Lobotomia (Livro II)

נכתב על ידי andiiep

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Oi! Primeiro você tem que ler essa daqui: https://www.wattpad.com/story/31808631-psicose, pra depois ler essa... עוד

Sinopse e Explicação
Epígrafe
Um - O Recomeço
Dois - Psicose
Três - O Retorno
Quatro - Reconciliação
Cinco - Behind Blue Eyes
Seis - Foragido
Sete - Sorte
Oito - Exumar
Nove - Cambridge
Dez - Pistas
Onze - Reencontro Inesperado
Doze - Lembrança de um passado não muito distante
Treze - Strip
Quatorze - O investigador Josh Bethel
Quinze - Estampido
Dezesseis - Destino
Dezessete - Por Um Triz
Dezoito - Destino (parte 2)
Dezenove - Reconciliação (parte 2)
Vinte - O grande reencontro
Vinte e Um - Luto
Vinte e Três - Foragidos
Vinte e Quatro - Sensacionalismo
Vinte e Cinco - O Primeiro Encontro
Vinte e Seis - Cativeiro
Vinte e Sete - Sequestrada
Vinte e Oito - Ajuda
Vinte e Nove - Resgate
Trinta - Verdades Secretas
Trinta e Um - Êxodo
Epílogo
AJUDA AÍ, GALERA!

Vinte e Dois - Funeral

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נכתב על ידי andiiep


Melissa passou o curto caminho de volta ao seu prédio tão perdida em pensamentos e dúvidas que mal notou a presença de Brian a acompanhando até lá. Só se deu conta de que estava na portaria porque ele pegou seu braço com delicadeza e a fez parar.

-Esqueceu onde mora? – ele riu.

-Estou mais distraída que o normal. – Melissa abanou com as mãos.

Foi Brian quem se aproximou para uma estranha despedida. Ele deu um passo à frente, esperando que Melissa autorizasse o outro. Ela finalizou a distância entre eles e o abraçou. Havia certa tensão no ar, por isso tratou de se afastar rápido.

-Foi ótimo revê-lo, Brian. – ela sorriu.

-É sempre bom vê-la também. Talvez possamos marcar outro desses?

-Com certeza. – Melissa assentiu e entrou no prédio.

Sentiu os olhos de Brian queimando suas costas até que entrou no corredor do elevador e certo peso pareceu lhe libertar. Foi, contudo, uma mínima parte do peso gigantesco que lhe atormentava. Além da inesperada amnésia e de todas as confusões e traumas inesperados dos últimos três dias, passou a ter que lidar com o fato de que Brian também havia aderido à causa de Barber.

Melissa quis xingá-la por isso, pela necessidade que as pessoas tinham de, aparentemente, protegê-la, mesmo depois de morta. Era só mais um motivo para preocupar Corey, mais um motivo para fazê-lo ter ciúmes de Brian, mais um motivo para fazê-lo odiar Brian... Melissa sabia que mais esse tipo de distração não era bem-vinda e poderia muito bem ter sido evitada se Brian não decidisse de repente ser tão... Intrometido. Ele não tinha nada que se meter naquela história, ele era apenas uma pequena parte dela, e não a mais importante, certamente... Atrapalharia mais do que ajudaria, no final das contas, isso era certo.

Por isso a necessidade de encontrar qualquer pista que os levasse na direção da pessoa que havia assassinado Danny Langdon... Da namorada misteriosa... De "G"... Enquanto o elevador subia vagarosamente, Melissa considerou seriamente a possibilidade de pegar o vídeo e levar ela mesma até Josh Bethel, sem esperar pela aprovação de Corey. Era uma confissão, era seu passaporte para a liberdade... E ele ainda assim preferia se deixar levar por sua teimosia... A cabeça de Melissa girou perigosamente e ela achou que fosse vomitar quando o elevador parou com um solavanco.

Era uma sensação já conhecida dos últimos dias. Dores de cabeça, enjoo, amnésia... Quando a porta do elevador abriu Melissa experimentou uma longa tontura. Tudo pareceu pequeno, então grande demais. Fechou os olhos com força, esperando que assim tudo aquilo passasse, que ela voltasse ao normal... Sentia tanta falta da normalidade... Não aconteceu. Fez força para lembrar, talvez ajudasse sua mente a se sentir mais tranquila. Sentiu que seu cérebro poderia explodir, mas não lembrou. Não se lembrou de muitas coisas, não se lembrou de aonde tinha ido após a briga com Corey e nem mesmo de alguns momentos antes de ele tomar o tiro... A porta do elevador fechou e ela ficou parada no andar por alguns minutos, até que alguém o chamou e ela se viu obrigada a subir até o 20º andar e então voltar ao seu.

