Terra Proibida - Essência

By EvaSans86

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Em um entrelaçar de passado e presente, mergulhe em uma trama que desafia os limites da razão e da sanidade... More

Nota da Autora
[Agora] A queda
[45 anos atrás] A proposta
Cap. 1 - Sentimentos Ocultos
Cap. 2 - Tormenta
Cap. 3 - Ecos do Passado
Cap.4 - A medalha
Cap. 5 - Revelação
Cap.6 - O nada
Cap. 7 - Oráculo
Cap. 8 - Isadora Moraes
Cap. 9 - Elizabeth Detzel
Cap. 10 - Segredos ao pôr do sol
Cap. 11 - Sangue quente
[45 anos atrás] A Alma à venda
[45 anos atrás] A casca
[Agora] O Salto
Cap. 12 - Despertar
Cap. 13 - O Animal que me tornei
Cap. 14 - Presente de grego
Cap. 15 - Feito de lágrimas e cinzas
[45 anos atrás] Ninguém se lembrou
[45 anos atrás] Inferno
[45 anos atrás] Quando todos os homens falharam
[45 anos atrás] Mais que morrer
[45 anos atrás] Seus pensamentos
[45 anos atrás] Miserável
[45 anos atrás] Esse tipo de amor...
Cap. 16 - Versões de uma mulher
Cap. 17 - A casa
Cap. 18 - Terceira morte
Cap. 19 - Primeira vida
Cap. 21 - Sete Palmos
Cap. 22 - O Centro do Universo
Cap. 23 - Essência

Cap. 20 - Alguém tem que morrer

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By EvaSans86


Agatha Detzel

Não estava dando certo.

A vida perfeita que tinha imaginado quando decidiu abandonar a maldita família Detzel, era de longe muito mais infernal. Saudade do tempo que meu único problema eram as notas na escola e aprender sobre magia.

Acordou abraçada a sua pequena Liesel, encolhidas debaixo do chuveiro, com a porta trancada se escondendo do homem que lhe jurou amor, queria poder acessar os poderes que abdicou. Sentia o sabor estranho do próprio vômito misturado com shampoo e lágrimas.

Não sabia dizer como chegou no banheiro, nem mesmo como teve a capacidade de tirar as roupas. Mas uma coisa era certa, não tinha sido ela mesma. Seu último pensamento antes de apagar tinha sido na Grande Mãe.

Será que ela pode me ouvir?

Será que ela pode me ajudar?

Será que ela quer me ajudar?

Olhou para Liesel amuada num cantinho brincando com uma medalhinha que nunca tinha visto. Pensou em perguntar à filha onde ela tinha achado aquela jóia mas antes, tinha prioridades e estava desesperada.

- Princesa, fique aqui e só saia quando a mamãe chamar, ok? - Disse tão baixinho que a voz saia engasgada pelas lágrimas. Era doloroso ver que a filha já entendia que não podia chorar alto, apenas assentindo com a cabecinha que tinha captado a mensagem.

Precisava de coragem. Um raio, com certeza.

Longe dos pequenos olhos que se mantinham fixos a medalha, preparou sobre a insalubre pia de mármore uma carreira de pó, cheirou e esperou o pior. Olhou-se no espelho sentindo o pesar de seus sonhos destruídos, da beleza arruinada e da impotência diante do mundo. Tudo o que restava era proteger a única pessoa que importava.

No dia em que viu Elizabeth, pensou em pedir ajuda, mas seu orgulho foi tão grande, que se amaldiçoava por não ter sido capaz de dizer uma única palavra sequer. Agora era tudo ou nada.

O som das coisas se quebrando pela casa e o marido descontrolado causavam arrepios por todo o seu corpo. Esperou a coragem que o efeito da droga lhe traria para sair pela porta do quarto e acabar com tudo. Duas coisas eram certas: Ninguém iria tocar em um único fio de cabelo de Liesel, a outra é que alguém morreria naquela noite, e não seriam elas.

