⊱✿ capítulo dois: reflexos.

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A garota assentiu, ainda sonolenta. Deu uma última olhada no relógio, que indicava que já eram meia noite.

Logo foi carregada, pois não tinha força o suficiente para andar sozinha, até uma sala com iluminação azul e uma maca. Inúmeros aparelhos de nomes desconhecidos estavam dispostos em uma estranha organização padronizada. As luzes do local ofuscaram os olhos da menina, que piscou repetidas vezes até se acostumar com o ambiente.

— Pode se deitar. — falou Margareth, sentando Angelina na maca com muito cuidado.

— Mas pra quê? Já fui toda espetada hoje, ontem e sei que amanhã vai acontecer o mesmo. Eu não gosto quando você cuida de mim, mamãe. Eu tenho medo.

Margareth levantou o rosto de Angelina, segurando o queixo da garota.

— Não fale assim comigo, Angelina. Nunca mais, ouviu bem? Nesses anos todos... Finalmente eu consegui hipóteses concretas, mas agora eu quero experimentar uma outra coisa.

— Ai que saco!

A mulher deixou de segurar o queixo de Angelina para lhe dar um tapa tão estalado que o som pôde ser ouvido do lado de fora da sala e o rosto da garota virou com um impacto. Definitivamente aquela marca ficaria estampada no rosto de Angelina por muito tempo.

— Espero que aprenda a se comportar, querida.

Margareth amarrou as mãos e os pés de Angelina em cinturões que passavam ao redor da cama. Suas mãos tremiam a cada ação e seu sangue fervia em seu corpo. Naquele momento, sua mente estava confusa, atordoada por tantas emoções. Talvez nem ela mesma estivesse ciente do que estava prestes a fazer, era como um impulso incontrolável que dominava seus pensamentos.

Posicionou uma espécie de capacete com uma série de fios conectados a eles na cabeça de Angelina. Uma grande máquina, agora ligada, emitia estranhos zumbidos, que no momento era o único som presente no local.

— Já usei isso outras vezes, né? Não gosto disso, me dói a cabeça. — reclamou, tentando inutilmente se mover para retirar o capacete.

O objeto em questão servia para distribuir descargas elétricas por todo o cérebro da garota.

— Testar a resistência do tecido do cérebro, talvez encontrar pontos que depois de receberem uma certa carga de energia, ativam habilidades ainda desconhecidas. — sussurrou Margareth, falando sozinha.

— O que disse?

— Nada importante. — retrucou a cientista, retirando suas luvas de couro e calçando luvas de látex, própias para procedimentos do tipo.

—Posso pelo menos ficar sentada? Os fios machucam. — resmungou Angelina, recebendo um olhar raivoso de sua mãe, que nada disse.

Margareth puxou uma cadeira do canto da sala para perto da maca onde sua filha estava deitada, se sentando alí com as pernas cruzadas.

Ela esperou alguns segundos antes de girar um botão prateado no equipamento, sorrindo satisfeita depois de ver o corpo de Angelina se contorcer por conta da recente descarga elétrica. Os punhos da adolescente estavam cerrados e seus pés completamente rígidos.

Seus pulmões buscavam desesperadamente um pouco de ar, o que impossibilitava a formação de qualquer frase minimamente coerente.

— Você está bem? — questionou Margareth, passando sua mão carinhosamente pelo rosto da filha.

Angelina não respondeu com palavras, porém balançou a cabeça, negando a pergunta feita.

— Te amo, filha. Muito. — falou a mulher, agora brincando com o cabelo ruivo de Angelina.

— Uhum.

Foi novamente surpreendida por um choque, porém dessa vez mais intenso do que o outro. A garota segurou firme no lençol, os nós de seus dedos já se tornavam brancos e seus olhos estavam vidrados no teto.

— Q-quero parar. — anunciou, logo que se sentia pronta o suficiente para dizer algo.

Margareth rapidamente desamarrou os pés e as mãos da menina, apenas para vislumbrar a cena de Angelina se levantando e logo após isso, se deitando de novo, devido a eletricidade que atravessava seu corpo.

Angelina sentiu um arrepio por todo o corpo, regurgitando o pouco que havia comido no dia com uma grande quantidade de sangue. Sua visão estava embaçada e seu corpo ardendo em febre, com gotas de suor pingando em sua testa, apesar da baixa temperatura do ambiente.

Ela estava fraca demais para reclamar de algo, então apenas deitou em sua própria sujeira.

— Faltam cinco horas para Noriko chegar. — disse Margareth, limpando um pouco do vômito da garota com sua luva e olhando para o relógio em seu pulso esquerdo. - Enquanto isso, tente não levantar.

A médica se levantou da cadeira, jogou sua luva na lixeira ao seu lado e ajustou seu óculos, saindo da sala.

Entrou rapidamente no banheiro, tentando encontrar o interruptor do ambiente, já que ela estava sozinha na Reference e todas as luzes eram apagadas, exceto a do quarto de Angelina e alguns locais onde constantemente havia a presença de Margareth.

Quando o encontrou, acendeu a luz, que revelou um espelho, no qual Margareth evitava se olhar.

Passou um pouco da água fria em seu rosto, respirando fundo e deixando algumas lágrimas escaparem de seu rosto.

— Sarah... O que foi que eu fiz? — perguntou, se sentando no chão do banheiro e chorando.

Sarah era sua irmã mais nova, que faleceu há vinte anos. Margareth constantemente se via conversando com ela ou até mesmo pedindo conselhos, e havia uma voz em sua mente que a respondia.

Depois de algumas horas, Margareth se levantou do banheiro, indo até sua sala e remexendo em alguns documentos antigos, alguns obituários de sua família e amigos, incluindo o de Sarah.

ImortalWhere stories live. Discover now