Sempre | Melhores momentos

By Souto14

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Para aqueles que vivem me perguntando sobre a volta do casal mais odiado e amado do universo literário. More

NOTAS
01 | Vizinhos novos
02| Reencontros
03| Invasão de privacidade e outras drogas
04| Segredos que nem são tão segredos assim
05| A namorada do meu melhor amigo
06| Lindos olhos
07| Não consigo mais
08| Amar você será meu fim
09| Na mesma moeda
10| Você não é um monstro
11| Reescrever as estrelas
12| Eu só queria que você soubesse
13| Palavras tem poder
15| Aquele que não deve ser mencionado
16| Alucinações
17| Bonequinho de plástico
18| Palavras vazias e desesperadas
19| New York
20| O capitão retira a máscara
21| Entre casais
22| Não tem como piorar
23| Eu achei que tinha superado
24| Faca cravada no peito
25| Quero você, apenas você
26| Sinto nojo
27| Principe encantado uma ova
28| Hospital, enterro e saudade
29| Fugitiva
30| Medo de perder
31| Longe
32| Uma vez rei dos babacas, sempre rei dos babacas
33| My escape
34| Sempre será você
35| Farsas e mais farsas
36| Cinderela
37| Entre términos e beijos
38| Gold Bet
39| Ferido
40| Nunca deixamos um Stone para trás
|THE END|
NOTAS FINAIS

14| Traidor

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By Souto14

Esse capítulo foi a pedido de uma leitora. Espero que aproveite, Sarah.

***

Max estava errado.

Minha alma santinha, como ele mesmo havia se referido, já tinha frequentado algo semelhante ao que tínhamos à nossa frente. Foi apenas uma vez, no entanto. Mas o suficiente para me fazer desejar nunca mais pôr os pés em um lugar como aquele.

Parada no meio da rua, sentindo um frio subir lentamente por minha espinha, olhei mais uma vez na direção em que meus amigos estavam caminhando, uma mansão com muitas pessoas bêbadas no jardim. Mais que merda. Meus dedos se fecharam em volta da bainha de meu suéter vermelho vinho, e rangi os dentes em desgosto. Se arrependimento matasse, eu teria caído dura assim que pus os pés para fora do maldito carro. Como uma boa amiga, achei que minha responsabilidade aquela noite deveria ser ajudar Mari a esquecer, pelo menos por algumas horas, o ex e toda a sua toxicidade. Mas, naquele momento, meus pés pareciam presos no concreto da rua, um bolo enorme subindo por minha garganta e suor frio escorrendo pela cavidade em minhas costas. A imagem de olhos verdes e raivosos me encarando com nojo, brilhou em minha mente e engoli a seco. Não importava quão fundo tentasse enterrar as lembranças daquela noite dois atrás, elas sempre voltavam de uma forma ou de outra. Mas estar em um lugar tão igual... parecia, apenas, fazer tudo queimar mais forte.

Confesso que fui estúpida não imaginando que topar sair com os patetas me levaria a isso. A verdade é que eu estava confiante de que o lugar não importava; eu tinha passado pela social na piscina sem nenhum problema, afinal. Eles tinham bebidas e aglomerações, assim como a festa na minha frente, então, porque estava entrando em pânico? Essa noite está muito mais parecida com a de dois anos atrás. Porra, sim. A pior merda que fiz na minha vida tinha começado comigo saindo escondida também, e a casa à minha frente chegava a ser assustadoramente semelhante à das minhas memórias. Essa era a resposta para o meu cérebro pifando... meu inconsciente tinha ligado todos os pontos muito antes do resto da minha cabeça. E não ajudava em nada que meus ouvidos repudiavam música alta e minha parte social odiava aglomerações. O lugar à minha frente tinha os dois de sobra.

― Vou pegar um táxi. Não estou entrando aí nem morta. ― Informei alto o suficiente para que o casal alguns metros à frente pudessem ouvir. Eles pararam de andar no mesmo instante.

― Nem ouse. ― Mariana franziu a testa em reprovação.

― Eu não me encaixo nisso. ― Ergui o queixo na direção da casa.

Max, que estava um pouco mais afastado, apenas levou as mãos aos bolsos da calça e lançou-me um olhar estranho. Desde que o encontramos no estacionamento ele estava agindo como se fosse outra pessoa. Fria e retraída.

― Estamos em uma festa, Lis, onde jovens costumam vir para fazer coisas irresponsáveis e divertidas. Sei que pode fazer algo assim essa noite.

― Vocês dois não estão entendendo... eu não posso. ― Troquei um olhar desesperado entre eles. ― Já tentei uma vez e foi um desastre total.

― Provavelmente tentou errado, então. ― Mari se aproximou com um olhar doce, e entrelaçou seu braço no meu. ― Essa noite será muito melhor, eu prometo.

Com isso, ela saiu me arrastando pelo jardim até a porta luxuosa da mansão, tirando-me qualquer chance de uma objeção. Suspirei pesadamente quando o frio em minha barriga se intensificou. De uma forma impossível, o som que já era estridente no jardim, dentro ficava pior. Havia pessoas bêbadas onde quer que se olhasse, e o cheiro misto de maconha, suor e álcool estava fazendo minha bile vir à garganta incontáveis vezes em um intervalo de meio segundo. A única coisa boa era que a ambientação interna tinha uma atmosfera completamente diferente da primeira festa que compareci. O lugar à nossa volta, felizmente ou infelizmente, não foi feito para amadores. A vibe que passava era que qualquer coisa seria possível ou legalizada enquanto se estivesse ali dentro. Fiz uma careta ao ver um casal quase transando contra uma parede ainda no hall de entrada. Os movimentos pelo menos lembravam vagamente a ação.

― Se eu ficar aqui por mais alguns segundos, juro que vou botar aquele jantar que não comi para fora. ― Balbuciei enquanto tentava me esquivar de algumas pessoas pelo caminho.

― Deixe de drama, Anna Lis. ― Mari arremessou de volta. Seus olhos sondaram o ambiente como os de uma águia, procurando por algo furiosamente.

― O que foi?

― O desgraçado do Philips sumiu na multidão. ― Respondeu com raiva e revirei os olhos achando uma graça como esse ódio entre eles funcionava. Não suportavam a simples menção do nome um do outro, contudo, os dois sempre estavam cientes da presença ou ausência dos mesmos.

Eu, por exemplo, melhor amiga dele e nem mesmo havia me ligado que o mesmo não estava mais andando a nossa frente como se fosse o rei da festa. E meu nervosismo não me deixou se importar menos. Tudo o que importava naquele instante era descobrir quem foi o gênio que substituiu toda a iluminação normal por luzes coloridas irritantes para cacete. Já podia sentir as dores criando forma em meu crânio e permanecendo.

