QUE SÉRIE FILHA DE UMA PUTA!!!
Luanna me viciou em The Walking Dead. Desde aquele dia na casa dela, antes de toda a confusão com o Veiga, eu venho assistindo toda vez que eu arranjo um tempo livre. Fiquei tão viciado que estou no fim da segunda temporada já. A primeira só tinha seis episódios e foi rapidinho para terminar.
Mas essa segunda temporada!!
Puta que pariu.
Essa, sem dúvida alguma, é a melhor temporada de todas. Nem assisti as outras. mas já sei que essa é a melhor. Porra, não tem como superar essa temporada.
Eu estou no fim do episódio doze, Rick acabou de matar seu melhor amigo, Shane, que se transformou em zumbi e Carl foi obrigado a dar um tiro na cabeça do morto. Tem noção disso? O moleque tem doze anos, mano. E matou o tio, padrasto, sei lá que porra esse doido era.
E mano, pra piorar, ou melhorar a situação, não sei, uma manata de zumbi está indo em direção a fazenda. Nem sei o que eles vão fazer pra matar tanto zumbi. Ainda estou processando a morte do Shane.
Seja como for, vai dar certo porque sei que tem onze temporadas no total e eu ainda estou na segunda. Tenho mais um episódio pra terminar dessa temporada. Mais um para ficar ainda mais louco das ideias.
Preciso de uma pausa.
Por isso, encho meu copo de água com a garrafa que eu trouxe lá da cozinha, pego meu celular e início uma chamada de vídeo com a Luanna. Só aquele rosto lindo para me deixar menos avoado por causa de uma série.
Ela leva longos quinze segundos pra atender.
— Sabe que horas são, Gabriel? — ela pergunta assim que atende com aquela voz de brava que faz um sorriso de adolescente surgir no meu rosto.
Está tudo escuro no vídeo e eu mal posso ver a cara dela. Só quero ver o rosto de Luanna e já vou me sentir melhor.
— Boa noite pra você também — digo, ouvindo o barulho de chave virando, carro desligando e alguém encostando as costas com força no banco. — Deixa eu ver seu rosto, preta.
— 'Tô um caco — ela desabafa e sua voz cansada me preocupa. — Horrível mesmo.
— Luanna, o dia que você for feia, eu saio do Flamengo.
— Ixi, se comprometeu. Vai ter que sair.
— Vai, preta. Quero te ver.
Ela suspira, não parecendo disposta a discordar de mim. Por isso acende a luz amarela do carro que é horrível, mas ajuda a enxergá-la melhor.
— Linda.
— Para de me iludir, Gabriel — ela pede, esfregando o olho e deixando o celular apoiado no volante. — Eu sei que estou destruída.
— 'Tava no barzinho até agora?
Luana assente com um sorriso exausto. Seus olhos estão fundos e vermelhos.
— Luanna, duas e meia da manhã, porra. Assim não dá.
— 'Cê quer que eu faça o que? Preciso trabalhar.
— Mas não desse jeito, 'tá se matando, porra.
Ela dá de ombros, pressionando os lábios.
— Eu não posso fazer nada, preciso desse trampo.
— Você 'tá endividada? Cara, eu te faço uma transferência, ou posso sacar e te dar pessoalmente.
— Não — ela discorda abafando uma risada. — Não 'tô louca de aceitar dinheiro assim de graça. Você não precisa fazer isso por mim.
— Eu só não quero que você se mate de trabalhar. Sua rotina acaba com você.
— Relaxa — ela pega o celular do volante, apaga a luz e sai do carro. Entrando dentro de casa. — Não precisa se preocupar comigo. Eu dou conta.
— Nenhum ser humano dá conta de verdade de uma rotina dessas. — Me lembro do horário que ela me mandou mensagem hoje antes de ficar off-line. — Você saiu de casa hoje 10 horas da manhã, mano. E 'tá chegando duas da manhã do outro dia. Sem cabimento, na moral.