Corey não demorou meio segundo para abrir a porta assim que Melissa bateu nela. Parecia que guardava a entrada, apenas à sua espera. Não seria uma novidade, dada a companhia que Melissa havia escolhido naquela manhã.

-Está tudo bem? – ele perguntou assim que colocou os olhos nela com mais cuidado, abandonando o olhar ressentido de encontro com Brian.

Melissa sentiu as mãos frias de Corey tomando seu rosto com delicadeza e o puxando para que o encarasse. Não estava bem e não seria sensato dizer que sim... Mas era um dia ruim para Corey, não gostaria de piorá-lo lhe informando a respeito de suas perdas de memória e dores de cabeça e tonturas e enjoos. Não era uma boa ideia.

-Eu acho que posso estar pegando uma gripe.

Ele franziu o cenho e seus olhos cerrados denunciaram sua incredulidade. Melissa também não teria acreditado.

-Parece que está passando por muito mais do que um início de gripe.

-Ah, quanto a isso você tem toda razão... – Melissa torceu os lábios.

Corey fez o mesmo e soltou um suspiro resignado.

-Peters fez algo a você? Disse algo a você?

-Não, ele não fez nada de mal para mim... – Melissa desviou de Corey e caminhou decidida até o sofá.

Precisava sentar, precisava de calma para raciocinar e tentar ajeitar, ao menos um pouco, o caos em que havia se transformado sua cabeça. Mal conseguia ouvir o que Corey dizia, seus ouvidos zumbiam.

-Então por que voltou com essa cara de quem viu um fantasma? – Corey parou e então continuou – Viu Barber outra vez?

-O quê? Não... Não a vejo há dias...

-Então qual o problema? – Corey sentou ao lado dela no sofá e a obrigou a encará-lo mais uma vez.

-Não há nada de errado, Corey, por favor... – Melissa abriu um pequeno sorriso – Vamos nos concentrar no que interessa no dia de hoje?

Ele a encarou por um breve instante, incisivo e invasivo, tentando desvendá-la como com frequência era capaz de fazer. Melissa achou ter escondido suas preocupações muito bem naquele momento. Ou então ele se lembrou de que dia era aquele, do que precisariam fazer naquele dia, do tipo de tragédia que teria que enfrentar em uma hora... Ele desviou os olhos para suas próprias mãos, que passaram a se entrelaçar nervosas.

Melissa aproveitou a deixa e o fato de que ele havia deixado aquele assunto de lado, ao menos por enquanto, e se aproximou. Acariciou os cabelos dele com delicadeza, esperando reconfortá-lo, e então o abraçou com força. Corey retribuiu seu abraço, rodeando sua cintura com seus braços fortes em um aperto de ferro. Melissa foi quem se sentiu segura ali, como se ele a disse com aquele simples gesto que tudo seria superado. Esperava que seu gesto demonstrasse o mesmo a ele, a pessoa que teria que ver a irmã que tanto amava sendo enterrada de longe, que não poderia se despedir adequadamente, que teria que dar seu adeus à distância...

-Ela está olhando por você, onde quer que esteja, Corey... Ela estará te ajudando, mexendo os pauzinhos lá no céu.

Ele soltou uma risada contida e então respondeu:

-Estamos precisando de qualquer ajuda, embora eu preferisse que ela continuasse nos ajudando aqui da Terra mesmo...

-Eu sei...

-O que mais me deixa revoltado... – Corey disse e então finalmente deixou o abraço se partir para que seus olhos azuis pudessem encarar os de Melissa – É não saber quem e por quê... Por que alguém gostaria de ver Carolyne morta? O que ela fez para merecer isso?

Melissa torceu os lábios.

-Acho que podemos deixar nas mãos da Scotland Yard, não? Não podemos assumir todas as investigações de morte que aparecerem à nossa frente.

-Eu não gostaria de ter que investigar a morte de ninguém. – Corey retrucou irritado – Acha que eu gosto disso?

-De maneira alguma. – Melissa levantou as mãos em posição defensiva – Nunca disse isso. Só acho que devemos nos concentrar em Danny Langdon e Barber agora... Assim que provar sua inocência poderá buscar justiça do modo convencional para a morte de sua irmã... Isso se ela não tiver algo a ver com a pessoa que estamos procurando.