― E por que se importa com isso? ― Questionei como quem não quer nada, mas bem atenta em sua resposta. Estava cansada de ficar no escuro...

― Você veio ficar com os amigos dele, não veio? ― rosnou. ― O idiota devia tê-la levado com ele.

Ela tinha um ponto, mas eu não estava deixando-a sozinha nesse lugar, vulnerável e propícia a fazer besteira.

Um segundo mais tarde chegamos ao que imaginei ser a sala de estar. Era um espaço grande com copos e garrafas de cerveja espalhadas por qualquer lugar plano. E então havia mais pessoas, divididas em três grupos: aqueles que se acomodaram nas extremidades do cômodo, conversando com um conhecido ou alguém que acabou de descobrir o nome. No sofá estavam aqueles que vieram para transar em público, mas confortavelmente. Eca. No centro estava o amontoado de corpos suados, porém, felizes, enquanto se moviam no ritmo da música. Alguns se divertiam sozinhos, outros estavam em grupos ou par, e por um segundo me imaginei fazendo o mesmo. Eu não sabia nem dançar dois passinhos para a direita, dois passinhos para a esquerda, mas aquela era a única parte da festa inofensiva, saudável e aparentemente emocionante. No entanto, o pensamento logo foi descartado quando notei um cara se aproximando indelicadamente de uma garota dançando sozinha, que ficou tensa no mesmo segundo e tentou se soltar do seu aperto inutilmente. O idiota continuou a segura-la perto, mantendo seu quadril colado no traseiro da garota claramente desconfortável. Senti o sangue ferver em minhas veias, e pronta para mandá-lo para o inferno, dei um passo na direção dos dois, mas minha melhor amiga foi mais rápida e passou por mim como um furacão ambulante. Pelo caminho, a loira tomou um copo de cerveja da mão de alguém e despejou tudo na cabeça do verme asqueroso. A desconhecida pulou para longe do aperto dele antes que pudesse se molhar junto, e deu uma joelhada incrível em suas bolas. Porra, eu quero ser igual as duas quando crescer. No momento em que o idiota saiu do seu estupor, ele se dirigiu as duas com puro ódio. Parecia um animal doente, gritando e gritando. Não dava para entender nada do que rosnava, contudo, mesmo a distância não parecia nada agradável. Nenhuma das meninas recuou, no entanto. Tudo o que fizeram foi cruzar os braços na altura dos seios e arrebitar mais o nariz. Mari disse algo arrogante o suficiente para fazê-lo perder a cabeça completamente e avançar na direção dela. Faça algo agora, a vozinha dentro do meu cérebro ordenou desesperada. Mas quando fiz menção de me mover outra vez, uma mão possessiva sobre minha cintura me fez congelar.

Droga, quantos idiotas assediadores tem nessa maldita festa?

― Aonde pensa que vai com tanta pressa? ― as palavras roucas soaram próximo ao meu ouvido e soltei o ar preso em meus pulmões, aliviada. Mesmo que não devesse. ― Não precisa se meter nisso, boneca. Os outros estão com elas agora. ― Sua respiração bateu contra meu pescoço, suave e quente, e me forcei a permanecer imóvel. Não, eu não estava atraída por ele, longe disso. Mas aquela região específica sempre foi extremamente sensível a qualquer tipo de atenção, e tudo o que eu menos precisava era de Paul Caradoc achando que tinha algum efeito sobre mim.

Mas voltando ao que importava, ele tinha razão.

Durante o segundo em que fiquei completamente desconcertada com a presença repentina de Paul, Max e Diego haviam se colocado entre as garotas e o verme asqueroso. Na social alguns meses atrás quando o loiro me protegeu do tal Liam, e nunca mais o vi tão furioso, achei que aquele fosse sua pior versão. No entanto, enquanto tinha um braço estirado na frente de Mariana, mantendo-a longe do outro cara, seu corpo emanava perigo. O verme recuou quase instantaneamente quando Phillips se dirigiu a ele. Merda. Eu só queria ter estado lá para ouvir a ameaça que fez até mesmo as meninas estremecerem. Quase perguntei a Paul o que ele achava que nosso amigo tinha dito ao verme asqueroso, porém consegui morder a língua bem a tempo. E ao invés disso perguntei:

― O que está fazendo aqui?

Seu corpo ainda estava bastante presente às minhas costas. E era quase impossível não tomar conhecimento do quão grande ele parecia naquele momento.

― Vim te buscar... ― O cheiro de nicotina misturado com álcool inundou minhas narinas quando falou. ― Estávamos esperando pela nossa mascote favorita para começarmos os jogos.

De repente, sangue latejou em minha cabeça furiosamente, e finalmente me lembrei do porque eu o odiava tanto. Dissimulado, manipulador e sociopata de merda eram boas formas de explicar seu caráter. Ou melhor, a falta dele.

― Eu não sou um brinquedo, seu cretino. ― Arremessei com raiva, me soltando do seu aperto e virando para ficar de frente para ele.

― Wou, você está ainda mais gata de frente. ― Inabalável como sempre, Caradoc piscou galanteador.

― Vá para o inferno, certo? ― gritei sobre a música alta e tentei passar por ele, seu aperto em meu cotovelo logo me impedindo. Revirei os olhos com um misto de raiva e frustração.

― Tão paranoica, boneca. ― Zombou ele. Um sorriso falso inocente esticando os lábios naturalmente vermelhos, como se o cara passasse o dia apertando-os entre os dentes. ― Eu não quis dizer que você seria o brinquedo. O grupo estará jogando verdade ou desafio na sala de jogos...

O que?

Claro que sim. A noite estava se repetindo muito mais do que imaginei, merda.

Sorri ácida.

― Esquece. Eu não estou participando desse jogo estupido, então nem perca seu tempo me contando sobre isso. ― Me soltei do seu aperto bruscamente, odiando como seu toque passava uma sensação possessiva e opressora.

Fixei meus olhos em seu rosto, e esperei por mais um dos seus sorrisos característicos, aquele que me chamava de boba e ingênua. A maioria das pessoas da minha idade sempre costumavam ter algo do tipo guardado para mim, mas o dele sempre costumava ser mais ofensivo. No entanto, o sorriso não veio. E curiosamente tudo o que encontrei foram olhos âmbar me fitando inexpressivos por três segundos inteiros, até que ele piscou e tudo voltou ao normal. A postura arrogante e o brilho malicioso em seus olhos.