Grande rainha mãe, me dê forças. Por favor, eu imploro! - rezou.

Quando cruzou a porta, sentiu o impacto de uma coronhada na cabeça, quase perdeu os sentidos. Se viu arrastada violentamente pelos cabelos, enquanto era insultada. A sensação da morte, a dor e o medo despertaram uma energia que há muito tempo não sentia.

Era a acolhedora e poderosa energia do fogo sagrado. Sim. Ainda era uma Detzel.

Obrigada minha mãe!

Não se lembrava muito bem como lançar feitiços verbais, mas se lembrava com clareza dos sinais que deveria desenhar. Sinais estes, que por curiosidade tinha aprendido em um livro proibido quando era mais nova.

Quando o homem a jogou contra a parede, com o próprio sangue que escorria, rapidamente desenhou com os dedos na superfície que conseguia tocar os sinais da morte, mentalizando o nome do marido assim como a forma como queria que ele morresse. Seus olhos cintilaram em um branco cósmico quando ativou o feitiço com sua recuperada energia, e logo viu o homem sofrer ao ser dolorosamente corroído até virar partículas gosmentas de vísceras e sangue.

Enquanto observava tudo, louca de adrenalina, achou a cor do sangue tão fascinante que cogitou ter ido para o campo errado das artes, a partir de agora, as artes plásticas eram suas favoritas. Vidrada na beleza da cor, pegou uma almofada no sofá, a embebeu com o sangue e começou a pintar as paredes.

Escorregou na poça gosmenta, e naquele momento, banhada no sangue inimigo, Agatha ainda sob fortes efeitos do entorpecente, ria. Antes de lembrar que a filha estava escondida no banheiro, acendeu um cigarro, colocou uma ópera para tocar no sistema de áudio da casa, dançou e pintou.

Foi libertador mandar aquele macho escroto pro inferno. Foi tão libertador quanto a arte. Deixou a família anos atrás para se dedicar aos seus dotes artísticos, queria brilhar por si só, afinal nasceu para ser uma estrela, para interpretar grandes papéis, para ser a maior atriz de todos os tempos. Uma pena tudo ter dado tão errado.

- Lili, feche os olhos. - disse à pequena que carregava no colo, após recobrar um pouco da sanidade. - Tenho uma surpresa dentro do carro e só vou entregar se você for uma boa garota e ficar de olhos fechados até eu falar pra abrir.

- Pra onde a gente vai, mamãe? - perguntou a garotinha.

- Vamos viajar.

- E o papai?

- Ele não vai. Ele foi pra outro lugar.

Agora, Agatha descobria uma nova paixão. Precisava de mais.

Mais sangue.

Henri Speltri

Fantástico era a única palavra capaz de descrever Henri quando acordou e processou tudo o que tinha acontecido no dia anterior.

Em uma animação fora do comum, correu para o quarto onde o pai dormia e literalmente pulou na cama, assustando o velho que por um triz não infartou.

- PAI! Me diz que eu não tô louco?

- Filhão... - Raul respirou fundo irritado - Você sabe que horas são?

- Pai, eu sou um bruxo!!! Eu sou mega, power, poderoso, cê acredita?

- Henri...

- Pai eu tenho poderes jedi, olha que irado! - Tentava usar a telecinese com os objetos do quarto fazendo uma verdadeira bagunça.

- FILHO!

- Adoro o Diegão! O cara é massa pra caray, devíamos ter atualizado o Beni para a versão Diego antes!

- HENRI ORTEGA SPELTRI!

- Quié??? Curte o momento comigo!

- MUITO CUIDADO com o Diego.

- Cuidado porque? Se não fosse ele e o Isauro eu tinha virado carne de sol.

- Cuidado, porque pra ele tudo tem um preço e é perigoso ele cobrar tua alma por esses tutoriais, então muito cuidado.

A advertência do pai fez mais sentido quando, no grupo criado por Diego, leu a sucinta ameaça na frase "o primeiro a sair do grupo morre."

Odiava grupos. Grupos de WhatsApp para o seu espírito de fofoqueiro era um convite a perder um precioso tempo de vida, pois enquanto não estivesse a par de tudo, não conseguia desgrudar os olhos, e parecia que quando entrava em um grupo, outros três surgiam. Quando viu que um tal de Alex saiu do grupo, essa foi sua deixa e saiu também.

Sentiu um breve arrepio na espinha mas ignorou, afinal, não era obrigado. Uma nova notificação chegou.

...

[Invite: Reunião deliberativa com Diego Del Toro

Onde: Fazenda das Almas

Data e Horário: Hoje às 10h

Arquivos de leitura prévia: Tutorial 7]

[Aceitar] [Declinar]

...

Anita Stier

Era uma merda não conseguir tocar em nada e quando seus dedos parcialmente se regeneravam, tudo voltava outra vez. Praguejou Diego, mas por outro lado agradeceu por não ter passado a mistura no rosto, caso contrário, preferiria milhões de vezes a morte do que deixar de ser linda.

Vestiu suas recém compradas luvas de nitrílica pretas de e saiu do carro. Não tinha tempo pra chorar de dor. Tentava manter a bandeira da paz estendida com Júlia, o que era dificílimo, pois qualquer mínima divergência a discussão começava outra vez.

Agora sentadas na mesa de um bar, Anita suspirava pesadamente por ter entregue o celular para que Júlia conseguisse visualizar suas mensagens, que faltava explodir de tantas notificações, o que rendeu mais uns bons minutos de pura treta.

- Que grupo é esse aqui? Só tem mulher. - Perguntou Júlia.

- Meu deus, se só tem mulher você reclama, se só tem homens, você reclama, caralho Jú!

- Péra... - Júlia se armava outra vez. - Nesse Gremlins tem um tal de Diego... uma Elizabeth, Sophia... quem é ela? Diego eu sei que é o Benício, mas e essa Sophia? Devo me preocupar?

- Júlia! Você vai fuçar até as pessoas que estão nos grupos de todas as minhas conversas, agora?

- Vou.

- Porra! Então lê e me diz logo o que o Diego quer, antes que essa doença aqui piore.

- Ele mandou o arquivo de um projeto... e orientações... - Júlia abriu o projeto, leu e ao mesmo tempo que estava puta com Anita, queria fazer parte do projeto também. - Vou entrar nesse grupo.

- Cê tá doida? O Diego odeia gente intrometida!

- Acho que to doida sim... pronto! Quero conhecer esse Diego, já que "dizem" que ele não é o Benício e está envolvido com as pessoas que eu mais gosto.

- Essas pessoas me inclui?

- Não.

- Tem notícia do Henri, pelo menos?

- Hummm... Vou perguntar ao Diego sobre ele. - Júlia respirou aliviada com a resposta do bruxo sobre Henri. O príncipe estava bem.

- E aí?

- Ele está ótimo e em Brasília na casa do pai... Opa... chegou uma localização aqui.

- Deixa eu ver, abre o mapa... Meu deus, na fazenda das Almas, Diego está louco? E o que a Elizabeth disse?

- Ela não falou nada até agora.

- E a Sophia?

- A Sophia está brigando com o Diego. Ihhhh... ele adicionou uma outra pessoa.

- Quem?

- Vivian, conhece?

- Não faço a mínima ideia de quem seja. Mas se tá nesse grupo ou o Diego gosta, ou colocou na fila de execução.

Neste exato momento, uma pessoa que Anita conhecia bem, se sentou na mesma mesa, a encarando de braços e pernas cruzadas.

- Então você é a famosa Anita? - Disse Wallace fazendo um biquinho de desdém. - Esperava mais ao vivo.

- E você é o famoso Hórus? - retribuiu no mesmo tom, acrescentando uma risada irônica. - Também esperava mais, te incriminar foi mais fácil que tirar doce de criança.