Corey demorou um pouco, mas assentiu em concordância, embora claramente relutante.

-Carolyne não merecia isso. – foi o que disse, então levantou do sofá e sumiu pelo corredor.

Seus olhos estavam injetados, a pele vermelha e as veias mais expostas que o normal. Ele estava nervoso e Melissa preferiu deixá-lo sozinho naquele instante. Ele merecia respeito por seu luto.

A entrada do cemitério estava lotada de pessoas, inclusive da imprensa, Melissa notou assim que viraram a esquina. O carro alugado estava estacionado a alguns passos de distância e Melissa o olhou esperançosa. Talvez fosse melhor utilizá-lo já, talvez fosse melhor desistir daquela estúpida e suicida ideia. Ali ainda estavam protegidos de todos os holofotes, separados por alguns metros e uma coluna de pessoas. Mas não seria o suficiente, ela sentia isso. Sentia um cheiro de confusão tão forte que não conseguia se livrar da sensação incômoda em seu pescoço e costas. Outro peso daqueles.

-De onde surgiram todas essas pessoas? – Corey sussurrou ao seu lado, nervoso.

A mão direita dele segurava a dela com uma força além do normal e suava em bicas. Sua voz saiu até meio trêmula. Ele definitivamente não estava bem.

-Sua irmã não era uma garota popular?

-Não para juntar tanta gente assim em um funeral. – Corey balançou a cabeça em negação e bufou irritado – Devem estar querendo aparecer para o meu pai, duvido que a conhecessem de verdade. Isso é ridículo. – disse, virou as costas e passou a andar de um lado para o outro, como fazia quando estava nervoso e precisava pensar.

Melissa o pegou pelos ombros e o obrigou a parar.

-Se quiser desistir, eu vou entender... Há muita gente ali Corey, é muito mais arriscado do que estávamos esperando...

Ele apertou os lábios e respirou com força. Então fechou os olhos, levou as mãos às têmporas e assim permaneceu por alguns instantes. Usava o boné e óculos escuros, seu disfarce de praxe. Melissa tinha certas dúvidas quanto àquele disfarce em meio a sua própria família e pessoas que o conheciam... Ele seria reconhecido por um olhar mais atento e menos cético... Um olhar que não o enxergasse como uma assombração no cemitério, um olhar que não decidisse concluir que era apenas uma pessoa muito parecida... Alguém poderia tentar se aproximar, tentar confirmar suas suspeitas, alguém poderia fazer um escândalo apontando para o fantasma de Corey Sanders no enterro de sua irmã. Só de pensar no tamanho da confusão e em todas as possibilidades Melissa se sentiu cansada e soltou um suspiro resignado.

Corey ainda demorou mais uns instantes até deixar que sua teimosia falasse mais alto.

-Não vou me perdoar se não estiver lá. Já não posso me despedir dela apropriadamente...

Melissa revirou os olhos, cansada da teimosia, mas ainda assim foi capaz de compreender o que ele queria e por que ele queria. Faria o mesmo por seus irmãos, no final das contas.

-Tudo bem. – assentiu – Como espera passar por essas pessoas sem ser reconhecido? Elas te conhecem, Corey... E se Josh Bethel estiver ali? E se a Scotland Yard tiver montado uma operação ali? Apenas esperando por você?

-Achei que tivesse entendido por que preciso fazer isso...

-Eu entendi.

-Então por que está colocando tantos empecilhos?

-Não estou colocando empecilho nenhum, Corey, eles estão ali e eu estou tentando lembrá-lo de todos eles... Para que você possa se planejar.

-Tem outra entrada. – Corey disse, olhando por cima dos ombros e do outro lado da rua.

Ele pareceu finalmente entender que a situação era perigosa e que poderia haver mais policiais ali do que seriam capazes de lidar.

-Acha que pode chegar lá em segurança?

Corey mordeu o lábio inferior e maneou a cabeça, ainda olhando atentamente ao redor.

- É do outro lado, longe do túmulo da família... Imagino que sim. – assentiu e se aproximou de Melissa.

