Ainda estou achando estranho o fato de Ward não ter me largado nem um segundo sequer na noite anterior.
Até começo a achar que isso pode ser uma melhora, não é mesmo?! Mas ainda achei estranho a frase dita e não explicada por ele.
O que é por mim?
Estou a alguns minutos olhando para o teto, e agora desço meu olhar para o homem que estava deitado em minha barriga, tendo suas boas horas de sono após ter demorado quase a madrugada toda pra dormir.
Se ele tinha algum compromisso na empresa, então suponho que já tenha perdido.
Só queria saber o que se passa na cabeça de Ward Kennedy?! O que ele tem feito? Com quem ele tem conversado?
- Tá muito tempo acordada?- sua voz sai rouca, ainda de olhos fechados.
- Não.
Devagar, seus olhos abrem... O azul vibrante daqueles olhos que parecem carregar mais coisas que um idoso bem vivido.
Eu amo tanto esses olhos que passaria horas admirando, Deus, como eu amo esse idiota!
- Te atrapalhei ontem? Me desculpa, eu não sei oque deu em mim.
- Não. Tudo bem... Vai me contar o que aconteceu?
- Foi do nada, só tive um dia ruim...
Ele está mentindo e eu claramente vejo isso!
- Certo... Então você simplesmente fica ausente na minha vida, não pergunta como eu estou, não faz questão alguma de me ver, mas então teve um dia ruim e me liga?- aquilo saiu rapidamente de mim, e eu quase me arrependo, mas por que me arrepender se é a verdade? De certa forma isso machuca.
- Achei que poderia contar com a minha namorada em um momento difícil.- aquilo quase me convenceu, mas isso é apenas uma manipulação suja.
- Agora eu sou sua namorada? Por que suas ações dizem ao contrário, Ward! Então eu sirvo apenas para ser seu calmante? Mas que diabos tá acontecendo com você?
Ele respira fundo, bem fundo...
- Me perdoa... Tudo está me consumindo, a empresa, a perda... Eu só não estou conseguindo me controlar e não quero passar essa negatividade pra você, por isso estou afastado, só estou achando meios de encontrar meu equilíbrio.
Por que isso me parece mais uma mentira?
Há muitas coisas que eu quero falar nesse momento, todas pregadas em minha garganta torcendo e lutando pela liberdade, mas não vou falar.
- Eu vou ser melhor, eu prometo. Só por favor me dê mais uma chance?!- ele segura firme em minha mão, me olhando, ah, meu ponto fraco!
- Ward...
- Eu prometo, eu vou ser melhor.- ele beija minha mão, ainda sem tirar os olhos de mim.
- Ok...
Ele sorri fraco, selando nossos lábios, fazendo meu corpo todo arrepiar com seu toque suave. Como eu senti falta disso, tanto que quero apenas chorar.
Um beijo leve, coberto de amor e ao mesmo tempo um toque de possessividade.
Mas para ser honesta... Não estou com um pressentimento nada bom...
- Acho melhor você se arrumar pra ir pra empresa, já passou das nove da manhã.- me sento na cama.
- Não há nada de importância. Pensei em passar esse tempo com você antes de você ir pra sua aula de especialização.
- E qual é a sua idéia?
- Hum... Que tal passarmos a manhã aqui?- ele pergunta sonolento.
- Precisa exercitar!
- Podemos ir a academia, se quiser, posso te ensinar a lutar!
- Acho que não estou vestida apropriadamente pra isso, e dispenso esse tipo de exercício físico.
- Então vamos ficar aqui, não há problema algum nisso. Vou lá em baixo pegar o nosso café, ok?
Ele deixa um selar em minha testa e sai do quarto.
Espero que essa melhora dure...
A manhã foi agradável, nostálgica até.
Ward parece ter voltado ao normal, mas não vou me animar com isso, até porque a sensação ruim ainda toma conta de mim, e sei que ele está escondendo algo... E sinceramente, estou receosa quanto a isso...
