe porque essa quantidade de tempo chamado presente pode ser sempre dividida em três partes e assim criar o passado e futuro dentro desse presente.

          Ela abriu a palma da mão na minha direção, e em seguida recolheu dois dedos.

          — Vamos supor que você tenha definido esse dia como presente, se dividirmos ele em três partes. O início dele é passado. — Ela abaixo um dos dedos. — Agora nós estamos vivendo o presente. — Abaixou o segundo. — E assim que eu terminar essa frase, nós estaremos vivendo o futuro, certo? — E finalmente abaixou o último dedo.

          Eu encostei minha cabeça na barra de ferro que estava na minha frente e esperei que ela continuasse a explicação.

          — Então você vai sempre continuar dividindo esse "presente" em infinitas vezes, sendo que nunca vai conseguir dizer exatamente que viveu de fato no presente.

          — E qual o sentindo disso? Ou você só queria forçar uma conversa no estilo das obras do NisiOisiN?

          Ela ficou envergonhada novamente e então começou a acenar exageradamente enquanto dizia:

          — Não, não, não, não, não... E-Eu só queria... Bem... Eu só queria dizer que a ideia de presente pode variar... Talvez eu não tenha escolhido o melhor jeito de fazer isso. — Ela encolheu os ombros e abaixou a cabeça. — Eu queria dizer que, se você levar essa ideia em consideração, a desculpa de que não é o momento certo pode ser errada, já que o futuro pode ser daqui a dois segundos, assim como o passado também.... O que eu estou tentando dizer é que o momento certo talvez nunca exista...

          Ela deu um pequeno grito e bateu a testa contra a barra de ferro, mas aparentemente, devido ao nervosismo, ela fez isso com muita força. No lugar onde ela forçou a cabeça, tinha se formado uma pequena mancha avermelhada.

          — Ah! Eu sou péssima para expressar as minhas ideias... — Ela soltou o corpo no chão e abriu os braços.

          — Não, eu entendi — respondi. — Eu tenho que te agradecer, isso me ajudou a pensar em algumas coisas, de certa forma.

          Acho que o que ela queria dizer com tudo isso era que eu devia tentar fazer as coisas do melhor jeito possível, sem me incomodar de esperar as oportunidades aparecerem.

          — Sério? Eu pensei que estava falando coisas que não tinham muito sentido... Eu tenho esse pequeno vício em puxar assuntos estranhos.

          — Eu percebi, mas eu também tenho o hábito de falar demais, sem contar que eu acabo misturando algumas coisas dos animês que vejo no meu cotidiano.... Acho que nós duas somos estranhas. Hahaha.

          — Talvez sejamos, não é? — Ela cobriu o rosto com o braço.

          — Tenho quase certeza disso, mas acho que não faz muita diferença.

          — Eu queria ter essa confiança... — disse ela com um tom meio triste.

          — Por quê?

          — Bem, você sabe, não é? A sensação de que possa estar fazendo algo errado...

          — Você quer dizer, aquela sensação de que você é o errado enquanto todo mundo está certo? É isso?

          Ela hesitou por um tempo e então concordou:

           — Sim... Sabe? Como se o mundo não fosse o lugar certo para você...

          — Ah sim, sei... — respondi. — Mas nesse caso, você tem duas opções, ou aceita que o mundo é errado para você, ou então, que você é o errado para o mundo. Eu, particularmente, gosto mais da primeira.

          — Por quê? — perguntou ela enquanto destampava o rosto.

          — Porque se considerar o mundo como errado, você ainda pode viver da sua maneira, o máximo que precisa fazer é ignorar as coisas que não te agradam. Porém, se você considerar que é o errado para o mundo, então tudo que sobra é mudar seu jeito ou passar toda a vida sofrendo com isso.

          — Você é incrível, Hikaricchi!

          — Não acho que seja tudo isso...

          Eu me levantei e comecei a limpar a saia preta que o Ash havia me dado.

          — Ei, Hikaricchi? — Eu olhei em direção à Shiori, que se mantinha fascinada. — Amanhã é o último dia de prova, você vem para cá, certo?

          — Sim — respondi. — Mas nós estamos na mesma sala, você pode falar comigo lá, não tem problema.

          — Hum... Não quero tomar o pouco do tempo que você tem com a sua irmã...

          — Não se preocupe, eu posso abrir um tempo na minha agenda para você.