― Não sei o que fizeram com você, boneca, mas pode soltar as armas. Não estamos fazendo o mesmo. Pode apenas assistir, se isso for demais para a sua alma puritana e paranoica. ― Paul esclareceu forçando um ar tedioso, e pisquei atônita por alguns segundos. Porque todos eles tinham o dom de ver por trás da minha máscara? Primeiro o Max, depois o Dean, e agora ele.

Droga!

― Qual vai ser? ― a voz impaciente dele me puxou para longe do meu estupor.

Ir com ele não parecia ser ruim, visto que eu não precisaria participar de nada. Mas ainda havia o fato de que se estivesse aceitando, minha melhor amiga acabaria sendo deixada sozinha nessa droga de festa...

― Mariana pode vir comigo?

Ele fez uma careta, e, então, respondeu como se algo estivesse amargando em sua boca.

― Gostaria de dizer que não, mas sua amiga e a outra garota acabaram de seguir os caras na mesma direção que estamos indo agora. ― Sua mão agarrou a minha e o rapaz começou a me arrastar para longe.

― Eu ainda não disse que aceitava. ― Protestei enquanto percorria os olhos rapidamente pelo espaço cheio, tentando achar qualquer traço de cabelos loiros ouro ou saltos que pareciam custar a minha mesada anual. Não seria muito difícil para Paul mentir sobre ela estar indo com os outros.

― Foda-se. Tentei fingir que você tinha uma escolha apenas para ser legal, mas minha paciência está chegando ao fim e eles arrancariam a minha cabeça se eu voltasse lá sem você. Sem falar que a sua ingenuidade seria como sangue para os carniceiros idiotas vagando por aí.

Ingenuidade é o caralho.

― Idiotas iguais a você? ― arremessei sem dó. Paul parou, e seus olhos caíram sobre mim como duas facas em chamas.

― Posso ser um bastardo de merda, boneca... ― as palavras foram arremessadas em minha direção com desgosto. ― Mas não preciso forçar garotas a irem para a cama comigo. Elas vêm por si só. E voltam por si só, também.

Ah, inferno.

Vergonha havia se tornado meu sobrenome naquele instante. Paul Caradoc era, de fato, um belo de um idiota narcisista, mas acusa-lo de assédio tinha sido um limite que eu não devia ter ultrapassado, mesmo que ele me irritasse mais que qualquer outro ser humano na terra.

― Desculpa, eu não...

O rapaz zombou estalando a língua.

― Não precisa torcer sua calcinha, boneca. Você não foi a primeira a pensar algo assim e tenho certeza que não será a última. Que bom que não me importo, certo? ― seu aperto se reforçou em minha mão, e logo estávamos andando de novo. ― Mas fique atenta, Anna Lis. Nem todos os monstros se parecem com um.

Gostaria de dizer que suas palavras não me acertaram com força, mas seria uma mentira de merda. Olhos verdes raivosos brilharam em minha mente outra vez, e senti meu corpo se contrair ao ter que concordar com Paul Caradoc. Os monstros de verdade saíam debaixo da sua cama quando você menos esperava, e quando as garras estavam a centímetro do seu coração era que você percebia que algo estava errado. Você foi atingida, e deixada para sangrar sozinha enquanto o seu monstro te chamava de boba e ingênua na frente da escola inteira. Desnorteada o suficiente, deixei que ele me guiasse para onde estavam os outros. E me agarrei à ideia de que se permanecesse com os meus amigos, estaria salva. Do passado. Das memórias. E da minha mente altamente destrutiva.

O cômodo em que entramos não estava mais iluminado que a sala, mas tinha um ponto positivo: não tinha as irritantes luzes coloridas. E o número de pessoas habitando o espaço era significativamente menor, também. Aos poucos a náusea que vinha embrulhando meu estômago foi passando, e o martelo batendo contra a minha nuca, cessando. Lentamente deixei que minha atenção caísse completamente sobre o ambiente. A música tinha ficado milagrosamente abafada do lado de fora, e um pequeno grupo de pessoas estava em volta de uma mesa de sinuca; todos os quatro desconhecidos para mim. Em um canto mais escuro estava dois caras dividindo uma poltrona, e rapidamente senti minhas bochechas esquentarem ao perceber que estava olhando muito mais do que apenas um beijo.

― É em momentos como esse que odeio a preferência dele. ― Paul murmurou raivosamente ao meu lado.

― Ele quem?

― Luke.

Levou alguns instantes para que meu cérebro pudesse ligar a resposta rosnada de Paul com a cabeça platinada sentada à direita, mas quando finalmente aconteceu, meu queixo caiu. E foi como se todas as luzes tivessem sido finalmente ligadas, clareando todos os últimos meses de convivência com Luke Mitchell. O garoto de cabelos platinados e olhos azuis tão claros quanto o céu era tão lindo quanto qualquer um dos patetas, mas sua atenção com as garotas era quase inexistente. Sempre achei estranho que todos os outros, até mesmo os comprometidos, tivessem que jogar um bolo de cartinhas no lixo, todos os dias, assim que as aulas acabavam, mas não Luke. Porque todas as alunas do Saint Valley sabiam, menos eu. Lembranças dele elogiando outros caras me atingiram em cheio e me perguntei como pude ser tão lenta. Houve até mesmo um comentário sobre Dean quando os garotos não estavam prestando atenção. O babaca é bonito demais para o próprio bem e a sanidade dos outros. E disse isso enquanto quase devorava com os olhos o rapaz completamente alheio do outro lado da sala de aula.

Minha mão voou para a boca no instante em que percebi que também conhecia seu acompanhante.

― O cara com ele não é o capitão dos Águias? ― questionei em um sussurro para o rapaz ao meu lado, que ao invés de murmurar algo de volta para mim, gritou na direção do casal:

― SEU TRAÍRA DO CARALHO.

Luke lhe ofereceu o dedo do meio como resposta sem se importar com nada além do beijo que estava trocando com o responsável por deixar Dean sangrando no gramado. Senti uma onda de raiva tomar meu corpo, e fechei a cara mesmo sabendo que era um sentimento infantil. Dean Stone estava bem em algum lugar, e nem sequer devia se lembrar que cortou o supercílio três semanas atrás por causa de um sem noção. Então, por que, diabos eu precisava tomar as dores dele? Sem falar que Paul tinha feito muito pior e estava ileso ao meu lado.

Bufei em frustração.

― Pare de ser ciumento e os deixe em paz, Paul. ― A voz do Cohen soou às nossas costas e me virei para encontrar todo o restante do grupo esparramado no sofá e algumas poltronas. Uma garrafa de cerveja vazia estava deitada sobre uma mesa de centro.