Ficamos mesmo a manhã inteira na cama, rindo de coisas bobas, conversando sobre coisas aleatórias e brincando como duas crianças, foi de fato uma manhã feliz...
- Pois é! Nada está fácil.- Jeggor diz ainda rindo.
- Ainda não acredito que você foi atropelado por uma bicicleta!- falo sem conseguir parar de rir.
- Vida de advogado não é nada fácil, tome cuidado quando resolver andar a pé ao invés de carro. Vou encarar isso como um sinal.
- Depois dessa? Estou pensando em entrar dentro da universidade de carro, nunca se sabe quando uma bicicleta vai aparecer nesse corredor!- olho para os lados.
Jeggor sorri tão abertamente que seus olhos chegam a fechar e todo seu cabelo vai para frente de seu rosto.
Jeggor é uma ótima companhia! Confesso que ele tem tornado as aulas chatas em aulas divertidas, por mais que ele não pareça nada com o gênio que é!
- Se você não parar de rir de mim, eu vou enfiar um bife na sua boca!- ele diz rapidamente me fazendo parar de rir e ficar enjoada só de pensar..
- Eu juro que eu vou atrás de você e te mato! Que tipo de vegetariano você é, pensando nessas maldades? Eu juro que vou te denunciar!- acuso.
- Acho melhor apressarmos nossos passos. Por que vem de salto? Seu pé não dói?
- Eu gosto, apesar de as vezes alguns chegam a ser desconfortáveis. Desde nova fui acostumada com isso, lidar com eventos de família... Acabei me apaixonando por saltos e pela moda mais moderna e menos escandalosa. E não me arrependo!
- Uau... Pequena advogada Young.
Entramos na sala, e logo a aula se inicia.
A tarde passou tão rápido que por um momento cheguei até a ficar grata por isso.
Após me despedir de Jeggor, vou para meu carro e me surpreendo ao ver Marc encostado no veículo, ele parecia impaciente e isso me preocupou.
- Oi?- me aproximo confusa.
- Angel, o Ward não me escuta, acho que só você pode fazê-lo mudar de idéia...
- Você tá me assustando... O que aconteceu?- pergunto já sentindo minha pressão cair.
- Ele não te contou do plano, não é?
- Que plano?
Marc suspira
- Ward resolveu matar todos da família do Hanry, você sabe... Ele matou o avô, ontem ele matou a mãe... Ele torturou a mulher, quando vi o corpo foi demais até pra mim... E agora ele quer matar a irmã, e ela só tem doze anos!
- Doze anos?- pergunto incrédula.
- Sim, e aparentemente ela nem sabe dessas coisas! Você precisa fazê-lo mudar de idéia.
- Como eu vou fazer isso?
Ele me entrega um papel
- Consegui esse endereço com o Tom, eles estão lá!
Pego o papel e observo atentamente, é um pouco longe da cidade...
- Quer que eu te acompanhe?
- Não, não precisa... Bom... Não estou muito certa disso, mas eu vou.- suspiro.
- Me ligue, ok? Deixei meu número aí também. Me liga se acontecer alguma coisa. Acho que ele só tem ouvidos pra você...
- Esperamos que sim...
- Boa sorte, Angel.
Entro no carro ainda receosa e saio dali
Então é isso que ele estava escondendo... Eu sinceramente não me importo com essa droga de vida obscura, afinal ele já era assim antes do nosso relacionamento, mas uma pobre garota de doze anos? Céus isso é ridículo! Eu facilmente o deixaria por isso.
Acelero mais a velocidade do veículo, torcendo para chegar a tempo.
Estacionei meu carro de qualquer jeito, na verdade isso nem importa!
Era uma casa no meio do nada, literalmente!
Gastei praticamente uma hora para chegar aqui e temo ter chegado tarde demais.
Corro em direção a casa e abro a porta, já vendo alguns homens parados, alguns rostos familiares, ao menos eles sabem quem eu sou.
- A senhora não pode entrar!- um deles diz, entrando em minha frente.
