Anna Estrella ✨
As horas iam passando rápido, e minha impaciência começava a dar indício. Depois de tomar um grande copo de água que a recepcionista me trouxe eu comecei a andar pelos corredores, tentando a todo tempo afastar os pensamentos negativos que insistiam em perturbar minha mente.
Dentro de mim um turbilhão de sentimentos implodiam. Eu estava feliz, por ele ter acordado, mas estava apreensiva e morrendo de medo do que os médicos possam me dizer.
Olhei para o meu celular observando as horas, quase oito horas da noite. Quando chamei os médicos na hora que o Filipe acordou, já era quase cinco horas. Ou seja, passou-se quase duas horas e meia por aí. Quase três.
Anna: Posso entrar? - Questionei, para o último enfermeiro que estava quase fechando a porta.
Enfermeiro: Claro, o médico precisa conversar com você. - Ele informou-me, e se afastou.
Um frio na minha barriga se originalizou.
Assim que adentrei ao quarto vi o médico examinando os olhos de Filipe - abrindo-os e iluminando com aquela luz que parecia uma canetinha - mas quando percebeu a minha presença, parou e fixou os olhos em mim. Filipe também fez o mesmo. Filipe já estava sem o tubo em sua boca e aparentava estar bem.
Um grande aliviou me preencheu, fui até ele e parei ao seu lado.
Anna: Sua mãe e eu estamos muito felizes em ver que você acordou. Eu fiquei bastante preocupada, na verdade, todos nós. - Comentei sorrindo, observei cada detalhe do seu rosto. Ele não expressou nenhuma reação, sua face estava séria.
Ret: Fico grato pela sua preocupação, mas quem é você? - ele questionou, olhando firmemente em meus olhos.
O que? Como assim?
Anna: Como assim quem sou eu? Eu sou a Anna. - Respondi rapidamente, mas a cara dele continuou do mesmo jeito. - Ele não lembra de mim? - Virei-me pro médico, e apenas balançou a cabeça, concordando.
Meu coração começa a ganhar batimentos descompassados, e minha respiração começou a acelerar. Ele perdeu a memória. Ele não lembra de mim. Ele tinha me esquecido.
Anna: Você não lembra de mim? De nadinha? - Questionei novamente, quase implorando que isso seja uma brincadeira muito sem graça.
Ret: Não. Eu só me lembro de uma garota muito chata, que trabalhava pra minha mãe. As vezes eu secava ela quando ia pro restaurante. Vivíamos brigando. - Ao final da fala, ele fez questão de esculpir aquele sorrisinho; malicioso e brincalhão.
Arregalei os olhos ficando estagnada no lugar, não sabia se ele estava tirando uma com a minha cara ou se ele realmente perdeu a memória, e só se lembrava da parte que a gente vivia se bicando pelos lugares. Ai meu Deus!
Ret: Eu estou brincando, morena. - Explicou rindo, me tirando do transe.
Anna: Seu idiota! - Dei um tapa no braço dele.
Ret: Ai porra! - Passou a mão no braço. - Dr. Avisa a ela que eu estou... Como é o nome do bagulho? - Questionou confuso.
Médico: Hospitalizado.
Ret: Isso aí. Tou hospitalizado.
Anna: Eu te odeio. - Afirmei, antes de envolvê-lo nos meus braços. Na mesma hora senti seus braços ao redor da minha cintura, retribuindo o abraço com carinho.
Ret: Apesar de você ser chata, é impossível te esquecer, amor. - Sussurrou em meu ouvido, fazendo-me sorrir abertamente.
É incrível como o abraço dele tinha o poder de consertar tudo. Eu sentia como se meus cacos estivessem sendo colados. Era tão bom estar no abraço dele, eu sentia muitas saudades. Estava feliz, finalmente.
Médico: Ranran. - O Dr. pigarreou, fazendo nós se afastar. - Desculpe te enganar, mas não podíamos negar um pedido tão inusitado como esse. - Ele deu um sorriso curto, mas logo continuou. - Ele está bem.
Anna: Bem? Mas os exames estão bons? Não tem nada de errado?
Médico: Nada. Está tudo ótimo com ele. - Me garantiu.
