Águas de Março

By gisscabeyo

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Rio de Janeiro, berço do samba, das poesias de Drummond, da Boemia de Chico Buarque, das noites na Lapa, da G... More

Prólogo.
1 - Goodbye, USA. Olá, Brasil.
2 - Coisas que eu sei.
4 - Não era pra ser tão fatal.
5- Oblíqua e Dissimulada
6 - Ano novo, desejo antigo.
7 - Nosso jogo é perigoso, menina.
8 - Infinito particular.
9 - Boemia Carioca
10 - Quebrando tabus.
11 - Bom dia.
12 - Canto de Oxum
13 - Agradável e lento.
14 - Tempo ao tempo.
15 - Menina veneno.
16 - Contrapartida
17 - O que é meu, é seu.
18 - Colo de menina.
19 - Meu Pavilhão.
20 - Rua Santa Clara, 33.
21 - Sensações extremas.
22 - Aos pés do Redentor.
23 - Codinome Beija-flor.
24 - Cuida bem dela.
25 - Luz em todo morro.
26 - Queime.
27 - Azul da cor do mar.
28 - Revival
29 - Desague.
30 - Axé!
31 - Vamos nos permitir - part1.
Vamos nos permitir - part2.
32 - Idas e Vindas.
33 - A lua e o sol - part1.
34 - A lua e o sol - part2.
Bônus - Part. 1
Bônus - Part. 2
Spin off - part 1.
AVISO - LIVRO

3 - Mais do que oculta.

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By gisscabeyo




LAUREN POV

"Não se luta contra o destino; o melhor é deixar que nos pegue pelos cabelos e nos arraste até onde queira alçar-nos ou despenhar-nos."

- Machado De Assis


23 de dezembro.

- Acho que esse é grande demais pra mim, Tay.

Comentei com minha irmã no segundo em que colocamos os pés no que deveria ser o nono apartamento que visitávamos em duas horas. Ela já estava de saco cheio, eu mais ainda e o corretor nem se fala. A questão é que eu precisava de um espaço nem tão grande, nem tão pequeno. Era difícil achar alguma coisa no Rio de Janeiro que não fosse de extremos, essa cidade não tinha nada de mediano. Dei alguns passos em direção à varanda e suspirei ao ver a praia de Copacabana cheia. "Não é o mesmo bairro dos seus pais, mas nada que uma caminhada não resolva", pensei comigo mesma e sorri, alisando o corrimão da varanda. O celular de Taylor começou sua sinfonia insuportável e decidi dar uma volta pelo apartamento para ver se era um bom espaço pra uma mulher e um cachorro de pequeno porte.

O ambiente era bom, muito bom, para dizer a verdade. A sala ampla me daria o privilégio de colocar um piano, quem sabe. Eu só precisava comprá-lo, mas o problema é que eu não sabia se queria. Fiquei vagando pela varanda enquanto Taylor falava ao telefone e, quando ela terminou, veio de encontro a mim com um sorriso amarelo no rosto.

- Era Camila.

Ela disse sem que eu tivesse perguntado. A menção do nome daquela menina me deixava um pouco incomodada. Eu não sabia dizer o motivo, mas Camila me deixava bastante desconfortável. Não que ela fosse impertinente, ela não era, mas tinha algo comigo, dentro de mim. Todas as vezes que ela aparecia, sendo com sua personalidade animadinha ou com caras e bocas, Camila deixava o ar um pouco diferente; mais vivo e interessante.

- Ah sim! – abri um sorriso sem dentes para a minha irmã, enfiando minhas mãos nos bolsos traseiros do jeans que eu usava. – O que ela queria com você a essa hora?

- Laur, já são duas da tarde. – Tay rolou os olhos e eu soltei uma risada. – Quer ir ao cinema ver um filme que lançou há pouco tempo.

- Entendo. – dei de ombros e voltei a olhar a paisagem, me sentindo confortável com o lugar . – Tay, falando na sua melhor amiga... Precisa me dizer do que ela gosta, me falar um pouco sobre ela. Quero ter uma noção do que comprar.

Como se eu já não me sentisse desconfortável o bastante com Camila, ainda a havia tirado no amigo oculto que minha família resolveu fazer de última hora. Acho que não tinha como as coisas se tornarem mais estranhas. Taylor cruzou os braços embaixo dos seios, me olhando com olhos estreitos. Sua expressão era de quem pensava em algo, me fazendo trocar o peso de uma perna para outra porque eu sabia que levaria bons minutos.

- Bem, Mila gosta de coisas simples, não é chegada em luxo, por mais que leve uma vida rica. – Taylor ia dizendo com interesse enquanto gesticulava como uma professora. – Ama livros, MPB, é fissurada em Elis Regina e Chico Buarque, são os ídolos dela. É filha de Oxum... Hm, mais o quê... Ah, e coleciona disco de vinil. De qualquer cantor, ela apenas coleciona vinil. Eu acho isso meio estranho, mas Mila é estranha, então tanto faz.