Era como se lasers estivessem prestes a sair dos olhos dos dois, pela forma que se encaravam.

- Amei a sua vibe Leona Vingativa! Já gosto de você! - Se apresentou Júlia a Wallace, tentando amenizar o climão.

- Também gostei de você. Reconheceu meu espírito selvagem. - Wallace mudou drasticamente a expressão ao responder Júlia, pareciam amigos de infância. - Mana, que cabelo incrível, já quero conhecer sua trancista!

- Ela arrasa néah? Te levo até ela.

- Arrasou! Agora vamos, que o Diabão hoje amanheceu virado.

- Vamos onde, criatura? - interrompeu Anita, ao ver Wallace se levantando da mesa.

- Pra fazenda das Almas, Diego pediu que eu as levasse comigo.

- Diego abriu as portas da casa dele? Eu conheço esse idiota há quase dois milênios e nunca ninguém pisou nesse lugar, nem os irmãos!

- Pois vão pisar agora. Diabão versão dois em um, queridas. Uma loucura.


Diego Del Toro

Amanheceu com as galinhas depois de um sono quase perfeito. Quase, pois no caso teve um "pesadelo" com uma completa desconhecida o tocando e o beijando como se fosse sua idolatrada Elizabeth. Será que estava atravessando uma puberdade tardia outra vez? Porque não havia condições de outra mulher invadir seus sonhos, mesmo ela sendo perturbadoramente linda. Ele pertencia a Liz, somente.

Bom dia, bruxinha ranhenta. - mentalizou a desejando com o sorriso mais descarado que já teve.

Depois de dez quilômetros de corrida e um banho gelado para amenizar um pouco a adrenalina, além de claro, movimentar seus grupos de whatsapp, decidiu que aquele era o dia perfeito para voltar às suas atividades junto aos iluminados.

Assim como no passado, não queria mais ser o líder. Aos seus olhos, esse era o cargo perfeito para Elizabeth. Combinava com ela. Queria se dedicar apenas às pesquisas, mas, como a criatura rancorosa que era, ia primeiro tirar de Alex todo e qualquer aliado.

Antes de "morrer", Diego já havia dividido a fraternidade em duas. Os que lhe eram fiéis automaticamente passaram a seguir Elizabeth, pois ela preservava seus ideais. Os menos engajados, foram facilmente convencidos pelo irmão, que usava o fato dos outros terem desaparecido do mapa como controle para mantê-los sob as rédeas.

Aos que seguiam o irmão, ofereceu duas opções: mudança de lado ou morte, afinal, todos estavam com pendências contratuais e estava com saudade de brincar de deus. Em todos os cantos do mundo, as pessoas que receberam suas mensagens estavam temerosas. Cada uma tinha um prazo diferente para se decidir e embora o bruxo pudesse matar todas de uma vez com apenas um estalar de dedos, ele queria aproveitar o momento. Essa seria a sua grande diversão para os próximos dias.

Antes de se vestir para os grandes eventos do dia, pesquisou as últimas tendências de moda masculina e ainda um pouco descrente se ficaria bem, materializou uma blusa de manga comprida preta em tramas ventiladas, uma calça jeans, também preta, mas que considerou um pouco justa demais e um par de Jordan.

- Casa, busque acessórios que combinem com minha roupa hoje. - perguntou à casa como se fosse uma assistente virtual. Analisava no espelho os cabelos curtos e quase cedeu ao impulso de fazer um feitiço para que eles crescessem mais rápido, mas... por incrível que pareça, gostou do visual tosado. Nunca tinha se sentido tão vaidoso em sua existência.

- Mestre, aqui estão acessórios que podem combinar com a sua roupa. - Respondeu a casa, que definitivamente estava "bugada" dadas as opções que tinha materializado no closet.

Hórus vai ter mais um trabalhinho... preguiça de consertar essa coisa.

