Entre Quatro Paredes e Nada M...

By AutoraDankaMaia

2.8K 335 185

Istvan é um homem atormentado por uma tragédia em sua vida. Na tentativa de continuar existindo de algum modo... More

Apresentação da Autora
Lorenza
O Monstro e Eu
Uma Menina Chamada Diana
Meu Fim. Meus Meios
Difícil Ser Eu Mesma
Cálice da Verdade
Uma Surpresa e Tanto

Umbral

379 38 29
By AutoraDankaMaia


 Copyright 2017© Danka Maia

Todos os direitos reservados

Esta Obra está registrada:

Nenhuma parte dessa publicação poderá ser reproduzida, seja por meio eletrônico, mecânico, fotocópia ou qualquer tipo sem prévia autorização por escrito da autora. Esta é uma obra de ficção. Qualquer semelhança com nomes, lugares e acontecimentos é mera coincidência.

Esta Obra está registrada: 1709103488089

Istvan...


Basta uma ligação. Basta uma frase para o seu mundo desabar sem que você tenha tido tempo sequer para piscar. Eu sorria mais uma vez sentindo o perfume da carta daquele dia quando o meu celular tocou e a minha vida acabou.

Não sei quanto tempo permaneci ali com aquele policial falando algo no meu ouvido enquanto meus pés caminhavam para o meio daquele matagal com aquelas fitas amarelas da perícia por todos os lados e o seu corpo debaixo daquele plástico preto e sobre a terra fria. Um calafrio me envolveu nesse momento só de imaginar que ali pudesse estar a razão da minha vida. Ninguém jamais me ensinou como viver sem conjugar o verbo existir. De repente meus pés estavam diante do corpo. Eu deveria reconhecê-la, mas apenas precisei levantar a ponta inferior do saco preto para me deparar com o tênis também queimado assim como todo corpo para saber que a minha filha de dezessete anos havia sido brutalmente assassinada depois de ser estuprada por dois vagabundos que não satisfeitos com as inúmeras pauladas em sua cabeça tentaram atear fogo em seu corpo dentro do carro. Só depois da tentativa frustrada resolveram largá-la no frio e ao relento até que um menino que passava para apanhar sua pipa presa numa das árvores avistasse o cadáver.

— Senhor... Sei que é um momento muito difícil como pai.

— É a minha filha policial.

— Mas ainda não viu o rosto.

— Não precisa, esse tênis foi o que eu escolhi para que ela saísse. Tivemos uma briga por ele sabia? Eu queria esse e ela o surrado laranja que eu vivo dizendo que já anda sozinho de tanto usá-lo.

— Senhor... Eu sinto muito.

Apenas olhei para ele acenando a cabeça. O que mais eu poderia dizer. Lorenza transpirava vida. Mataram a milha filha por causa de um maldito celular. Não satisfeitos, bateram na cabeça dela com uma barra de ferro. Não satisfeitos porque ela gritava por socorro, jogaram-na dentro do carro de qualquer jeito. Não satisfeitos estupraram a minha garotinha, então apanharam a gasolina do carro e atearam fogo com ela dentro do veículo sabendo que ela ainda estava viva.

Nem sei como me tiraram daquela cena. Não sei como fui parar na delegacia. Não sei como contei o que o delegado precisava saber. Eu estava no modo automático eu só fazia porque minha sede era olhar nos olhos daqueles homens e antes de matá-los perguntar por qual razão tanta atrocidade. O que minha Lorenza fez contra eles para receber tanta dor.

Do seu funeral eu só me recordo da foto em cima do caixão que teve que ser lacrado. Nem mesmo pude ver o rosto da minha menina por uma última vez. Sei que muitas bocas me falaram coisas, muitas mãos afagaram meus ombros assim como muitos braços me cercaram. Mas desde aquele instante que vi o tênis da minha garotinha o gosto tornou-se insosso, os ouvidos surdos e meu coração oco. Naquele dia dezesseis de agosto de dois mil e quinze o meu martírio começou. Eu era mais uma alma no umbral.

Foi depois do memorial de Lorenza feito sete dias após sua morte que recebi em minha casa a visita do Tenente Óregon.