Tay deu de ombros e eu abri um sorriso involuntário. Quer dizer então que a menina gostava de discos de vinil? Eu havia gostado daquilo, e ficado com uma curiosidade maior em outra questão.

- Oxum é...? – Perguntei com as sobrancelhas erguidas, um pouco envergonhada por não saber.

- Oxum é um Orixá do Candomblé, que é a religião da Camila. – Tay me explicou enquanto se aproximava, parando ao meu lado e se apoiando na grade da varanda. - É um pouco complicado para te explicar, você teria que sentar e estudar sobre, mas esse é o básico. Dentro da religião, que como você sabe, é de origem Africana, se é chamado de filhos de santo, entende? E Camila é filha d'Oxum.

- Como Iemanjá? – Perguntei ao olhar para ela, colocando uma mecha de cabelo atrás da orelha. – Eu só escutei falar de Iemanjá e liguei os pontos.

- Isso, Iemanjá também é um Orixá, considerada rainha do mar, das águas. Vai ver muita oferenda para ela na praia durante a virada do ano. É um ritual muito bonito.

- Tenho certeza de que é.

Sempre admirei religiões e seu poder de crença, por mais que seja ateia. O sobrenatural nunca foi algo que me chamou a atenção. Para mim, as coisas acontecem em decorrer das nossas escolhas e nós somos responsáveis por elas. Não acredito que haja uma força superior comandando tudo isso. Mas a quem acredita, meu eterno respeito e admiração.. e passei a admirar Camila por isso também.

- Então, pense em algo baseado em tudo isso para dar a ela, amanhã compraremos. Agora vamos decidir logo sobre esse apartamento porque Camila já deve estar chegando por ai.

- Ah.. você a convidou pra vir até aqui? – Taylor abaixou a cabeça e sorriu, como se tivesse sido pega em uma encrenca. – Não se preocupe, sei que vão sair e não faz sentido você ficar na rua esperando por ela.

- O plano original é te levar também.

- Como?! Tay, você sabe que estou atolada de trabalho pra fazer, a empresa abre logo depois do ano novo, tenho contratações pra cuidar e..

- Ai, quanto bla bla bla. Não quero saber quando sua preciosa Microsoft abre, você prometeu que me daria um pouco de atenção. Por favor, Laur, é só um cineminha, não vai matar o seu precioso tempo. Além disso, você precisa conhecer a Camila melhor.

- Por que?! Acho tão desnecessário quanto ir ao cinema com vocês ao invés de trabalhar.

- Porque você precisa saber o que falar na hora de falar sobre seu amigo oculto, não é? – dei de ombros e Taylor ouviu a campainha do apartamento, se afastando para atender. – A propósito, você pode fazer o show que quiser, sei que está louca pra conhecê-la também.

Minha irmã me deixou sozinha na varanda com meus pensamentos e eu parei por alguns segundos, pensando, refletindo no que Taylor quis dizer. Sim, eu queria conhecer Camila melhor, mas ao mesmo tempo achava que seria uma perda de tempo tentar desvendar alguém como ela. A garota era como o vento; impossível de se pegar. Escutei a voz das duas invadindo o apartamento vazio e virei nos calcanhares para dar uma olhada em Camila. O velho look carioca de verão estava presente em cada peça, mas com um toque sutil de estilo. Quando nossos olhos se encontraram, ela abriu um sorriso mostrando todos os dentes e caminhou até mim, estendendo a mão.

- Belo apartamento, gringa, quando se muda?

- Não sei se vou ficar com ele, ainda temos uns quatro para ver. – esfreguei o pescoço com um pouco de desconforto e vi o corretor por cima do ombro de Camila. – Apesar de achar que esse homem não está interessado em me mostrar mais nada, sempre acho algum defeito nos apartamentos que ele me mostra.

- Defeitos?! Não vejo nenhum nesse lugar. Se não se importa, vou dar uma olhada por aqui, se eu encontrar alguma coisa de errado, você não compra.

- Mas..

Camila virou as costas e iniciou seu próprio tour pelo apartamento de dois quartos. Era de fato muito bonito, com uma vista de tirar o fôlego, mas faltava alguma coisa para torná-lo perfeito. Talvez se eu tivesse trazido Joker, ele poderia dar o toque final. Taylor me abraçou pela cintura em um ato inesperado e eu lhe dei um beijo na testa, esquecendo um pouco do que estava acontecendo à nossa volta. Família era o meu bem mais precioso, tê-los por perto seria essencial pra que eu vivesse tranquila no Rio de Janeiro. "Francamente, ela está louca!", ouvi a voz de Camila falando alguma coisa com o corretor e fui de encontro a ela na sala. Cruzei os braços embaixo dos seios e Taylor fez o mesmo movimento, observando a garota sorrir enquanto apertava a mão do corretor.