          Ela sorriu e voltou a cobrir o rosto com o braço.

          — Até mais, já deve estar quase na hora da Luna terminar a prova — disse enquanto começava a caminhar.

          Shiori apenas acenou com o outro braço e me deixou ir sem dizer mais nada.

2

          Eu deixei o terraço da biblioteca e comecei a ir para a lanchonete. Esta escola era dividida em basicamente três partes: salas de aula, refeitório e biblioteca.

          A área das salas de aula era dividida em prédios, a Yanatsu era composta apenas pelo ensino médio, porém, em cada ano havia seis turmas, nomeadas de A a F, isso fazia com que o número de alunos fosse bem alto.

          A segunda área era a do refeitório, onde havia uma lanchonete que vendia de quase tudo. Estranhamente, bem próximo a esse local ficavam as quadras de esportes e o campo de futebol. Não era incomum alguém acabar sendo atingido por uma bola enquanto comia algo, então você sempre tinha que ficar prestando atenção ao redor.

          A última grande área é a da biblioteca. Um enorme prédio antigo que diziam estar repleto de livros... Nunca entrei para confirmar, então não posso dizer muito. O máximo que faço é usar as escadas dela para chegar até o terraço e passar o resto do período.

          De todo modo, eu estava agora entrando na área da lanchonete. Várias mesas organizadas por todo o lugar, algumas tinham quatro assentos, outras seis, mas, no geral, todas estavam vazias. Talvez ainda fosse cedo demais para vir esperar a Luna.

          Eu olhei em um dos cantos e vi a figura de uma pessoa conhecida, ela parecia estar um pouco perturbada e com os pensamentos longe.

          — Ochitsuite, Hikari... — sussurrei para mim enquanto observava a Liss sentada.

          Comecei a caminhar em sua direção, aparentemente, ela notou minha aproximação e ficou inquieta, nossos olhos se encontraram e, em seguida, ela desviou eles para longe, tentando ignorar minha presença.

          — Err... Oi — Comecei dizendo. — Será que posso? — Apontei para o banco que estava vazio de frente para ela.

          Ela não negou, mas também não concordou, sem pensar muito, eu me sentei e voltei a falar:

          — V-Você não parece muito bem... Aconteceu alguma coisa?

          — H-Hum... Nada... — respondeu ela, apertando as mãos contra o peito.

          — C-Certo... Então...

          Tenha calma, Hikari, aproveita a chance para conversa com ela... Não estraga tudo, você só precisa continuar com um assunto interessante, vamos lá, pense... Pense... Ela está aqui cedo... Talvez ela também tenha ido bem na prova de hoje...

          — Liss! — gritei ao invés de ser sutil. Ela me olhou assustada e começou a prestar a atenção. — Com foi a prova? Você também achou fácil?

          Seu rosto ficou completamente vermelho, parecia que eu não teria uma resposta.

          Será que eu falei alguma coisa errada? Não, pior! Será que ela está doente? Isso pode ser febre? Ai meu Deus, o que eu faço?

          — Enfermaria! — Acabei gritando de novo... — Você precisa ir para a enfermaria.

          Não sei se existe uma enfermaria nesta escola, mas deve ter, ou melhor, tem que ter, né? Sempre tem nos animês.

          — Hã? Não, não, não preciso. — Ela agitou as mãos em frente ao corpo tentando negar. — É só que...

          — O que foi? Você está com algum problema, não é? Aposto que é com aquele seu mestre. Ele deve estar tentando te forçar a fazer coisas estranhas, não é? Eu sempre soube que não se pode confiar em pessoas com aquele tipo de olhar de peixe morto.

          — Hi...

          — Mas não se preocupe, eu vou te ajudar, nós vamos ligar para polícia e pedir para prenderem ele. Não, melhor, nós vamos chamar a máfia, sim, isso, a máfia, eles vão dar um jeito nele... Na verdade, eu não conheço ninguém da máfia, mas nós também damos um jeito nisso, não se preocupe.

          — Ka...

          — Aposto que ele está te forçando a vestir uma roupa de empregada e servir ele enquanto diz "goshujin-sama", ah! Aquele maldito me paga. Como ele se atreve a fazer isso com a minha irmã mais velha!

          — HIKARI! — Liss gritou. A cantina toda ficou em silêncio e, reflexivamente, o seu rosto ficou todo vermelho.