Tomou sua cintura em mãos com força e possessividade, como se aquela fosse a última vez em que faria aquilo. Melissa sentiu um frio na barriga percorrer logo em seguida todo o seu corpo. Pensar naquilo fez seu estômago enjoar. Não poderia ser um daqueles maus pressentimentos. Tudo daria certo. Um pensamento positivo não custaria nada. Um negativo poderia atrair uma confusão maior do que aquela em que estavam se metendo.

Quando o perfume de Corey tomou suas narinas, Melissa deixou-se fechar os olhos e aspirar com força. Ele aproximou os lábios do pescoço dela e ali depositou um demorado selinho. Foi quando Melissa abriu os olhos e encontrou aquele mar azul brilhante lhe encarando de volta.

-Vai dar tudo certo. – ele piscou e abriu um pequeno sorriso de canto de lábio.

Ela se esforçou para guardar aquele sorriso em sua memória, fazer com que fosse o combustível para continuar com aquilo até o fim. Então rodeou o pescoço dele com seus braços e beijou seus lábios com força. Seus olhos fecharam apertados enquanto aproveitava ao máximo a maravilhosa sensação de seus lábios juntos, porque era o que mais parecia certo em seu pequeno universo. Foi Corey quem se afastou e a lançou um olhar levemente preocupado.

-Não se preocupe. – pediu e tomou o rosto dela em mãos – Nos vemos daqui a pouco. Tente conversar com meus pais, por favor.

Melissa engoliu em seco e umedeceu os lábios enquanto assentia relutante.

-Boa sorte. – sussurrou quando ele se afastou.

E esperou que virasse a esquina e o perdesse de vista para cuidar de seus próprios deveres. A entrada do cemitério parecia ainda mais cheia. Especialmente de repórteres e câmeras de televisão. A inconveniência daquilo fez Melissa para por um instante e respirar fundo outra vez antes que juntasse as forças para dar os passos que a separavam da entrada do cemitério.

Melissa teve dificuldade para se enfiar no meio dos repórteres que ali se aglomeravam. Estavam à espera de alguém, concluiu, quando notou que todos olhavam para um mesmo lado da rua, ansiosos e nas pontas dos pés. Certamente os pais de Corey e o cortejo com o caixão. Ela baixou a cabeça e abriu espaço com os ombros entre eles, alcançando finalmente o portão de ferro escuro retorcido. Nunca havia gostado de cemitérios e toda aquela sensação de que algo daria errado só aumentou sua aversão a locais como aquele.

Dentro do cemitério, contudo, as coisas estavam mais calmas, embora a aglomeração de pessoas fosse maior do que a esperada para um enterro. Era como se uma pequena celebridade estivesse a caminho. Mais uma vez tentando passar sem ser notada, Melissa baixou a cabeça e caminhou calmamente entre os túmulos, buscando aquele que Corey lhe havia indicado como sendo o de sua família. Não precisou de instrução, contudo. Havia muitas pessoas ao redor ali também. Então Melissa deu um jeito de ficar em um local não tão próximo e nem tão distante. Não tinha como saber onde estariam o pai e a mãe de Corey, então sua estratégia estava suspensa por enquanto. Contudo, ainda tinha que se preocupar com Corey e seu posicionamento. Ela olhou ao redor e não o encontrou. Tentou não pensar que no caminho havia encontrado Josh Bethel. Porque ele não estava ali, ela logo notou. E não parecia haver qualquer policial por perto também, o que era um alívio, de certa forma.

A todo momento Melissa mudava o peso de seu corpo de um pé para outro, impaciente. Seus olhos varriam o local e as pessoas ao seu redor. Todas conversando aos cochichos, como se estivessem com medo de acordar os mortos. Não soube quanto tempo se passou até que algo acontecesse. O burburinho sussurrante cresceu, assim como o número de pessoas ao seu redor. Foi quando notou que uma coluna de pessoas vestidas de preto vinha andando naquela direção. Então lembrou-se de procurar por Corey mais uma vez. E lá estava ele, em uma colina distante, encostado em uma gárgula de pedra, olhando... Melissa esperou que ninguém mais se desse ao trabalho de olhar naquela direção e voltou sua atenção ao cortejo fúnebre que finalmente se aproximou.