Anna: Mas eu percebi que o senhor estava preocupado, então eu pensei em várias coisas. - Expliquei, me aproximando mais do médico.
Médico: Sim, e ainda estou preocupado, porque não é todo dia que presenciamos um milagre. - O Dr. Olhou para Filipe. - Senhorita Dias, entenda; em todos anos de trabalho eu nunca vi alguém ficar por tanto tempo em coma e acordar como se estivesse apenas tirado um cochilo. Os exames neurológicos dele estão bons, os cardiológicos também. Saturação ótima. O ferimento da bala está com uma cicatrização excelente, e sem contar que ele não perdeu nenhum movimento do corpo. Geralmente os pacientes que ficam muito tempo em coma necessitam de fisioterapia, pois podem perder um pouco dos movimentos, e até mesmo fala, mas ele está com todas as funções ótimas.
Anna: Que merda! Seria de grande ajuda se ele ficasse sem falar, ele é muito chato. - Brinquei rindo.
Ret: Ei! - Protestou, mas rindo também.
Médico: Vou atualizar o prontuário dele, e daqui a pouco eu retorno. - O médico falou e antes de sair chamou-me atenção. - Senhorita Dias já pode ligar para seus familiares. - E saiu.
Esperei que o médico fechasse completamente a porta e me virei pra Filipe, o abraçando com mais força.
Anna: Eu fiquei com muito medo. Fiquei com medo de que você morresse. - Confessei, com a voz um embargada pelo choro contido.
Ret: Agora estou aqui, morena. - Ouvi a voz dele estava me causando uma sensação nova, inebriante, algo que não consigo explicar em palavras.. - O médico disse que você não estava sozinha. Cadê a minha mãe? - Questionou, me olhando nos olhos agora.
Antes que eu possa responder dona Vanda adentra ao quarto totalmente desesperada, me afasto do filho dela dando espaço para que ela possa abraça-lo e conversar com ele.
Vanda: Oh meu filho... - Segurou seu rosto chorando. - Estava com tantas saudades, tive medo de perde-lo. - O abraçou apertado.
Ret: Eu estou aqui mãe. Estou aqui com a senhora. - Abraçou ela também.
Anna: Eu vou ligar pro pessoal. - Avisei me afastando.
Os dois continuaram conversando, e me afastei por completo para poder fazer as ligações.
(...)
O pessoal estava todo reunido. Foi difícil convencer o médico a deixar todos entrarem no quarto, o importante é que deu tudo certo. Filipe sorria e fazia gracinhas com o pessoal, principalmente com a Bella.
Nem parecia que fazia algumas horas que saiu do coma.
Bella: E quando você vai receber alta? - Perguntou curiosa.
Anna: O médico não avisou ainda, mas provavelmente em breve.
Ret: Eu espero que seja logo, oh comida ruimzinha que eles servem aqui viu. - Fez careta.
Cabelinho: Nam, é muito ruim mermo. - Falou rindo.
Cobra: E como você tá se sentindo? Dor? - Perguntou ao Filipe.
Ret: Papo reto, sinto umas dorzinha aqui e ali, mas o médico disse que era normal pelo tanto de tempo que fiquei na mesma posição. Ele disse que minha saúde tá ótima. - informou.
Cabelinho: Já visse? O cara tem sete vida. Virou um gato foi? - Zombou.
Ret: E quem disse que não sou um gato? - Arqueou as sobrancelhas, convencido.
Bella: Realmente quem disse? Tu parece mais uma caveira maconhada.
Ela falou, sorrindo sarcástica. Ele a olhou e estirou língua, é parece que alguma coisa nunca muda.
Vanda: Bom, gente a conversa tá ótima mas Filipe precisa descansar.
Ret: Mas do que eu já dormi? Aí se me fode mãe. - negou com a cabeça.
Vanda: Você ainda tá sob medicamentos, até quando vai resistir? - Questionou, cruzando os braços.
Pior que é verdade, o Filipe não estava como antes cheios de aparelhos, contudo, ainda estava tomando o soro.
Anna: Sua mãe tem razão, mas ele pode ficar acordado até dá sono. - Falei por ele. - Você tá com sono? - Observei o mesmo.
Ret: Tou não pô, tou dizendo. - Balançou a cabeça.