          — M-Me desculpa... E-Eu fiz de novo... — Abaixei a cabeça e tentei controlar meus olhos, que começaram a lacrimejar.

          — Hikari. — Ah! Ela me chamou pelo meu nome. — Isso não tem nada a ver com o Amato, eu só estou um pouco deprimida porque fui mal na prova...

          — Mas você está aqui, pensei que tinha terminado mais cedo...

          — Foi por isso... — Ela fechou as duas mãos sobre a mesa. — Eu não consegui fazer nada, então acabei saindo mais cedo. Eu não consigo entender, as matérias são muito difíceis... Como você consegue? Você também é uma Tsukumogami, mas ainda assim é a primeira aluna da sala.

          Respira... Ela finalmente está mostrando interesse em conversar com você, Hikari, então não estrague tudo agora.

          Eu puxei um pouco de ar e então respondi:

          — Eu tenho sorte! — disse, tentando parecer confiante.

          Que tipo de resposta foi essa? Agora ela deve estar pensando que eu sou arrogante, ou metida.

          — B-Bem, o que quero dizer é que eu consigo chutar as alternativas com mais facilidade... — Tentei consertar.

          — Hum... Seu aprimoramento, não é?

          — Sim — respondi. — Eu consigo "sentir" qual alternativa é a certa...

          — Deve ser legal, isso ajudaria bastante — disse ela, sorrindo.

          Ah! Ela é muito fofa enquanto está sorrindo, será que eu posso apertar? Não, não, se eu fizer isso agora, ela vai ficar brava e acabar me deixando de lado de novo.

          — Sabe, Liss... — Comecei dizendo. — Se você quiser, eu posso tentar te ensinar um pouco... Nós conseguimos aprender as coisas mais rápido, então, talvez se nós duas nos juntarmos...

          — Então, esse é seu plano! — A voz de uma garota atrás de mim fez com que eu parasse de falar. — Você está querendo roubar a Lili para você?

          — Por favor, Nina, não me chame assim, isso é vergonhoso. — Liss voltou a ficar completamente vermelha.

          A primeira garota passou por mim e se sentou ao lado da Liss, ela era pequena e usava uma longa trança caída na frente do corpo. Estranhamente, ela havia colorido as pontas de azul escuro, o que, junto do cabelo preto, dava um ar bem bonito.

          Não posso negar, ela tinha um belo cabelo...

          Inconscientemente comecei a passar a mão no meu, Nina me olhou com um certo desprezo, e então disse:

          — O que foi, Hikari? Invejando meu cabelo de novo?

          — N-Não! — disse eu, mas já era tarde para esconder a vergonha.

          — Ah... Sabe... Do que vocês estão falando mesmo? — disse a segunda garota enquanto se sentava ao meu lado.

          Essa garota... bem, essa garota é essa garota... Eu não vou perder meu tempo descrevendo alguém como ela... Tão sem graça...

          — Rachel... Você nunca presta atenção em nada? — disse a baixinha irritante.

          — Ah... Sorry, eu estava me perguntando o porquê de ninguém se incomodar com o fato da Liss ter um olho de cada cor...

          Qual é dessa fala? Por um acaso ela é o personagem despreocupado que tenta falar algo inteligente...

          — Mas é isso que dá o charme para ela! — Nina agarrou o braço da Liss e a puxou para perto. — Você também não pode esquecer dos cabelos brancos.

          — Hum, verdade, será que ela é alguma coisa diferente? Tipo um alienígena, ou quem sabe um mutante com poderes... — Rachel se virou para mim e continuou. — Você também, não é, Hikari? Você consegue as maiores notas, mas em sala, mal consegue responder uma conta de matemática mais complexa...

          Ela inclinou a cabeça para a direita e depois para a esquerda, como se estivesse fazendo um alongamento, mas foi rápido demais para ser considerado como isso.

          — Eu às vezes fico me perguntando sobre isso... Se vocês são realmente humanas... Não que seja algo ruim. Hahaha. Porém, me incomoda um pouco esse jeito de vocês duas.

          — Esse jeito? — perguntou Liss.

          — Hum... Esse jeito despreocupado, sabe? É como se vocês tivessem acabado de nascer, como se estivessem aproveitando a vida pela primeira vez.

          — Qual o problema disso? Você acha que só por que estamos vivendo felizes, isso nos faz menos humanas? — falei.

