- Nós vamos furar a fila?
- Shiiiuuuu - viro irritada para o Morgado - Claro que não - falo mais alto - só vou entregar isso aqui para o meu amigo que tá ali.
Continuo andando e ignoro alguns olhares de adolescentes em mim. Talvez eu não esteja chegando tão de mansinho assim, mas a culpa é do Morgado! Ele ainda tenta olhar para a minha mão para procurar o que é o "isso aqui". Acho que o sol está afentando a cabeça dele, coitado.
Acelero o passo. Red está de costas e coloco a mão no ombro dele.
- Red.
Ele vira com um sorriso radiante até que seus olhos passarem de mim para o Morgado. O sorriso murcha como um balão furado. Aproveito o gancho - se é que isso pode ser chamado de um gancho - e faço as apresentações.
- Então, Red, esse é o Morgado lá da agência. Morgado esse é o Red, meu melhor amigo.
Morgado toma a dianteira e estica o braço para comprimentá-lo. Solto o ar em alívio ao ver que Red desmanchou um pouco a cara amarrada.
- Red, que nem o personagem do jogo? - Morgado pergunta com as mãos no bolso e sustenta um olhar meio presunçoso. Ainda não descobri se isso é algo da personalidade dele ou ele apenas fica fazendo tipo.
Red apenas confirma com a cabeça e lança alguns olhares para mim.
Não consigo pensar em nada para puxar assunto, ou seja, a segunda parte do plano de puxar papo também estava indo por água abaixo. Os dois já acharam coisas melhores para fazer. Morgado começa a mexer no celular e Red liga o 3DS. Eu fico torcendo para essa fila andar logo.
Por sorte, a fila anda mais rápido do que o crescimento do meu desespero no peito em não saber lidar com os dois. Eles mal se olham e não fazem muita questão de tentar desenvolver qualquer diálogo. Cheguei a soltar algumas vezes: "Nossa que calor, né?" e só ouvi alguns grunhidos.
Entregamos nossos ingressos na entrada e em seguida seguimos para revista. Somos separados em duas filas, homens e mulheres. Eu e Red passamos pela revista ao mesmo tempo. Enquanto esperamos o Morgado ser revistado, Red chega mais perto de mim.
- Isso será um desastre.
- Agradeço o seu apoio.
- O cara é um mauricinho. E quantos anos ele tem? 40? Por Jirachi, o que foi ele tentando dar um de entendedor de Pokémon?
- Não! Acho que não - e começa a passar na minha cabeça se o Morgado seria o tipo de cara que vive fazendo plásticas. Afinal, ele mora na Califórnia, o povo é meio obcecado com isso por lá - Olha, pega leve. Okay? Aliás, você podia ajudar um pouquinho. Custava puxar assunto. ALIÁS, foi você que começou com esse lance de puxar papo...
- Oi - Morgado interrompe o crescente da minha voz.
- Eu vou lá me inscrever no campeonato. Ele começa mais tarde, então, se quiserem dar uma volta por aí - Red começa a dar uns passos para trás, se afastando da gente.
- Okay. Me manda uma mensagem falando onde é exatamente.
Red some no meio da multidão que começa a se formar conforme o pessoal vai entrando no evento.
Como dois ETs, eu e Morgados fomos largados no meio do pátio. Milhares de outras coisas estavam acontecendo a nossa volta. No pátio em particular tinha algumas barraquinhas de comida. Mais alguns metros a nossa frente algumas pessoas lutavam com objetos enormes enrolados em fita adesiva prateada. Na nossa esquerda, uma fila começava a se formar para um stand de mangás, aqueles quadrinhos japoneses que começam de trás para frente. Algumas pessoas subiam e desciam uma rampa que parecia levar para uma quadra. Da mesma direção parecia vir um som abafado de música.
Fazia tempo que eu não vinha num evento como esse. Tenho boas recordações com o Red nesses eventos. Eu sempre me senti meio deslocada, mas acho que era mais coisa da minha cabeça. Porque ali tinha gente de todas as idades, jeitos e gostos. E eu não sei explicar, o pessoal é muito receptivo.
Olho para o Morgado que também está olhando para todas as direções. Nossos olhos se encontram. O medo e vergonhinha - sem sentido - que estavam dentro de mim, se dissipam.
- Não era o que eu imaginava - Morgado começa - mas parece bem legal.
Eu abro a boca para falar quando um grupo de garotas aparecem ao nosso lado.
- Você tira uma foto com a gente? - elas lançam olhares suplicantes para o Morgado que lança um olhar confuso para mim.
Eu apenas dei de ombros. Não faço ideia de onde essas meninas brotaram. Duas delas estavam vestindo uma espécie de fantasia sexy de faxineira. Elas não devem ter mais do que 14 anos. Eu na idade deles, provavelmente, me vestiria de Pikachu e ainda com aqueles macacões que te cozinham por dentro.
Morgado começa a fazer perguntas, mas as meninas dão gritinhos estridentes.
- MORTA! Ele sabe as falas e tudo!
- NOSSA, VOCÊ É MUITO O HAKU!
Aos poucos começo a perceber que elas estão confundindo ele com algum personagem. Um foguinho de vingança começa a crescer dentro de mim por todas as vezes que ele perguntou sobre a B&T, ou por me colocar no grupo da empresa, onde eu não queria estar.
- Vocês querem que eu tire a foto? - pergunto. Morgado só faltou me engolir com o olhar.
- AAAAH! - elas gritaram juntas.
- Mas, pera, quem tem a melhor câmera? - uma delas levanta a questão.