Bella: Então problema resolvido. - Sorriu pra dona Vanda.
Ela sorriu de volta e se afastou indo conversar com o médico sobre a alta do Filipe. Enquanto isso o pessoal se concentra em informar o Filipe o que anda acontecendo sobre a ausência do mesmo.
Cabelinho: Inclusive, dei um fim naquele filho da puta. - Se referiu ao dono do morro vizinho.
Ret: Jae, valeu.
Apesar de saber que ele provavelmente queria da um fim nele, o mais certo era fazer isso. Não sabíamos que dia ou mês, ano que ele acordaria e cabelinho queria o vingar. A única coisa que passou pela a nossa cabeça foi isso, e sinceramente eu até gostei.
Por alguma razão fiquei com medo de perder Filipe novamente por conta dessa vida que ele leva, e mesmo que essa seja a forma que ele ganha a vida ainda sinto medo e insegurança.
Algumas horas se passou e o horário de visita também, o pessoal foi pra casa e eu fiquei. Não queria sair daqui sabendo que amanhã o meu dia é corrido. Tem o restaurante que acho impossível dona Vanda abrir, e a escola, a consulta.
Sentei-me na cadeira ao seu lado.
Anna: Se eu pudesse traria o Marvin aqui pra te ver.
Ele arregalou os olhos e balançou a cabeça.
Ret: Aquele cachorro é um capeta, tenho a maior certeza que nem sentiu a minha falta. - Negou rapidamente.
Soltei um riso e bati no seu braço.
Anna: Não fale assim do meu bebê. - Briguei, rindo.
Ret: Eu que sou o doente e você o defende? - Questionou, incrédulo.
Anna: Você o xingou primeiro e ele nem fez nada. - O defendi. - E outra, ele sentiu sua falta sim. Sabia que ele dormia em cima da tua camisa?
Ele arqueou as sobrancelhas e disse.
Ret: Você deixou ele dormir em cima da minha camisa? - Questionou.
Balançei a cabeça em confirmação.
Ret: Pô, morena. Ele já fudeu com a minha Kenner e agora minha camisa? - Falou incrédulo.
Anna: Filipe deixa de ser idiota, o meu bebê é limpo e ele dormia em cima da nossa cama. Claro com a camisa embaixo dele.
Ret: Mudou muita coisa. - Revirou os olhos.
Anna: Deixa de ser besta. - Revirei os olhos também. - Como você está se sentindo depois de tudo isso?
Ele me olhou por alguns instantes e depois retornou a dizer, sua expressão tornando-se inexpressiva.
Ret: Tou me sentindo mó estranho, porém, sei que agora está tudo bem e a única coisa que quero focar é em como as coisas vai desenrolar entre a gente. - Sorriu, claramente idealizando alguma coisa entre a gente.
Certamente eu queria o mesmo que ele, porém, quero focar em sua saúde agora. Quem sabe quando voltarmos a gente não tem essa conversa.
Não estou dizendo que estou em dúvidas com meus sentimentos. Eu sei o que eu quero claramente, e nada vai mudar. Entretanto, quero ter a certeza que ele esteja bem, e quando voltarmos a gente decide o que vamos fazer daqui pra frente.
Anna: Podemos ter essa conversa depois? Vamos esperar sua mãe voltar e nos dizer o que o médico disse. - Expliquei quando ele expressou sua confusão.
Ret: Tudo bem então. - Sorriu compreendendo. - Então, a única solução é falar como as coisas continua no morro. Quero saber de tudo, e sinto que o cabelinho não me contou todas as coisas.
Apenas assenti, sentando-me mais perto dele. Comecei a contar algumas coisas que a gente ocultou, inclusive, sobre o bebê que a Luisa carrega. Sei que ela deveria dizer a ele, mas é melhor eu dizer, afinal de contas ele já suspeitava de certa forma. Apenas estou contando o resultado dos exames.
Ele ficou surpreso, e de início quieto também. Talvez, assimilando o que eu acabará de despejar em cima dele. E até compreendo, é uma responsabilidade e tanto que ele vai ter que carregar para o resto da vida. Mesmo assim, para tudo que ele precisar estarei aqui para ajudar.
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Capítulo levinho, com nosso Filipe de volta sã e salvo.
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