          — Sim, humanos de verdade não são felizes. — Rachel levantou os dois braços para se alongar e depois acrescentou: — Não consigo acreditar que existam humanos realmente felizes, para mim, tudo não passa de uma ilusão. Quer dizer... Eu só acredito que alguém possa ser realmente feliz depois de descobrir que este mundo é horrível. Se, mesmo depois de perceber que o mundo não tem nada a te oferecer, você ainda continuar se achando feliz. Aí, talvez, eu acredite na felicidade.

          — Então você não é feliz? — perguntei.

          — Não — respondeu ela de imediato, mas então ela balançou a cabeça, negando, e complementou. — Não posso dizer que sou feliz, mas também não posso dizer que sou infeliz... Se eu parasse para pensar, conseguiria enumerar várias coisas das quais eu tenho vontade de ter ou fazer, coisas que poderiam me deixar "feliz". Porém, no fundo, isso é só um reflexo de quão humana eu sou.

          — Está vendo, Hikari, o que você fez? Agora ela entrou no modo filosofia. — Nina disse enquanto começava a se levantar. — Vamos, Rachel, se você continuar aqui vai acabar deixando todo mundo louco.

          — Mas, Nina... Eu nem comecei com as minhas citações... — Rachel disse com um tom de voz triste, enquanto se levantava.

          — Essas duas me irritam. — disse eu enquanto observava as duas se distanciarem.

          — Hum... Elas são um pouco complicadas, mas no fundo são pessoas legais. — Liss levantou o rosto e sorriu novamente. — Elas gostam de conversar, pena que, às vezes, eu não faço a mínima ideia sobre o que elas estão falando... Ainda mais quando é sobre essas coisas que passam de noite na televisão.

          — Hum... Sério? Deve ser sobre aquele programa que passa todas as noites, da garota que perde suas memórias.

          — Verdade... — disse ela. — Mas eu não gosto de ver essas coisas, então não sei muito bem. Você assiste?

          — Eu? Ah, bem... Não... Luna é quem gosta de ficar vendo.

          — Entendi. — Ela sorriu novamente.

          — Ei, sabe... Sobre o que eu estava falando, se você quiser, eu posso... Cuidado! — Antes que eu pudesse fazer alguma coisa, uma bola de futebol entrou voando no refeitório.

          A bola veio em uma velocidade impressionante e acertou a Liss por trás, a cabeça dela bateu com tanta força na mesa que todos ficaram em silêncio, nem mesmo o responsável por fazer aquilo conseguia dizer alguma coisa.

          — Liss... Você está bem? — perguntei, mas não obtive resposta. Ela permanecia com a cabeça na mesa.

          O que eu faço? O que eu faço? O que eu faço? Ambulância? Médicos? Professores? Espera já sei...

          — Enfermaria! Ela tem que ir para enfermaria.

3

          — Que cara é essa, Hikari? — Ash se aproximou, perguntando.

          — Não consegui convencer a Liss a estudar comigo, e ela ainda acabou indo para enfermaria...

          — Enfermaria... Espera? Existe uma enfermaria nessa escola... Como era? Tinha uma professora responsável também?

          — Era o de sempre, várias camas e uma professora peituda de jaleco branco.

          — Incrível, nunca imaginaria que isso existia de verdade.

          — Pois é, também achei estranho... Não, não era sobre enfermarias que devíamos estar falando, era sobre a Liss!

          — Ah, certo... O que aconteceu?

          — Ela estava reclamando que não foi bem na prova, então eu me ofereci para ajudá-la a estudar.

          — Você também é péssima em estudar.

          — Isso não vem ao caso agora. — Ele se aproximou e se sentou no banco ao meu lado. — Eu só queria poder passar mais tempo com ela.

          — Mas você sabe que isso poderia ser pior, certo?

          — Por quê?

          — Ela pode acabar te odiando mais ainda se descobrir que você não vai ajudar em nada...

          — Eu não sei mais o que fazer... Parece que tudo que tento só acaba piorando mais as coisas. Nada funciona.

          Ele colocou os braços por trás do banco e começou a encarar o céu.

          — É um pouco complicado, mas você tem que ir com calma. Aos poucos, eu sei que você vai conseguir entrar no coração dela e fazer ela se sentir bem. É isso que amizade significa. — Ele respirou e então continuou a falar. — Então, tudo que você precisa é um pouco de esforço, assim com toda a certeza, você vai sair vitoriosa nessa história!

