Terra Proibida - Essência

By EvaSans86

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Em um entrelaçar de passado e presente, mergulhe em uma trama que desafia os limites da razão e da sanidade... More

Nota da Autora
[Agora] A queda
[45 anos atrás] A proposta
Cap. 1 - Sentimentos Ocultos
Cap. 2 - Tormenta
Cap. 3 - Ecos do Passado
Cap.4 - A medalha
Cap. 5 - Revelação
Cap.6 - O nada
Cap. 7 - Oráculo
Cap. 8 - Isadora Moraes
Cap. 9 - Elizabeth Detzel
Cap. 10 - Segredos ao pôr do sol
Cap. 11 - Sangue quente
[45 anos atrás] A Alma à venda
[45 anos atrás] A casca
[Agora] O Salto
Cap. 12 - Despertar
Cap. 13 - O Animal que me tornei
Cap. 14 - Presente de grego
[45 anos atrás] Ninguém se lembrou
[45 anos atrás] Inferno
[45 anos atrás] Quando todos os homens falharam
[45 anos atrás] Mais que morrer
[45 anos atrás] Seus pensamentos
[45 anos atrás] Miserável
[45 anos atrás] Esse tipo de amor...
Cap. 16 - Versões de uma mulher
Cap. 17 - A casa
Cap. 18 - Terceira morte
Cap. 19 - Primeira vida
Cap. 20 - Alguém tem que morrer
Cap. 21 - Sete Palmos
Cap. 22 - O Centro do Universo
Cap. 23 - Essência

Cap. 15 - Feito de lágrimas e cinzas

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By EvaSans86

Henri Speltri

Depois de finalmente conseguir dormir, diante dos últimos acontecimentos, Henri acordou no susto em meio às pilhas de papéis em sua mesa no escritório, todo babado, com o celular literalmente tocando alto. Como aquela merda tinha saído do modo silencioso? Não fazia ideia. Ainda era madrugada e certamente não perdoaria o indigno ser humano que se atrevia a atrapalhar seu sono de beleza. O número era desconhecido.

Atendeu.

Acorda macho! Seu cliente VVIP além de ser um grande gostoso é também, a partir deste exato momento, um foragido da justiça.

— Be... Benício!?...

Se liga na melhor parte, tô carregando o Wallace junto. Agora você tem dois clientes very, very, veeeery important foragidos.

— Cara, você pirou?! Cê tá louco?

Relaxa que isso já é notícia velha.

— Mano, eu vou te MATAR!

Entra na fila Henri, entra na fila. - Benício ria. - Liguei só pra te avisar mesmo. Beijooooo!

A chamada foi desligada.

Três dias atrás, recebeu a notícia de que o alvará de soltura de Wallace sairia até o fim da semana, e também, da moção de Benício para um outro presídio, dado ao nível de periculosidade que ele oferecia aos demais detentos e para a sociedade.

Com esse telefonema, tinha certeza que, agora, o infarto vinha.


Alexandre Travos

Sentia um ódio peculiar. 

Não conseguia falar.

Dois etéreos o tiraram da banheira do hotel no dia seguinte ao envenenamento e o levaram ao conselho dos imortais. A sua volta, estavam encarregados de diferentes reinos, possessos.

— Você nos garantiu que Diego Del Toro estava morto!

— Te emprestamos a espada dilaceradora de almas para que ele nunca mais voltasse a existir.

— Lhes concedemos um veneno capaz de anular os poderes que ele tinha!

— Te demos permissão para utilizar as correntes amaldiçoadas para prendê-lo! Como ele foi capaz de voltar?

Alejandro não conseguia se erguer e também não conseguia falar. Se engasgava e sangrava pela boca.

— Por isso eu sempre disse para não confiar em aberrações!

— Não teremos paz enquanto existir um Del Toro e enquanto existirem as mulheres do fogo. Eu voto para eliminarmos esse maldito aqui e agora! - diziam apontando para Alejandro.

— Eu também! - gritou alguém no fundo.

— Eu também voto!

Quase sem conseguir, Alex se levantou estendendo os braços em sinal de paz.

— Podem me matar! - A voz saia com dificuldades - Mas com a minha morte... vocês acham mesmo que o meu elixir vai continuar funcionando? - houve um silêncio geral - A essa altura... do campeonato, acham mesmo que eu sou apenas um mero lacaio de vocês? - a voz saia rouca e baixa. Alex começou a gargalhar descontrolado com os lábios pintados de sangue.

Caminhou até um homem que tinha traços Atlantis e o atacou violentamente sugando-lhe o sangue e também o seu dom, a arte. Os outros presentes assistiam tudo horrorizados. Mesmo que pudessem matá-lo naquele momento, o elixir os detia.

— Ah. Ah... Ah.. - Alex testou a voz. - Muito melhor agora. - deu um giro, observando a reação de todos. -  Mas se perder os benefícios do meu elixir não forem o suficiente pra fazer vocês raciocinarem, posso jogar no ventilador as merdas que tenho guardadas de cada um aqui, e acho que o estrago seria muito maior do que qualquer Detzel ou Del Toro. - pausou - Vocês se destroem por si sós. Não é mesmo? - Deu outra crise de riso. - Mas fiquem tranquilos, eu vou matar o Diego outra vez e quantas vezes forem necessárias. - Começou a tossir sangue e perder a voz outra vez.