Melissa identificou de cara a mãe de Corey. Um véu preto cobria sua cabeça, enquanto era amparada por uma garota que parecia estar no final da adolescência. Provavelmente uma sobrinha querida. Havia um lenço em suas mãos, que ela usava vez ou outra para enxugar os olhos que soltavam grossas e pesadas lágrimas. Ao lado dela, em posição ereta, queixo erguido, óculos escuros de grife cobrindo os olhos, estava o pai de Corey... Ar e postura de uma pessoa poderosa. Tinha os traços parecidos com os de Corey, porém mais duros e angulosos. Era um homem charmoso de cabelos grisalhos e corpo em forma. Melissa logo tirou tais pensamentos da cabeça, lembrando-se de olhar para Corey. Queria saber o que ele estava pensando lá em cima, vendo o pai pelo qual nutria tanto ressentimento... Queria estar ao lado dele para confortá-lo, abraçá-lo e dizer que tudo ficaria bem, ainda que não pudesse garantir que tudo ficaria bem... Não conseguia convencer a si mesma disso, essa era a dura e crua verdade.

O cortejo parou ao lado do túmulo já aberto na grama. Melissa se aproximou o suficiente para ver a nova lápide de mármore branco que havia sido disposta ali. "Carolyne Anne Sanders" era o que dizia. Tentando se aproximar também dos pais de Corey, Melissa deu a volta e quando o fez, seus olhos bateram na lápide que havia ao lado da de Carolyne.

"Corey Sanders"

Seu coração foi na boca quando leu o nome dele naquele objeto tão triste e fúnebre. Outro frio percorreu sua espinha, especialmente quando bateu os olhos na grama e notou que estava revirada. Era óbvio, o túmulo havia sido exumado há alguns dias. E Corey não estava ali, afinal de contas. Estava a longos metros de distância, assistindo a toda aquela cena com suas próprias lágrimas nos olhos. Melissa estremeceu e virou os olhos para outra direção. E quando o fez, toda aquela sensação ruim foi triplicada, porque quem enxergou entre as pessoas que acompanhavam a família de Corey foi a última pessoa que gostaria de ver na face da Terra.

Josh Bethel.

O maldito investigador Josh Bethel, sempre no lugar certo, na hora errada.

Melissa suspirou e rezou para não chamar a atenção dele. E cuidou, acima de tudo, para não olhar em direção ao local em que Corey estava, completamente inconsciente da presença do investigador. Então se posicionou atrás de uma estátua de anjo, de modo que ainda pudesse acompanhar o funeral, mas Josh Bethel não lhe visse, e pegou o celular. Digitou uma rápida mensagem para Corey e não teve coragem de olhar para ver se ele tinha recebido. Ficou pensando então como faria para conversar com a mãe ou o pai de Corey sem que Josh grudasse em seus calcanhares imediatamente. Não era segredo que faria isso. Não era segredo que possivelmente estava ali esperando encontrar Melissa. Ou Corey. Já que acreditava tão piamente que ele estava vivo...

Mais uma vez, Melissa tinha que admitir as habilidades do investigador e amaldiçoá-las com todas as suas forças. E agradeceu internamente quando o reverendo iniciou a cerimônia do funeral e chamou completamente a atenção de Josh Bethel e de todas as pessoas que estavam ali. Melissa, mais uma vez temerosa, recusou-se a olhar na direção de Corey. E esperou, afinal, que a grande asa de pedra daquela estátua de anjo a escondesse o suficiente de Josh Bethel enquanto pensava em uma estratégia de aproximação da senhora ou do senhor Sanders. Logo concluiu, contudo, que não havia meio de chegar a qualquer um deles sem chamar atenção. Especialmente de Josh Bethel, que estava tão próximo, quase como um guarda-costas, um cão de caça farejando sua presa.

Melissa não viu o tempo passar. Mal notou as belas palavras de despedida que foram ditas em homenagem a Carolyne. O tempo todo seus olhos estiveram focados no túmulo que pertencia a Corey enquanto tentava encontrar uma saída. Certamente as homenagens a Carolyne não foram extensas o suficiente. O cérebro de Melissa parecia congelado e tudo o que conseguia processar eram aquelas letras cursivas que compunham o nome de Corey no mármore. Tinha medo de que aquele se tornasse o local de descanso eterno de Corey como havia sido preparado desde o início. Isso porque aquele estranho frio na barriga que ia e vinha pra sua espinha não tinha ido embora.