          — Você acabou de usar o lema da Jump como base para esse discurso, não foi?

          — De todo modo, não adianta ficar forçando situações para ficar com ela, não pode se esquecer que lutamos duas vezes e, em uma delas, nós os deixamos gravemente feridos.

          — Mas, mas... Ah! — Eu coloquei a mão na cabeça e comecei a gritar.

          — Você é impaciente demais, é por isso que você sempre acaba falando descontroladamente com quem não conhece... Bem, pelo menos, você parou de rir de um jeito estranho.

          — Foi só daquela vez! Eu não sabia o que fazer, ok? Eu também não sabia, como contar a parte da divisão de vida...

          — Então, você decidiu começar a rir? — Ele deu uma gargalhada e voltou a falar. — Tanto faz, isso já passou mesmo.

          — Mas então... — Tentei mudar de assunto. — Onde está a Minami? Ela não devia ter vindo com você?

          — Hoje ela saiu mais cedo da escola, então foi direto para casa.

          — E por que você veio para cá? Não tinha necessidade de vir nos buscar.

          — Eu lembrei que vocês estavam nas suas primeiras semanas de provas, então achei melhor vir todos os dias. A situação em que a Luna estava ontem me deixou um pouco preocupado.

          — Tem razão... Falando nisso, ela ainda não veio, já está quase no fim da aula, só falta ela sair.

          — Ela deve estar conferindo as respostas... Ela nunca fica satisfeita com as coisas da primeira vez.

          — Não consigo entender isso, ela estuda, estuda e estuda, mas ainda fica para trás nas provas.

          — Ela sempre foi assim. Diferente da Minami que faz as coisas de um jeito fácil, a Luna precisa se esforçar para conseguir o mínimo dos resultados... Mas isso é uma coisa que você não vai entender. Pessoas que fazem as coisas sem perceber nunca vão entender as pessoas que se esforçam.

          — Talvez seja, mas eu queria saber pelo menos um pouco mais sobre ela e também sobre você... — Tomei um pouco de coragem e disse. — Você também é assim, não é? Precisa se esforçar para conseguir as coisas.

          Ele me olhou um pouco surpreso e então disse, sorrindo:

          — Sim... Eu nunca fui considerado alguém especial, sempre precisei estudar para as provas, mesmo as mais simples... Sinceramente, eu não sei a quem a Minami puxou, deve ter sido algum parente distante...

          — Isso não te incomoda? — perguntei.

          — Até que não... Eu sempre tive consciência de que meu mundo era assim, então eu nunca esperei me tornar alguém de sucesso, tudo que eu queria era encontrar uma pessoa legal e um trabalho que pudesse me sustentar.

          — P-Por que você não faz um cursinho? V-Você, com toda certeza, conseguiria uma faculdade se estudasse.

          Ele inclinou o corpo para frente e então disse:

          — Por que será...? Acho que é porque o dinheiro não daria, tenho que pagar as aulas de canto e a escola atual da Minami tem um alto custo com materiais escolares, então não sobraria muito para fazer outras coisas.

          Não é justo! Não é justo ele ter que se sacrificar pelo nosso bem. Ele não quis dizer, mas eu sei que também contribuo para essas despesas...

          — Ash... V-Você não precisa se sacrificar assim... — Comecei dizendo. — Nós três entenderíamos se você decidisse usar um pouco do dinheiro para o seu próprio bem.

          — Hikari, não faz o mínimo sentido ser feliz sozinho. — Ele disse sério e então acariciou meu cabelo suavemente. — Eu já me decidi, não vou voltar a ser como antes, eu prefiro ver a felicidade dos outros do que apenas ser feliz... Não, o melhor seria dizer que eu sou feliz por saber que pessoas importantes para mim também estão felizes. — E de um jeito gentil, sorriu, fazendo meu coração disparar.

          Eu fechei meus olhos por alguns segundos, a sensação dele mexendo nos meus cabelos era tão boa que me fazia querer sorrir, mas eu tentei evitar fazer isso. Ainda com os olhos fechados, disse:

          — Sinto muito, por ter roubado seu pouco tempo de vida. — E lentamente comecei a abrir meus olhos.

          Assim que eu terminei de abri-los, Ash estava com o rosto próximo ao meu, sem me deixar desviar o olhar, ele me encarava fixamente com seus olhos castanho claro.

          — Você sabe que foi graças a você que estou aqui. Então não tem motivos para você se sentir culpada — disse ele com um tom de voz sério.