Usou o google mesmo e preparou um café. Morgana, a gata o acompanhava por todos os lugares da casa onde ia. Ela documentava tudo o que acontecia.

Em breve a reunião iria começar. Mas antes... como a boa pessoa que não era, olhou bem para os frutos da árvore ancestral e realizou que talvez, elas rendessem um drink incrível, que claro, ele não ia beber, mas sim uma intrusa.

Pegou o fruto, lavou e ao descascar, confirmou a sua hipótese, não era manga. Parecia muito, mas não tinha caroço e o sabor era muito mais suave, algo mais parecido com um pêssego.

Chupa Benício! Não é manga.

Quando Wallace, Júlia e Anita chegaram à casa acrônica, Diego se divertiu ao reparar em suas feições. Wallace estava admirado. Júlia o encarava com ódio e Anita, completamente retraída ao fundo.

- Bem-vindos a quase todos.


Júlia Mwale

Sem dúvidas a casa de Diego era simples e rústica, porém linda. Embora esperasse um castelo medieval "a lá conde Drácula", masmorras, calabouços e clima sombrio, a casa parecia um ambiente tanto quanto familiar, tinha cheiro de coisa assando no forno, flores no jardim, pássaros cantando, luz, cores, muita vida e... Morgana! A gata que sua melhor amiga, Olívia, odiava, pois enchia suas roupas pretas de pêlo. A bichana passou rebolativa por entre suas pernas a saudando.

Quando olhou para o bruxo, não tinha como desassociá-lo de Benício, afinal era o mesmo corpo, a mesma gata, a mesma cara de tédio, mas foi a entonação do "Bem-vindos" a pegou de surpresa. Era outro jeito de falar. Ele parecia possuído por uma entidade altiva e bem vestida. Nada da famigerada camiseta branca por baixo de uma camisa de flanela xadrez, calça jeans e all-star, o odioso look "Família Speltri" que ela e a amiga detestavam.

Encarou Diego de forma imponente. Não ia deitar pra ele nunca.

- Maria Júlia Mwale. - Disse ele a encarando. - Vejo que sua avó lhe ensinou alguns bons truques. Sinto muito pela sua perda, ela era uma pessoa incrível. A melhor detetive que tive o prazer de conhecer. Quem sabe você se torne tão boa quanto ela, um dia.

- Você conheceu a minha avó e sabe que ela era benzedeira, Benício, para de palhaçada. Não se faz doido que o pau te acha. - Ameaçou. Foi automático, eram anos sendo hostis um com o outro e não seria qualquer mudança de personalidade que iria alterar isso.

- Jú, pelo amor de deus! - ouviu Anita cochichar com um olhar aterrorizado, quase implorando para que ela ficasse calada.

Diego apenas sorriu a ignorando, e se tinha uma coisa que a irritava profundamente era esse comportamento no Benício.

Não importava quem ele era - bruxo, diabo, deus - tinha uma vontade absurda de esculhambar com a raça dele por tudo o que aconteceu, pelo chifre, pela morte da Olívia. Mas antes de soltar os cachorros, o olhar de soslaio que Diego lançou em sua direção despertou a memória de uma das piores fases de sua vida: Era adolescente e estudava em uma escola de "bacanas" sofrendo bullying diariamente. Quando a dupla Henri e Benício chegou, tudo mudou.

- Júlia, seguinte, tá vendo o idiota do meu primo? - A lembrança de um Benício marrento e jovenzinho, tirando uma nota de cem reais da carteira e apontando para um garoto apático e todo arrebentado sentado na arquibancada do ginásio, veio vívida. - Pede pra algum restaurante entregar almoço pra vocês dois. Não pede só pra ele, pede pra vocês dois, tá ligada? Porque caso contrário, esse idiota vai desconfiar que sou eu que estou pagando e eu não quero que ele saiba. Pede alguma coisa gostosa, não se importe com o preço, da onde saiu essa nota tem muito mais... - Ele suspirou, para em seguida falar consigo mesmo - Dessa vez, vou ter que falar pro meu pai que fui eu que bati nesse otário. - voltando o olhar para ela - Olha Jú, pra quem quer que seja, fale que fui eu que arrebentei a cara do Henri, beleza? Porque o troco que eu vou dar nos desgraçados que bateram no meu irmão ficará escrito na história.