- Sabe quais foram as minhas conclusões? – Camila perguntou se aproximando um pouco de mim e abriu os braços. – Esse lugar combina com você; branco, arejado e cheio de espaços vazios prontos pra serem preenchidos. Pode fechar negócio.

Taylor começou a gargalhar e puxou a garota para a varanda, me deixando a sós com o corretor. Ele ergueu uma prancheta e me convidou para sentar na única mesa com duas cadeiras que tinha no apartamento. Enquanto eu assinava os papéis no modo automático, a imagem de Camila continuava indo e vindo. Ela conseguiu dar o toque final, mostrou que não precisava de mais nada, mas.. como?! Rodei esse apartamento duas ou três vezes, tinha sempre alguma coisa faltando e basta ela aparecer, dar algumas voltas e fecho o contrato?! O corretor apertou minha mão com força e estendeu um chaveiro com três chaves prateadas; duas para a porta da frente e a terceira, da portaria. Taylor se aproximou e as puxou da minha mão, tirando uma e colocando em seu próprio chaveiro.

- Sabe como é, preciso ter um acesso à esse lugar, garantir que você não vai se isolar mais ainda e nunca mais sair.

- Não se preocupe, Taylor, ela não vai ficar reclusa. Esse apartamento não é pra alguém ficar preso nele, sinto como se fosse um ninho que os pássaros vão e vem o tempo todo. Entendem o que eu quero dizer?

Camila falou com os olhos fechados e quando nos encarou, deu de ombros, rindo do próprio monólogo. Levantei da cadeira e decidi explorar o apartamento de novo. As falhas tinham de estar ali, afinal, as vi da primeira vez que entrei aqui. Nada nos quartos, nem no banheiro ou na cozinha. Era como se o furacão Camila tivesse passado e levado tudo, sem deixar vestígios de destruição. Fiquei parada alguns segundos no meio da sala e Taylor me puxou pelo braço, apontando para o corredor.

- Vamos chegar atrasadas no cinema e não estou nem um pouco afim de perder esse filme. Gringa, você não se importa de ver um filme nacional, né? – tranquei a porta do apartamento e me virei para Camila, dando de ombros. – Imaginei. Bom, mesmo que se importasse, eu não podia fazer nada quanto a isso. Querendo ou não, você vai ao cinema conosco, apostei uma rodada de tequila com a Taylor que ia conseguir te tirar de casa e não costumo perder.


Nunca fui muito fã de cinema, ainda mais de uma língua que eu não tinha total controle, mas o filme que Camila e minha irmã escolheram me ganhou nos primeiros vinte minutos. Uma trama envolvendo a polícia e os bandidos do Rio de Janeiro, cheio de denúncias ao governo e às milícias, formada por PM's que comandavam o morro. Volta e meia, quando não conseguia entender o que eles estavam falando, parava para observar as pessoas dentro do cinema. Gostava de ver suas reações, o que estariam pensando, mas foi o olhar impressionado de uma pessoa que me prendeu por algum tempo; Camila. Enquanto devorava o balde de pipoca com minha irmã, a garota não desgrudava os olhos da tela, fascinada com o conteúdo do filme. A pouca luminosidade dava ao seu rosto contornos que a deixavam ainda mais bonita. "Espera, bonita?! Tem alguma coisa errada", me mexi com desconforto na poltrona e voltei a olhar para a tela. Mesmo que não estivesse entendendo algumas palavras, era melhor encarar o filme que o rosto da melhor amiga de Taylor. A verdade é que eu estava encantada pelo jeito livre, leve e solto de Camila. A maneira dela de ver as coisas, sempre de forma positiva, era capaz de colocar um defunto de pé. O exemplo claro disso foi o momento em que fomos comprar as pipocas; quando Taylor reclamou do excesso de manteiga, Camila deu de ombros e mostrou a língua, comentando com indiferença enquanto caminhávamos com o mar de gente até a sala do filme; "Vamos morrer de um jeito ou de outro e não sabemos quando. Posso tropeçar, cair na escada e quebrar o pescoço, por exemplo. Por isso, não vou desperdiçar a chance de comer o que eu gosto, se quiser, compre outro balde pra você", confesso que não segurei o riso, me rendendo um olhar feio de Taylor e um sorriso divertido de Camila. A menina sabia chegar no limite sem ultrapassar a linha.

- Ei, está entendendo bem? - fui tirada do meu transe parcial pela voz dela, me fazendo encara-la. - Algum problema? Se não gostou, podemos sair e ver outro.