— Pegamos senhor Istvan Yotuel. Pegamos os assassinos de sua filha.

Caí diante do homem de joelhos. Agradecido por seu empenho em fazer justiça em nome de Lorenza. Nada poderia trazer minha menina de volta, mas alguma coisa podia ser feita para que outros pais não tivessem suas vidas dilaceradas como a minha. Porque perder um filho é arrancar seu coração depois enfiá-lo na terra e ter que continuar nisto que se chama vida.

— Por favor, senhor Istvan, levante-se.

Por mim eu ficaria aos pés dele para sempre. Aquele homem havia sentido e se importado com minha dor ao ponto de trazer um pouco de dignidade em memória de minha Lorenza. Ele me ergueu me colocando no sofá. Ingrid, minha irmã, que passou a morar comigo desde o acontecido deu-me algo para me acalmar. Minhas mãos tremiam demais. Tudo que consegui foi derramar a xícara no carpete.

— Você precisa se acalmar Istvan. — Ingrid tentou me apaziguar enquanto colocava a xícara sobre a mesa de centro.

— Mantenha a calma senhor Yotuel. Agora mais do que nunca terá que ser forte para ver e acompanhar a condenação desses vagabundos.

— Quem são? Como descobriu tenente? Eles confessaram?

— Meu irmão acalme-se!

— São dois homens. Um tem dezoito anos e outro trinta e três.

— O que? Trinta e três? Minha idade? Como um homem pode fazer isso? Ele não tem família?

— Senhor Yotuel, por favor, sente-se. Se o senhor não conseguir se controlar receio que eu não poderei dar mais informações.

— Desculpe Tenente. Estou bem. Eu confesso que já tinha perdido minhas esperanças.

— O mais velho é um antigo conhecido da justiça. A ficha dele se estende entre pequenos furtos ainda na adolescência até trafico de drogas e roubo de carros. Mas assassinato parece que foi o primeiro infelizmente. Lamento que sua filha tenha sido a vítima dele. Ele também responde por violência doméstica. O mais novo parece que teve uma participação menor na morte de Lorenza. Não tem antecedentes e...

— Ele tem filhos?

— Istvan...

— Eu quero saber Ingrid! Eu tenho esse direito! — voltando meu olhar para o policial. — Ele tem filhos?

— Até onde sabemos ele tem dois filhos. Parece que o filho é maior de idade e mora com um tio em outro Estado. Mas ele tem uma filha.

— Qual a idade dela? — eu tinha sede dessa informação. Minha irmã e Óregon se entreolharam rapidamente até que ele me respondesse que se tratava de uma menina de treze anos de idade. — Treze? Ele tem uma filha de treze anos mesmo assim estupra e mata a minha de dezessete daquele jeito?

— Istvan...

— Senhor Yotuel...

— Não! Eu quero saber! Eu tenho o direito de saber detalhe por detalhe desse filho da puta!

— Istvan para com isso. — Ingrid segurava em meus braços tentando abaixá-los.

— Esse desgraçado tem dois filhos! Uma menina quase da idade da minha Ingrid!

— Tenho certeza que ele não é um bom pai meu querido.

O Tenente se calou e eu compreendi aquele olhar.

— Eu quero falar com ele!

— Não senhor Yotuel. Isso não será possível.

— Não pode me negar isso Tenente Óregon! — voando para afrontá-lo. — O senhor tem filhos. Disse-me isso. Não pode negar a um pai que está sofrendo o que eu estou esse direito! Sabe disto Óregon! Sabe disto!

— Para Istvan! Para!

— Senhor, acalme-se!

— Não irei me acalmar porra nenhuma! Eu quero falar com esse filho da puta do caralho! Eu vou ao papa, ao inferno, aonde for necessário, mas eu ficarei cara a cara com esse monstro custe o que custar ou eu não me chamo Istvan Yotuel!

Saindo dali para o jardim de inverno de minha cobertura com a finalidade de esfriar a cabeça. O ar fresco em nada aplacou a minha ira, pareciam pequenas fisgadas de realidade de que eu não poderia mudar uma vírgula da minha dor. Um tempo depois senti a mão de Ingrid sobre meu ombro. Ficamos em silêncio por um tempo. Então ela chegou-se ao meu lado debruçando suas mãos sobre a mureta e sem olhar para mim disse:

— Conheço você o suficiente. Sei que fará isso de qualquer jeito. Você nunca precisou de consentimentos para nada. Mas pense em Lorenza.