Na ocasião, a família de Júlia passava por dificuldades financeiras, ou ela guardava dinheiro para o transporte ou comprava comida. Odiava e ao mesmo tempo agradecia Benício pela marra que ele tinha diariamente ao fingir que não se importava com o irmão o chamando de primo e literalmente a pagando para cuidar de Henri, que a considerava sua heroína correndo atrás dela feliz da vida sem saber de absolutamente nada. Os garotos que agrediram Henri foram todos expulsos por diferentes e assustadores motivos.

Outra lembrança surgiu. Minutos antes de sua avó fazer a passagem, Benício esteve com ela.

- O garoto bonito não é flor que se cheire, menina. - disse uma velhinha bastante debilitada e sôfrega - Cuidado. Tome o chá que te ensinei sempre e mantenha-se longe dele todo tanto que puder.

- Vovó, ele te fez alguma coisa? Ele te maltratou? - se armando para sair do quarto do hospital, quando a avó a segurou pela mão.

- Não, não, muito pelo contrário. Esse doutor cuida muito bem de mim, mas ele ainda não sabe quem ele é. O outro tá dormindo, você deve temer o outro.

- Bicho idiota, eu vou matar ele! - disse com a voz embargada.

- Filha, calma. Se não fosse o doutor Diego, minha passagem seria bastante dolorosa...

A minha vovó conhecia ele...

Voltou a si com Anita a chacoalhando.

- Jú! JÚ!

Olhou para a porta da casa na intenção de sair e fugir, quando viu Henri a atravessando, com um sorriso de orelha a orelha. Era engraçado constatar que depois da festa "bad vibes" na Chapada, adquiriu um carinho especial por ele. Carinho que em anos namorando não foi capaz de cultivar. Agora, ele finalmente era um amigo querido. Correu e o abraçou, não iria embora sem ele.

- Jú, me solta... - Ele tentava se desvencilhar.

- Fica quieto um pouco, eu estava preocupada com você. - Não resistiu ao impulso e o beijou no rosto. - Henri, vamos embora daqui.

- Para Jú, que eu não tô acostumado com esse grude e não vou embora coisíssima nenhuma. A senhora se diz preocupada e me larga no meio da estrada? Ah vah tomar no meio do seu cu! Tô pra ver tanta hipocrisia.

- Henri, foi sem querer... Vamos sair daqui! - implorou o tentando puxá-lo porta a fora.

O ex se soltou e foi em direção à Diego, o abraçando de uma forma tão calorosa que nunca tinha visto antes. Era uma colisão de energias tão poderosas que a tirou de órbita por um instante.

- Filho da puta - dizia Henri segurando a cabeça do irmão, olhando para Diego procurando algum machucado ou coisa do tipo - Você tá bem? Você teve a audácia de morrer de novo?

Morreu onde? ele está vivíssimo!

Todos seguiram até a cozinha da casa. A mesa posta típica de uma casa mineira, cheia de pães de queijos, biscoitos caseiros, bolos dos mais variados tipos, geléias, café e um suco aparentemente tão refrescante que após ver Diego se servir de um café juntamente com Henri, se sentiu à vontade para se servir um copo. Bebeu. Tinha um gosto diferente, mas ao mesmo tempo familiar.

Wallace fez o mesmo.

Anita apenas acompanhava a todos com o olhar distante.

Que tanto de luzes são essas? - Ela conseguia ver o enxame de almas que habitavam a casa.

Sentiu um pavor profundo.

Ela estava fora do corpo e via Diego a encarando com um meio sorriso enquanto cortava algo parecido a uma manga. Ela era alérgica à manga.

