*Narrador
*12 de Junho de 1988 - 19h00 P.M*
Sérgio suspira ao colocar o telefone no gancho e escuta Samuel dar risada.
- Passar o primeiro dias dos namorados com a namorada longe da namorada. - ele provoca o irmão. - Que azar.
- E você vai pra onde vestido desse jeito? Essa camiseta é minha?
- Vai ter um baile lá no clube do Cecap, eu vou com o Dinho e o Bento e o Júlio vão nos encontrar lá, vamos? - Samuel pergunta, ignorando o fato de estar usando a camiseta do irmão.
- Não, estou velho pra ficar andando com a pirralhada. - ele responde e Samuel revira os olhos.
- Você só tem dezenove anos e o Júlio é mais velho que você e vai. - Samuel fala pegando as chaves do carro do pai e jogando para o irmão. - Leva a gente pelo menos, quero chegar cheiroso e se eu for a pé vou chegar suado.
- Você nunca está cheiroso, Samuel. - Sérgio provoca o irmão que apenas fecha a cara. - Vamos logo que eu quero voltar pra assistir o filme que vai passar.
Ambos saem de casa e entram no carro que o pai tinha. Em poucos minutos Sérgio estaciona em frente a casa de Dinho e desce do veículo, seguindo até o portão que estava encostado.
- Folgado, hein. - Samuel fala ao descer do carro e ver o irmão entrando na casa dos Alves. - A Diana e o Dinho já estão brigando.
- Lá não é lugar para pirralha, mãe. - Dinho fala irritado. - E desde quando Diana usa maquiagem? - a voz enciumada do garoto fez com que Maria desse um sorriso.
- Boa noite, crianças. - ela deposita um beijo na cabeça de cada um dos Reolis. - Filha, você só vai se o Dinho te levar, a mãe não pode fazer nada. - ela fala e acaricia o rosto da filha, antes de voltar para a cozinha.
- Você não vai! - Dinho fala irritado e Diana suspira.
- Você nunca me deixa fazer nada, Alecsander. - a voz chorosa da garota fez que Sérgio encarasse Dinho de forma séria, que por sua vez revirou os olhos.
- Nem vem se meter, Sérgio. - ele fala irritado. - Você ouviu a minha mãe, ela só vai se eu quiser levar e eu não quero!
Diana olha para Sérgio buscando refúgio no rosto do mais velho, seus olhos marejados e a ponta do nariz vermelho indicavam que a menina estava prestes a cair no choro e aquilo amolecia o coração do Reoli.
- Por que ela não pode ir? - Sérgio pergunta e Samuel dá risada.
- Sabia que ele iria se meter. - ele resmunga e leva um beliscão do irmão.
- É um baile de dia dos namorados, onde os garotos vão atrás de... - Dinho respira fundo. - Ela não vai, eu quero me divertir e não quero ter que ficar cuidando de ninguém.
- Eu já tenho quatorze anos, Alecsander! Não preciso que fique cuidando de mim. - Diana esbraveja.
- E eu tenho dezessete e estou mandando você ficar em casa! - Dinho retruca. - Você sabe qual é a intenção dos rapazes que vão pra esse baile, Sérgio.
- A mesma que a de vocês? - Sérgio cruza os braços e Dinho suspira.
- Não vou mudar de ideia. - ele fala de forma séria e Diana segue em silêncio para o quarto.
- Uma hora ela vai crescer e você não vai conseguir prender ela em casa, Dinho. - Sérgio alerta o amigo que apenas da de ombros.
- Eu amarro ela no pé da cama, quero ver sair. - ele resmunga e Samuel dá risada.
- Vamos logo, eu levo vocês. - Sérgio fala e os três seguem para fora de casa.
No caminho para o clube ele escutava Samuel e Dinho conversando animados sobre o que esperavam da noite e tentando convencer o mais velho a ficar e participar da festa com eles. Mas Sérgio recusou, ele não tinha vontade de ir para um baile sem a namorada e como Cláudia estava viajando para o interior de São Paulo, ele preferiu ficar em casa.
Mas ao deixar os garotos na frente do clube, mudou seus planos, passou em uma padaria e seguiu para a casa dos Alves.
Dessa vez o portão já estava trancando e ele precisou tocar a campainha.
- Sérgio, que surpresa boa! - José fala ao abrir a porta da sala e ver Sérgio no portão. - Esta sumido, rapaz.
- Trabalhando muito, tio. - Sérgio sorri e abraça o mais velho assim que ele abre o portão. - Eu vim assistir um filme com a Di, posso?
- Por favor! Ela está toda deprimida que o irmão saiu e não a levou. - José sorri e fecha o portão. - Crianças, sabe como são.
- Prometo não demorar, fiquei de buscar eles e decidi vir ficar um pouco com a Di.
- Fica em paz, meu filho. - José aperta o ombro de Sérgio enquanto eles entram na casa. - Eu gostaria mesmo é que você dormisse aqui, é capaz que Bento, Júlio e o Samuel durmam aqui após o baile.
- Se não for incomodar.
- Você nunca incomoda, rapaz. - ele sorri para o garoto. - Diana está no quarto e se você me der licença, vou ir deitar, estou cansado demais.
- Boa noite, tio e muito obrigado.
- Boa noite, fio. - José se despede e segue até seu quarto, fechando a porta.
Sérgio segue até o quarto de Dinho e Diana e bate na porta, ele abre a mesma ao ouvir um "Entra" baixinho. Diana que estava encolhida na cama, se senta confusa ao ver o Reoli.
- Está triste? - ele pergunta e ela assente.
- O Dinho me odeia, Sérgio. - ela suspira. - Ele nunca me deixa sair com vocês e agora encrencou que eu estou usando maquiagem.