O que esse filho da puta fez comigo? Ah... eu vou te matar Diego.

Se desfez para em seguida reaparecer diante de Santiago, no hospital, atrás da porta do consultório.

O irmão se despediu do paciente que atendia para em seguida se encostar na mesa de braços cruzados e com a feição carregada com a cabeça balançando em negação. Alejandro agora voltava a tossir sangue e se deixava cair no chão.

— Esse é mesmo o líder dos iluminados? - Perguntou Santiago.

A voz de Alejandro não saia.

— Você quebrou nosso vínculo, não consigo te ouvir, vai ter que escrever. - entregou um bloquinho na mão do irmão.

Assim que Alejandro terminou de escrever, Santiago pegou o bloquinho da mão dele e estava escrito: "Diego fudeu com minha garganta, minha voz, meu talento! Quem trouxe esse maldito de volta?"

— Você esperava o quê? Que não houvesse um bruxo mais poderoso que você depois da morte do Diego? Eu devia ter me aliado com a Detzel mais cedo, ela é infinitamente mais poderosa.

"você também está apaixonado por ela?"

— Estou? Boa pergunta! Ela pelo menos não me ilude dizendo que me ama enquanto pensa ou transa com os meus irmãos.

Alejandro voou no pescoço de Santiago colidindo com a parede de fundo do consultório.

— Resolve essa merda, - balbuciou - Eu sou o seu líder, não se esqueça!

— Meu líder? Quem você pensa que é? - Os olhos de Santiago luziam dourados. - Só porque te deixei a cargo, não significa que você manda em mim. Acha que por ter absorvido a energia e o poder do Diego você se compara a ele? - riu na cara de Alejandro - Sabe o que fazia Diego ser tão poderoso? Não eram as bruxarias, não eram os feitiços e muito menos a magia, mas o fato de saber fazer tratos que beneficiavam todas as partes.  Qual benefício você trouxe aos iluminados? Você quer matá-lo, certo? Dessa vez vai ter que me matar primeiro.

Santiago se desmaterializou com Alejandro e reapareceram em um terreno baldio. Jogou o irmão no barro vermelho e lançou sobre ele mais um feitiço. Esse fazia com que Alejandro também soltasse, além do sangue, bolhinhas de sabão pela boca toda vez que tentava falar.

— Feitiçaria básica Alex. - disse em alto e bom tom, enquanto o outro se arrastava engasgado no chão com sangue saindo pela boca, sem voz e soltando bolhas de sabão. - mas o que você estava fazendo, mesmo? Quando Diego tentava te ensinar o básico quando éramos jovens? - estalou os dedos como que se lembrando. - Ahhhh... Você estava fodendo com a maldita princesa que mandou cortar nossas cabeças. Então agora se vira.


Anita Stier

Tudo só podia ser um pesadelo.

Nem cogitou que era uma cilada quando recebeu o pack de produtos enviados por uma perfumista famosa.

Extremamente animada, após tomar um banho maravilhoso, abriu a embalagem de um creme para mãos e sentindo um delicioso aroma, passou o produto de toque aveludado, super entusiasmada por ter sido uma das contempladas a receber tais mimos.

Ledo engano.

Minutos depois sentiu a pele das mãos começarem a arder, para em seguida queimarem como se tivesse mergulhado em ácido.

Depois de se desesperar, colocar debaixo d'água, derramar leite, e tudo o que poderia aliviar a dor, se atentou às iniciais gravadas em letras douradas na embalagem do creme: DDT. Quase sem conseguir tocar, nas embalagens de tanta dor, viu uma carta no fundo da caixa, que dizia:

Querida Anita,

Espero que esse presente possa te proporcionar a experiência transformadora que é queimar como se estivesse no inferno e estar a sete palmos abaixo do chão.

Com raiva mesmo.

Diego Del Toro.

Anita se jogou no chão do banheiro com os olhos praticamente sem vida. Estava desolada. Estava arrependida. A dor nas mãos não se equiparavam à dor que sentia na alma. Revisitou o dia em que se juntou aos traidores. Devia ter confiado nele, devia tê-lo escutado. Devia a ele a existência e agora ele a estava cobrando.

Ouviu o interfone tocar e ignorou, já tinha perdido completamente a noção do tempo. Estava tão triste e com tanta dor que a última coisa que queria era se mover daquele gélido chão.

Quando lentamente levantou o olhar, o ser mais irritante que tinha conhecido nos últimos tempos estava a sua frente, com os olhos esbugalhados atentos ao estado de suas mãos com uma expressão curiosa, o tagarela, Henri Speltri.

— Esse novo tratamento de beleza eu desconhecia... Virou moda, agora? Lavar as mãos com ácido?

— Não. - respondeu ela emburrada. - O quê você faz aqui?

— Tecnicamente, você não deveria se curar sozinha? Pensei que os vampiros tivessem esses lances legais de curar sozinhos, super velocidade, brilhar no sol, mas... No seu caso, eu não tô vendo vantagens não. Serasse você veio com defeito de fá...

Enquanto Henri falava sobre o que ele achava sobre os vampiros, Anita já tinha perdido as contas do quanto já tinha revirado os olhos. O que eu fiz pra merecer mais isso agora? Será que essa criatura também é uma espécie de tortura mandada pelo Diego?

— Como você entrou aqui?