- Não, está tudo bem. Não é muito difícil de entender o que eles estão dizendo, só algumas gírias que complicam.

- Tipo qual? Talvez eu possa traduzir algumas pra você.

- Hamm.. caralho, porra, puta que pariu, coé. - usei um português carregado e Camila segurou o riso, talvez por educação. - Acho que são palavrões em sua maioria. Não consigo pronunciar direito.

- Olha, até o coé você pode usar o fuck. Convenhamos, o inglês não tem muitas variações de palavrão, essa dádiva é dos brasileiros. Quanto ao coé, é como um hey ou hi. Algo bem informal.

- Entendi. Obrigada pela dica, agora vou compreender oitenta por cento do filme.

Camila não se segurou e riu um pouco mais alto, fazendo uma sinfonia de 'shhs' se elevar na sala. Taylor olhou para nós duas com curiosidade e me encarou por alguns instantes com um sorrisinho no rosto, mas parou quando Camila falou alguma coisa no ouvido dela. As duas cochicharam entre si e voltaram a assistir o filme. Naquela sala escura, me peguei imaginando o quão interessante seria pegar a mão de Camila, sentir a pele macia e bronzeada de sol, o cheiro, o gosto e.. "Deus, eu preciso sair daqui e respirar um pouco, isso não é normal", levantei da cadeira em um solavanco e disparei para fora da sala de sessão, deixando Camila e Taylor com cara de azulejo. Voltar a ver o filme estava fora de cogitação e como ainda faltava uma hora e meia para terminar, decidi dar uma volta pelo shopping, talvez encontrar o que dar de presente para Camila.


Visitei dez lojas, todas pareciam clichês demais, caras demais para gostos tão peculiares como os da garota, extravagantes comparados à simplicidade de como Camila vivia apesar da boa condição financeira. Comprei um sundae de chocolate e sentei do lado de fora do shopping, observando o Sol se pôr entre os prédios. A cada colherada, tentei imaginar no que cada uma daquelas lojas podia me oferecer e que combinasse com Camila, mas o estoque que minha memória fotográfica tinha organizado foi descartado na mesma velocidade que apareceu. "Não vou acabar encontrando nada e vou ter que dar biscoitos caseiros ou uma poesia meia boca. Droga, Lauren, assim não dá", discuti comigo mesma enquanto limpava um pouco de sorvete que sujou meu queixo. Talvez fosse a quantidade de glicose ou o esporro mental, mas ao jogar o copo do sundae na lixeira, reparei em um loja pequena que as portas davam para a rua. Os dizeres "A Casa Do Antigo Mundo Da Música" estava iluminado por luzes em neon recém acendidas e a fachada era coberta de discos de vinil antigos, fitas cassete, fotos de cantores famosos nos anos cinquenta, sessenta, setenta. O verdadeiro túnel do tempo estava bem ali, a um par de passos de distância. Coloquei as mãos nos bolsos e quando passei pela porta, o cheiro antigo preencheu minhas narinas e abri um sorriso, me sentindo estranhamente confortável. Joana, minha amiga de setor na Microsoft nos Estados Unidos, seria capaz de ter oito filhos com a emoção de achar um lugar como esse. Parecia que o Rio de Janeiro tinha crescido à sua volta e a loja ficou intacta, talvez por ninguém ter coragem de colocá-la abaixo ou reformá-la. Não tinham muitas pessoas, talvez duas ou três, tirando o atendente que caminhava entre os corredores e uma senhora de idade atrás do balcão. A melodia de Garota de Ipanema ressoava pelo ambiente através das caixas de som e reparei nos outros clientes murmurando com ela. Parei em frente a uma sessão de MPB e tirei um vinil do Chico Buarque, avaliando seu estado; "A capa está um pouco gasta, mas isso só mostra quantas vezes ele foi pego para que os outros pudessem apreciá-lo. Será que ela vai gostar desse aqui?", fiz inúmeras perguntas mentais até que o rapaz se aproximou com um sorriso simpático.

- Posso ajudá-la? Sou Cauã.

- Lauren. - apertei a mão do rapaz e ele me lembrou dos adolescentes cheios de hormônio que conheci na época de faculdade. - Olha, eu não sou brasileira, como você já deve ter reparado no meu sotaque, por isso preciso da ajuda de alguém que entenda muito da música daqui.

- Ah, muitos gringos vem aqui na loja durante a alta temporada, já estou acostumado. - a palavra "gringos" me fez revirar os olhos e o menino percebeu, pois coçou a nuca. - Temos uma grande variedade de bons cantores brasileiros, mas os mais procurados no vinil são os da velha guarda da MPB. Muita gente vem procurar por Tom Jobim, Chico Buarque, Elis, Bezerra da Silva, Toquinho. Você pode escolher qualquer um que não vai se arrepender.