― Estávamos prestes a começar sem vocês. ― Diego foi quem se pronunciou dessa vez, sentado no sofá com uma cerveja a caminho dos lábios. Seus olhos verdes brilhantes estavam realçados pela camiseta verde militar que trajava e seu sorriso perfeito estava mirando em nossa direção com cautela. Não passou despercebido por mim, também, que a garota da pista de dança estava sentada ao seu lado aparentemente ansiosa. O que era compreensível, visto que a mesma estava em volta de pessoas desconhecidas que poderiam ser qualquer coisa, menos legais e sensatas. Não que os patetas fossem sensatos cem por cento das vezes, mas, com certeza nunca seriam uma ameaça como o verme asqueroso foi para ela. Meus olhos se fixaram nela por mais alguns segundos, admirando primeiro o seu cabelo azul preso em um rabo de cavalo alto, depois o vestido prateado que usava, tão curto e apertado quanto o da minha colega de quarto. Meu olhar desviou para o cara ao lado assim que a voz dele voltou a soar: ― Por que demoraram tanto?

― O que você acha? ― Paul se jogou sobre a última poltrona vaga, um sorrisinho malicioso esticando seus lábios. ― Anna Lis estava preferindo me levar para um lugar privado e nos divertimos um pouquinho. Precisei persuadi-la do contrário, é claro. Não podia deixar todos vocês esperando.

Em outro momento, Max, para manter a nossa farsa sobre controle, lançaria alguma ameaça na direção do amigo maluco para ficasse longe de mim. Mas naquela noite, o meu melhor amigo não aparentava estar muito ciente do nosso trato. Sentado em uma das três poltronas ocupadas, o loiro nem mesmo notou minha presença na sala enquanto tinha aquele olhar estranho ainda nublando suas feições normalmente gentis e suaves. Meus olhos deslizaram para o copo de uísque equilibrado entre dedos frouxos e sua coxa esquerda. Eu não me importava com o que os outros pensavam da nossa relação fantasiosa, não quando tinha planos de acabar com ela em breve..., mas algo estava acontecendo com ele. E com isso, eu, definitivamente, me importava. Fiz uma nota mental de me aproximar assim que possível e me mostrar disponível para ajudá-lo com o que fosse. Era o que amigos de verdade faziam, certo?

― Até parece... ― Subitamente o tom desdenhoso da minha melhor amiga cortou o ar, e somente então, me lembrei de que ela estava ali também. Paul não mentiu.

Meu olhar recaiu sobre a garota sentada em uma poltrona, as pernas elegantemente cruzadas e uma cerveja quase vazia entre os dedos finos. De uma forma estranha, naquele momento, ela parecia fazer parte do grupo muito mais do que eu, supostamente, deveria parecer.

― E de quem foi a ideia de te trazer aqui mesmo, Barbie plastificada? ― Rosnou de volta.

― Minha. ― Max respondeu calmamente, e todos se viraram em sua direção. Olhos azuis fixos no rosto de Paul, duros e superiores, desafiando-o silenciosamente a se opor.

O outro riu.

― É por isso que gosto de você, cara. Sempre fazendo merda e tornando as coisas muito prazerosas para mim. ― Seus olhos carregavam um brilho doentio de excitação. Mas também havia raiva entoando cada palavra pronunciada.

Do outro lado da mesinha, Max Phillips parecia possesso com a insinuação.

― Vamos começar essa porra hoje ou não? ― Diego rosnou, percebendo a tensão perigosa que estava se formando. Suspirei aliviada quando nenhum dos dois ousou dizer mais nada.

― Você está nessa? ― Petros se virou para mim, e tive dúvidas se era isso mesmo. Desde que havíamos nos conhecido, ele nunca tinha falado comigo. No início, achei que talvez o rapaz tivesse algo contra a minha presença, mas o mesmo era apenas muito aéreo para as coisas que não tinham a ver com futebol ou com sua namorada, Becca. A mesma garota sentada sobre seu colo naquele momento, e que me lançou um sorriso amigável.

― Anna Lis. ― Seus lábios se mexeram outra vez, uma sobrancelha castanha arqueada elegantemente no ar, uma pontada de diversão consumindo os olhos pretos. Inferno, era mesmo comigo

― Sim... quer dizer, não! ― Me atrapalhei um pouco, conseguindo arrancar risadas de alguns.

― Aposto que a boneca ainda está pensando naquele quarto escuro e privado... ― o olhar dele encontrou o meu, divertimento genuíno destacando o dourado em suas íris.

Idiota irritante e sádico.

― Só se for para trancar você lá dentro e jogar a chave fora.

― Com você estou topando qualquer coisa. ― Retrucou preguiçosamente.

Por mais que estivesse com vontade de pular nele e esgana-lo com minhas próprias mãos, respirei fundo uma e outra vez. Então voltei minha atenção para o casal sentado a poucos metros de mim, me esforçando para soar confiante e decidida dessa vez:

― Aquele idiota sem cérebro me falou sobre o jogo, mas estou apenas assistindo.

― Sem problemas. ― O rapaz respondeu simplesmente, e depois voltou-se para os outros. ― Todos os restantes estão dentro? Ou tem mais alguém sensato aqui?

Ninguém se pronunciou. E automaticamente estranhei que Mariana estivesse nessa também. Ela não os odiava?

― Luke? ― Paul gritou.

― Eu pareço que estou interessado, porra? ― O garoto platinado gritou de volta, ofegante.

Na verdade, ele parecia estar se divertindo bastante. Mordi os lábios para conter o sorriso.

― Então pegue logo um quarto, merda. Não quero ter que ver sua bunda branca quando me levantar daqui.

― Eu transo onde...

― Estou girando a garrafa! ― Davi avisou por cima, dando fim a conversa "agitada" dos dois, e um instante mais tarde o objeto estava girando sobre a mesa de centro.

Pela visão periférica notei minha melhor amiga me chamando para sentar ao seu lado, e assim fiz. Paul, de uma forma nenhum pouco surpreendente, murmurou algo como "ao meu lado você ficaria mais confortável, boneca", mas, preferi se fazer de louca e deixá-lo falando sozinho. Talvez "louca" não fosse exatamente a palavra certa, visto que ignorar o idiota era uma vigorosa prova da minha saúde mental. Paul Caradoc não era apenas alguém que destruía a si mesmo, mas alguém que sentia a necessidade de puxar outras pessoas junto. E eu não estava caindo em suas garras.