Seus devaneios só chegaram ao fim quando notou a movimentação de pessoas em direção à saída do cemitério. Fazendo uma prece para uma divindade que frequentemente esquecia existir, ela saiu de trás da estátua de anjo e esperou pelo melhor, uma vez que o pior já lhe parecia uma certeza inevitável. Assim que se deixou aparecer sentiu os olhos de águia do investigador Josh Bethel queimando sua pele. Houve uma certa onda de arrepios percorrendo sua pele e ela respirou bem fundo antes de dar o primeiro passo até os pais de Corey. Não ousou olhar na direção de Josh e estranhou, porém agradeceu, quando notou que ele não estava se aproximando.

O senhor Sanders estava rodeado de repórteres, câmeras e microfones. Absolutamente inacessível. De certa forma, Melissa sentiu alívio por isso, porque não tinha muita certeza se teria coragem de falar com ele. Parecia um homem importante demais para ser incomodado por ela, uma reles médica que havia tratado seu filho renegado por um curto período de tempo em uma prisão. Não, não parecia provável que ele lhe daria atenção. A senhora Sanders, por outro lado, estava isolada dos repórteres, ainda chorando sobre o túmulo de Carolyne, amparada pela mesma garota que a havia acompanhado na entrada do cemitério. Havia um segurança próximo de um tamanho equivalente a um guarda-roupas que tinha o olhar persuasivo o suficiente para manter as pessoas afastadas. Ao menos as inconvenientes e os insistentes repórteres que faziam um barulho que certamente aquele cemitério jamais precisou suportar.

Melissa hesitou, ainda sob o olhar atento de Josh, podendo jurar que ele também sustentava aquele sorriso de canto de lábios, ainda que não se atrevesse a olhá-lo. Nem para Corey. Desejou que a mensagem tivesse chegado, ou que sua visão fosse boa o suficiente para notar que Josh Bethel estava ali. O segurança olhou feio para Melissa quando ela se aproximou, mas não fez menção de afastá-la. A senhora Sanders levantou os olhos marejados e inchados do túmulo de sua filha quando sentiu a aproximação de Melissa. Levou um milésimo de segundo para reconhecê-la, e quando o fez, para surpresa de Melissa, levantou e se aproximou. A garota continuou ajoelhada na grama, olhando para Melissa com cara de interrogação. Afinal, quem seria capaz de arrancar a senhora Sanders de seu luto àquela altura?

-Doutora Melissa... – ela disse, a voz embargada e falhando, enquanto tomava as mãos de Melissa entre as suas.

Melissa sentiu pena dela. Mal conseguiu imaginar a dor de uma mãe obrigada a enterrar dois filhos em menos de um ano. Excruciante e inconcebível, foram as palavras que encontrou para definir o indefinível. E então lembrou-se de que Corey estava vivo e bem e esperou que tudo desse certo para que aquela mulher tivesse um motivo para sorrir em meio a tanta desgraça.

-Senhora Sanders, meus pesamos, sinto muito por sua perda...

-Muito obrigada, querida, muito obrigada, está sendo muito difícil acreditar... Tão de repente, tão brutal...

-Eu sei, mal posso dizer que imagino a dor de vocês... Eu mal a conheci, mas sei que era uma pessoa incrível, Corey falava dela com tanto amor...

Nesse momento, a senhora Sanders se perdeu em mais um tanto de lágrimas, e Melissa se arrependeu de ter citado o nome de Corey. Certamente não era o momento certo e sua falta de tato e envergonhou.

-Desculpe, eu...

-Não, está tudo bem, querida. – ela apertou a mão de Melissa entre as suas – Meus dois filhos foram levados de mim, não estou reagindo muito bem a nada, você deve entender...

-Sim. – Melissa suspirou, e aproveitando seu já anterior momento de indelicadeza, perguntou o que a levara até ali, lembrando-se de que Josh ainda estava por perto, a observando – Vocês... Já sabem o que aconteceu? A polícia conseguiu descobrir alguma coisa?

-Bem, não... – ela enxugou as lágrimas – Ainda estamos tentando entender... Você viu os noticiários, deve ter visto como... Como ela... Como tudo aconteceu...

-Eu vi. – Melissa assentiu – Exatamente como Barber Paay...

-Não foi Corey, é claro. E nem antes. Não acredito agora que tenha sido ele, é o que eu digo! – ela disse para Melissa, e sua voz subiu algumas oitavas.

As lágrimas começaram a escapar descontroladamente em seus olhos, e Melissa notou que ela perdeu o controle.

-A polícia já investigou algo nesse sentido? Vocês tem alguém em mente?