— Sua ex abriu a porta. - disse ele dando de ombros - Vamo lá Anita! Preciso encontrar o Benício e não tenho a noite toda. Levanta, bota um cropped, reaja!

— E se eu me recusar? - disse com os olhos adquirindo um tom feral, como se fosse atacar Henri a qualquer momento, enquanto ele simplesmente se sentou no vaso cruzando as pernas, balançando o pé impaciente.

— Aí você terá dois trabalhos, o de recusar e o de aceitar. - pegou o vaper no bolso e tragou - Só saio daqui com você. Afinal, essa bagunça também é sua.

Neste exato instante, Júlia entrou no banheiro e quando Anita bateu os olhos nela, desabou em lágrimas.

[Um dia antes]

Benício Speltri

Naquela manhã, Benício tinha recebido uma visita um tanto quanto inusitada.

Um homem muito baixinho, feio, com feições rústicas, sofrida, endurecida e talhada conforme as dificuldades da vida o esperava no parlatório. Seu nome era Isauro.

Entrou na sala sem saber muito bem o por quê de estar alí. Encarou o homem reticente.

— Boa tarde mestre. - disse em uma voz tão polida que não combinava em nada com a sua forma física. - vim lhe comunicar que todas as encomendas e presentes foram entregues com sucesso.

— E como foi a repercussão dos presentes? - Perguntou Diego com um sorriso oblíquo.

— Ah mestre, eu não queria estar na pele deles.

— E minha bruxa maldita?

— Acho que ela adorou a chuva de girassóis.

Diego fez uma cara boba. Sua expressão corporal era tal qual um adolescente ao saber que era correspondido pela menina mais bonita da escola. Ficou vermelho, mordeu os lábios e mexeu no, agora, cabelo curto e deu pulinhos de alegria. Isauro apenas observava espantado. Quando Diego finalmente se conteve, continuou:

— Preciso que abra a Alexandria para um novo usuário, encontrei um bom olho dessa vez.

— Sim mestre. Como devo chamá-lo?

— Hórus...

Quando deu por si, Benício estava sentado sozinho no parlatório. Se debruçou sobre a mesa e respirou fundo. Diego certamente estava aprontando. Quando foi ao pátio, acendeu um cigarro para só então tentar raciocinar, olhou para o lado e lá estava ele refletindo seus gestos. Era como se olhar no espelho, porém um espelho cheio de vontade própria e, dessa vez, visivelmente bem humorado.

— Eu odeio ser deixado no escuro Diego. Me faça rir também. - seu tom de voz era sério.

É para sua segurança. Quanto menos souber, melhor.

— Se continuar assim eu vou descobrir uma forma de te exorcizar.

Eu só mandei alguns presentinhos! Coisinhas singelas! - ironizou - Eu tenho um bom coração, fiz tudo na maior das boas intenções, eu juro!

— De boas intenções, o inferno está cheio.

Captou bem o espírito, - gargalhou - é bem isso mesmo. - Diego perdeu o olhar nas nuvens com uma irritante cara de apaixonado. - Mudando de pau pra cacete, precisando sair daqui logo. E quando digo logo, quero dizer, hoje. Estão todos aguardando o dia da nossa transferência para nos matar, então porque não antecipar um pouco as coisas?

— Acho válido. E também, já cansei desse Spa. Alguma ideia?

Hummm... - Diego soprava a fumaça pensativo. - Um jeito é arrumarmos uma boa briga, mas aí vamos ter que quebrar um dedo, braço... Perna não, por quê vamos ter que ser ágeis, mas todo mundo te ignora nessa porra! Todo mundo corre de você!

— Minha reputação me precede.- respondeu mal humorado.

Benício andou pelo presídio inteiro. Encarou e perturbou os outros detentos, tirou onda com os carcereiros, mexeu com todos, mas nada, absolutamente nada fazia com que eles quisessem algum tipo de confusão com ele.

— Mexe com esse aí não que é caixão e vela preta. - ouviu alguém dizer de longe. Merda!

Todos estavam tão deboas, tão serenos que o lugar parecia mais um retiro espiritual do que um presídio, concluiu. 

Algo chamou a atenção quando passava por um grupo de homens quietos demais, agachados em um lugar afastado. Benício passou direto, porém Diego parou e observou a cena com os olhos semicerrados. Seu bom humor rapidamente foi embora.

Eles estão planejando jogar os filhotinhos da gata comunitária para os cachorros!?- sussurrou com uma expressão incrédula.

— Como assim, jogar?

— É! Você não ouviu?

Benício olhou para o chão, meio que procurando algo e quando encontrou, era uma pedra do tamanho de um punho fechado. Nessa hora ele agradeceu a Henri por ter sido, por anos, sua cobaia nas pentelhagens. Mirou a pedra na cabeça de um dos quatro homens e atirou para machucar bastante. O homem caiu desnorteado.

Caralho mermão! COÉ? - disse um que não foi acertado.

TÁ MALUCO MANO? - gritou outro.

Quer morr... - esse optou por não terminar a frase quando viu quem era o autor da pedrada.

Benício se enfiou no meio deles e já foi pegando todos os gatinhos para si. O apedrejado apenas chorava.

Dói né? - perguntou Benício a ele. - Posso fazer muito pior com pessoas que maltratam serezinhos indefesos. Que tal brincar com alguém do seu tamanho?

Porra mano, desculpa aê. Não vamos mais jogar eles pros cachorro, não. - Disse o mais velho do grupo.