Alguns minutos se passaram, e, em silêncio, assisti ao jogo dos meninos se desenrolar lentamente. Os desafios eram tediosamente fáceis, como virar cinco shots de tequila de uma vez ou conseguir uma determinada quantidade de números de telefone em cinco minutos. Enquanto as verdades apenas nos arrancavam uma dezena de gargalhadas, como quando Petros confessou ter perdido o bv com uma prima aos onze anos e que saiu com um lábio cortado e um pedaço do dente faltando. Também assistimos encantados, Ayla, a garota da pista de dança, aceitar seu desafio com unhas e dentes, e beijar o goleiro dos Lycans sem nenhuma amarra. Cohen assobiou, e Meg, sentada ao lado dele, murmurou para que procurassem rápido um quarto quando os dois se perderam no momento, e a garota de cabelo azul foi puxada para o colo do seu novo amigo.

Senti meu estômago se revirar com a cena desconfortavelmente familiar. Dean. Eu estive com ele da mesma forma, apenas algumas horas atrás.

― Verdade ou desafio? ― A voz de Paul soou e fui puxada para longe das lembranças.

Por mais que o beijo no auditório ainda queimasse em minha mente como se houvesse ocorrido a um minuto atrás, e a saudade que sentia dele ainda me deixasse tonta, sempre que a garrafa estava sobre a posse de Paul se tornava impossível não notar o clima tenso que caia sobre a roda de amigos como um trovão. Embora o rapaz ainda não tivesse ido longe, sua falta de limites não tinha passado despercebido nem mesmo pela novata. E conscientemente ou não, estavam todos se preparando para o momento em que o cara saltaria sobre sua presa. E pelo tom em sua voz, naquele segundo, ele estava fazendo exatamente isso. Quando minha atenção desabou sobre o rapaz, seus olhos âmbar estavam fixos sobre a pessoa ao meu lado. Profundos e venenosos. Senti a pose da garota se quebrar e observei seus dedos se fecharem com força em volta da garrafa. Medo. Mariana estava com medo, pois ela não achava nenhuma das alternativas seguras.

― Verdade. ― Balbuciou, por fim.

― Já traiu a confiança dos seus amigos, Jhones? ― Ele cuspiu como se já possuísse a resposta, e apenas ansiasse pelo segundo em que a veria lutar contra a verdade.

― Não.

― Tem certeza? Há muitas pessoas aqui que podem dizer outra coisa. ― Caradoc deslizou o olhar por cada um dos patetas presentes. O contato visual durou apenas alguns milésimos de segundos, mas não havia como negar que muita coisa foi dita silenciosamente neste ínterim.

Amigos?

Eles realmente tinham sido todos amigos?

― Se não percebeu, Caradoc, essa é a minha vez de responder. ― Mariana retrucou fria como o gelo. ― A única verdade que importa, nesse momento, é a minha. Se ela não lhe agrada, então vá para o inferno.

Quando minha melhor amiga terminou, pela expressão no rosto dos meninos, um nervo havia sido atingido. O que diabos estava acontecendo? Paul passou a língua entre os dentes, aquele brilho perturbador ainda iluminando seus olhos. Em um bater de cílios, seus dedos estavam girando a garrafa agilmente outra vez. Senti a merda vindo antes mesmo que a velocidade do objeto diminuísse, conquistando aos poucos o estado de inércia. Duvidando da maré de azar do par de loiros, deixei que meu olhar vagasse da garrafa para Paul, e de Paul para Max. Repetidas vezes. Mas quando a imagem não mudou, tudo o que pude fazer foi me escorar contra as costas da poltrona e esperar a merda piorar.

― Verdade ou desafio? ― Caradoc perguntou lentamente para o meu namorado de mentirinha, sorrindo perversamente quando viu a raiva inundar seus olhos claros.

― Verdade.

― Já dormiu com a colega de quarto da sua namorada? ― Questionou incisivamente.

Alguém praguejou baixinho, mas minha mente estava muito ocupada reformulando aquela pergunta para conectar a voz familiar a seu respectivo corpo. O que diabos ele disse?

― Você já tem essa resposta. ― Max rosnou obviamente desconfortável.

― Sim, eu faço. ― Deu uma pausa dramática antes de continuar: ― Mas não acho que isso sirva para a sua garota também. Estou errado, boneca? ― Subitamente todos os olhos estavam em mim, e travei. Primeiro, porque eu odiava ser o centro das atenções, como naquele momento. E segundo, eu não tinha a droga da resposta.

― O loiro e ela estão juntos? ― Ayla tentou sussurrar para Diego, porém, a mesma claramente não dominava a arte da sutileza, visto que com um pouquinho de esforço até mesmo os meninos da sinuca seriam capazes de ouvi-la.

― Pois é. ― Foi tudo o que o goleiro disse em resposta.

Me virei para uma Mariana inquieta e de bochechas exageradamente vermelhas, seus olhos fixos na cerveja vazia em suas mãos como se o objeto insignificante pudesse teletransportá-la para qualquer lugar que não fosse aquela sala de jogos.

― Há muito tempo atrás. ― Max finalmente confessou secamente.

Meu cérebro disparou.

Então teria sido assim o surgimento do ódio mútuo entre eles? Um relacionamento fracassado, onde até mesmo a amizade entre ela e os patetas teve de ser sacrificada. Puta merda. Por que nenhum dos dois haviam me dito nada? Teria sido muito melhor do que descobrir por meio de Caradoc e seu pau na bunda, em uma roda de verdade ou desafio, onde as pessoas estavam me olhando com pena. Não somos namorados de verdade, senti vontade de gritar, mas não fiz. As coisas estavam ruins o bastante.

― Como se sente sabendo que dividem muito mais do que um quarto, boneca?

― Melhor do que você esperava, eu vejo. ― Admiti irritada por seu comportamento, mas nenhum pouco surpresa. Ele era ele, afinal.

― Ah certo, como pude esquecer que estava falando com a racionalidade em pessoa. Tão compreensiva. O tempo todo. ― Zombou asperamente. ― Mas se acreditar mesmo que o passado permanece no passado, Anna Lis, tenho pena do seu pobre coração tolo e pulsante.

Mariana se levantou abruptamente e fui capaz de sentir o ódio emanando de seu corpo pequeno. Mas ao invés de gritar alguns xingamentos na direção do moreno, como imaginei que faria, a garota loira agarrou a garrafa entre os dedos e a girou, parando-a propositalmente na direção que desejava.

― Como pode ver, essa é minha vez de perguntar e você está escolhendo dizer a verdade. ― Anunciou cortante. ― É verdade que Paul Caradoc é a porra de um lixo ambulante tão tóxico para as pessoas a sua volta, que não pode nem mesmo ser reciclado? Nah, não precisa responder essa também, porque, todos nesta sala sabem a resposta. Completamente e irrevogavelmente verdade. ― Com isso, a loira se dirigiu a saída com o queixo erguido e bateu à porta com força, fazendo os caras da sinuca olharem em volta atrás do estrago.