Ela ri do que eu digo, entrando em seu quarto, fechando a porta e apoiando o celular na cômoda.
— Você 'tá parecendo minha mãe falando, Gabriel. Já disse que eu 'tô bem e que eu dou conta.
De repente, ela começa a dar um show pra mim. Isso mesmo. Um show. Porque Luanna, não sei se faz de propósito, mas tira a regata que está usando, retira a calça e fica só de calcinha e sutiã.
Puta que pariu, Luanna!
Me obrigo a agir normalmente, afinal eu já vi o corpo dessa mulher completamente nu muitas vezes para ficar tão agitado vendo de novo. Eu conheço cada detalhezinho. Não devia estar agindo como quem nunca viu uma mulher gostosa antes. Mas... Luanna é meu ponto fraco. Nua, então, acaba com minha cabeça.
— Eu preciso tomar um banho — ela diz, caminhando pelo quarto só de calcinha e sutiã enquanto procura uma roupa para vestir.
— Vai me levar junto com você?
— Pro banho? — ela olha pro celular com um sorrisinho malicioso. — Nem fodendo, né?
— Poxa, preta. Eu só queria te foder agora.
— Vem me buscar, eu te passo o endereço.
— 'Cê 'tá falando sério? — me animo só de pensar na possibilidade.
— Claro que não — ela ri, debochando de mim e me deixando com cara feia de decepção. — 'Tô muito cansada, preto. Se eu pudesse, eu dormiria até meio dia.
— Vai ter que trabalhar que horas hoje?
— Tenho que estar no barzinho às 11 da manhã. Mas eu acordo às 8.
— Luanna — digo seu nome, balançando a cabeça sem acreditar. — Você pelo menos está se alimentando direito?
— Então — ela colocas as duas mãos na cintura e sorri para mim, tentando me ganhar.
E eu já sei a resposta, mesmo sem dizer.
Meus olhos não perdem tempo em analisar o corpo de Luanna de novo, mas não com malícia, e sim com preocupação. Ela está magra. Mais magra que o normal. Suas costelas estão ficando marcadas. Sua barriga está estranha de uma forma que eu não sei explicar. Ela não está com o corpo normal. Está perdendo peso.
— Vai se alimentar agora, Luanna — ordeno, com a voz firme.
— Preciso tomar um banho primeiro.
— Porra de tomar banho. Você precisa comer. E agora, caralho. Anda!
— 'Tá bom.
Ela pega uma roupa qualquer jogada pelo chão, se veste e sai do quarto me levando junto. Logo ela está na cozinha, me deixando em cima da bancada para pegar alguma coisa da geladeira.
— Ah! Sobrou bolo de cenoura que eu fiz ontem! — Ela exclama que nem um criança feliz, cortando um pedaço e comendo enquanto ainda procura o restante de sua comida. — Tem feijoada.
— Feijoada é muito pesado pra comer agora — informo, a fazendo assentir.
— Verdade. Então vou fritar uns ovos e comer com pão. Tem presunto e queijo aqui também. E acho que tem pão de forma no armário.
Quando menos percebo ela está na boca do fogão, preparando sua janta, se é que pode se dizer assim numa hora dessas da noite.
— Mas me fala — ela começa a falar, mexendo na frigideira — por que está acordado uma hora dessa? Jogadores não têm uma hora específica para dormir pra não ficar cansado no CT de manhã?
— Sim, mas eu estava assistindo série e nem vi a hora passar. 'Tô indo pro último episódio da segunda temporada de The Walking Dead.
— Caralho! — ela exclama, virando o rosto para me encarar com aquela cara de quem foi surpreendida. — Você realmente gostou da série, né? Terminou duas temporadas rapidinho.
— Seloco, Luanna! Essa série é foda!
— Eu sei — ela se anima junto comigo. — Eu sou viciada. Mas, assim, chega numa determinada temporada as coisas ficam mais... chatas.