Foi mal mermo. - disse outro.

— O quê? Nem assim eles querem brigar? - Diego estava perplexo. Realmente estavam sendo evitados e abstraídos.

Benício saiu arrasado com os gatinhos no colo e os colocou no lugar onde sabia que a gata se escondia. Em agradecimento, a gata mãe ronronava se esfregando em suas pernas. Diego não resistiu em abaixar e acariciar a pancinha que se abria para ele. Naquele instante de ternura, eram um só.

Hórus

Wallace se aproximou de Benício curioso. Era engraçado vê-lo conversando sozinho  e fazendo carinho na gata.

Já tinha aprendido a identificar quando falava com Diego e quando era o Benício quem estava no controle. Achava a mudança de postura dos dois bastante divertida, um era "descolado" o outro, a "realeza". Sabia que embora, a maioria do tempo quem dominasse fosse Benício, Diego era esperto, tinha tomado uma parte do corpo para si, sem que o outro notasse. Logo, Wallace sempre disfarçadamente se atentava à mão esquerda do duplo e o soar dos dedos batendo em código ou desenhando zeros e uns

Com Diego, conversava a maioria das vezes por código morse e outras por sistema binário de programação. Para diversão própria, tinha experimentado testar Diego em java e python, assuntos super específicos de sua área de atuação, mas uma vez que explicou a ele a lógica das duas linguagens, se surpreendeu com a rapidez com a qual ele desenvolveu seu raciocínio.

Às vezes se referia a Benício como "o duplo". Adorava essa engenhosidade e dualidade, Benício e Diego mantinham seu cérebro trabalhando e quando voltasse a liberdade, não estaria enferrujado em nada, mas sim, melhor do que nunca.

— Doutor, você tá pagando de louco outra vez? Qual foi a da pedrada?

— Ah! - Benício deu um sorrisinho sem graça. - De gênio e louco, todo mundo tem um pouco, não é mesmo?

Só que, no caso, eu sou o gênio - respondeu Diego em morse.

— O chefe da cozinha não para de te encarar, o que tá rolando entre vocês? - Perguntou Benício a Wallace.

— Nós ficamos, mas o viado acha que eu sou bagunça. Durante o dia ele prega os valores tradicionais familiares, mas à noite, me procura. Cê acredita que a mulher dele tá grávida?

— E tu é a famosa teúda e manteúda? Mas e aí? O quê tu fez? Por quê ele tá te olhando com um ódio específico no olhar?

— Fui dar amor ao próximo, claro! Olha pra minha cara! vê se pode, nesta altura do campeonato, eu dividir um macho com mulher? Gosto de exclusividade e o Mixaria pelo menos é desenrolado.

— Qual dos dois você quer?

— Nenhum.

— Então tá. Vou tirar os dois da tua reta.

— oi?

— Era justamente a deixa que eu precisava e um deles tá vindo pra cá... - Estava estampado na cara de Benício que ele ia aprontar alguma. Puxou o Wallace pela cintura, deixando-o completamente desnorteado.

— O que você tá fazendo? - perguntou, Wallace assustado com o arrocho.

— Vamos ver se eles gostam de você mesmo? Se gostam, vão surtar, se não, vão apenas ignorar.

Um dos homem caminhou possesso até os dois. Wallace não sabia se memorizava o número que Diego tinha  acabado de passar, desenhando em sua pele do braço, se fugia do arrocho de Benício ou se entrava na onda e via o que acontecia. O chefe da cozinha parou quando o olhar de Beni colidiu com o dele. Wallace só conseguia perceber Benicio balançando a cabeça em negativa. E sentiu ele pegar em sua nuca o abraçando como se fosse dele. O outro homem que também estava interessado em Wallace, o Mixaria, também se enervou e foi rumo a eles.

— Beniiiiiiiiiiii...

— Shiiiiiiiiiiiiiii, - indicou para que se calasse, para em seguida dizer baixinho ao pé de seu ouvido de uma forma sensual - agora ou eles rastejam aos seus pés, ou desistem de te importunar. Quem é louco de me enfrentar aqui dentro?

— Tu se acha, né? - respondeu incrédulo.

— Wallace, tenho duas notícias pra te dar agora. Uma boa e outra ruim, qual tu quer primeiro?

— A boa, claro!

— A boa é que eles gostam de tu mermo!

— e a ruim!

— é que eu vou quebrar todo mundo na porrada!

O caos estava instaurado.

O chefe da cozinha partiu pra cima de Benício, possesso de ciúmes. Wallace na tentativa de apartar a briga, acabou sendo alvejado também. Com ódio no olhar, o outro interesse amoroso do jovem se juntou à pancadaria na intenção de protegê-lo.

O que começou com Benício e os amantes de Wallace, se alastrou como fogo em pólvora e mais rápido que imaginasse, quase todos que estavam no pátio estavam brigando.

Quando Wallace finalmente deu por si, tanto o chefe da cozinha, quanto o Mixaria o protegiam dos demais detentos que estavam inflamados no meio da confusão. Parecia que todas as desavenças entre eles estavam sendo resolvidas ali.  Mas logo que seu olhar localizou Benício, entendeu a ideia do duplo. Ele estava sentado perto da grade, com um corte enorme no rosto, a cara lavada em sangue, fumando e rindo.