- Acho que vou precisar de uma cesta, vocês têm uma por aqui?

O adolescente saiu desembestado para trás do balcão, acordando a idosa que cochilava tranquila sentada na cadeira. Quando me estendeu a cesta, me pediu para ficar à vontade pra escolher o que quisesse e se precisasse de alguma coisa, era só chamar. "As pessoas no Brasil são mais simpáticas que nos Estados Unidos, não tem comparação", pensei com um sorriso no rosto enquanto tirava dois ou três vinis de cada sessão e colocava na cesta. A melodia de Garota de Ipanema continuava a tocar nos alto-falantes e só foi interrompida por uma mais agradável. Minha vontade de deixar aquela loja estava nula, se tivesse um café, seria impossível me fazer sair de lá. A baixa luminosidade dava um ar confortável ao lugar, sem contar com a decoração. Poderia pedir por um painel do igual ao da loja para colocar no apartamento. Nem percebi que ao invés de escolher os discos para Camila, estava pegando alguns para mim. Teria que comprar uma vitrola, mas isso não seria problema, a modernização dos aparelhos antigos trouxe facilidade para encontrá-las em qualquer loja de som. Depois de procurar por mais alguns, coloquei a cesta com belos vinte discos e a idosa atrás do balcão ajeitou os óculos no rosto enrugado.

- Você parece muito interessada na música brasileira, moça.

- Ah.. vim procurar um presente de amigo oculto e acabei me interessando, bossa nova é muito bonita. Aliás, a senhora sabe dizer onde posso encontrar uma vitrola?

- Tem uma loja no shopping, eles têm muitos estilos. Eu, para falar a verdade, prefiro a velha e clássica, gosto de coisas antigas. – observei a idosa passar a ponta dos dedos por um aparelho com uma película mínima de poeira encobrindo a tampa e sorri. – Os antigos passam a verdadeira essência da música, você consegue sentir o que as pessoas há anos atrás sentiram, na mesma sintonia. Essas vitrolas novas não passam a mesma coisa, vá por mim, já tentei. Se você ainda estiver interessada em comprar uma nova, a loja fica no segundo andar do shopping, mas se quiser uma antiga, posso te vender uma que chegou ontem na loja, está nova.

- Se está nova, por que gostaria de vender pra mim? Por que não troca a sua velha por essa que chegou ontem?

- Porque meu marido passou a vida toda escutando seus discos nessa vitrola, quando a agulha desce e se encontra com um vinil, liberando a música que ele esconde, sinto meu velho comigo. Entende, moça? Não é porque chegou algo mais bonito e decente que vou trocar minha velha companheira. Como eu disse, se quiser comprar, faço por trezentos reais tudo; a vitrola e os discos.

Apertei a mão da idosa e Cauã trouxe a vitrola do estoque, meus olhos brilharam. Um belo gramofone, precisando apenas de um polimento, foi colocado na minha frente. A idosa, que descobri se chamar Olga, soltou uma risada com minha aparente admiração pelo objeto que eu tinha acabado de comprar. Conversamos por mais uma hora, ela parecia conhecer de tudo um pouco, inclusive me deu dicas de como presentear uma pessoa que mal se conhece no amigo oculto. "Olha, quando tive que fazer isso, acabei casando com a pessoa que eu tirei. Não se assuste, não estou dizendo que isso vai acontecer com você, mas nunca se sabe o que pode nos esperar quando abrimos o papel e lemos um nome que não é familiar", foram as palavras dela antes do meu telefone explodir em um toque comum. O nome de Taylor brilhava no visor e pedi licença a Olga, me afastando para atender a chamada.

- Você sabia que é muito feio sair no meio da sessão e não voltar?! Tudo bem que o filme não é lá essas coisas, mas caramba, Lauren, isso foi golpe baixo.

Esperava ouvir a voz da minha irmã, mas foi Camila quem começou o falatório do outro lado da linha. Ela parecia se divertir às minhas custas, mas ao mesmo tempo, se preocupava se eu estava confortável com uma coisa ou outra. Tratei de encurtar o assunto e disse onde estava, que fez Camila soltar um gritinho empolgado. "A paixão por discos de vinil. Só espero que ela não compre os que eu planejei dar de amigo oculto", voltei para o balcão e Olha voltou a sorrir, me analisando por trás das lentes dos óculos de grau. Camila e Taylor apareceram dez minutos depois e o furacão carioca se espalhou pelas sessões de discos antigos. Minha irmã decidiu ignorar o pequeno surto da amiga e se aproximou de mim com um sorriso, me dando um beijo na bochecha.

- Você não perdeu nada, o filme era mesmo uma droga e..

- Taylor, você precisa ver isso! São maravilhosos, ai meu Deus, que capa linda!

