[45 anos atrás] A proposta

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[2ª Edição]


A lua estava em seu quarto minguante, quando do alto da Serra dos Cristais os irmãos Ferri avistaram a histórica Diamantina. Embora o céu estivesse estrelado, naquela época do ano o frio era cortante e a força do vento trazia consigo toda a gama de sons que permeavam a noite. Pacientes, o trio contemplava as singelas luzes da cidade se apagarem com o passar das horas, esperando o momento certo para o salto.

Gosto de cidades históricas...

Gosto de pessoas históricas!

Tem um ar boêmio não acham?

Concordo. Impressionante nunca termos vindo aqui antes...

Diego ouvia o diálogo mental dos irmãos totalmente alheio. Ele já esteve ali.

Santiago, o mais velho dos Ferri, no momento em que colocou o vívido olhar na cidade passou a adorar seu clima hospitaleiro, completamente fascinado pela incrível historicidade que estava prestes a desvendar. Já Alejandro, o mais novo, embalado pela mesma vibração que o mais velho, ouvia em som, uma musicalidade magnífica.

Lado a lado, Santiago e Alejandro compartilhavam suas experiências sensoriais em um leve toque de mãos que amplificava a sinestesia.

Enquanto os irmãos dividiam a apreciação, Diego, o irmão do meio, mantinha-se a parte. Estava agachado, olhando para o solo, taciturno, alheio ao tempo e ao espaço. A verdade é que não queria estar ali, assim como nos últimos tempos não queria estar em lugar algum. As pessoas e as coisas o entediavam, tudo fazia parte de um ciclo comum. Possuía um notável mau-humor, o que o distinguia completamente dos irmãos. Ao contrário dos dois, não se considerava um sobrevivente, mas sim um resistente.

O trio tinha pontos de vista completamente distintos, entretanto, complementares. Tinham seus momentos. Buscavam o equilíbrio enquanto dançavam conforme seus interesses.

— Diego. – chamou Santiago – vamos?

O silêncio foi sua resposta. Santiago e Alejandro entreolharam-se e com sutil aceno de cabeça o mais velho indicou que deviam partir. A dupla desapareceu como um raio deixando o outro para trás.

Diego não estavam ali a passeio, tinham um objetivo.

Ao notar a ausência dos irmãos, pegou do solo um punhado de terra e ergueu-se.

Quanto tempo, Arraial do Tijuco?

Em um gesto quase ritualístico assoprou o punhado de terra. Virou-se na direção oposta a cidade e sem mais delongas, desapareceu como a fumaça se desfaz no ar.

Dirigiu-se para o alvo.

Diego se materializou envolto de fumaça no interior do casarão de arquitetura colonial, as energias e criaturas do plano sutil que habitavam a casa fugiram. De fato, ele era intimidador. No breu, caminhou despreocupadamente até uma grande mesa de mogno e sobre ela pegou um charuto que se acendeu sozinho assim que o levou a boca. Sentou-se na aconchegante e espaçosa cadeira de couro com design italiano, e colocou os pés sobre a mesa brincando com a fumaça que produzia.

— Meu Deus! — clamou o dono da casa ao notar a sombria presença do estranho no local, com uma arma calibre 22 em punhos.

— Não chego a tanto. — respondeu calmamente em um ronronado, iluminado pelo fogo do charuto. — Acho que estou mais para o diabo.

Terra Proibida - EssênciaWhere stories live. Discover now