― Estou ficando farto da sua mente distorcida, porra. ― Max se levantou também, depositando o copo vazio sobre a mesinha.

Algo cintilou nas íris douradas de Caradoc. Algo entre ódio genuíno e vergonha. E foi estranho como isso soou errado em seus olhos, mas duvido muito que mais alguém tivesse notado tal coisa.

Eu vinha aprendendo ao longo dos meses que a maioria de nós tinha seu próprio mecanismo de defesa defeituoso, e Paul estava fazendo uso dele vinte quatro horas por dia. Nunca de guarda baixa. Nunca deixando alguém realmente entrar fundo em sua mente e coração. Mariana arranhou sua armadura, depois Max amassou um pouco a lataria, mas eles estavam longe de causar algum dano permanente. E o cara não precisou mais do que um piscar de olhos para se recuperar, e retomar a carranca de indiferença habitual.

― Eu devia fingir que me importo? ― Ele cuspiu na direção do loiro, arrancando um riso amargo do mesmo.

― Faça o que quiser. ― Deu de ombros, lançando um olhar de nojo para o rapaz esparramado na poltrona.

Com um último olhar em minha direção, e provavelmente o primeiro também, Max Phillips sibilou "prometo te explicar tudo depois" antes de começar a seguir o mesmo caminho que Mariana. Ainda com dificuldades para processar todos os acontecimentos da noite, deixei minha atenção vagar pelas pessoas restantes na roda. Becca e Meg estavam cochichando baixo, enquanto Ayla, que estava próxima o bastante, parecia ouvir tudo atentamente. Os garotos tinham expressões duras e afiadas, nenhum deles provocando qualquer mísero som, mas pareciam estar fazendo aquela coisa estranha outra vez, trocando olhares como se pudessem se comunicar telepaticamente.

― Hoje foram longe demais. Todos vocês. ― Declarei as palavras de uma vez antes que pudesse desistir, recebendo um olhar indecifrável dos quatro rapazes.

― Eles nem mesmo abriram a porra da boca... ― Paul rosnou.

― Deixaram que ele passasse dos limites. ― O cortei ainda dividindo minha atenção entre todos eles. Não tinham dito nada, mas estavam todos cientes de qual caminho torto seu amigo estava seguindo e escolheram deixá-lo continuar.

― Eu não sou o caralho de um animal de estimação para me manterem na coleira. ― Insistiu perto do descontrole. ― E se quiser um conselho, é melhor ir atrás daqueles dois ou vai perder a vez.

Exausta, suspirei audivelmente massageando as têmporas, finalmente, cedendo a ele. Castanhos sem graça se chocando contra dourados furiosos.

― Sim, estou ciente de que não é um animal de estimação, mas agiu como um cão selvagem quando não pensou na droga dos seus atos. Phillips é o seu amigo, Paul, e você o fez sair daqui te odiando. E a Mari... aquela garota tem passado por merda o suficiente, e não precisa de você tentando enterrá-la mais fundo. Último ponto, pare de tentar opinar no meu relacionamento. Não namoramos a três, droga.

Sem esperar por uma das suas características respostas afogadas no sarcasmo, deixei meus pés traçarem o mesmo caminho que os outros dois.

(...)

Quando se é jovem costuma-se acreditar que diversão significa ter liberdade para ir em festas como a dessa noite. Mas se você for do tipo responsável acharia tudo isso uma porcaria. Principalmente se estivesse completamente sóbria, como eu estava, e precisando assistir sua amiga louca/bêbada dançando em cima de uma mesa. Inclusive, era por esse tipo de coisa que eu nunca bebia. Passar uma vergonha alcoólica como aquela nunca esteve na minha lista de opções. Claro que aos olhos de uma dezena de caras a minha melhor amiga estava arrasando, e elogios lançados sobre a música alta em sua direção era o que não faltava. Mas de que tudo isso vai adiantar quando a ressaca finalmente bater e as lembranças vergonhosas vierem? Paul não valia isso. Os patetas não valiam isso...

Se eu fosse contar quantas vezes a tinha chamado para voltarmos juntas para o colégio, e a garota apenas prometia: "Só mais dez minutinhos." Acabou que de dez em dez, se passaram mais uma hora perdida dentro do maldito inferno. E meus ouvidos não suportavam mais a música estridente e de péssimo gosto. Sem falar que meu nariz estava começando a ficar irritado pelo forte odor de nicotina flutuando até mim do casal dividindo um cigarro a poucos metros. Ninguém tinha ensinado aos dois idiotas que não se devia fumar em locais fechados? Arrgh!

― Acho que sua amiga bebeu demais. ― Max brotou ao meu lado, fazendo-me bater a cabeça contra a parede que usava para me escorar. Desde o verme asqueroso, eu não confiava em ninguém se aproximando de fininho. Foi por isso que escolhi me abrigar em um canto de parede. Isso, e porquê o lugar me proporcionava uma boa visão da garota ainda dançado sobre a mesa do outro lado da sala. Se algum idiota a puxasse para longe, eu estaria pronta para chutar as suas bolas com força suficiente para deixa-lo estéril.

― E pelo que parece... por culpa sua e daquele idiota do Paul. ― murmurei com irritação e por um segundo deixei que meu olhar caísse sobre ele, apenas para encontrá-lo com aquele olhar flamejante outra vez enquanto assistia Mariana se entregar ao ritmo da música completamente. Lá em cima, a garota parecia inalcançável. Ela sabia que era bonita e não tinha medo de usar isso ao seu favor.

Mas a forma como Max a olhava era diferente dos outros caras. Sim, sem dúvidas ele a queria, mas havia muito mais queimando em seus olhos. Raiva, desprezo, admiração, carinho e... saudade. Estava tudo tão reprimido e embolado, como se uma emoção não pudesse existir sem a outra. Eu sabia o que era aquilo. Sabia como era odiar estar apegado a alguém que não merecia. Max se odiava. Mas ele também a amava... E não importava o quanto tentasse lutar contra si mesmo, sua mente e corpo sentiam falta dela mais do que sentiam de qualquer outra coisa considerada necessidade básica. Ele suspirou pesadamente passando os dedos furiosamente entre os fios do seu cabelo, e então deixou seu olhar perdido cair sobre os próprios sapatos.

― Pode acreditar, Lis... a sua amiga não foi a única que saiu machucada alguns meses atrás. Sei que Caradoc passou dos limites, mas todos nós sentimos falta dela e odiamos ter que lidar com isso

― O que aconteceu meses atrás? Porque vocês se afastaram? ― questionei exasperada, o mistério começando a me corroer aos poucos e não estava mais dando para ser paciente.

Respostas.