— Não diga o nome dela Ingrid. Não use o nome da minha filha para tentar me impedir. Isso é baixo demais e fica pior ainda vindo de você.

— Istvan... Eu entendo você meu irmão. Não consigo imaginar se algo assim tivesse acontecido com o meu Otto. Mas meu irmão... Eu só estou tentando preservar você. Entenda isso.

— Sei que me apoia e me ama Ingrid. — virando-me para ela. — Sei que me ama. Somos gêmeos. Somos mais ligados do que os irmãos comuns, não é verdade? — Ela me deu um riso como resposta esfregando meu ombro. — Então me apoie. Mesmo que não concorde. Eu só quero que ele me diga o porquê.

— E se não houver um por quê?

— Então devo odiá-lo ainda mais do que já odeio.

— Como fará isso? A justiça não permitirá Istvan.

— A justiça não, mas o dinheiro pode. E dinheiro eu tenho. É uma questão de mexer as peças certas desse tabuleiro. Ligue para Gregory. Peça que venha o mais rápido possível. Diga que tenho um trabalho para ele.

— Berta ligou. Queria saber como estava.

— Depois eu ligo para ela.

— Istvan ela está sofrendo tanto ou mais que você. Lorenza também era a filha dela.

Respirei cansado daquela conversa. Eu e minha ex-mulher tínhamos enfrentado um divórcio desgastante. Berta não aceitava a separação e muito menos o fato de Lorenza ter preferido ficar comigo. Às vezes eu entendia os sentimentos dela, mas eu e nossa filha tivemos uma ligação especial desde sempre. A primeira palavra que Lore disse foi papai. Elas não eram próximas. Era uma relação que considerei estranha em muitas ocasiões, mas não questionei. Berta se comportava como se disputasse com nossa filha quem seria a primeira em meu coração. Lorenza foi crescendo e aceitou o desafio para o meu desespero. Não seria um exagero afirmar que nossa separação se deu mais pelo embate delas e por Berta me acusar de acobertar demais Lorenza e preferir ficar ao seu lado jogando fora nosso casamento, que na visão dela era sensacional.

— Vou beber um pouco Ingrid.

— Não acha que está bebendo demais?

— Preciso fazer alguma coisa para me deixar um pouco dormente às vezes. De cara limpa não dá mana.

Depois de uma garrafa de whisky, muitas lembranças e mais lágrimas. Meu celular tocou. Era Berta. A última vez que nos vimos foi no funeral de nossa filha.

— Berta.

— Pensei que não iria me atender. De novo.

— Não estava bem Berta.

— E acha que eu estou Istvan?

— Imagino que não.

— Imagina? Eu era a mãe dela. Ela saiu de dentro de mim, você lembra?

— Berta não faça cobranças. Não estamos num momento para isso. Desculpe se me expressei mal. Não foi a minha intenção.

— Essa voz arrastada. Enchendo a cara outra vez com certeza.

— Cada um lida com a sua dor como pode.

— Istvan... Eu sinto sua falta. Queria muito poder estar ao seu lado agora. Podemos ficar juntos. Isso nos fortaleceria. Ninguém entende melhor a nossa dor.

Ela tinha razão. Ninguém no planeta poderia compreender melhor nossa dor naquele instante em nossas vidas além de nós mesmos. Eu estava fragilizado. Talvez Berta tivesse certa. Seria um recomeço. A dor nos uniria.

— Berta...

— Fale meu amor.

— Eu quero falar com o assassino de nossa menina.

— Mas não são dois?

— Segundo o tenente Óregon, o mais velho foi quem... O mais novo só estava na hora errada e com a pessoa errada.

— Mas não pode fazer isso Istvan. Não é ético.

— Que se foda o que é ético! Eu falarei com esse desgraçado custe o que custar Berta.

— Acho melhor não Istvan. Não vai trazer nossa filhinha de volta.

