21. A vez em que uma loba dourada se sentiu impotente

932 191 178
                                    

"Cinquenta e sete, cinquenta e oito, cinquenta e nove... sessenta". 

E mais uma volta havia sido completada pelo ponteiro do relógio na parede, de frente para a minha cama. Eu tentava me apegar àquele movimento trivial, inalterável, constante, embora há muito já tivesse perdido completamente a noção do tempo. Existiria, por acaso, alguma distorção, no mundo natural ou no mundo sobrenatural, capaz de comprimir uma experiência extensiva e maçante dentro de momentos breves e efêmeros? E, se a resposta para essa pergunta fosse mesmo negativa, como todos insistiam em dizer, por que razão eu me sentia como se tivesse vivido um ano inteiro em apenas uma semana?

Sete dias. O prazo estipulado pela direção do colégio e anunciado pela diretora Guilhermina para a suspensão das aulas finalmente tinha terminado. Quem imaginaria que aquelas palavras eram apenas um mero prelúdio da gravidade do que ainda estaria por vir? Sim, no começo eram poucos. Três alunos, uma professora. Logo fizeram uma associação com o caso dos dois garotos que se perderam na reserva e foram encontrados desacordados, primos de Bárbara. Os sintomas eram muito parecidos, não podia ser uma mera coincidência. Esses foram os cinco primeiros. Mas a praga não parou por aí. Ao longo de toda aquela semana, mais e mais casos continuaram a ser reportados e, depois de uma única semana, já havia quase cinquenta pessoas em Esmeraldina sob a influência da misteriosa "peste do sono".

A princípio, havia o medo do contágio, que por muito pouco não colocou os habitantes da região em um estado de histeria coletiva. Mas, depois de uma investigação mais aprofundada, notou-se que não era preciso entrar em contato com os doentes para ser acometido. Pessoas de diferentes lugares da cidade, sem nenhum tipo de relação entre si, simplesmente desmaiavam sem aviso e não mais acordavam, enquanto outras, que estavam constantemente ao lado das primeiras vítimas, nada sofreram. Logo, descartou-se a ideia de que fosse um vírus ou algo do tipo. Porém, até aquele momento, ninguém sabia explicar o que acontecia em Esmeraldina de fato.

Estava deitada, perdida em minhas próprias especulações, até que batidas na porta do meu quarto finalmente me puxaram de volta ao mundo real.

— Tá aberto — gritei, desanimada demais para me levantar e ir conferir quem era.

Meu pai abriu uma fresta e colocou apenas a cabeça no interior do cômodo.

— Minha filha, venha se despedir do seu irmão, ele já está de partida.

A ida de Benjamin para a sede da Caçada Voraz havia sido adiada temporariamente após toda a situação da doença misteriosa vir à tona. Hector pediu que Ben ficasse um pouco mais na cidade e tentasse descobrir se o que estava acontecendo ali tinha alguma relação com o sobrenatural. Porém, o prazo para aquela tarefa logo se esgotara, sem resultados conclusivos, e questões mais urgentes para o conselho, como a investigação do artefato encontrado na reserva, foram colocadas em primeiro plano. Por esse motivo, a mudança do meu irmão não pôde mais ser postergada.

Dirigi-me até o andar inferior da casa e encontrei meus pais e meus dois irmãos na sala de estar.

— Você quer que eu te leve até lá, meu filho? — perguntou meu pai.

— Não precisa, já combinei com o Ian. Vamos no meu carro, depois ele trará o veículo de volta — Ben respondeu. Esmeraldina não tinha aeroporto, então era preciso embarcar em uma cidade vizinha.

— Pelo menos você ganhou um carro pra usar até o retorno do Ben, pé de pato — comentei, tentando animar Ian de alguma forma. Ele apenas deu um breve sorriso e manteve o mesmo olhar triste dos últimos dias, no entanto.

— Benjamin, antes de você ir, tenho uma última pergunta — interrompeu minha mãe, indiferente ao que havíamos dito até então. — Você não descobriu nada mesmo sobre a tal praga do sono durante essa última semana?

O Clube da Lua e o Devorador de Sonhos (Livro 2 ✓)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora