A casa abandonada.

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                                       ♡

Passou-se três dias desde que eu e Yeonjun compartilhamos nossos ''traumas'' de certa forma, não somos amigos, porém depois daquele dia eu desenvolvi um pouco de empatia por ele e entendi o motivo de ele querer tanto uma amizade aqui dentro, ele de certa forma precisava fugir daquele ambiente nocivo e toxico que sua casa é, porém ele tentou com a pior pessoa que tinha a oportunidade, eu definitivamente sou horrível fazendo amizades ou sendo gentil com as pessoas, não faço isso a um bom tempo e essa é a desvantagem enorme de ter essa merda, eu sou péssimo conversando sobre qualquer coisa que envolva contato ou algo que esteja na atualidade, até porque eu literalmente não me importo, não pesquiso sobre isso, não faz diferença.

Ontem Yeonjun tentou puxar assunto comigo sobre as coisas que estão passando na TV ultimamente e foi mais um papelzinho pra sua caixa de frustrações, porque eu não assisto TV, eu odeio na verdade, acho uma perda de tempo, não tem nada que seja útil, mas não que na internet seja diferente, eu só acho que é mais ''real'' de certa forma, mesmo que seja contraditório. Ele vem tentando fazer isso desde aquele dia, parece que depois de descobrir sobre a ansiedade ele quer ainda mais se aproximar e "cuidar" de mim, como se eu precisasse disso, na verdade.

Hoje ele tentou novamente, porém acordei num mal humor maior do que todos os outros dias, acordei com minha mãe novamente transformando aquela casa num circo ao vivo, aparentemente ela se separou do meu ''padrasto'' e até que esse demorou pra acabar, foram longos dois anos de fingimento até porque ela nem gosta tanto dele assim, só queria a presença dele, meio doido como pessoas que nasceram pra ficar sozinhas não aceitam simplesmente seu destino, se apoiar no amor só trás dor, como já havia dito.

- Qual é, pensei que estávamos progredindo nossa amizade, ontem você até sorriu pra mim. – Yeonjun disse colocando a cadeira dele ao lado da minha, se sentando.

- Eu nunca disse que éramos amigos, você ainda me irrita, esqueceu? – Suspiro, me afastando um pouco, ainda não ficava confortável com toda aquela aproximação natural dele, ele parece ser uma pessoa completamente carente, cruzes.

- Você não precisa dizer, está na cara que quer minha amizade, Soobin. – Chato, chato, chato. Chato não, precisamente INSUPORTÁVEL.

- E agora você lê mentes, é, poste de luz radioativo? – Zombo dele, enquanto termino minha lição, já sabia que nenhum dia até o fim do ano eu teria paz com aquele garoto, ele é tão insistente que chega a ser triste.

- Já disse pra parar de me chamar assim! Eu acho essa cor muito bonita, ok? – Passou a mão por seus próprios cabelos, com um olhar orgulhoso.

- Por isso não podemos ser amigos, além de você não ter senso do que é ou não é bonito, ainda é irritante.

- Então por que nesses três dias que fomos embora juntos você não reclamou em nenhum momento? Essas suas mentiras não me convencem. – Primeiro, eu fiz teatro!!! Mentiras? Se eu realmente quisesse que você acreditasse em mim, eu conseguiria, mas não me esforçaria nem o mínimo pra usar todo meu talento com um garoto que não sabe nem ao menos usar um sapato diferente.

- Se eu estivesse mentindo, pode ter certeza que não seria com isso, acredite em mim. – Suspirei.

Nesses dias que eu passei com o Yeonjun, a presença dele começou a não me causar tanta ansiedade assim, agora as sensações eu ao menos consigo esconder, mas ainda me sinto um pouco desconfortável perto dele, principalmente porque ele sempre quer ficar TÃO perto, isso com toda certeza me irrita, muito invasivo. Seus machucados sumiram um pouco, mas nem tanto, os hematomas em seu rosto ainda estão presentes, mas os do braço já estão prestes a sumir, isso me deixa feliz, saber que o pai dele não fez nada novamente nesse tempo, esse é o único motivo de eu me manter perto, pra se em algum momento isso acontecer de novo, ele ter alguém pra conversar.

- Ei. – Ele diz em um tom sério, lá vem...

