Primeiros conflitos

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Há dias em que desde o momento que colocamos os pés fora de casa sabemos que tudo irá ser totalmente horrível. Horas preciosas de produtividade foram perdidas durante a manhã, indo até ao massagista que resolveu se machucar justamente no dia em que deveria me atender. A incompetência das pessoas que me cercam é algo extremamente irritante. Qual a dificuldade em ser organizado, perfeccionista e exigir de si mesmo o melhor para ser o melhor naquilo que faz? Foi assim que me tornei a melhor editora-chefe do mundo da moda, e falar isso não é falta de humildade, é apenas reconhecer e valorizar todo meu esforço para me tornar quem sou hoje: a melhor e mais bem paga editora não só de NY, mas do mundo.

Mas ao que me parece as pessoas que trabalham para mim desfrutam de alguma disfunção cognitiva que tornam-as incompetentes, sem criatividade, lerdas, atrapalhadas e sem qualquer controle emocional. No inicio da minha cerreira eu acreditava que exigir o máximo dos meus funcionários iria faze-los descobrir que eles são mais capazes do que imaginam, fui iludida como uma pobre professora do ensino médio. A realidade é que se eu não cobrar o melhor eles irão me entregar a primeira porcaria que fizerem e estarão contentes em obedecer uma ordem, e não em ter produzido o seu melhor. 

A minha exigência criou fotógrafos, escritores, estilistas e modelos de sucesso. Recebo muitos obrigados, mas na realidade foram esses sucessos que criei que me deram a fama de "mulher de gelo". Afinal, quando algum fracassado fala mal de mim, ele é apenas um ressentido, ninguém dá ouvidos à um fracassado. Mas quando alguém que esta sobre os holofotes te critica, então os demais irão acreditar - não importa se toda as minhas criticas e cobranças fizeram aqueles profissionais cresceram, o que eles guardam de mim são apenas os meus apontamentos críticos de todas as porcarias que me entregaram. Decepções. No fim, todos são uma decepção.

No fundo sinto uma pontada de excitação quando chego ao escritório e estão todos ofegantes e com fisionomias desesperadas e vermelhas - como se tivessem corrido uma maratona. Sei que isso se deve à noticia que estou chegando, isso fica mais evidente quando Emily vem correndo em minha direção desesperada, sem equilibro algum esbarrando em mim enquanto disparo minhas ordens. Emily se esforça para fazer seu trabalho, fingo não ver seu descontrole emocional quando peço coisas difíceis sem dar detalhes e ela fica repetindo uma irritante frase, como se fosse um mantra, "eu amo meu trabalho"... se amasse, você se esforçaria mais, Emily.

Ao entrar na antessala onde ficam as assistentes, ainda dando ordens sem pausas para minha assistente, noto a presença destoante de uma morena totalmente desarrumada, com os cabelos precisando de um corte e uma hidratação imediata, para não falar no figurino horrível que parece infectar todo prédio. Meus olhos são bem trainados, avalio a jovem em milésimos de segundos sem que ela ou a minha funcionária notem, e me pergunto o que aquela figura quase patética está fazendo em uma editora de revista de moda - claramente ela não tem o mínimo sentido de estilo e nem amor próprio para sair com esse casaco horrendo.

Pergunto para ruiva quem é a garota. Emily foi responsável por entrevistar as ultimas duas assistentes que foram um completo desastre, então quero entrevistar essa garota - além do mais preciso descarregar meu estresse da manhã em alguém, e destruir as expectativas dessa garota de trabalhar aqui parece ser uma boa forma de fazer isso.

O problema é que algo mexe comigo quando ela entra no escritório, com aqueles olhos enormes, inocentes e famintos que observam, com fascinação, cada detalhe do meu escritório mesmo estando sob estresse da entrevista, e  meu corpo se tenciona quando seu olhar finalmente pousa sobre mim. Decido evitar ao máximo encara-la, será mais fácil de enxota-la do meu escritório. Seu monólogo da vida universitária é entediante - mesmo que seu currículo seja impecável e impressionante. Mas como posso contratar uma pessoa que se quer ouviu falar de mim? Sem qualquer senso? 

 Mas como posso contratar uma pessoa que se quer ouviu falar de mim? Sem qualquer senso? 

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Com um gesto de mãos e um"isso é tudo" encerro a entrevista e peço que se retire. Ela se afasta, mas parece ser tomada por uma repentina onda de coragem e, pasmem, retorna e faz um discurso desafiador e atrevido. Fico impressionada, admito, finalmente ela tem toda a minha atenção e meu olhar fixo nela. É uma garota inegavelmente linda, com dentes perfeitos, lábios lindos, e olhos que me desconcentram uns instantes de sua fala. Linda e inteligente, ainda que um pouco acima do peso para trabalhar em uma revista de moda e roupas que parecem serem compradas em um brechó de 1.99. Ficamos em silêncio por alguns instantes, pondero a opção de contrata-la ou simplesmente dizer "eu disse que isso é tudo, suas falhas mentais te impedem de entender quando algum assunto está terminado? Se retire". Mas no momento em que estou pronta para responder Nigel entra no escritório,  me poupando o trabalho de pedir para que ela vá embora.

Enquanto Nigel fala, vejo-a se afastar e isso me incomoda. Na realidade a jovem pode ser uma boa funcionária, algo em meu intimo me diz que ela tem futuro - habilidade que desenvolvi nesse anos de carreira: reconhecer talentos a serem lapidados. Mas tem algo mais, sem aqueles olhos me fitando o meu corpo parece ficar, de repente, gelado. Já não ouço mais Nigel e nada do que ele mostra parece ser minimamente bom. Corto a fala de Nigel e mando Emily ir em busca da garota, irei contratá-la.

Eu espero que o fato de ela ter sido contratada para trabalhar em uma revista de moda faça com que ela se vista melhor no seu primeiro dia de trabalho. Pelos céus, se ela viesse sem sapatos seria melhor que aqueles sapatos terríveis com os quais ela teve a ousadia de pisar no meu escritório.

Não, não contratei a menina pela sua inteligencia e seu currículo impecável, nem por sua dicção perfeita, ou sua beleza irrefutável. Contratei Andreia por seus olhos e seus olhos serão a minha ruína.

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Eaiii, o que acharam? Irei seguir o roteiro original e a sequência dos fatos, mas com a Miranda apaixonada pela Andy e seus próprios pensamentos em relação a isso. 

Isso é tudo.

Os olhos da guerraOnde histórias criam vida. Descubra agora