Capítulo 3.2

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Em festas sempre há um certo pânico entre os servos que desejam dar o seu melhor e receber a recompensa no final, sejam em gordos saquinhos de moedas ou apenas serem reconhecidos por seus monarcas. Nada importava no momento. Só que aproveitaria tudo sem ser descoberta.

Posso confessar que aquela mesa farta atraiu minha atenção, não era todo dia que via coisas como aquela. Aliás, nunca estive presente em um local como esse, mesmo sabendo cada detalhe desses jantares comemorativos e as intenções de seus representantes. Talvez estivesse encantada demais para não perceber quem estava bem a minha frente, o que nos separava apenas era a longa mesa de madeira, que agradeci mentalmente por estar ali e ser bem extensa.

Seu olhar cruza com os meus e um pânico atinge completamente, por que ele conseguia fazer aquilo comigo? Sendo que era a segunda vez que o via em tão pouco tempo, só que dessa vez ele estava impecavelmente vestido e sua voz gentil fez com que meu sangue corresse energicamente nas veias. Aquilo estava errado, completamente errado e não seria vencida pela distração que me olhava com tanta amabilidade.

Saio daquele local sem olhar para os lados. Necessitava fugir dele novamente e se não o fizesse, certamente iria desistir dos meus planos só para conseguir tirar dele uma noite de pura e preciosa atenção.

— Merda! Tenha foco e esqueça os engomadinhos que só desejam diversão — repreendo-me pela distração involuntária.

Subo as escadas que deveriam levar até os quartos. O livro que havia lido complementava o que já sabia sobre aquele castelo. Nem todo o tempo que perdi tinha sido gasto com baboseiras, alguns conhecimentos adquiridos seriam de grande valia naquele instante.

Várias pessoas passavam por mim sem nem mesmo olharem para minhas feições, todas com o nariz empinado e corpos eretos que seria divertido vê-los tropeçarem em seus próprios pés e irem de cara no chão. Poderia até dar um jeitinho nisso. Quem sabe mais tarde tenha a oportunidade de parar e rir da cara de alguns idiotas da realeza. Aquilo seria tão hilário e desastroso para eles.

Essa tramoia teria infelizmente que esperar, agora meu alvo era outro muito maior.

Algumas jovens emperiquitadas estufam o peito ao passar ao meu lado, como se eu fosse a ralé e elas as dondocas que possuíam toda a beleza das grandes deusas que um dia habitaram esse mundo. Coitadas! Mal sabiam elas que estavam ridículas com todas aquelas joias e panos que cobriam qualquer curva que poderia ter em seu corpo. Tinha até dó dos iludidos que irão ser enganados e que se arrependerão amarguradamente depois por suas escolhas no calor do momento.

Se o príncipe daquele reino for esperto, não irá cair tão facilmente naquele mar de vaidades sem beleza alguma aparente. Um bando apenas de interesseiras e nada mais que isso, típico das pessoas de sangue azul.

Por que estava se importando com aquilo? Maldita distração!

Continuo meu percurso pelos corredores e escadas, disfarçando quando era necessário. Mesmo com vestimentas que se assemelhavam a uma serva, ainda assim poderia ser pega por estar vagando pelos corredores, e não desejava ter que prestar um serviço como empregada para alguma arrogante que apenas quer se gabar de seus atributos nada avantajados.

Ao subir o último lance de escada na qual julgava que aquele corredor seria o utilizado pela realeza — já que Baltazar não era o tipo de rei que se misturava com seus hóspedes, se gabar de sua riqueza parecia ser inevitável para aquele desgraçado. Tento controlar a raiva, não poderia deixar que mais um deslize da minha parte impedisse de cumprir com minha promessa. Respiro fundo e dou mais um passo. Certamente minhas suspeitas estavam todas certas quando ao local de seus aposentos.

O espaço aberto é completamente diferente de todos os outros. Um tapete vermelho cobria toda a sua extensão, quadros pendiam das paredes, algumas estátuas feitas de metais e até de mármore — que julgava ter vindo de muito longe — compunham o enfeite daquele lugar, mostrando todas as riquezas conquistadas através do sofrimento de muitos. Tinha que confessar que mesmo sabendo como tudo aquilo chegou ali, ainda assim admirava a beleza diversificada do local iluminado por lustres e com várias flores em vasos compridos e detalhados.

Andava admirada com a beleza e com o perfume que exalava do corredor que sem querer esbarro em um guarda. Ele me olha assustado e rapidamente recobra sua postura.

— O que você pensa que está fazendo aqui? — O jovem pergunta ao analisar minhas vestes. Se eu dissesse que ele era feio, estaria mentindo descaradamente. Por mais que sua armadura cobrisse boa parte de seu corpo, ainda assim seu rosto não estava escondido com aqueles elmos horríveis, que só serviam para esquentar a cabeça, pois não protegiam de uma flecha e muito menos de um machado.

— Desculpe... eu me perdi completamente — admito ao girar o corpo de uma maneira que demonstrasse estar encantada com o lugar. O que não era completamente mentira. Só tinha que tomar cuidado com o que responderia às suas próximas perguntas. — Você poderia, por favor, me ajudar? Não sei como faço para chegar ao quarto da minha senhora. Ela deve estar furiosa com meu atraso, e não quero ser castigada por isso. — O guarda apenas me olha nada discretamente, ele seria facilmente manipulável. — Por favor! — contínuo com delicadeza.

— De qual reino a senhorita veio, assim posso ajudá-la a achar o corredor certo?

Pergunta errada, maldição! Precisava mudar o foco daquele diálogo.

— Qual o seu nome? — devolvo com outra pergunta na qual sai tão tímida e inocente como o rosto que possuía.

— Sir Frederich — responde meio sem graça, talvez por perceber que flagrei seu olhar indiscreto.

— Todos esses quartos são da realeza, Frederich. Se é que posso te chamar assim? — indago aproximando cada vez mais dele, o jovem parece engolir em seco antes de responder.

— Si-sim. Agora você precisa voltar, se alguém te pegar neste corredor, você estará encrencada.

— Adoro uma boa encrenca — sussurro bem próxima. A voz sedutora e as ações seriam o suficiente para desarmá-lo completamente.

Bufo, quando dou conta de como estava agindo para conseguir apenas uma informação, a intenção não era seduzi-lo e sim fazê-lo dizer o que me interessava. Eu não era ela e aquela ação mostrava o quanto sempre fomos parecidas. Afasto rapidamente do jovem que olha sem entender o que eu tentava fazer. Se o coitado esperava por um beijo, acabou de ter sua primeira decepção dessa noite.

Olho rapidamente para os dois lados do corredor e recebo um sorriso daquele que ainda continuava encarando.

Continua...

O Despertar da Aurora - Livro IWhere stories live. Discover now