▪▪▪

Raul Speltri

Estava na hora de ter uma conversa séria com Elizabeth. Precisava entender quem de fato o filho era. Precisava de respostas honestas.

Como pode Diego Del Toro se manifestar no meu filho?

Quem é o real pai do meu filho?

Porque ela nunca assumiu a maternidade do garoto?

Com esse emaranhado de dúvidas, Raul se dirigiu ao escritório de Elizabeth naquela manhã, porém, ela não estava lá e para sua surpresa, ela estava internada.

Ao chegar no hospital, pensou que veria Liz acamada, doente, como já viu no passado, mas quando se aproximou do quarto, ouviu um barulho não muito comum para hospitais, principalmente em uma ala vip como aquela. Entrou sem bater e quando focalizou nela, Elizabeth estava visivelmente... bêbada?

Liz estava sentada, fazendo do controle remoto da TV microfone em uma mão e na outra, uma garrafa de vinho, a qual bebia pelo gargalo, completamente desgrenhada.

Sobre a cama havia diferentes pratos com queijos, pizza e amêndoas. Raul nunca tinha visto Elizabeth em tamanha bagunça. Na mesa de cabeceira ao lado, tinham mais, pelo menos, outras 6 garrafas, dentre vinhos, whisky e gin.

Na TV, em último volume, um clipe musical da década de 80 e Liz cantava a plenos pulmões, entre uma golada e outra, Girls Just Want to Have Fun da Cyndi Lauper.

— Raulllllllll - disse ela se levantando cambaleante da cama, derrubando coisas no chão, quando o viu.

— Liz... Você tá em um... - tomou o controle da mão dela, desligando a TV.

— Hospital, eu sei, eu sei...

Raul apertou a campainha que chamava as enfermeiras, sentou Liz novamente na cama, claramente irritado com a situação, enquanto ela se debatia tentando se levantar outra vez.

— Elizabeth Detzel! Se comporta, pelo amor de Deus!

— Vo..você não é meu pai, nemmmmmm meu marido, que Deus o tenha. Ah... Eu trouxe ele de volta. Que MERDA! - gritou.

— Liz? O que aconteceu com o Diego?

Antes que ela respondesse, Thiago atravessou a porta e os olhos de Elizabeth se encheram de lágrimas.

— Es-se maldito o matou! - disse ela trôpega, em um tom de voz estridente, apontando para Santiago, aos soluços.

— Liz... - disse Santiago em tom apaziguador, tentando ajudar Raul a deitá-la na cama. - Isso aqui é um hospital, mulher!

— Eu já falei pra ela. - enfatizou Raul.

— Santiago, VAI EMBORA! Eu não quero mais te ver! - Os olhos de Elizabeth se iluminaram em ira. - eu não quero te ver NUNCA MAIS!

Santiago a abraçou na tentativa de contê-la, enquanto ela o machucava e desferia golpes em suas costas violentamente com chamas. Raul assistia a tudo perplexo, caminhando para trás, procurando um lugar seguro ante ao evento que se desenrolava. Santiago, com muito custo, a fez adormecer e criou uma barreira à sua volta. Raul não sabia se, se assustava ou achava a barreira a coisa mais linda que tinha visto nos últimos dias. Parecia uma enorme bolha de sabão.

Em choque, Raul contemplava o estrago feito por Liz no, até então, médico à sua frente, e via tanto a pele quanto as roupas dele se reconstruírem a olhos nus. Com os olhos dourados, Santiago seguiu lentamente em sua direção.

— Raul Speltri, você acabou de chegar aqui e você não se lembra de nada que aconteceu nos últimos quinze minutos...- a entonação de Santiago era intimidadora e seus olhos dourados e pupilas se dilatando eram assustadores.

— Santiago Del Toro, - Respondeu à altura, mesmo se cagando de medo.- eu não vou me esquecer de absolutamente nada que eu vi aqui. - Os olhos do vampiro se arregalaram e retornaram a cor original em surpresa - e pelo amor de deus, PAREM com essa putaria e me expliquem TUDO o que está acontecendo nessa porra, porque eu já perdi minha paciência.

— Raul...

— Não adianta querer me hipnotizar ou me enganar. - disse categórico. - Não vai funcionar! Entendeu? Eu quero saber por que caralhos, Diego Del Toro está dentro do meu filho? - sua expressão era de pura ira - E aí? Vai responder ou vai me matar?

Santiago estava desconfigurado e também desconcertado.

Agora sentado na cafeteria do hospital, Santiago trazia até ele uma xícara de café. Com os ânimos controlados, Raul encarava atentamente o loiro que apenas suspirava, sem muito querer falar.

— Por onde começar... - ponderou Santiago - é uma história tão longa...

— Então encurte para a parte que envolve meu filho e o Diego.

Santiago bagunçava os cabelos e por um momento Raul notou uma grande semelhança gestual e até mesmo física entre ele e Henri. Isso o assombrou.

— Bem, como eu posso dizer...

— Anda logo homem! Desembucha!

— O Benício é o Diego.

— Cuma? Meu filho é a reencarnação do Diego?

— Não exatamente...

— Eu já estou perdendo minha...

— Benício é o próprio Diego em carne e osso.

— Mas... como assim? Eu o carreguei no colo, vi esse menino crescer! Eu penei em hospitais com ele quando adoecia, levei pra escola, dei broncas homéricas quando ele fazia merda... impossível!