Escutamos a voz de Camila nos fundos da loja e Taylor pediu licença, se arrastando em direção à amiga. Olga gargalhou e negou com a cabeça enquanto a garota corria de um lado para o outro, puxando discos e mostrando para minha irmã, que parecia pouco interessada. Bastaram meros dez minutos para Camila escolher trinta vinis, levando com um sorriso infanto-juvenil até o balcão. Nossos olhares se cruzaram e ela piscou, brincando com a aparente inocência que a situação dava ao seu jeitinho. Reparei no perfil dela, no quanto o queixo fora desenhado com perfeita sintonia com a boca, fazendo uma curva cuidadosa que contra a luz, davam a Camila uma beleza de tirar o fôlego. Vi o brilho nos olhos enquanto ela passava disco por disco para Olga, parecendo uma criança que recebeu o melhor presente da vida. Consegui ver que nenhum deles eram iguais aos que eu comprei e dei meu trabalho por completo. Recolhi minhas coisas e me afastei, balançando a cabeça para afastar certos pensamentos que me incomodavam de uns dias para cá. Esperei minha irmã e Camila perto da porta e me despedi de Olga, agradecendo mais uma vez pelo gramofone. Quando nos aproximamos do carro, senti alguém segurar o meu braço e suspirei aliviada ao ver os olhos de Taylor me encarando com curiosidade.

- Sabe, você esteve bem estranha hoje. Acho que foi desde o minuto em que a Camila te fez assinar os papéis do apartamento, quer dizer, se não tiver gostado, não precisa..

- Eu gostei do lugar, só que estava vendo defeito onde não tinha, talvez por não querer sair de casa tão cedo. Tudo que a Camila fez foi me ajudar, só isso.

Abri a porta do carro e olhei em volta procurando pela amiga da minha irmã, que vinha toda desengonçada carregando duas sacolas com discos. Rezei para que ela não tropeçasse, mas talvez os orixás, como Taylor diz, não estivessem do meu lado no momento. Camila escorregou em um sorvete derretido e o sapato a fez derrapar, abrindo um perfeito espaguete no meio do corredor. Corri em direção a ela enquanto Taylor abraçava a lataria do carro de tanto rir. Minha gargalhada estava presa na garganta, mas a preocupação para saber se Camila estava bem ou machucada era maior. Quando me aproximei, ela gemia um pouquinho de dor, tentando inutilmente sair da posição embaraçosa em que se meteu. Segurei seu corpo pelo tronco e a ergui, fazendo com que ambas tropeçassem. Se não fosse por um carro estacionado, teríamos ido direto para o chão. O olhar de Camila leu meu rosto por alguns segundos e senti meu corpo suar frio com a aproximação daquela menina, mas consegui respirar quando ela se afastou, parecendo desligada.

- Malditas crianças, fico puta quando derrubam essas merdas no chão e tropeço como uma imbecíl desligada. Porra! – o festival de xingamentos dela fez a minha gargalhada destrancar e explodi, a fazendo erguer uma sobrancelha. – Que foi, nunca viu ninguém caindo?!

- Não com tanta classe, tem certeza que não quer largar engenharia química e tentar um curso de ginástica?! Sua elasticidade é ótima!

Taylor, que até então tinha conseguido se controlar, berrou de novo e a acompanhei, recebendo bolsadas de Camila até o carro. Ela pareceu realmente incomodada por ter caído de uma maneira tão majestosa, bem que Taylor comentou que são apenas pequenas coisas que tiram a garota do sério. Decidi ignorar a risada presa e dirigi até em casa, percebendo que a noite já estava pronta para derramar seu véu sobre nossas cabeças. A chegada ao prédio não melhorou muito o humor de Camila, que entrou no elevador respirando fundo e nem sequer se despediu quando paramos em seu andar. Fiquei alguns instantes estática e Taylor revirou os olhos, esfregando as têmporas para buscar paciência.

- Odeio quando ela faz isso. Camila não sabe rir da própria desgraça algumas vezes, ai acontece esse tipo de coisa. Francamente, não achei nada demais.

- É.. mas o tombo foi magnífico.

Nós duas nos olhamos por alguns segundos e começamos a rir de novo, algo que invadiu os corredores e intrigou nossos pais quando chegamos ao apartamento. Amanhã seria véspera de natal. Amigo secreto. Camila emburrada recebendo meu presente. Uma possível retaliação da parte dela se eu não fizer alguma coisa antes. Joker pulou nas minhas pernas e decidi sentar na varanda com meus pais, contando sobre o apartamento e mostrando as fotos. Ambos acharam o lugar perfeito, enfatizando que o bom gosto de Camila foi crucial para que ele fosse escolhido. Sorri sem jeito para os dois e olhei o mar, se perdendo no seu próprio horizonte. "Talvez uma desculpa não faça mal a ninguém".