- Posso tirar várias fotos com celulares diferentes...
- AAAAAH!
Elas jogam pelo menos uns seis aparelhos no minha mão. Elas começam a se aglomerar em volta dele fazendo poses. Morgado apenas cruza os braços e sei que ele quer me matar.
No meio das milhares de fotos com pessoas diferentes, em dupla, sozinhas, com o celular x, y,x z, eu aproveitei para tirar uma foto com meu celular. Ficamos pelo menos uns cinco minutos ali até elas irem embora.
- Quem diria que você também faz cosplay - cruzo os braços e não consigo evitar o sorriso de triunfo.
- Por favor, Anne - ele ajeita o cabelo irritado.
- Ah, para! Foi engraçado. Um pouco perturbador - começo a mexer no meu celular e abro a foto para analisá-la melhor -, mas definitivamente engraçado.
- Você.. não... fez... isso... - ele fala entre os dentes cerrados.
- Relaxa, é só uma recordação. Quer comer alguma coisa ou dar uma volta por aí?
Ao menos uma vitória nessa minha vida errada das tecnologias. Agora tenho uma arma contra ele. Não que eu realmente vá usá-la, mas só de ter visto a cara de desespero dele por um segundo já valeu a pena. Ele precisa aprender relaxar um pouco.
Ele começa a andar em direção a rampa. Acabamos na parte das lojinhas que tem um monte de coisinha fofa que não faço ideia de quais são referências. Escolho algumas coisas que pelo menos sei o nome, tipo, Harry Potter e outras coisas mais conhecidas da cultura pop.
Depois do momento tietagem no pátio, o Morgado não falou mais nada. Será que ele ficou realmente sentido? Acho uma bobeira.
Decido comprar alguma coisa pra ele lembrar desse dia que talvez seja menos traumatizante do que a foto dele com um monte de adolescentes vestidas de faxineira sexy. Vejo alguns broches sortidos e um em particular parece perfeito. Compro enquanto ele está distraído perguntando para um cara de uma das barracas qual a margem de lucro eles conseguiam num evento como esse.
Pika-pika.
Red: 2º andar.
Red: Sobe pela escada do pátio.
Red: Segunda sala a direita.
Eu: Indo...... --->>
Interrompo a pesquisa de mercado do Morgado e chamo ele para ir para o campeonato.
- Vamos? - não precisei dizer muito mais para ele entender do que eu estava falando.
Não era possível que ele estava tão chateado. Tento pensar em algo que possa melhorar um pouco esse clima esquisito.
- Eu posso apagar a foto, se você quiser - falo enquanto caminhamos até a sala.
- Você ainda está pensando nessa história, por isso não está falando comigo?
- Mas... - meu cérebro começa a bugar - você que...
- Sim, fiquei um pouco irritadinho, mas passou. Você que não disse mais nada!
- Desculpa, eu acho. Que estranho isso! - rio nervosa.
- Então, onde encontramos o seu Mestre Pokémon?
Dou risada. Não pela piada. Era aquela típica risada que surge depois de um momento de tensão. E talvez seja bom eu falar para ele não chamar o Red de Mestre Pokémon na frente dele, não dessa forma debochada. O que o Morgado tinha de bonito, tinha de estranho. Talvez, esse seja o único alerta que preciso emitir para o Pepa.
Chegamos na sala que já estava com todas as mesas arrumadas uma de frente para outra. Um cara que parecia ser um do organizadores começava a alocar os jogadores. Meu olhar encontrou o do Red assim que aparecemos na porta. Consegui sentir um certo alívio no rosto dele, o que me faz imaginar que ele estava apreensivo ao me esperar.
Aviso o Morgado que já volto. Ele assente com a cabeça e fica apenas olhando meio curioso. Eu vou até o Red.
- Preparado?
- Como nunca. É bom ter você por aqui, mesmo com aquele mala - ele solta um sorrisinho.
- É, ele é realmente estranho. Mas esquece ele e arrasa! - dou abraço forte nele.
Me afasto um pouco e volto para perto do Morgado.
Apesar de ter alguns adolescentes e até crianças, o campeonato era majoritariamente formado por pessoas mais velhas, vinte para cima. Cada partida variava muito de tempo, algumas eram super rápidas, outras chegavam a quase 20 minutos, isso porque ainda estavam na eliminatória.
- Ele é bom nisso? - Morgado apontou para o Red que estava super concentrado enquanto jogava contra o seu segundo oponente.
- Sim. Ele joga outras coisas, tem um canal no Youtube e faz stream de jogos na internet. Não é super famoso, mas está ganhando o espaço dele. Ele quer muito chegar no mundial. E ele vai conseguir! - analiso cada expressão dele, já que as telas são muitos pequenas e eu não entendo muito das coisas, prefiro manter distância.
- Acho que ele vai sentir o impacto dos campeonatos americanos. O negócio lá é outro nível! Eu falei que já fui em um para ver como era.
- Legal - preciso manter a minha concentração em mandar positividade para o Red - Mas acho que ele dá conta sim. Ele é o melhor mestre pokémon para mim! - diferente do Morgado, falei sem nenhum deboche, obviamente.
++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++
Eu nem sei como agradecer o apoio de vocês. Realmente, preciso encucar menos e curtir mais a história. Diversão em primeiro lugar! As vezes, a história irá parecer um fanfic, mas depois a gente ajeita hehe.
Já dei um rascunhada no que vai acontecer na última parte desse capítulo e no quarto! Espero que estejam curtindo como sempre <3
beijos, beijos!