A Última Música

By lalupaisreal

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Músicas marcam momentos. Foi isso que aconteceu com Miranda, uma música marcou a sua vida, da pior maneira po... More

Prólogo
I
II
III
IV
V
VII
VIII
Nota Final

VI

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By lalupaisreal

Depois de seis horas, os dois finalmente estavam em frente à casa que tinha sido palco dos pesadelos de Miranda. A frente era mesma, o jardim que tinha ali era o único que havia mudado, as flores haviam morrido, deixando tudo sem cor. Passava das duas horas da tarde, a rua estava vazia como sempre, era uma região afastada e nesse horário as pessoas estavam trabalhando ou na escola.

Mesmo assim, a garota prendeu o cabelo, colocou a boina e óculos escuros, Houston fazendo o mesmo. Os dois saíram, ela na frente, abriu o portão de ferro que rangeu com o movimento, depois bateu na porta, seu coração em ritmo acelerado. Alguns minutos depois, a fresta foi aberta levando-a a encarar o homem que ela tanto odiava, eles estavam finalmente frente a frente.

— Olá, papai.

O homem ficou surpreso, a observando, sem nada dizer, abriu mais a porta, permitindo sua entrada.

Miranda analisou o local, tudo estava do mesmo jeito de quando morava ali, fazendo seu corpo se arrepiar, como se sentisse novamente o medo de anos atrás. Mas ela não deixou ele o dominar, tirou o sobretudo, a boina e o óculos, deixando seu cabelo loiro cair em cascata em suas costas. Olhou para o seu pai que já não tinha a mesma aparência de antes, seu cabelo estava ralo e um pouco grisalho e ele estava mais gordo, mas os olhos castanhos ainda estavam ali, assim como as malditas covinhas.

Ele sentou-se em uma cadeira e parou para analisar a filha, ela estava crescida e bem diferente da última vez que a vira, ficava a imaginar se algum dia ela apareceria.

— Então, Miranda, veio até aqui apenas para me ver? - ele finalmente disse, a sua voz dando um pequeno start nela.

— Estava passando pela redondeza e resolvi olhar o ambiente, aqui me traz ótimas lembranças. - disse ela irônica - Olhe Houston, foi aqui nessa casa maravilhosa que eu cresci.

Apenas neste momento que seu pai viu o rapaz, levantou as sobrancelhas para ele, analisando-o vagarosamente.

— Parece ter sido uma infância muito agradável. - disse Houston no mesmo tom que ela.

— Foi maravilhosa, não foi papai? Nossas tardes eram tão familiares, passávamos ela ouvindo Nirvana, você se lembra? - ela disse indo até o som que tinha ali, procurou o CD e o colocou em um volume baixo. - O que acha de relembrarmos os velhos tempos? - disse com uma voz ameaçadora.

— Eu não quero ouvir nada Miranda, diga o que quer e vá embora. É dinheiro que precisa? Eu consigo para você - o mais velho falou ameaçando-se levantar, amedrontado.

A garota estendeu a mão para ele em negativa, fazendo um sinal para que permanecesse onde estava. Ignorou o falatório do pai e começou  balançar o corpo no ritmo da música.

With the lights out, it's less dangerous. Here we are now; entertain us...

— Você não quer dançar, papai? Você amava dançar.

— Pare com essa palhaçada, Miranda. - o velho alternava seus olhares entre a filha e o rapaz a sua frente, que continha um sorriso debochado no rosto.

— Ele não quer me divertir, Houston. - falou Miranda para o seu parceiro, fazendo manha - O que faremos com ele?

Houston foi até o homem que não entendia o que eles queriam com toda aquela abordagem. Em um movimento rápido, tirou a corda que tinha no bolso do sobretudo e amarrou os braços do mais velho na cadeira.

— O que você está fazendo? Me solte. - ele se debatia.

— Eu odeio a droga dessa música. - ela gritou - Toda vez que as suas mãos nojentas me tocaram, toda vez que você me abusou, a droga dessa música estava tocando repetidamente. E eu passei todo esse tempo com ela latejando em minha cabeça, eu conheço cada batida, instrumento e tom cantarolado. O pessoal do Nirvana não merecia que a música deles fossem a trilha sonora da sua monstruosidade, papai.

— Como se você não gostasse... - o homem não teve tempo de terminar a frase, Houston acertou um soco no seu rosto.

— Não, Houston, a única pessoa que pode machucar ele sou eu.

Ela se curvou e tirou a faca da sua bota, conseguia ver o medo nos olhos do pai. A sensação era muito melhor do que tivera em todas os outros assassinatos, ali estava a pessoa que a transformou em quem ela era hoje. O homem que tirou tudo de si. Miranda conseguia inalar o cheiro do terror que corria pelo corpo do seu pai e isso a deixava ainda mais forte e corajosa

— Diga 'oi' para o meu pequeno amigo. - ela disse, virando a faca.