24 de Dezembro. Véspera de Natal.

- Lauren, tire o Joker agora mesmo de perto da árvore de natal!

O grito da minha mãe me acordou por volta das dez da manhã, horário em que eu não planejava, sob hipótese alguma, já estar de pé. Taylor encontrou comigo no corredor e a expressão dela dizia a mesma coisa; estava puta. Passamos a madrugada inteira jogando conversa fora, ouvindo alguns dos vinis e embrulhando presentes. Nossa árvore parecia uma montanha colorida e no meio de tantos embrulhos, estava Joker. O filhote parecia estar se divertindo, porque cada vez que minha mãe se enfiava entre as caixas para tirar o cachorro de lá, ele se escondia, saindo e voltando para o mesmo lugar. Foi a minha presença que o fez sossegar, pulando no meu colo enquanto me joguei no sofá para voltar a dormir. Lógico que na véspera de natal meus pais não me dariam folga, por isso, nem sei contar quantas horas perdi na rua comprando coisas esquecidas das listas do mercado ou um enfeite que falta aqui e ali. Quando consegui parar em casa pra tomar banho, já beirava onze horas. Faltava pouco mais de uma hora para Camila chegar e eu teria que pedir desculpa pela noite anterior, a não ser que ela não estivesse mais chateada e nada daquilo fizesse sentido.

- Já sabe o que vai falar sobre a Camila? – Taylor entrou no meu quarto com um vestido vermelho e abri um sorriso, analisando seu corpo. – Por favor, pare agora mesmo de me olhar de cima a baixo. Precisa de alguma ajuda? Posso chamar a Normani.

- Só estou com dificuldade de fechar esse zíper e..

- Eu ajudo. – minha irmã e eu olhamos na direção da porta e Camila estava com um sorriso no rosto, com os braços cruzados embaixo do peito. – Você nunca ia fechar esse vestido sozinha, de onde tirou essa ideia? Nunca usou um desses?

- Já, mas acontece que não sou um polvo pra ter vários braços. Emergências ocorrem o tempo todo, por isso você está aqui pra me salvar.

Minha pequena comparação fez Camila respirar fundo e revirar os olhos. Ela terminou de fechar o meu vestiu e saiu do quarto com Taylor em seu encalço. Ajeitei o vestido branco com detalhes em vermelho, coloquei o salto e fiz meu caminho até a sala, onde minha mãe já estava se preparando para fazer o amigo oculto. Chequei o relógio e faltavam dez minutos para meia-noite. Camila e Taylor conversavam na varanda e gesticulavam tanto que pareciam maestros regendo uma orquestra. Peguei a primeira taça de champagne e sentei no sofá, tirando o iPad da mesa de cabeceira para ver algumas coisas da empresa. Quando dei por mim, todos já estavam sentados, apenas esperando que eu largasse "o maldito e estúpido trabalho", como dizia Taylor.

Tive a sorte de não ser a primeira, a oportunidade de ver e conhecer um pouco mais sobre os outros era fascinante. Troquei olhares com Camila muitas vezes e ela sorriu, dizendo de longe que estava tudo bem. Acompanhavam o movimento dos lábios dela e fiquei hipnotizada, voltando ao normal quando Normani anunciou Taylor como sua amiga oculta e as duas fizeram alguma dança no meio da sala, arrancando risadas de todos. Respirei aliviada quando minha irmã me descreveu um pouco e me deu um livro com poesias brasileiras. Meus olhos brilharam ao ver a capa verde e amarela com letras douradas. Enchi a bochecha da minha irmã de beijos e quando tentei sentar, minha mãe me interrompeu.

- Filha, agora é a sua vez de falar quem é seu amigo oculto.

- Ah.. claro, eu já sabia. – coloquei os óculos de grau, segurei o embrulho e parei no centro da meia lua, com todos os olhares em mim. – Bem, como todos já sabem, eu sou nova no pedaço, por isso não tenho ideia de como isso vai sair. Desculpa a todos os envolvidos, primeiramente. – houve uma sinfonia de risos e Camila sorriu pra mim, parecendo mais tranquila do que no nosso primeiro encontro. – A minha amiga oculta é uma pessoa que pra mim, continua sendo oculta. Olho pra ela e não consigo ver com clareza o que tem por dentro, talvez seja essa a maior aventura pra quem acaba de ter um primeiro contato. Quando eu digo que as pessoas são difíceis de decifrar, não estou mentindo. Caramba, posso programar um jogo novo em algumas horas, talvez eliminar um vírus perigoso de um software. Posso inventar uma campanha para determinado produto em quinze minutos, mas as pessoas.. nossa.. são mais complexas que códigos e sistemas. A minha amiga oculta pode ser comparada a um ataque viral ao computador central da minha cabeça, cheia de artimanhas para escapar das minhas redes de bloqueio e.. – todos ficaram em silêncio e eu respirei fundo, me arrependendo um pouco por ter feito algumas comparações. – Cortando todo o papo nerd, vamos direto ao ponto. Minha amiga oculta é uma garota cheia de sonhos e manias, com um coração enorme pelo que já ouvi falar e excelentes habilidades de ginástica. Minha amiga oculta é filha de Oxum, orixá que representa o amor, a beleza, o ouro. Dança samba e só pensa em se divertir. Minha amiga oculta é uma garota que eu tenho certeza que será uma grande mulher. Feliz natal, Camila.