- Hm? – Continuo olhando para a lousa, ele com toda certeza vai reprovar esse ano, não fez uma lição desde que ele chegou aqui.

- Que tal sairmos no domingo? Eu tenho um lugar especial, ninguém nunca vai lá, acho que você iria gostar, não sei... – Ele disse meio tímido.

- Por que eu aceitaria sair com você? – Soltei um ''tsc'' negando com a cabeça. – Eu passo, de verdade.

- Vamos, por favor, eu prometo pra você que se sair comigo no domingo, nunca mais encho seu saco, de verdade, eu te dou todo espaço que você precisa, e nunca mais falo com você na aula. – Parecia um acordo justo, até intrigante de certa forma, é... Talvez eu aceitasse. Ele estava me olhando, com aqueles olhos de cachorro abandonado, mas isso não me cativa de forma nenhuma, não sei por que, mas me da uma vontade enorme de gargalhar.

- Ok, é um acordo que eu posso aceitar, é bem tentador. – Digo com um sorriso, suspirando. – Eu aceito sair com você no sábado, mas você tem que cumprir sua parte do acordo, se não, irei te ignorar pra sempre.

Ele confirmou com a cabeça, com um sorriso. Nós passamos o resto da aula sem conversar muito, mas ele parecia animado, eu estava com um pouco de medo, a única coisa que passava na minha cabeça era que eu definitivamente tinha perdido toda a minha sanidade pra aceitar uma coisa daquelas, de verdade.

Depois daquele dia, Yeonjun faltou em todas as aulas, porém não me deixou esquecer sobre o domingo, já que na saída do dia que marcamos ele escreveu no meu braço com uma caneta permanente, que por Deus não importa o quanto eu esfregue, não sai, mais um motivo pra odia-lo, jaja a lista ficara quilométrica. Foi estranho, passar aqueles dias sem ele me enchendo o saco, foi solitário, na verdade, não que eu goste das provocações ou dele atiçando minha ansiedade, mas ter alguém nem que seja só pra xingar é muito reconfortante, ao menos assim eu conseguia esquecer os dias de merda que eu tinha na minha casa, mas isso eu sentiria com qualquer pessoa, acredito eu.

Foram dias exaustivos, dias que eu não pude ao menos dar um descanso pra minha mente, tive crises fortíssimas indo pra escola e voltando pra casa, coisas que nesses três dias eu não senti, cogitei seriamente em virar de fato amigo do loirinho radioativo, só pra não ter que passar por isso mais, mas seria um pouco egoísta da minha parte me aproximar mais dele só por interesse pessoal... Apesar que toda amizade é construída em cima de um interesse pessoal, não?

O domingo chegou e com ele minha falta de vontade e escassez de roupas também, não faço a menor ideia do que vestir, se uso algo normal que eu usaria pra ir pra escola ou se vou mais arrumado, até porque não quero ser zoado, se tiver mais pessoas lá, porém, só de pensar que possam ter mais pessoas além do Yeonjun, meu coração já acelera, ele faria isso comigo? Mesmo sabendo que sou péssimo lidando com situações sociais? Espero que não, talvez ele só queira ter um dia fora da escola com você, Soobin, não seja tão pessimista...

Caminhei calmamente para a porta da escola, que dessa vez estava vazia, nunca pensei que fosse ver ela de outro ângulo, uma perspectiva da qual não precisasse sofrer, e olhando estando em outra situação, até que a escola não era tão feia assim, mas ainda era um inferno, isso é imutável. Esperei sentado nos bancos por alguns minutos, Yeonjun não demorou muito para chegar, ele estava usando uma calça jeans meio larga, uma blusa branca e uma jaqueta jeans, até que estava bonitinho, mas o cabelo definitivamente estragava todo o conceito do visual, definitivamente precisava pintar aquilo.

- Para de julgar meu cabelo. – Ele resmungou, cruzando os braços, parando em minha frente.

- Como sabe que estou fazendo isso? – Dei uma risadinha, me levantando.

- Sua cara de julgamento é perceptível. – Colocou as mãos em seu bolso, começando a andar. – Vamos, é aqui perto, não vamos precisar andar muito.

Me ensine a amar  ||  YeonbinWhere stories live. Discover now