Henri lentamente realizava o que estava acontecendo ao mesmo tempo que Anita acudia seu corpo que caía inerte.

O enxame de almas a envolveu.


Henri Speltri

Mas que diabos tá acontecendo?

Jú!

Minutos atrás estava extremamente feliz em ver o irmão, mas agora, um sentimento agridoce o desnorteava.

- Benício, que porra é essa? - perguntou com a voz trêmula correndo para ajudar Anita a socorrer Júlia. Levantou o olhar para o irmão que tranquilamente saboreava a fruta sentado a mesa como se nada estivesse acontecendo. - Me ajuda! O médico aqui é você, não é?

Wallace estava literalmente congelado no tempo. Anita tentava reanimar a moça que expelia sangue pela boca, seus globos oculares se convertiam em um tenebroso breu. Suas veias saltavam no esforço de se manter viva.

- Jú! Júlia! - Chamava Henri, que tentava soprar ar em seus pulmões. Se melando de sangue.

Desolado olhou para o irmão, ofegante entre lágrimas e terror.

- Bem, agora que estamos todos livres de distrações. - disse Diego, indiferente. - Vamos ao que de fato interessa.

- BENÍCIO! - gritou Henri vendo os lábios do irmão se converterem em um sorriso falso.

- Henri, se eu fosse você, ficava quietinho. - seu tom de voz assustadoramente baixo. Um arrepio percorreu a espinha de Henri quando Diego se levantou da mesa e foi até ele se abaixando e passando o braço por cima de seu ombro. - Afinal, você pode ser o próximo. - continuou o bruxo.

- Diego, eu imploro! - Anita suplicava. - me mata, mas não mata a Jú!

- Ah Anita!

- Diego, perdão. Por favor, por tudo o que é mais sagrado! - dizia com a voz embargada.

- Você sabe o exato motivo por ainda estar viva, não sabe? Sabe como eu trabalho e ainda está surpresa?

Eu quero meu irmão de volta! - pensava Henri, aterrorizado.

Diego se levantou como se nada tivesse acontecido, materializou e acendeu um cigarro, dando um forte trago. Henri pode ver claramente a íris do irmão luzir dourada em seus olhos. Realmente, aquele não era Benício.

- Vamos. - disse o bruxo - Temos muitos assuntos a tratar e preciso me livrar dessa bagunça antes que minha convidada ilustre chegue.


Diego Del Toro

Não se enganem, tudo é um processo.

Para esse idiota do Henri se tornar o que ele precisa ser, essa chata tem que morrer.

Acordou Wallace já no escritório da casa, como o rapaz era demasiado importante, não queria chocá-lo com a cena da cozinha.

Anita estava trêmula e recusava a lhe olhar nos olhos. O que a culpa não faz, né querida?

Henri estava completamente fora de foco. O propósito de Diego era fazê-lo enxergar que tudo aquilo não era uma brincadeira e que dali pra frente se depararia com coisas muito piores. Esse era o ônus de se lidar com o sobrenatural.

O motivo que fazia Diego manter a cabeça de Anita no exato lugar, era uma dívida que existia entre ambos desde tempos remotos.

Agora estavam quites. Ele estava livre da culpa de ter destruído a família e a vida que ela um dia teve. Estava livre do carinho que um dia já sentiu por aquela mulher. Entretanto, ela jamais seria uma estranha, tiveram uma história juntos. Só de vê-la sofrer para encontrar os seus filhos renascidos sem sua ajuda já seria o suficiente, e ele teria o maior prazer em esconde-los dela.

Esse era o ponto fraco de Anita e era nele onde a atingiria.

Ouviu o sino da porta tocar.

- Minha ilustre convidada! É um prazer enorme recebê-la!

- Tio! Que lugar dahora!!! - disse a garota. - Posso tirar fotos aqui? Meus seguidores vão amar!

- Claro. Sinta-se como se a casa fosse sua.

- Massa!!!

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