O silêncio foi quebrado por Taylor batendo palmas, seguida dos outros presentes. Alejandro estava com o cenho franzido, assim como meu pai, mas os dois começaram a gargalhar com uma dancinha da felicidade feita por Sofia. Me abaixei para dar um beijo na cabeça da pequena e quando me endireitei, estava frente à frente com Camila. Estendi o presente a ela e com um sorriso acanhado, impressionante vindo da parte dela, desembrulhou o pacote e soltou um berro de comemoração. A garota me apertou em um abraço forte e caloroso, que devolvi na mesma intensidade. Quando nos afastamos, parecia que o mundo tinha parado de rodar por alguns instantes. Eu sabia quem ela era, Taylor já tinha feito o trabalho de me informar sobre até o tipo sanguíneo de Camila, mas não pude deixar de reparar no quão bonita ela estava com aquele sorriso no rosto. Precisei me sentar para que ela anunciasse que tinha tirado Andrea como amiga oculta, mas meus olhos me impediam de sequer voltar ao trabalho, Camila tinha roubado toda a minha atenção.

- Vamos comer, por favor! Papa, estou fome e já deu meia-noite, você prometeu!

A voz de Sofia me tirou do transe parcial e a segurei pela mão, levando a pequena até a mesa. Todos pareceram perceber que comer depois de um amigo oculto com aquele desfecho seria a melhor coisa a se fazer. Fazia anos que não passava um natal tão agradável, sem contar que estava com a minha família de novo e nada mais importava. Trocamos ideias na mesa, comentamos sobre o ano, minha vinda para o Brasil, os hobbies e do que estava gostando mais no Rio de Janeiro. Foram risadas, brindes com champagne e vinho, jogos de carta e música antiga. Me senti completa pela primeira vez desde que tinha me separado dos meus pais e até então, aquela era a melhor sensação até agora.


Quando o relógio da sala marcou três da manhã, Alejandro se despediu de mim com uma Sofi adormecida no colo, agradecendo pela noite. Camila ficaria para passar a noite, implorando ao pai que tinha assuntos para tratar na praia no dia seguinte e seria impossível dormir em casa. Nem mesmo Alejandro acreditou na história, mas começar uma discussão dentro da casa dos outros não era algo que ele parecia fazer. Dito assim, ele entrou no elevador e tranquei a porta, fazendo meu caminho até meu quarto. Joker estava adormecido na minha cama e depois que troquei o pijama, decidi beber um copo d'água para evitar a ressaca. Quando cheguei na cozinha, vi a geladeira aberta e reconheci aquelas pernas morenas de praia. Esperei alguns segundos até que ela fechasse a porta e desse de cara comigo ali, parada observando-a. Não deu outra; Camila deixou outra garrafa cair no chão, mas pelo menos não era de vidro.

- Porra, você me assustou.

- Se assusta muito fácil, deveria ter colocado isso no que disse sobre você no amigo oculto. – levantei a garrafa do chão e me servi com um pouco de água. – Por que não vai dormir? Se vocês pretendem ir à praia amanhã, sugiro que deite agora mesmo.

- E quanto a você? Não acha que mereça descansar?

- Ainda tenho muito trabalho pra fazer, mas agradeço a preocupação, menina.

- Tudo bem, vou dormir mesmo, preciso de uma boa noite de sono se quiser impressionar no vôlei amanhã. Ei, você deveria vir assistir, é bem legal.

- Se eu acordar a tempo, posso pensar em ir.

- Você quem sabe. – Camila se aproximou de mim, me deu um abraço e um beijo na bochecha, se afastando. – Obrigada pelo que disse sobre mim no amigo secreto, acho que nunca percebi como eu sou.. bem.. até hoje. Foi o melhor natal de todos, acho que devo isso a você. Boa noite, Lauren.

Fiquei parada feito um poste no meio da cozinha e não me mexi quando ouvi a porta do quarto da minha irmã abrir e fechar. Alguma coisa nessa menina mexia com o que eu tinha deixado dormir por muito tempo, como se fosse um enorme despertador interno. Passei a ponta dos dedos pela bochecha e sorri, negando com a cabeça; "É, Camila, foi o melhor natal de todos".


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