          — Ash... — Hesitei por um momento e então disse. — Você é feliz?

          — Claro — respondeu ele sem desviar o olhar. — Eu tenho a Minami e a Luna, uma casa boa e ainda posso aproveitar tudo isso.

          — Entendo... — respondi tentando não demostrar emoção.

          — Mas o mais importante é que você está lá. — Ele sorriu sem se afastar de mim. — Então, obrigado, Hikari, por existir na minha vida. — Em um movimento inconsciente, eu fechei meus olhos, enquanto sentia ele se aproximar do meu rosto.

          Mas, espera... Por que eu fechei meus olhos? Será que... Será que... Ele vai me beijar? Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! ...Não! Não! Não! Não! Não! Não! Não! Não! Não! Não! ...Eu não sei se posso... Será que estou bem maquiada? Espera, eu não uso maquiagem! Ah! O que eu faço? E se ele não gostar? C-Como eu vou continuar morando com ele? E se ele me pedir em casamente? Eu só tenho cento e poucos anos, não estou pronta para isso ainda!

          Eu tentei controlar minhas emoções e esperar o resultado daquilo. Porém nada aconteceu, eu abri meus olhos e ele estava sentando um pouco longe de mim, olhando desconfortável para uma garota parada a pouco mais de quatro metros de nós.

          Ela havia trocado o uniforme escolar por uma roupa casual e deixando os cabelos soltos, abandonando a fita que sempre usava para prendê-los. Entretanto, ainda mantinha a mesma expressão de sempre.

          — M-Me desculpa! E-Eu... E-Eu não queria... E-Eu só... E-Eu só estava trazendo ela. — Shiori estava com o rosto completamente vermelho e com uma expressão de pânico. — Ela estava parada, batendo o corpo contra a parede, como se estivesse tentando atravessá-la. Eu não sabia direito o que fazer, por isso trouxe ela.

          Enquanto tentava gesticular, Shiori soltou o braço da Luna, que saiu andando em direção ao nosso banco, ela veio caminhando com uma expressão de morte no rosto e parou no meio exato dele. Porém, ela não se sentou, ou tentou fazer alguma outra coisa, ela apenas ficou parada tentando forçar o corpo contra o banco.

          Luna havia abandonado sua maria-chiquinha, para usar um rabo de cavalo na lateral da cabeça, talvez em uma tentativa de parecer mais madura, mas isso claramente não funcionava. Ela ainda mantinha uma expressão infantil, com um certo ar de dignidade, como aquelas crianças que tem um comportamento quase impecável.

          Sendo assim, a Luna deveria saber que se comportar igual a um NPC bugado não era nada legal...

          Ash se levantou e a segurou pelo braço.

          — Luna! Temos pizza de atum hoje!

          Respondendo ao estímulo da comida, ela arregalou os olhos parecendo finalmente estar enxergando algo e, em seguida, soltou um pequeno grunhido, como se fosse um filhote de gato.

          — Yaaaaah...Eu não aguento mais! Essas provas vão me matar! — Ela bateu a cabeça contra o peito do Ash.

          — Só falta um dia, você não pode desistir...! — disse Shiori em um tom baixo, ao mesmo tempo em que parecia querer gritar.

          Ela ainda estava vermelha de vergonha e segurava as duas mãos em frente ao peito, Ash olhou em sua direção e disse:

          — Isso, Luna, a representante de classe tem razão, você não pode desistir.

          Ele sorriu para ela, Shiori ficou ainda mais inquieta e respondeu, gaguejando:

          — H-Hum... B-Bem... E-Eu não sou representante de classe...

          — Como não? — perguntei. — Você usa óculos, é a primeira a deixar a sala nas provas, sempre ajuda os outros e não tem amigos.

          — Eu tenho amigos!

          — É o que toda pessoa sem amigos diz...

          — Claro que tenho! Tem aquele... E aquele... — Ela começou a contar pessoas com os dedos da mão enquanto abaixava a cabeça. Eu já conseguia imaginar um pouco de fumaça saindo dela. — Ah! Que seja! Eu não sou a representante, ok?

          — Ok, você não é representante — disse Ash.

          — Ash! Eu estou com fome, vamos logo! — Luna bateu duas vezes a cabeça no peito dele e se afastou indo em direção à porta da escola.

          — Você quer ir também...? Como é seu nome mesmo? — perguntou ele.

