Ela era uma nova chance de quebrar a maldição, e eu sabia que mais cedo ou mais tarde, Primavera viria atrás dela. Poderia ter sido Kaira naquele ataque. Snow saiu sem sequelas porque era um espírito, mas Kai teria.. Teria sucumbido.

Ela estaria viva, mas não seria a mesma.

E a ideia daquilo sequer poder acontecer me sufocava. Eu não sabia quando começou, mas eu passei a nunca querer vê-la envolvida demais, para que não se machucasse. No entanto, meus irmãos não sabiam disso, e continuavam contando mais sobre nosso mundo.

E mesmo com essa mentalidade, quando meus pais vieram e eu não pude ficar com eles pois obviamente ainda não se recordavam de nada, eu fui atrás dela. Kaira parecia me acalmar e tudo que eu mais precisava era disso naquele momento, eu já não aguentava mais.

Porém, Kai já sabia até do Guardião. Como diria que eu era quem ela procurava? Que meus poderes provavelmente não funcionariam porque eu estava amaldiçoado? Por fim, acabamos discutindo, e ao menos disso eu tirei uma coisa boa.

Eu pude aproveitar de sua raiva no momento que encontrei Snow enroscada nos cipós. Eu precisava mandar Kaira embora de alguma forma, e ser frio pareceu uma ótima escolha. Estávamos indo longe demais. Se ela descobrisse sobre a árvore, não teria muito o que fazer.

O pensamento me fez parar.

— Ah, droga. — resmunguei, já acelerando o passo e seguindo em direção à árvore de prata. Ela era o símbolo do meu aprisionamento, ao mesmo tempo que era a chave para minha salvação.

Todo esse paradoxo me fazia não gostar muito de visitá-la, mas naquele momento era necessário. Quando cheguei, não precisei de absorver muito dos arredores para saber que Kaira estivera ali, duas vezes.

A partir do momento que ela encontrasse a árvore, ela seria chamada pela energia do lugar. Inclusive, a presença dela ainda estava fresca demais, o que significa...

— Que ela se encontrou comigo antes de sua pequena irmãzinha receber o presente. — virei-me para a presença já conhecida, quase rosnando. Ela sorria debochadamente. — Você é um ótimo investigador, Glacier.

Quis atingi-la. O único ser que se lembrava do meu verdadeiro nome era Primavera. Até isso ela quis mudar da memória dos meus entes queridos e me renomeou de "perigo", e mesmo que eu contasse minha verdadeira identidade, a pessoa me escutava falar "Hazard", de qualquer forma. Eu já havia tentado várias vezes.

A única coisa que Primavera não tirou de mim foi a capacidade de me transformar em minha forma animal. Só porque ela não podia. É um livre arbítrio dos espíritos circular na forma animal ou humana, e Primavera não tinha o poder do Universo para mexer com meu livre arbítrio.

— Cala a boca, Primavera.

— Não me afronte assim, meu bem. — ela semicerrou os olhos e, com um único movimento de sua mão, uma das folhas de âmbar da árvore caíram e se espatifaram no chão. A dor ecoou em mim e eu caí de joelhos.

Ergui o olhar apenas o suficiente para ver Primavera caminhar em minha direção, com flores brotando do chão onde pisava. Uma víbora como essa não merecia o poder encantador que tinha.

— Você sabe o que fez hoje, Glacy? — ela segurou meu queixo, erguendo-o e me obrigando a encará-la diretamente — Você mandou embora sua última chance e acabou de me fazer vitoriosa.

— Você iria machucá-la. É melhor que ela fique longe da floresta. Eu vou dar um jeito, essa maldição nunca fez sentido mesmo.

Primavera sorriu de um jeito estranho. Não gostei nem um pouco daquilo.

Quando cai a última folha ✓Where stories live. Discover now