Eu precisava de respostas.

Se ele a amava, então por que a deixou ir?

Por que a deixou se machucar com o imbecil do ex?

― Sinto muito, mas acho que ainda não posso te explicar isso. ― E ele parecia realmente sentir. ― Quando ela se abrir com você, venha até mim e explicarei o meu lado dos fatos. Aquele que ela prefere ignorar...

Céus, eu estava condenada a morrer precocemente por motivos de ansiedade. Se minha fonte de informação fosse realmente ser Mariana, eu só conseguia a imaginar escrevendo em letras grandes e vermelhas no meu lado da parede:

NÃO IMPORTA!

― Foi por causa dela que você aceitou o namoro falso?

― Estou nessa por muitos motivos, Lis. Alguns que nem mesmo consigo mais imaginar o propósito.

Suspirei em simpatia.

Embora eu já houvesse tomado minha decisão de parar com tudo, passar a noite com os meninos e sua necessidade ridícula de se meter em nosso "relacionamento", apenas a fortificou. E eu estava prestes a dizer isso a ele quando o vislumbre de um cabelo preto familiar chamou minha atenção pela visão periférica. Meus olhos cravaram-se em suas costas cobertas por uma jaqueta preta, a que tanto imaginei escondida no fundo do seu armário, e não deixei que sua presença se perdesse mesmo quando o rapaz se imprensou contra a multidão dançando no meio do cômodo para alcançar as escadas que levavam ao andar de cima. Minha respiração ficou presa em meus pulmões no segundo em que o desconhecido familiar elevou um pouco o rosto para enxergar os degraus à sua frente. Dean. O mesmo maxilar definido e maçãs afiadas. Suas feições estavam sérias e ele parecia curiosamente concentrado na sua atividade de subir a escada o mais rápido que conseguia. Acho que o vi pular três degraus de uma vez. Se fosse possível. O perdi de vista quando seu corpo sumiu no andar superior, fazendo-me suspirar em frustração

O que ele faz aqui?

― Então... ― Mariana chamou minha atenção enquanto se aproximava com os seus belos saltos pendendo entre os dedos finos. Ela parecia exausta, mas muito mais sóbria do que quando subiu naquela plataforma pouco confiável. ― Vamos embora? Tenho números de telefones suficientes para ligar até o Natal.

Com a mão desocupada e um sorriso ensaiado, Mariana puxou uma centena de papeizinhos do vale entre seus seios para enfatizar seu discurso. Um grunhido rude chamou minha atenção, e girei a cabeça na direção do som. Embora Max Phillips se esforçasse para parecer distraído com uma galera montando um Beer pong na mesa que antes minha amiga dançava, uma carranca profunda dominava suas feições. Ele estava com ciúmes. Mordi o lábio inferior para não sorrir para a forma com o garoto parecia fofo com aquelas bochechas rosadas e lábios retorcidos em um bico infantil.

Sabendo que Mariana ainda estava esperando por uma resposta, voltei minha atenção para a mesma.

― Estava apenas esperando você pedir. ― Bati de leve o cotovelo contra as costelas do cara ao meu lado, chamando sua atenção.

― Posso leva-las de volta... não tenho mais nada aqui, também. ― Murmurou em reconhecimento.

Mariana foi a primeira a se mover para longe, sendo seguida de perto por Max Phillips como se estivesse tentando fazer um muro em volta dela sempre que um cara fazia menção de interceptá-la no caminho. Deus, isso era muito fofo. Era errado dizer que shippava sem saber o motivo do primeiro término? Provavelmente sim. Mas não tornava menos fofo...

Quando finalmente fiz menção de segui-los, lembrei do cara correndo apressado para o andar de cima. Meu estômago embrulhou. E se ele estivesse precisando de ajuda? Se tivesse bebido ou comido algo que não fez bem? Olhei de volta para os meus amigos, os dois sumindo na esquina que levava ao hall da mansão, e suspirei pela milionésima vez essa noite. Eles não iriam embora sem mim, certo? Sem pensar muito, comecei a subir as escadas atrás do meu ex-vizinho. Eu só precisava checá-lo por alguns segundos... ver se tudo estava bem e então ir embora. Se a situação fosse favorável e o mesmo não estivesse mais com raiva, eu podia até mesmo tentar contar a ele toda a verdade sobre mim e o Phillips. Não esperava que pudesse me perdoar, mas que ao menos se mostrasse apto a conversar com o seu colega de quarto e entender seus motivos. Os dois precisavam disso. Mereciam isso. Estava cansada e me sentindo extremamente culpada por ter me metido entre a amizade dos dois.

Terminei de subir as escadas, dando de cara com um corredor cheio de portas e senti o desânimo me inundar sabendo que não seria fácil encontrá-lo se não tentasse checar cada maldito buraco. Abri a primeira, encontrando um quarto de hóspedes que parecia completamente vazio. Pulei para a próxima, e precisei proteger os ouvidos com as duas mãos quando uma garota seminua gritou em minha direção por ter atrapalhado seu momento com um garoto cheio de tatuagens, que por sinal eram lindas. No entanto, não consegui admirar mais do que meia dúzia delas antes que o cara batesse a porta na minha cara e o barulho da chave girando no trinco flutuasse até meus ouvidos.

Estava me dirigindo para a próxima porta quando a voz de Paul jorrou em minha mente, me fazendo hesitar no meio do corredor.

[...] pegue logo um quarto, merda. Não quero ter que ver sua bunda branca quando me levantar daqui.

Cristo, e se as próximas portas tivessem o Luke dormindo com o capitão dos águias?

Ou quaisquer um dos patetas com suas respectivas acompanhantes?

Merda, ainda havia muitas portas para serem abertas e Dean tinha que estar atrás de alguma. Exausta de fugir, decidi continuar mesmo que houvesse grandes chances de ter pesadelos pelos próximos nove anos caso encontrasse algo que não devia. Com uma das mãos segurei a maçaneta com firmeza, e a outra usei para remediar meus olhos de um choque completo. Se houvesse alguém transando dentro do cômodo, eles teriam chance de fazer qualquer merda que fizesse a cena se tornar menos constrangedora. Pelo menos eu esperava. Empurrei a porta com cautela e esperei pelos gritos me pedindo para sair ou qualquer som de roupas sendo consertadas, mas nada veio. Certa de que não haveria ninguém no cômodo, deixei que a mão vedando minha visão caísse para a lateral do meu corpo e em questões de milésimos de segundo o mundo se deteriorou abaixo dos meus pés. Stone. Ele estava lá dentro... mas não sozinho. Com certeza, não sozinho. Sentindo um enorme e doloroso nó crescendo em minha garganta, observei o rapaz afastar seus lábios dos da garota e virar seu rosto lentamente na direção do intruso. No caso, minha direção. Mordi a parte interna da minha bochecha e fechei as mãos em punhos com tanta força que minhas unhas romperam a carne. Não me importei, no entanto. Mudar o ponto focal da dor para qualquer outro lugar que não fosse o meu peito, deixaria tudo mais fácil de suportar.