— Pro grande Diego Del Toro? Homem de uma das bruxas mais foda de todos os tempos? Não mesmo. Elizabeth o trouxe de volta.

Raul o encarava descrente.

— Mas o que aconteceu com ele, pra Liz precisar trazê-lo de volta? - perguntou consternado.

— Eu e meu irmão o matamos.


Elizabeth Detzel - feito de lágrimas e cinzas

Com o olhar perdido na barreira criada por Santiago para que ela não causasse mais estragos, Elizabeth pegou outra garrafa de vinho que estava próxima a cama e deu um longo gole. Não queria estar sóbria quando a hora chegasse.

Desde quando Diego a deixou para encontrar os irmãos há 35 anos atrás e não mais voltou, Liz amargava a dor de não tê-lo em sua vida.

Não como seu companheiro.

Trazê-lo de volta foi um ato de bravura e loucura, mas o que ela podia fazer? Era inconcebível viver em um mundo onde Diego Del Toro não existisse. Ele era como o ar que respirava. Seu sonho continuado, seu crime calculado, seu calcanhar. Antes de serem amantes, eram amigos. Parceiros. Ele se dedicava a ela como uma deusa e ela, a ele como sua vida.

Quando viu o corpo de seu amado em cinzas e sua alma se desfazendo como uma sutil poeira estelar, ela deu seu tudo para que ele voltasse a viver novamente. Como louca, juntou pedaço, por pedaço do que sobrou de seu amor, cinza por cinza e com suas lágrimas o refez. Mas tudo o que restou dele era tão pouco que, o que conseguiu recuperar e o sangue dele que corria em seu próprio corpo só funcionariam se o trouxesse da forma mais básica ao mundo. Como um minúsculo bebê.

Mas a alma de Diego era tão grandiosa, tão poderosa e ao mesmo tempo estava tão frágil, que manter sua consciência desperta em um corpo de criança o destruiria de uma vez por todas. Então o adormeceu e o selou deixando apenas sua parte essencial para que vivesse como qualquer mortal.

Liz ancorou a chama da vida dele a dela. Para que se caso alguém tentasse matá-lo sua energia o ressuscitaria.

Foi uma dor excruciante trazê-lo de volta pela primeira vez. E era cada vez pior à medida que sua chama, ou melhor, vida era consumida. Liz sabia que deixá-lo morrer abreviaria ainda mais seus dias. Mas antes morrer primeiro do que perdê-lo outra vez.

E no meio desta contradição, Liz ia permitir que Benício "morresse" mais essa vez. Assim seria mais fácil apagar seus rastros fronte aos reinos e à superfície.

Seus súditos o levariam ao necrotério, simulariam seu enterro e o entregariam à sua nova casa em Liverpool. O plano era que quando ele acordasse novamente, estaria em uma nova vida, sem lembranças dos acontecimentos desta, ou de suas existências passadas.

Liz estava envolta pela mais pura e palpável tristeza.

A decisão de se internar, foi uma sugestão de Santiago, pois na última morte de Benício, levou dias para se recuperar e no hospital seria mais fácil cuidá-la. Neste caso, não havia vitalidade ou almas que suprissem a vida que perdia, ou melhor, doava. Como não sabiam quando ele morreria, preferiram se precaver.

Liz adorava Diego de todas as formas. Humano. Feral. 

Forçou-se a desassociar Benício e Diego para seu próprio bem. Quanto mais parecido fisicamente Benício se tornava de sua versão original, Liz sentia a torrencial de sentimentos efervescer. Não havia nada tão triste do que ver o seu grande amor vivendo uma outra história em uma linha temporal diferente da sua. Mas seria muito pior não vê-lo nunca mais.

Queria que, pelo menos, ele fosse feliz.

Fechou os olhos e recriou mentalmente seu último beijo. A última vez que se sentiu protegida. A última vez em que se sentiu amada. Mas agora, para salvá-lo, o mataria.

Liz ria própria desgraça.


Benício Speltri

Após a confusão generalizada que provocou naquela tarde, Benício, assim como outros detentos tiveram que ser levados ao hospital.

Entrou no camburão algemado com as mãos para trás, junto com Wallace e mais outros três dois detentos tão arrebentados quanto ele. Era uma posição incômoda, estava com o dedo médio direito quebrado, mas não estava em posição de reclamar. Embora pouco pudesse ver, percebia uma movimentação, um tanto quanto peculiar dos policiais que os escoltavam. Olhou em volta, sentindo algo estranho, quando dentre os outros detentos que eram levados percebeu Diego sentado à sua frente.

Necessidades sombrias são partes do meu desing

[Dark necessities - Red Hot Chilli Peppers]


Eles vão tentar nos matar hoje. - disse Diego.

Benício apenas respirou fundo com pesar.

Mas eu não vou deixar. Façamos um trato? - continuou Diego.

Não era você quem estava rindo de mim por tentar fazer um trato comigo mesmo?

Os dois conversavam mentalmente, porém Diego parecia rendido. Mordeu o lábio e sorriu enquanto passava a mão nos cabelos.

— Sim, mas não temos outra opção, temos?

— Qual é a sua proposta?

— Toda vez que houver uma situação de perigo ou a necessidade de matar, seja lá o que for, uma barata, por exemplo, você me deixará assumir.

— Suas necessidades sombrias, suponho.

— Não minhas, mas nossas, no caso. Melhor que se mantenha a parte.