— Não é a volta dela que busco é a razão para tanta brutalidade contra uma menina de dezessete anos. Você como mãe deveria me apoiar! Lorenza merece o máximo de dignidade que pudermos dar a memória dela!

— Não grita. Calma!

— Não entendo por que vocês não querem que eu fique cara a cara com esse filho da puta!

— Istvan...

— É isso mesmo Berta! Porra! Ninguém está do meu lado!

— Está bem. Faça como quiser. Se acha que isso é o que dever ser feito estarei do seu lado.

— Jura?

— Claro. Quando foi que não te apoiei durante quinze anos entre namoro, noivado e casamento? Eu te amo Istvan. Eu te amo.

O sussurro dela se perdeu quando desliguei. Mais alguns goles e Ingrid me avisou que meu advogado estava subindo. Gregory era o cara perfeito para aquele tipo de negociação. Eu era um tanto visado por ser dono de cassinos, então precisava de alguém para escolher a dedos outras pessoas para agir em meu nome. Ingrid fechou a porta depois de acompanhá-lo até a sala de jogos onde eu bebia sozinho.

— Imagino que minha presença aqui demande algum cuidado. Alguma tarefa especial suponho.

— Você me conhece o suficiente para saber que sim Gregory. Sente-se. Bebe algo?

— Não obrigado.

— Eu preciso de um momento a sós com o canalha que matou minha filha Gregory.

Ele desabotoou o terno entendendo de cara meu propósito.

— Isso não será muito fácil Istvan.

— Não será muito barato você quer dizer.

— A polícia de Vegas conhece você. A banda podre o venera, mas a banda dos politicamente certos o odeia. Vocês tem um caso de amor e ódio faz anos com eles.

— Apenas me informe quanto custará.

— Quer mesmo fazer isso?

— Cinco minutos com ele basta.

— Eu não acho que seja uma boa ideia você se expor assim e...

— Isso é tudo por hora Gregory.

— Istvan como seu advogado...

— Eu te pago honorários caríssimos para que me defenda e não para ouvir seus conselhos. Passar bem Gregory.

— Como desejar. Com licença.

Duas garrafas depois eu apaguei ali mesmo sobre a mesa de sinuca.

Sempre contando com o carinho de seu voto, comentário e indicação aos amigos!

Continue Reading

You'll Also Like

28K 1.1K 22
𝐔𝐦 𝐫𝐨𝐦𝐚𝐧𝐜𝐞 𝐥𝐞𝐬𝐛𝐢𝐜𝐨 𝐂𝐨𝐧𝐭𝐞𝐦 𝐝𝐫𝐨𝐠𝐚𝐬 , 𝐩𝐚𝐥𝐚𝐯𝐫õ𝐞𝐬 𝐞𝐧𝐭𝐫𝐞 𝐨𝐮𝐭𝐫𝐚𝐬 𝐜𝐨𝐢𝐬𝐚𝐬 𝐄𝐬𝐩𝐞𝐫𝐨 𝐪𝐮𝐞 𝐯𝐨𝐜ê𝐬...
496K 22.2K 115
𝙨𝙚 𝙘𝙝𝙚𝙜𝙤𝙪 𝙗𝙖𝙜𝙪𝙣ç𝙖𝙣𝙙𝙤 𝙖 𝙢𝙚𝙣𝙩𝙚 𝙩𝙤𝙙𝙖 𝙚𝙪 𝙣𝙖𝙤 𝙘𝙤𝙣𝙨𝙞𝙜𝙤 𝙢𝙖𝙞𝙨 𝙥𝙚𝙣𝙨𝙖𝙧 𝙤𝙪𝙩𝙧𝙖, 𝙖 𝙜𝙚𝙣𝙩𝙚 𝙨𝙚 𝙥𝙖𝙧𝙚...
366K 15.7K 54
• dark romance; •drogas; • sexo; •Palavrões de todos os tipos; • Porte de arma; •Sangue; •Torturas; • Se não gosta, por favor não ler. ▪︎Hum...
79.2K 4.4K 50
Victoria Senna a menina que desde que nasceu já foi alvo dos holofotes. Seu pai, Ayrton Senna foi quem plantou esse amor incondicional pela corrida...