- Claro que posso, é meu namorado quem está lá dentro!- falo.- Você precisa sair da minha frente agora!
- Desculpe, senhora Young.
- Se você não sair da minha frente sua vida tá acabada!- tento ameaçar mas não adianta.- Por favor... Me deixa entrar!- falo quase chorando.
Ele abre espaço, e por um momento senti um alívio.
- Última porta do corredor.- ele diz.
- Obrigado, prometo que não vai morrer.
Com o coração disparado entro pela porta, que ia diretamente a um enorme corredor, extremamente macabro.
Como dito, abro a última porta e entro no grande cômodo. De longe reconheço Ward, ele está de costas.
- Já?- ele pergunta.
- Onde tá a garota? Você a matou?- pergunto.
Rapidamente ele se vira assustado
- O que você tá fazendo aqui?
- Me responde... Você a matou?- pergunto sentindo meu coração doer.
- Foi o Marc que te disse, não foi? Merda... Angel não é pra você estar aqui, vai embora!
Ela se aproxima de mim furioso, mas não recuo.
Seus olhos estão completamente diferentes de hoje cedo, estão escuros, estão frios...
- Que tipo de homem você é, Ward? Não acha que já matou o suficiente? Ela só tem doze anos! Me responde, você matou a garota?
- Não há nada que você disser que me fará mudar de idéia, Angel. Não se meta em assuntos que não lhe diz respeito!
- Ai meu Deus! Você é um completo doente, Ward Kennedy! O que você tem na cabeça? Ela não tem nada a ver com isso, você por acaso ficou maluco? Perdeu a noção?
Ward respira fundo passando as mãos pelo seu rosto. Já eu completamente frustrada, frustrada por namorar um doente psicopata sem noção alguma!
Isso soava diferente nos livros, mas eu não estou em um!
- Sai daqui! Quem te deixou entrar?
- Sério que você só vai me falar isso?
- Não se mete, Angel. É a minha vingança! Não foi o seu pai que morreu!- ele grita.
- Não se atreva a gritar comigo, seu imbecil. Eu não sou surda! Não admito que fale comigo dessa maneira!- falo ainda mais alto.
Ward me pega pelo braço com uma certa força me levando em direção a porta novamente, mas consigo me soltar de seu toque com uma certa dificuldade, me fazendo bater contra uma parede.
- Angel, você precisa sair daqui, agora! Eu não vou repetir! Você não vai me fazer mudar idéia.
- Você é um desgraçado, Ward. Eu não sei que diabos estava se passando pela minha cabeça quando me envolvi com você! Matar uma garota de doze anos que nunca te fez nada? Isso é imaturo! Ainda mais se você já matou toda a família dela praticamente!
- Tudo é sua culpa, se você não tivesse entrado naquela maldita sala, nada disso estaria acontecendo!- ele solta.
Céus....
Isso doeu mais do que eu esperava...
É como se tudo tivesse parado de repente, e um silêncio de instala na grande sala.
Isso foi o gatilho, a gota d'água.
Sinto meus olhos soltarem todas as lágrimas que segurava, sinto minhas pernas ficarem fracas, mãos trêmulas... Sinto vontade de desmoronar.
- Angel...
- Não.
Tiro a aliança e jogo no chão
- Você não merece nem o meu perdão, Ward. Saiba que culpar os outros por SEUS ERROS não vai mudar o fato que você é um homem totalmente desprezível.
Não consigo falar mais nada, eu só quero chorar.
Saio dali o mais rápido que consigo e mal me vejo passando pelos seguranças, nada mais me importava.
Rapidamente entro em meu carro e saio imediatamente dali.
Tentei não deixar que os olhos cobertos de lágrimas não atrapalharam o meu caminho, afinal um acidente não era a melhor opção, já há dramas demais nessa história toda.
Quando cheguei em casa, corri para meu quarto e me tranquei.
Só agora pude descarregar toda a dor
A dor de um choro alto
A maior dor que eu já senti em toda a minha vida!
...