-Não, não temos... Eu não sei o que a polícia anda fazendo! Eu disse a ele, àquele investigador petulante, eu disse "reabra o caso de Corey, olhe o que aconteceu agora" e ele disse que foi provavelmente alguém tentando copiá-lo... Bom, eu já não tenho tanta certeza assim!

Nesse momento, a garota finalmente se aproximou e voltou a colocar os braços em torno da senhora Sanders.

-Tia, acho que está na hora de irmos embora. – ela falou baixinho.

Melissa olhou ao redor e notou que muitas das pessoas observavam aquela conversa, incluindo os repórteres.

-Chelsea, esta é a doutora Melissa, ela cuidava de Corey no... Naquele lugar. – a senhora Sanders apresentou, parecendo ser capaz de voltar ao normal.

A garota voltou seus olhos azuis parecidos com o de Corey na direção de Melissa e abriu um pequeno sorriso.

-Como vai? – cumprimentou.

-Tudo bem, e você?

-Não muito bem, como dá para notar... – ela deu de ombros e torceu os lábios.

-Sinto muito. – Melissa disse.

-Que bom que veio prestar suas homenagens a Carolyne, doutora, ela gostava de você e somos todos agradecidos pelo que fez pelo nosso Corey... – a senhora Sanders tomou as rédeas da conversa novamente – Não sabemos quem poderia fazer isso com nossa Carolyne, assim como não sabemos que poderia ter feito aquilo com Barber, aquele anjo... Mas uma coisa eu lhe digo, doutora, ainda que continuem me chamando de louca, como vêm fazendo nos últimos dias, não foi Corey.

Chelsea puxou a senhora Sanders dando um último aceno amigável na direção de Melissa. Então os repórteres correram na direção dela. Os arredores do túmulo finalmente ficaram vazio e Melissa se pegou analisando a lápide da irmã de Corey. Sentiu quando ele se aproximou e parou ao seu lado.

-Achei que te encontraria aqui.

-Que coincidência, porque pensei o mesmo que você...

-Estamos em sintonia então, doutora Melissa.

-Não sei se fico feliz ou irritada com isso. – Melissa rolou os olhos – Precisa de alguma coisa?

-Ah, você tem várias coisas de que preciso... – ele disse e ela se obrigou a virar os olhos na direção dele pela primeira vez. Não gostou do sorriso que encontrou – Estou tentando vencê-la pelo cansaço.

Melissa teve que rir.

-Não há nada para vencer aqui, não estamos jogando.

-Eu gostaria de pensar que não, mas toda essa sua... Aura misteriosa... – ele estalou os lábios – Parece que você está jogando comigo.

-Eu não tenho culpa se você é paranoico o suficiente para achar que um cara morto está vivo e tem disponibilidade para me seguir por aí... Sua imaginação é bastante fértil, investigador. Garanto que não tenho qualquer intenção de "jogar" com você. Já disse tudo o que sabia e é a verdade. – Melissa finalizou, e seu tom foi definitivo. Seu olhar era duro, contudo, obviamente, não intimidou Josh como ela gostaria de ter feito.

Como se fosse capaz de intimidar um experiente e inteligente investigador da Scotland Yard...

-Eu... – ele começou a dizer, no exato instante em que o telefone de Melissa apitou.

Ela pegou o celular e o nome de Corey piscou bem grande na tela. Não houve tempo para escondê-lo de Josh Bethel, contudo. Ele havia sido mais rápido. E quando Melissa levantou os olhos em sua direção, o que recebeu em troca foi um olhar de puro triunfo.

Ele olhou ao redor imediatamente, como se através da mensagem tivesse começado a sentir a presença de Corey. Não demorou muito para encontrá-lo na colina. Ainda que distante, era possível reconhecê-lo resoluto vestido de preto em seu boné e óculos escuros.

Josh abriu um pequeno sorriso maldoso para Melissa e disse:

-Odeio ter que dizer que eu avisei.

Melissa tomou um susto quando ele começou a correr na direção da colina, foi repentino e inesperado. Era longe, e embora Josh Bethel mais parecesse um maldito corredor de maratona, Corey teria tempo de escapar se começasse a correr naquele instante. Mas ele não começou. Melissa ligou para ele e foi só quando o telefone vibrou em suas mãos que Corey pareceu perceber que alguém vinha correndo em sua direção. Continuou sem reagir, contudo, sem ainda reconhecer Josh Bethel e seu porte atlético.

-Corre! – foi o que ela gritou, quando ele atendeu ao telefone.