— Porquê?

— Só confia. Você quer ser livre outra vez, não quer? - Benício assentiu. - Então não me questione. No mais, não me intrometerei nas suas escolhas ou decisões daqui pra frente.

Trato feito.

Ahhh começou.

Ao sair da cercania do presídio, era perceptível a aceleração do camburão aumentando gradativamente. Os policiais que conduziam, começaram a evoluir de inquietos a apavorados. Não tinha freio. O desespero foi se alastrando e se manifestando em todos.

— A ideia não era se antecipar e fugir antes da transferência, pelo visto, vamos morrer antes de conseguirmos? - se agoniou Benício . Seus olhos passeavam entre todos os rostos aflitos, sentindo o coração palpitar como tambores de uma escola de samba.

Diego fechou os olhos e de um sorriso contido que em seguida floresceu uma ensandecida gargalhada.

Impacto.

Sentiu o corpo chacoalhar como se fosse gelo dentro de uma coqueteleira. O camburão derrapava e capotava em espiral e os segundos pareceram eternos.

Um belo dia para morrer - pensou.

Quando o camburão finalmente parou no meio do cerrado que acompanhava a estrada. Era um verdadeiro alívio todos ainda estarem vivos, mesmo que bastante machucados.

— Wallace, você tá bem? - Perguntou Benício.

— Não mas... sim... sei lá! Tudo dói.

— E os outros?

— O chefe tá respirando mas tá muito machucado e o Mixaria tá...

— Eu tô todo arrebentado - respondeu o Mixaria - mas vou sobreviver!

— Alguém pode soltar minha algema?

Finalmente soltos e fora do camburão, os detentos se ajudavam. Benício ajudava a colocar a perna de um no lugar e verificava o estado de todos. Dos policiais, um deles tentava se movimentar mas não conseguia, o outro, estava desacordado.

Benício jogou o celular deles longe e retirou suas armas.

Agora só falta meu secretário chegar.

Todos estavam próximos ao camburão capotado quando viram algo estranho no céu. Parecia uma redoma de vidro se quebrando.

Uma enorme quantidade de criaturas mágicas, belas e ao mesmo tempo assustadoras apareceram brigando entre si.

— Caralho... isso é o apocalipse? - disse um dos homens perplexos.

Deveras, era uma visão perturbadora e magnífica ao mesmo tempo. Uma batalha etérea no final de uma tarde quente e seca em pleno planalto central.

Toda essa confusão só pra nos matar? - Perguntou Benício a Diego

Diego apenas estendeu a mão a Benício. Precisava assumir o comando. Parecia uma grande luta, mas com um estalar de seus dedos, todos seriam reduzidos a pó.

Seus olhos reluziam dourados.

Mas o corpo parecia não acompanhar a potência e a energia que tentava emanar. Levou um golpe nas costas, para por fim se tocar, que aquele corpo não estava treinado para manipular os elementos como um imortal. Estava de volta ao básico.

Mas Isauro era seu suporte.

— Mestre! - Disse o homem se aproximando de Diego. - tudo bem?

— Não... eu simplesmente não estou conseguindo...

— Nossos homens resolverão tudo por aqui. Infelizmente não consegui trazer o carro intacto até aqui, tem um pequeno arranhão na lataria, mas tome. - entregou nas mãos de Diego um celular, uma carteira com documentos, uma chave de ouro e a chave do carro. Era um Volvo. - Vou limpar seu caminho. O carro está escondido a alguns quilômetros daqui.

— Obrigado. Se cuide.

— Mestre. É sempre um prazer servi-lo.

Os Etéreos e os seguidores de Diego lutavam bravamente uns contra os outros. Por onde passava Diego era reverenciado. Logo ele que adorava uma boa batalha, agora tinha que se manter à parte por sobrevivência. Precisava recuperar seu poder ofensivo. Sua sorte é que embora tivesse muitos inimigos, também tinha cultivado bastante aliados. Aliados esses que o estavam protegendo naquele instante.

Embora fisicamente não pudesse fazer muito, conseguiu coordenar seu exército de forma tática. Levou pelo menos umas quatro horas para que a batalha acabasse e o último etéreo fosse executado.

Antes de deixar o lugar, foi até uma barricada onde Wallace e os outros detentos estavam escondidos. Sentou-se ao lado dele e começou.

— Tenho uma proposta para você. - disse calmamente ao rapaz.

— Proposta? Agora?

— Você pode ficar aqui, ir ao hospital, voltar ao presídio e receber seu alvará em três dias e viver como uma pessoa comum, longe de qualquer suspeita, ou...

— Ou?

— Ou vir comigo e viver experiências bizarras, mas que podem te dar acesso a dados inimagináveis.

— Dados inimagináveis? - repetiu Wallace com os olhos arregalados de animação. A palavra dados era como música a seus ouvidos.

— Sobre tudo e todos.

— Eu vou! Eu quero ir com você!

Quando estavam prestes a se levantar e seguir o caminho em direção ao carro que estava escondido na mata, um dos policiais que os escoltavam sacou uma arma que estava escondida na panturrilha e atirou contra Diego acertando o lado direto de suas costas.

Não acredito que me acertou pelas costas!

Em um rompante de ira, Diego se virou para o autor do disparo e ao fechar a mão esquerda como se estivesse amassando uma bola de papel, o homem foi contorcido e morto. Os outros sobreviventes que consistiam nos dois outros detentos, além de Wallace, e mais um policial, se esconderam de medo e tudo o que queriam era fugir dali para o mais longe possível.