— Também, né? Pra que fazer onze temporadas? Tenho certeza que metade do elenco vai estar morto até lá. Me fala se o Glenn morre. Esse moleque é fera demais, se morrer, eu paro agora de assistir.
— Eu não vou te falar nada — ela dá risada da minha reação, colocando os ovos no pão e o deixando em cima de um prato ao lado do copão de Coca-Cola. Luanna precisa passar numa nutricionista urgente. Não se alimenta direito e quando se alimenta se entope de açúcar. — Mas muita coisa vai acontecer ainda, relaxa.
— Tenho certeza que o fazendeiro morre. Deve morrer nesse último episódio, né?
— Para de me pedir spoiler! — ela implora, rindo. — Não vou te contar nada, você tem que...
Ela para de falar ao ouvirmos um barulho estranho. Luanna olha assustada para trás. Imediatamente me preocupo. É a primeira vez que vejo o olhar de Luanna tão assombrado. Nem quando seu irmão e o seu ex nos viram na casa dela, ela ficou tão assustada quanto.
— Que foi isso? — pergunto.
— Espera aí — ela pede, deitando o celular o que faz a câmera ficar virada para o teto e me impossibilitando de vê-la.
Não ver o que está acontecendo só me deixa ainda mais nervoso, principalmente por ouvir a voz de Luanna e o barulho que se segue.
— Marcos, caralho! — ela repreende. — Isso é hora de chegar?
— Sai do meu pé, Yasmin! — diz provavelmente o tal do Marcos com a voz completamente arrastada de um bêbado. — Me leva pro quarto e me mama, vai!
— Eu não sou a Yasmin, seu animal!
— Ah, Luanna! — o cara exclama feliz e eu fico ainda mais irritado. — Você é tão linda!
— 'Tá... Não, Marcos. Me solta! Sai... Sai, porra! Fica aí!
— 'Tá bom — diz o cara com manha.
Segundos depois, o celular é erguido e a cara da Luanna aparece na tela.
— O que foi isso? — pergunto assim que a vejo e suspiro de imediato.
Luanna pega o pão e o copo de Coca-Cola e logo começa a caminhar de volta para seu quarto onde tranca a porta e finalmente se senta em sua cama.
— É o namorado da menina que eu divido a casa.
— A tal da Yasmin?
— Isso — ela confirma, respirando fundo e mordendo o pão. — Ele é um alcoólatra do caralho.
— O que ele fez com você? Eu ouvi você mandar ele te soltar.
— Ele me abraçou, aquele maluco. 'Tá tão bêbado que nem sabe o que faz — ela diz de boca cheia.
— Ele já fez isso antes?
— Que? — ela franze o cenho, tentando me entender. — Não. Não, Gabriel. Ele não é um perigo. Juro pra você. O filho da puta é inofensivo, não bota medo nem numa mosca. Foi fácil me soltar dele. Fica de boa.
— Não vou ficar de boa sabendo que um bêbado chega na sua casa no meio da madrugada e fica te agarrando.
— Não é assim. Marcos é um idiota. Não é um perigo. Confia em mim.
— Por que você não sai dessa casa?
— Porque eu não tenho dinheiro pra pagar um aluguel inteiro. Aqui eu pago metade.
— O dinheiro que você ganha no barzinho não compensa? — Porra, ela trabalha que nem uma condenada e mesmo assim não consegue ter dinheiro para fazer o que quer.
— Poderia compensar se eu não tivesse cheia de dívida.
— Que tanto de dívida é essa, Luanna? Tentou abrir uma empresa ou algo assim?
— Não — ela ri do que eu digo, engolindo a comida e bebendo um pouco de Coca. — Quando eu consegui o apartamento lá em São Paulo, meu irmão pagou a entrada e eu não permiti que ele pagasse o resto. Eu 'tava trabalhando numa empresa boa de marketing e conseguiria me sustentar. A ajuda dele sempre foi bem-vinda, mas depender disso já era demais pra mim. Por isso comecei a pagar sozinha. Até reformei o apartamento inteiro. O problema é que fui demitida e tive que congelar minhas dívidas. Agora que estou trabalhando de novo, 'tô podendo pagar. Mas com juros. Meu dinheiro vai tudo pra isso, e o restante eu uso pra pagar a metade do aluguel e os gastos com meu carro. Não sobra quase nada.