         Shiori entrou em pânico e não conseguiu responder nada... Que tipo de reação é essa? Vai me dizer que ela já se apaixonou...?

          — Shiori! Shiori! Esse é o nome dela! — gritei.

          — Calma, você podia ter só falado.

          — Eu estou calma! — Virei o rosto e comecei a acompanhar Luna, que tinha voltado a andar no modo NPC.

4

          Contrariando o que eu esperava, Shiori aceitou o convite e veio junto de nós para casa, eu ainda não a conhecia muito bem, mas pela aparência e modo de se comportar, eu diria que ela era do tipo tímida e que, de maneira nenhuma, iria à casa de uma pessoa que acabou de conhecer.

          Nós entramos no apartamento, joguei a mochila ao lado do sofá e o Ash foi em direção à cozinha para esquentar a pizza que estava no congelador.

          Sentada no chão com as pernas cruzadas, estava Minami "fingindo" tocar seu violão.

          — Oh...! — Shiori parecia ter se surpreendido ao vê-la.

          Talvez esse tipo de reação fosse o esperado, até mesmo para mim, ainda era um pouco complicado entender o que havia se passado na cabeça dela quando decidiu fazer isso, mas bem... Quem sabe é aquilo que chamem de crise adolescente, certo?

          Minami havia deixado seu cabelo crescer ainda mais, porém, ao invés de usá-lo solto, ela passou a prendê-lo em um coque, formando uma única mecha que caia na lateral do seu rosto.

          O corte em si era muito bonito, e junto dos seus cabelos castanhos, acabava deixando-a ainda mais bonita, o grande problema, quem sabe, tenha sido o fato dela ter furado a orelha.

          Ok, isso não é um problema em si.

          Ash claramente foi contra isso, mas depois de um pouco de conversa, ele acabou cedendo, eram raros os momentos em que ele não fazia os gostos delas, então, deveria ser de se imaginar que acabaria a deixando usar um brinco na parte de cima da sua orelha.

          Shiori olhou para ela, no momento em que ela voltou a fazer as cordas do seu violão ressoar.

          Minami tinha finalmente aprendido a tocar uma música...

          Uma única música que ela repetia dia e noite sem parar, como se fosse um mantra de um templo budista.

          Eu me aproximei e sentei no sofá, Shiori acompanhou e se sentou ao meu lado sem dizer nada. Peguei o controle da TV e liguei em um canal de notícias, a repórter falava algo sobre um crime cometido em uma cidade do exterior, algo como um assassinato brutal em uma vila pequena. Sem dar muita atenção a isso, eu mudei para um canal de filmes apenas para ter um pouco de som em volta.

          — Aiii! — gritou Minami enquanto deixava o violão de lado.

          — Você está bem? — Shiori olhou assustada para a reação repentina dela e já começava a se levantar.

          — Hã? Quem é você mesmo? Bem que seja... Eu estou bem, só arrebentou outra corda. — Enquanto sorria, Minami se levantou e foi até uma cômoda que estava no canto oposto da sala.

          Ela puxou a gaveta e começou a mexer entre um amontoado de cordas de violão. Essa foi a solução mais pratica que o Ash arrumou, era mais simples deixar várias cordas compradas, já que ela as arrebentava pelo menos quatro vezes na semana, do que ir comprar todos os dias apenas uma.

          — Você é da escola da Luna? — perguntou Minami enquanto começava a tirar a corda velha do violão.

          — H-Hum... S-Sim... M-Me chamo Shiori, prazer em te conhecer.

          Ela precisa gaguejar toda frase?

          — Olá! O prazer é meu — respondeu Minami. — Você é representante de classe?

          Shiori soltou o corpo no sofá enquanto cobria o rosto, depois de alguns segundos, disse:

          — Qual o problema? Por que todo mundo me pergunta isso? — E então deixou os ombros caírem, parecendo desistir das próprias perguntas.

          Minami inclinou suavemente a cabeça para direita, parecendo estar em dúvida e, sem desviar o olhar de Shiori, tocou as cordas do violão fazendo um som estranho.

          — Você parece esse tipo de pessoa, sabe? Se tivesse que atribuir uma função a você, seria a de representante de classe. Não sei muito bem como explicar, mas você é uma representante, só não sabe disso ainda.

          — Eu não me vejo fazendo isso...