— O que você pensa que vai fazer? - gritou o homem.

Desceu o instrumento pelo pescoço dele, pressionando agora com mais força, fazendo um filete de sangue escorrer por ali.

— Miranda, me solte! Você não pode fazer isso! Eu sou o seu pai! - bradou ele exasperado.

A garota se afastou um pouco e caiu na gargalhada, riu tanto, a ponto de lágrimas encherem seus olhos e faltar-lhe o ar. Houston, apenas observava com uma expressão serena e um sorriso de satisfação nos lábios.

— Desculpe. Não consegui me conter. - disse ela enxugando os olhos e  recuperando o ar de seus pulmões - Engraçado, você não se lembrou desse detalhe quando suas mãos percorriam o meu corpo. - em um lance rápido, enquanto falava, encravou a faca na mão dele, fazendo-o rugir de dor.

Rodou o instrumento em uma volta de 180º e retirou lentamente enquanto o homem gritava e se debatia tentando se soltar.

— Acabe com ele de uma vez, querida. Não estou suportando olhar na cara desse velhote que ousou te tocar e não fazer nada. - disse o rapaz esfregando uma mão na outra, ficando inquieto.

— Paciência, gafanhoto. - sorriu para ele.

O sangue escorria pela mão do velho, seus batimentos acelerados à espera do que viria a seguir. Nunca imaginaria que aquela menininha que ele tinha por debaixo do seu corpo tornaria essa mulher dura, fria e sem emoção.

— Em que eu te transformei? - sussurrou o velho, transtornado.

— Este momento não é nada se comparado ao caminho que tracei para chegar aqui. A droga dessa música estava tocando quando eu vi um homem que tinha os mesmos traços que você, esses olhos que tanto me assombraram e essas covas malditas quando ria. Eu olhava para ele e só conseguia enxergar você. Ele foi minha primeira vítima. - disse se aproximando novamente do velho - Cada facada que eu dava, sentia como se estivesse te golpeando. Sabe como a Scotland Yard me chamou? Alice. Porque o sorriso que você me dava enquanto me violentava me perseguiu todos os dias em meus pesadelos, então eu o reproduzia em cada homem que passei, fazendo parecer o sorriso do Gato de Cheshire.

Ela caminhou até o som e aumentou o volume, deixando no máximo, como seu pai sempre fazia. Depois andou até ele, ficando em sua frente.

— Agora, você vai dar o seu último sorriso, papai. - ela sussurrou em seu ouvido, passando a ponta da faca pela sua barriga.

— Não Miranda, não faça isso, por favor! - implorou.

— Eu era sua filha, mas mesmo assim você me machucou. A minha mãe morreu acreditando em você, achando que eu era louca, pensando que a realidade era impossível de acontecer. Prometi a mim mesma que um dia eu iria me vingar e esse dia chegou. Essa vai ser a última vez que vamos ouvir essa música juntos.

— Filha, não...

— Queime no inferno, desgraçado. - ela enfiou a faca no seu coração, empurrando cada vez mais fundo, girou o objeto em um movimento já velho conhecido seu.

Retirou a faca e enfiou novamente, repetidas vezes, enquanto gritava, insana, para que o velho morresse. 

Houston a abraçou, a puxando para si.

— Acabou, Miranda, acabou.- sussurrou tentando acalmá-la.

— Me solte, ainda falta uma coisa. - ordenou desvencilhando-se dele.

Ela tirou a faca e com alguns movimentos e os cortes certos, fez o largo sorriso nele.

— Agora você sempre vai ficar sorrindo, papai. - deu dois tapinhas em seu rosto.

A denial, a denial, a denial, a denial... - Kurt Cobain cantarolava os últimos versos.

Miranda virou-se, sentia-se exausta, subiu as escadas indo ao seu antigo quarto, não queria ver Houston limpando a cena. Entrou no local, tudo ainda estava da mesma forma, as bonecas, a cortina de borboletas e os posteres na parede. Uma lágrima solitária caiu dos olhos dela, deixando a garota surpresa, fazia séculos que não chorava. Encostou-se na parede, fechou os olhos e suspirou, as lembranças voltavam em sua mente, não soube quanto tempo ficou ali parada, mas logo Houston foi lhe chamar, tudo estava terminado.

Era o fim daquele ciclo, Miranda finalmente estava livre das amarras do passado. Porém, ainda havia algo, ou melhor, alguém, que não poderia continuar com ela em sua nova jornada.

Olhou para o rapaz  por alguns segundos, levantou-se, deu-lhe um selinho e sorriu em agradecimento.

— Vamos.

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