Paralisada ainda no mesmo lugar, possivelmente em choque, assisti seus olhos castanhos se arregalarem em assombro, seu rosto perder a cor e uma expressão de culpa recair sobre suas feições. Dean separou os lábios fazendo menção de dizer algo, mas voltou a fechá-los um segundo mais tarde. Afinal, não havia nada a ser dito, tudo o que importava estava bem à minha frente. Linda Queiróz, sentada na borda da cama com cachos selvagens e bochechas coradas, tinha meu ex-vizinho ajoelhado aos seus pés. Um sorrisinho sem humor esticou meus lábios quando percebi que a camisa que faltava em seu dorso era a que cobria o corpo perfeito dela. Rápidos, hein?

― Você é a Anna Lis Scott, certo? ― Nem mesmo notei quando a garota se levantou da cama e deu alguns pequenos passos em minha direção, se detendo no meio do caminho por algum motivo que não ficou claro para mim. Tudo o que eu conseguia enxergar era ele, estático no mesmo lugar e posição. Filho de uma mãe desgraçado. ― Nós não estávamos...

― Isso não tem nada a ver comigo, não se preocupe. ― A cortei um pouco rude, mas eu só precisava fazê-la calar a boca e sumir dali o quanto antes. Minha presença era a única sobrando. ― Eu... eu estava procurando alguém, mas ele deve estar no quarto ao lado.

Menti descaradamente, gostando da raiva que consumiu os olhos castanhos fixos em meu rosto. Contudo, nem mesmo isso foi capaz de diminuir o desconforto pressionando meu peito contra minhas costelas. Stone esteve me segurando a algumas horas atrás como se eu fosse tudo o que ele queria, mas nada daquilo havia sido verdade. Assim que foi contrariado, o idiota foi atrás de alguém que poderia lhe proporciona uma experiência muito mais prazerosa. Meus olhos ardiam com lágrimas não derramadas, e sangue latejava alto contra meus ouvidos, a decepção consumindo meus ossos aos poucos. Vocês não são nada um do outro, então não ouse pensar que merecia exclusividade, a vozinha do meu inconsciente rosnou furiosa. No entanto, cada célula em meu corpo permaneceu sendo enfraquecida e machucada com a dor fantasma da traição. Não importava para mim se não éramos nada, ele tinha dito que estava apaixonado. Me fez acreditar que eu era a única de quem ele precisava. Inferno, eu estava pronta para dizer que o amava...

No meu limite, decidi que estava na hora de voltar para o colégio e fingir que o incidente não tinha acontecido, assim como os meus sentimentos por ele.

― Tenham uma Boa noite. ― Anunciei ainda sem encarar a garota e voltei a bater à porta deixando-me sozinhos, mas não sem antes notar a jaqueta abandonada no chão não muito longe de onde o casal estava.

A primeira lágrima caiu quando cheguei às escadas e me amaldiçoei mentalmente por estar sendo tão patética. Não importava como o rei dos babacas havia me tocado e me beijado naquele maldito auditório, a sua ceninha romântica com a garota capa de revista tinha deixado claro que durante todo esse tempo estive certa. Não éramos real.

Terminei de descer as escadas e corri através da multidão, encontrando um pouco de dificuldade de chegar ao hall sem querer gritar com alguém por esfregar seu corpo suado e nojento contra o meu. Porra, se arrependimento matasse, naquele momento sim, eu estaria completamente morta. Nunca devia ter aceitado sair da escola... Pensando bem, eu nem mesmo devia ter aceitado sair de São Paulo.

Pare de chorar, droga!

Quando finalmente consegui alcançar o jardim, a primeira coisa que encontrei foi o carro do Phillips no outro lado da rua. Eles tinham esperado por mim. Diminui meus passos para conseguir enxugar as lágrimas marcando meu rosto, antes de alcançá-los.

― ANNA LIS! ― meu coração falhou algumas batidas e quase tropecei na grama ao ouvi-lo gritar às minhas costas.

Com um breve olhar sobre o ombro, vi que o rei dos babacas caminhava rapidamente em minha direção ainda somente de calça e tênis; a jaqueta pendurada em uma das mãos. Senti minhas bochechas queimarem com a visão do seu peito e abdômen nu. Ele não podia nem mesmo ter pego de volta a merda da camisa?

Para proteger o pouco de dignidade que me restava, escolhi ignorá-lo e continuar andando como se não tivesse visto ou ouvido nada.

― Anna Lis, você pode me ouvir somente dessa vez? ― gritou mais uma vez, começando a chamar a atenção das pessoas à nossa volta e me encolhi internamente.

Aumentando a velocidade em minhas passadas, foquei minha atenção no carro do outro lado da rua desejando imensamente o segundo em que finalmente me veria longe dele e daquele lugarzinho nojento.

― O que diabos você quer de mim, Scott? ― Vociferou mais alto e estanquei no lugar. ― Pelo menos uma vez na sua vida pare de fugir e diga qualquer caralho de coisa.

― Cale a porcaria da boca, Stone! ― Devolvi no mesmo tom ainda de costas para o cretino. Quem ele pensava que era para me tratar assim na frente de todos? E tentando se fazer de vítima, ainda por cima.

Essa noite será muito melhor, eu prometo, a voz da minha melhor amiga veio amarga em minha mente e revirei os olhos. Sim, com certeza, muito melhor. Tão melhor que eu nem mesmo conseguia controlar as fodidas lágrimas de felicidade embaçando minha visão.

― Não... eu acho que não. ― No momento em que sua respiração alcançou a pele sensível em meu pescoço foi que percebi o quão perto ele estava. Seu toque quente e familiar se fechou contra meu pulso, e em seguida me vi obrigada a encará-lo. ― Estou em silêncio a muito tempo e me cansei disso, Scott. Eu não me importo que fale também, mas terá que me ouvir primeiro.

Dean ergueu uma sobrancelha no ar, desafiando-me, e esperou por um protesto que nunca veio. Sua proximidade abrupta estava me deixando sem ar e um pouco tonta. E naquele momento, minha mente só conseguia pensar em como o universo costumava ser irônico se tratando de mim. Quando fui machucada naquela noite, dois anos atrás, tudo o que desejei foi que ele estivesse realmente lá. Dessa vez, eu somente desejava que não fosse o caso.

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