— Porra — suspiro, às vezes eu esqueço o quanto é difícil ser um simples trabalhador em nosso país. Tenho mais dinheiro do que eu preciso. — Eu vou te ajudar.
— Não vai, não.
— Vou sim, Luanna. Vou sacar um dinheiro pra você.
— Eu não vou aceitar seu dinheiro, Gabriel. Não 'tô passando fome. Você tem que ajudar quem precisa.
— Você passa fome, sim. Mas porque quer — ela assente, sorrindo. — E eu não quero que você more na mesma casa que um maluco.
— Mesmo assim, meu dinheiro não é suficiente pra pagar um aluguel por aqui. Rio de Janeiro consegue ser mais caro do que São Paulo.
— Vem morar comigo então — sugiro sem pensar, a deixando com o cenho franzido e uma expressão chocada.
— 'Cê quer que eu more com você? — ela pergunta só pra ter certeza.
— Aqui você pode morar de graça e é pertinho do seu trabalho. Pelo menos se livra de um maníaco.
— Gabriel — a voz dela ganha mais intensidade como se ela quisesse saber o real significado desse pedido. — A gente moraria na mesma casa. É isso mesmo que você está sugerindo? A gente nem namora, o que você falaria pra sua família?
— Que estou ajudando uma amiga endividada.
— Ata — ela assente. — Uma amiga.
— Se você quiser que eu te apresente de outra forma, é só falar.
— Você gostaria de me apresentar de outra forma?
— Depende de você.
— Depende de mim? Eu não sei o que você quer comigo. Tipo a gente transa, conversa todo dia. Você já até tem liberdade para me ligar por chamada de vídeo. Mas tudo isso significa o que?
— O que significa pra você? — Devolvo a pergunta, sentindo meu coração acelerar.
— Eu perguntei primeiro.
Respiro fundo e me aconchego no travesseiro. Ô merda, não era para as coisas caminharem para um assunto tão sério quanto esse. Eu gosto da Luanna e gosto do que a gente tem. Mas... não quero me precipitar. Não quero quebrar a cara. Não dá para fazer tudo na base da emoção. Eu sei que há sentimento da minha parte, mas isso não basta.
Por isso eu digo:
— Não sei o que significa — mentira, eu sei o que significa, só tenho muito medo de dizer e de estar me iludindo. — Eu só quero te ajudar.
— Não preciso de ajuda. Eu 'tô bem.
Acho que nem ela acredita no que diz.
Luanna está perdendo peso, está dormindo pouco, trabalhando muito. Sua vida corrida está acabando com ela. Devia enxergar isso. Mas não vou discutir. Não mais. E não hoje. Ela precisa descansar, já tomei muito do tempo dela.
— Você é forte — é o que consigo dizer, oferecendo um sorriso. — Sei que consegue dar conta.
Não sei se ela consegue dar conta, por isso vou ter que me preocupar em dobro. Será que devo conversar com a chefe dela? Ela é amiga da Dhiovanna. Talvez eu consiga melhorar esse tempo de serviço de Luanna. Assim ela não se mata de trabalhar.
— Agora vamos falar de coisa boa — ela pede, mordendo outro pedaço do seu pão. — Me fala o que 'tá achando da série.
QUE VONTADE DE BATER NO GABRIEL até ele admitir logo pra Luanna que tá apaixonado. O coitado se perde no que fala. Ele quer uma coisa e diz outra e fica nisso. Mas calma. As coisas não vão ser assim pra sempre. É um processo, que vai acelerar muito daqui pra frente.
Espero que vcs estejam gostando. Próximo cap será o grande dia do Trio do Flamengo.
Ô DIA ABENÇOADO.