Não demorou um milésimo de segundo para obedecer a ordem que lhe havia sido dada. Melissa desligou o telefone e não ficou para assistir ao pior. Correu na direção da saída do cemitério, na direção do carro estacionado a meia quadra dali. Seu coração quase saía pela boca a essa altura e não se importou por chamar a atenção das muitas pessoas que ainda se acumulavam por ali. Todos os olhares curiosos se viraram para ela quando passou, uma ou outra pessoa tiveram que ser empurradas de seu caminho e não se preocupou em pedir desculpas. Enquanto passava entre os túmulos e atormentava o descanso dos mortos amaldiçoou aquele frio na barriga que ia para a espinha. Sim, estava certa, alguma coisa iria dar muito errado ali. Era óbvio, o plano era imbecil, havia muita gente... Como ele passaria despercebido? Contudo, mais uma vez, ficou com a sensação de que tudo havia saído dos trilhos por causa dela.

Por que olhou o maldito celular? Por que não cuidou para que ele não se aproximasse e não visse o nome de Corey? Por que havia gravado o nome de Corey naquela porcaria?

Um caos.

Melissa sentiu que ia desmaiar quando atravessou os portões de ferro do cemitério. Havia uma pontada incômoda em sua barriga, fruto de sua respiração errada em toda aquela corrida. Seu coração havia atingido um ritmo de batidas que beirava o desumano. As mãos suavam e o corpo todo tremia, mas foi capaz de continuar correndo pela calçada até chegar ao carro. A chave se enrolou para sair de sua bolsa e ficou pensando o que poderia fazer a partir dali... Estava pronta para fugir, mas não havia sinal de Corey... Não poderia simplesmente ligar para ele, não estava em momento de atender ligações preocupadas da namorada. Resolveu entrar no carro, dar a partida e deixá-lo a ponto de sair arrancando dali, esperando que Corey tivesse a mesma ideia que ela e saísse do cemitério em direção ao carro.

Melissa já estava pronta para dirigir o carro até a outra entrada do cemitério quando viu pelo retrovisor Corey virar a esquina. Ainda estava a três quadras de distância. Melissa olhou ao redor e calculou quanto tempo levaria para dar a volta e conseguir encontrá-lo no meio do caminho. Não havia tempo para isso. Seu desespero aumentou, contudo, quando logo depois Josh Bethel virou a esquina também, acompanhando admiravelmente o ritmo de Corey.

Melissa fechou os olhos e apenas rezou para que Corey conseguisse chegar até ali inteiro. Quando ouviu Josh Bethel gritar o nome de Corey, contudo, seus olhos abriram automaticamente e quase teve uma parada cardíaca quando viu a arma nas mãos dele apontando para as costas de Corey. Estava a duas quadras de distância.

-Pare, Sanders! – ele gritou outra vez.

Corey não olhou para trás. Tinha os olhos fixos no carro, como um corredor buscando pela linha de chegada.

-Acabou para você, Sanders! Pare ou eu vou atirar! – Josh gritou outra vez, a uma quadra do carro.

A essa altura todas as pessoas ao redor já haviam parado de fazer o que faziam para prestar atenção na cena de filmes de ação que se desenrolava. Melissa estremeceu quando o pai de Corey olhou naquela direção e seu coração quase parou quando viu a expressão de reconhecimento que tomou suas feições no exato momento em que reconheceu o filho.

Corey continuou a correr, ignorando o mundo ao seu redor. Estava a meia quadra do carro quando veio o tiro. Corey abaixou a cabeça, porém manteve seu ritmo. O tiro passou raspando por ele. Melissa duvidou que seu coração sobreviveria àquilo. Quando Corey chegou no carro, entretanto, certo alívio perpassou sua corrente sanguínea. Até outro tiro ser disparado e passar ao lado da cabeça dele. Melissa abriu a porta e Corey se jogou no banco do passageiro. Ela não deixou que ele fechasse a porta apropriadamente, arrancando com o carro enquanto cantava pneus.

O circo já estava armado, de qualquer forma.

Mais um tiro foi disparado e atingiu o vidro do carro, passando entre Corey e Melissa. Ela não desacelerou. Seu pé afundou o acelerador até atingir o assoalho do carro. Furou um, dois sinais vermelhos. Muitas buzinas soaram em descontentamento. Não havia um carro atrás deles. Josh Bethel não contava com um carro esperando por Corey.

Ponto para Melissa.

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