Akumi não deu chance para Haku atirar outra vez, mordeu seu braço e o derrubou com uma força inesperada, mas não havia tempo para sugar sua vida também. Ainda em cima do rapaz, ela dirigiu-se a Ame e ordenou:

-- Leve Mikoto agora. Eu a reprogramarei assim que terminar com este traidor.

Ame olhou de Haku para Mikoto, que agora mal se sustentava nos cotovelos, quase desmaiando. Seu rosto estava tomado pela confusão, o conflito de não saber o que fazer, exatamente a mesma expressão que Haku exibira quando Mikoto disse a ele para ficar com o clã Kairiku em Shiro.

-- Você a está machucando, Akumi-sama.

-- Ela se rebelou contra mim. Pare de fazer perguntas e faça o que mandei! – ela não precisava fazer muito esforço para manter Haku imobilizado no chão, mas também não podia baixar a guarda e dar-lhe a mínima chance que fosse para tentar revidar.

Ame ainda não se movera, e agora fitava sua mestra com um pouco mais de determinação.

-- Meu objetivo principal é garantir a segurança de Mikoto-sama.

-- Seu objetivo principal é acatar todas as ordens de seus criadores. Eu sou sua criadora, e se não obedecer minha ordem, vou considera-lo um rebelde como seu irmão, e os dois terão o mesmo fim.

Akumi ficou satisfeita quando Ame inclinou-se na direção de Mikoto, mas para apanhar a pistola que voara da mão de Haku minutos atrás. Ele sabia menos ainda do que o irmão sobre armas de fogo e não tinha nenhuma prática com pontaria, mas ainda assim mirou na nogitsune.

Porém, não destravou a arma antes de puxar o gatilho, e não houve disparo. Assim que percebeu que não havia perigo, Akumi lançou um olhar com todo o seu ódio ao mais novo traidor e arreganhou os lábios, pronta para saltar em sua jugular.

Foi a distração que Haku precisava. Conseguiu soltar a mão direita, que a pata dela segurava contra o chão, e acertou um soco no ombro ferido por Yasha. Akumi recuou, ganindo, e o rapaz tomou a arma de Ame logo que se pôs de pé. Apesar de não ser grande coisa como atirador, errar àquela distância era difícil.

A raposa devia ter pensado o mesmo, pois correu para longe e desapareceu na porta do laboratório.

Atrás dos dois, Takako, Yukio e Sayuri gemiam, enfim capazes de se levantar, e enquanto isso, Mikoto mal conseguia sentar, tremendo incontrolavelmente e coberta de suor. Ela piscou para clarear a visão e precisou do apoio de Haku para se manter em pé.

-- Aonde ela foi? – perguntou com a voz fraca.

-- Eu não sei, só a vi sair do laboratório – Haku a soltou quando ela parecia capaz de se aguentar sozinha – Akumi teria matado todos nós se não fosse o Ame.

Todos olharam surpresos para o rapaz, que assentiu e murmurou, um pouco constrangido:

-- Eu só cumpri o meu objetivo de proteger Mikoto-sama. Se alguém a ameaçasse, mesmo que fosse a minha mestra...

-- Por que fala como se pedisse desculpas? O que você fez foi incrível – Sayuri exclamou empolgada, apesar da fraqueza. Haku adicionou:

-- Você conseguiu ir contra a "programação" que te impuseram e fez o que achava que era certo. Conseguiu evoluir, fazer algo por si mesmo.

-- Acho que aprendi vendo você – Ame sorriu.

-- E eu aprendi com a Mikoto.

E ela, mais recuperada, dirigia-se para a saída do laboratório. Takako correu atrás dela.

-- Aonde vamos agora?

-- Procurar Akumi. E só eu farei isso, vocês três estão muito debilitados para lutar contra ela.

-- Nem pense nisso – Yukio parecia um irmão mais velho zangado – Ou vamos todos embora ou ninguém vai.

-- Com "embora" você quer dizer sair daqui? Ir para o mundo humano? – Ame perguntou receoso, mas os outros sequer o ouviram. Takako argumentava:

-- Nós acabamos de ver o que ela pode fazer com você, se ela fizer de novo, você vai precisar de ajuda.

-- Se vocês vierem comigo nesse estado, não serão capazes de se defender – Mikoto procurava impacientemente por algo nos bolsos – E Akumi não vai me derrubar outra vez, porque não quer arriscar me danificar. Alguém tem um ofuda sobrando?

Haku constatou que o armário que abrigava instrumentos sagrados fora alvo do fogo da nogitsune. Felizmente Sayuri ainda tinha dois papéis em branco no bolso, dos quais Mikoto se apossou.

-- Ei, aquela raposa é vulnerável a armas de fogo. Eu posso ajudar – Yukio ressaltou, mas Mikoto não cedeu.

-- Entregue-me uma de suas armas e eu uso contra ela.

-- E você sabe atirar, por acaso? – Sayuri ergueu uma sobrancelha. Takako argumentou:

-- Não acho que uma pistola possa realmente matá-la. Kitsunes são seres muito mágicos, mesmo as nogitsunes, e só podem ser mortas com eficiência por meios mágicos. Em outras palavras, é melhor ter duas miko para te ajudar do que fazer tudo sozinha.

Mikoto deixou escapar um grunhido de irritação.

-- Está bem. Mas vocês três vão ficar atrás de mim, e ao menor sinal de perigo, fiquem afastados. Haku, Ame, podem ir na frente?

Os dois rapazes guiaram o pequeno grupo, seguidos por Mikoto, as duas sacerdotisas mais velhas e Yukio, de armas em punho e atento a qualquer movimento. De costas para Takako e Sayuri, a menina discretamente tirou um ofuda e a caneta do bolso e escreveu um kami.

O Conto da Donzela do SantuárioWhere stories live. Discover now