Sérgio fecha a porta e se senta na cama de Dinho, se virando para Diana.
- Ele não te odeia, ele só é ciumento. - Sérgio a consola. - Ele não aceita que você não é mais a menininha que quebrava os carrinhos dele e eu concordo com ele, por que quer usar maquiagem?
- Porque eu quero ser bonita. - ela fala e ele nega.
- Diana, você já é bonita! E ainda é muito nova para pensar nessas coisas, só tem treze anos.
- Eu faço quatorze daqui duas semanas. - ela resmunga e ele dá risada. - As meninas da minha escola usam e são bonitas, elas são magras e usam umas roupas descoladas, eu não tenho dinheiro pra comprar as mesmas roupas e sou gorda, me resta usar maquiagem.
- E você gosta de usar maquiagem? - ele pergunta e ela o encara em silêncio. - Não faça nada porque acha que deve fazer, faça as coisas porque quer fazer... Quer usar maquiagem?
- Eu quero ser bonita! - ela insiste e ele suspira.
- Olha, você acha a Cláudia bonita? - ele pergunta e ela sorri.
- A Cláudia é linda, você é um homem de sorte.
- Eu sei. - ele sorri. - E ela não usa maquiagem.
- Sério? - Diana pergunta surpresa.
Ela e Claudia ainda não eram tão próximas e isso surpreendeu a garota.
- Sim e eu acho que ela a mulher mais linda do mundo, não estou dizendo que você nunca vai poder usar maquiagem, claro que vai... Mas eu te acho linda do jeito que você é, assim como o seu irmão, o Bento, o Júlio e... - ela o interrompe.
- O Samuel?
- O Samuel! - Sérgio afirma e não consegue evitar um sorriso ao ver a animação e o brilho nos olhos da garota quando ele cita seu irmão. - Ainda está triste?
- Um pouco. - ela resmunga e ele dá risada e abre a sacola, entregando a embalagem para a mesma. Ela abre o pequeno isopor e vê um pedaço de torta de limão. - TORTA DE LIMÃO!
- Sim, só não acorde seus pais. - ele dá risada ao ver a animação da garota, ela se levanta e se joga nos braços do mais velho.
- Te amo, Sérgio.
- Eu também te amo, vamos combinar uma coisa? - ele pergunta e ela o encara com atenção. - Não force para crescer, seja você mesma e sempre que estiver triste, eu vou aparecer com uma torta de limão.
- Eu prometo. - ela sorri e beija seu rosto. - Quer assistir um filme?
- Só se for Dirty Dancing. - ele responde, sabendo que era o favorito da garota.
- Por isso você é meu favorito. - ela segura sua mão e o puxa para fora do quarto.
02 de agosto de 1995 - 23h40 P.M
Samuel havia ido na casa de seus pais buscar algumas coisas e pediu para Sérgio ficar de olho na namorada.
O Reoli mais velho tinha o coração dividido e sofria sem conseguir enxergar uma saída, de um lado a noiva que sofria em silêncio e não contava o motivo e do outro a irmã mais nova de consideração que estava se afundando em depressão. Ele não sabia o que fazer, mas sabia que iria tentar de tudo para ajudar as duas.
Ele deixa um bilhete na mesinha de cabeceira ao lado de Cláudia, o bilhete dizia que ele estava com Diana e não iria demorar e ao lado uma rosa e um chocolate. Cláudia finalmente conseguiu dormir e ele não queria a acordar.
O mesmo sai em silêncio do quarto e tenta fazer o mínimo de barulho possível, ao descer as escadas ele encontra Valéria e Dinho deitados no sofá e abraçados.
- Onde vai? - Valéria pergunta ao ver ele pegar a chave.
- Na padaria, querem alguma coisa? - ele pergunta e eles negam.
- Corre, a padaria fecha meia noite. - Dinho o alerta e ele assente.
Sérgio sai de casa e desce a rua, por sorte encontra a padaria aberta e não demora muito para voltar pra casa.
- O Sam já voltou? - ele pergunta e Dinho nega. - Ótimo.
- Sérgio? - Dinho o chama assim que ele coloca os pés no primeiro degrau. - Obrigado.
Ele sabia o que o amigo iria fazer, sabia que não só ele, mas todos da casa estavam abalados com o que estava acontecendo e mesmo depois da pequena discussão que tiveram hoje mais cedo, o Dinho era grato.
- Pelo quê?
- Eu não poderia ter escolhido irmãos melhores para a Diana. - ele responde e Sérgio sorri e assente. - Boa noite.
Sérgio se despede do casal e sobe as escadas indo até o quarto de Diana e Samuel, ele bate na porta e escuta um "Entra". Ao entrar no quarto e ver a garota encolhida na cama e agarrada ao Sansão, sentiu a nostalgia tomar conta do seu coração.
Em silêncio, ele fecha a porta e se aproxima da mesma. Coloca a embalagem na mesinha de cabeceira e segue até a televisão do quarto, ligando a mesma e o fita cassete. Ele coloca a fita do filme e segue até a cama, Diana já estava sentada e observava tudo com atenção. Sérgio se senta ao seu lado e entrega a embalagem para ela, ela abre a mesma e ao ver o pedaço de torta de limão, sente os olhos marejarem.
- Eu prometi, não foi? - ele pergunta e ela assente. - Quer assistir um filme?
- Só se for Dirty Dancing. - ela responde com a voz marejada e ele sorri.
- E é por isso que você é a minha favorita. - ele diz beijando sua testa e a puxando para um abraço.
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Capítulo escrito: 24.03.2024
Capítulo postado: 24.03.2024