          — Talvez seja o que chamam de classificação natural, você olha para alguém e pensa que aquela pessoa é boa, ou então que ela parece assustadora, pode ser meio que um instinto humano de julgar ameaças. No seu caso, a sensação que passa é de que você deve ser responsável por alguma coisa... Bem, mas isso não vem ao caso. — Ela começou a mexer no braço do violão. — Você quer ouvir uma música?

          Sem se incomodar com a mudança de assunto e nem se importar com as nossas respostas, ela começou a tocar a mesma música novamente.

          Em conjunto, Luna abriu a porta do quarto e saiu vestindo apenas uma longa camisa branca. Não, não, ela não estava só de camisa, tinha um short curto por baixo que mal dava para ser visto.

          — Ah, Shiori? Não tem problemas você vir para cá? Não é melhor ligar para os seus pais? — perguntou Luna enquanto se sentava ao nosso lado.

          Shiori hesitou por um instante e fez uma expressão de melancolia como se falar daquilo fosse algo ruim, e então, com uma voz leve, parecendo tentar contradizer as suas emoções, disse:

          — Eles trabalham até tarde, de qualquer forma, eu iria ficar sozinha mesmo. — E então sorriu suavemente para mim.

          — Eles trabalham em quê? — perguntou Minami.

          — Eles são donos de um restaurante do outro lado da cidade, por isso acabam passando a maior parte do dia lá.

          — Deve ser triste ficar o tempo todo sozinha...

          — Eu não acho tão ruim assim, na verdade, eu meio que gosto, posso ficar em casa lendo sem barulho por perto.

          — Acho que não sirvo para ser solitária... Não aguento passar um dia sozinha em casa — disse Luna.

          — Não seria o contrário? — Shiori colocou as mãos entre os joelhos.

          — Com assim? — perguntou Luna.

          — Se você precisa ficar no meio de pessoas, isso te faz solitário, não acha? Por exemplo, se você tem que sempre estar junto de alguém, de um jeito, significa que estar sozinha te incomoda, ou seja, você é solitária. Mas se você escolhe ficar sozinho e não se sente mal por isso, então pode se dizer que você não é solitário.

          — É um jeito interessante de pensar...

          — Sim, eu li em um livro uma vez, se parar para pensar, humanos são seres extremamente sociais então aqueles que conseguem não se incomodar com isso são surpreendentes — disse Shiori com um sorriso no rosto.

          — Bem, pode ser verdade. — Luna concordou enquanto acenava com a cabeça.

          Eu me preparava para comentar como isso parecia apenas uma desculpa de quem não tinha amigos, quando minha visão se embaçou. Meus ouvidos ficaram tapados e eu perdi os sentidos, como se estivesse preste a desmaiar.

          Minha cabeça começou a doer e os fragmentos das imagens começaram a se formar, deixei meus instintos tomarem conta, e a pessoa que sempre me preocupa apareceu.

          — Mestre! — gritou Liss enquanto corria. Ela ainda usava o uniforme da escola e parecia um pouco cansada.

          Um segundo flash se formou e eu pude ver, ao fundo, uma garota vestida com um yukata roxo. Ela segurava um guarda-chuva oriental florido e tinha uma franja tingida da cor lilás. Eu tentei prestar atenção ao fundo para ver se encontrava alguma dica de onde ela estava. O lugar parecia com a quadra aos fundos da escola, perto do refeitório.

          Liss ainda corria em direção ao seu mestre, quando, subitamente, caiu. As imagens se misturaram e eu não pude ver o porquê. Em seguida, as cenas trocaram para o Amato caído no chão e a Liss usando o próprio corpo para protegê-lo.

          — Hikari...! Hikari...! — Aos poucos, a voz da Shiori foi entrando nos meus ouvidos e, finalmente, eu consegui enxergar o meu redor.

          Ash estava parado do meu lado, apenas esperando que eu dissesse o que vi.

          — Quanto tempo? — perguntou ele.

          — Não sei, não deu para sentir muita coisa dessa vez, talvez alguns minutos... — respondi. — Eles estão na escola!

          — Luna, Minami, a pizza já está na mesa, daqui a pouco nós voltamos.

          — E-Espera! Onde vocês vão assim? O que está acontecendo?! — gritou Shiori.

          — Depois eu te explico! Agora não dá tempo.

          Então, sem dizer mais nada, nós nos levantamos e fomos até a Yanatsu.

~

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Fortsett å les

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