Após o sangue esfriar e sentir a dor, Diego deixou o corpo.

AAAAAAAAAAAAAIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIII - Gritou Benício, ao assumir o controle, praticamente desnorteado de tanta dor - DIEGO SEU FILHO DA PUTA!!!!!!!

Wallace o ajudava a conter o sangramento.

Calma, calma. Você aguenta. Já sobrevivi a coisas piores. - Diego ignorava completamente o sofrimento de Benício. - Para de drama e vamos! Me siga.

— Eu preciso tirar essa bala...

Não agora. Precisamos sair daqui antes.

— Benício, o que vamos fazer agora? - perguntou Wallace.

— Vamos seguir com o plano e sair daqui, toma. - Entregou para Wallace a chave do carro.

Os dois caminharam praticamente dois quilômetros até finalmente encontrarem o carro. Benício suava frio de tanta dor e, também, por estar perdendo sangue.

— Precisamos te levar a um hospital! 

— Não... - disse ele batendo o queixo - vamos encontrar uma farmácia no caminho, lá a gente pega remédios e os utensílios necessários pra você tirar essa bala.

— Eu?

— Vai ser fácil. Confia. - Na verdade, Benício tentava confiar em si mesmo naquele momento.

Wallace nunca tinha entrado em um carro tão caro e tão chique em toda a sua vida. Benício sentou no banco do navegador enquanto ele assumiu a direção, mas nitidamente não sabia por onde começar com aquela máquina toda.

— Você não... não sabe dirigir, sabe? - Perguntou Benício ofegante.

— Sei, mas nunca dirigi um carro desses antes. Muita calma nessa hora.. - balbuciou para si mesmo apertando o botão da ignição.

— Pegue. - Benício tirou o celular que Diego tinha recebido de Isauro do bolso e entregou a Wallace, que feliz, o conectou no carro e nos mecanismos de busca e GPS.

— Para onde vamos?

Diamantina, Minas Gerais. - Disse Diego a Benício.

Esse idiota quer ir para Diamantina.

Benício gemia de dor, mas mesmo assim, fez uma lista do que Wallace deveria comprar assim que encontrassem uma farmácia. Após a compra, pegaram a BR 040 rumo a Belo Horizonte. Por sorte o cartão de crédito era por aproximação. 

Diego estava calado e pensativo durante o trajeto. Benício engolia e mastigava os analgésicos como se fossem bala e cochilava em alguns momentos. Já Wallace, ouvia uma playlist pop para se manter acordado durante o trajeto.

Dirigiram durante aproximadamente quatro horas até pararem em uma pousadinha de beira de estrada. No quarto, Wallace se preparava para tirar a bala das costas de Benício. Tinha esterilizado todo o material conforme tinha orientado e preparado dos demais artefatos.

— Preparado? - perguntou Wallace, reticente.

— Manda ver. Nasci pronto! - O duplo deu uma boa golada em uma garrafa de whisky.

A dor era tão intensa que sua reação automática e desesperada foi rir. Demorou alguns minutos até Wallace tirar a bala e costurar a ferida como se tivesse alinhavando uma peça de roupa.

— Not today satan, not today! - disse rindo, entre outros insultos.

Wallace fez o sinal da cruz ao ouvir.

A quantidade de analgésicos que Benício tinha ingerido, a meia garrafa de whisky que tinha bebido e a febre o faziam alucinar e conversar alto com Diego.

— Ah você vai sentir dor também!

Não mesmo. Passo.

— Temos que dividir o ônus.

Nem fudendo.

— Sou eu que decido!

— Benício! - disse Wallace fazendo o sinal de silencio. - Dorme homem!

— Henri! Tenho que falar com o Henri!

— Não! Vai dormir!

— Prometo que durmo depois de falar com ele.

Pegou o celular e discou o número de Henri. Eram 3h45 da madrugada.

— Acorda macho! Seu cliente VVIP além de ser um grande gostoso é também, a partir deste exato momento, um foragido da justiça... Se liga na melhor parte, tô carregando o Wallace junto. Agora você tem dois clientes very, very, veeeery important foragidos...

Ao desligar a chamada, tomou finalmente um banho para se livrar do sangue, do suor e por fim adormeceu.


Diego Del Toro.

Ela estava em sua cama e como das outras vezes que acordava, estava assustada, suada e ofegante procurando por ele.

Encostado na janela, com os braços cruzados, e cabelos oscilando com a brisa que entrava pela janela, quebrava a luz do sol com seu corpo bem definido. Como de costume quando estava em casa, Diego estava completamente nu.

Quando os olhos da ruiva se abriram e colidiram com os seus, haviam atração, urgência,  desejo e saudade. Ela correu até ele se jogando em seus braços, o cheirando o tocando como o ser mais precioso de toda a galáxia.

— Bruxa maldita dos infernos, eu estou furioso! - disse ele.

O que também podia ser traduzido como, coisa mais linda do universo, eu estou morrendo de saudade. Ele devolveu o cheiro. Esfregou o nariz no dela e a arrebatou em um apaixonado beijo.

I'm comin' back to you

[CRUEL- Jackson Wang]



[NOTA DA AUTORA]

Next episode: De volta à 40 anos atrás.


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