Capítulo 1 O contrato

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Ela decidiu ficar no Parque de São Carlos depois que seu turno acabou. O dia estava bonito. O sol brilhava naquele mar de céu azul. "Outono é a melhor estação sem dúvida." ela pensava. Não havia nenhuma programação marcada para aquela tarde. O que foi bom pois, seu peito ainda queimava em uma mistura de raiva e frustração devido a discussão com seu pai mais cedo. Sua vontade era de gritar. Mas era incapaz de magoar sua mãe: "Droga de auto-imagem. Por que eu tenho que colher o que os outros plantaram? Eu não tive nada a ver com isso".

Há alguns anos, seu pai, descendente de uma das famílias mais nobres da região, resolveu se aventurar em um novo ramo de negócios. A sociedade falhou e a família agora encontrava-se à beira da falência. Através de amigos em comum, ele conheceu um empresário bem sucedido disposto a investir nas suas empresas. Mas como tudo na vida tem seu preço, em troca, este homem pediu que Dânia se casasse com seu filho Arthur.

Inacreditável como, em pleno século XXI, na era da informação, uma coisa desse tipo pudesse acontecer. Dânia pensou em recorrer a internet e criar uma nova página anônima para tentar denunciar tamanha discrepância e assédio. Quem sabe ela encontrasse outras meninas que também viviam a mesma aflição para que, juntas, pudessem lutar contra esse sistema patriarcal que ainda existia apesar da evolução e de tantas leis a favor das mulheres.

A ideia ficou apenas em seus pensamentos. Aos prantos, sua mãe implorou para que aceitasse o casamento arranjado para salvá-los da falência. A promessa que fizera era suficiente para ela se submeter àquela situação de forma passiva. Ela faria o sacrifício.

Com o acordo assinado, a aliança aconteceria assim que Dânia completasse a maioridade. Sua família agora se recuperava do vexame. Financeiramente as coisas se normalizaram, a dispensa cheia, os caprichos de beleza de sua mãe garantidos e os ternos do pai sempre a postos durante as manhãs antes dele sair para lidar com os negócios.

Desde que soube da notícia, aos 16 anos, Dânia foi se tornando mais fechada, introvertida. Seu quarto era o lugar da casa em que mais se sentia segura. Suas palavras foram diminuindo lentamente. Já não havia tanto brilho em seu olhar e as gargalhadas não faziam mais barulho pelos corredores da casa.

Durante esse período, enquanto caminhava descompromissada no intervalo de uma das aulas, Dânia encontrou um folheto no mural de avisos da escola oferecendo vagas para voluntários como guias no parque da cidade. Em outra época, esse anúncio não teria nenhum sentido para ela. Porém, na atual situação, a proposta surgiu como uma válvula de escape. Ela não esperava, que com poucos argumentos, conseguisse convencer seus pais e se surpreendeu com a liberação deles sem maiores discussões. Talvez tivessem um pouco de consciência em saber que ela estava no seu limite.

RuínasWhere stories live. Discover now