Mikoto se virou num pulo e Haku assumiu sua posição defensiva característica à frente dela. Yasha contemplava as portas com uma postura muito descontraída, que ela manteve ao falar com os dois jovens novamente.

-- Não precisam ficar tensos desse jeito. Caso não tenham notado, não quero brigar. Aliás, já faz um bom tempo que não tento nada contra a miko júnior aí.

-- Diga isso para Iruka – Mikoto apertou com mais força a naginata. Yasha revirou os olhos.

-- Se sentiu tão ameaçada por um susto e umas barracas derrubadas? Aquilo foi só um puxão de orelha para te colocar no caminho certo.

-- Por quê? Eu não quero nada a ver com isso. Mesmo que sejamos parentes, não quero saber! Não me envolva com sua família chegada nos youkai!

-- Acho que é meio tarde para pedir isso – Yasha falava com tanta calma que chegava a irritar. Ela andou para as portas – Já que estamos aqui, por que não entramos?

A mulher puxou as maçanetas, quase tão grandes quanto sua tanto, e abriu as portas, revelando um interior escuro e mais profundo do que se esperaria daquela rocha. Apenas olhar para aquele negrume fez um calafrio percorrer a coluna de Mikoto. Yasha deu um passo para o lado.

-- Vamos? Os youkai não podem sair, mas humanos podem ir e vir à vontade. A fronteira é só para eles. Estranho, não acham?

-- O que te faz pensar que eu iria a qualquer lugar com você?

-- Porque aonde eu vou residem as respostas para todas as suas dúvidas. Sobre mim e o que eu faço, nossa origem em comum que eu já tinha mencionado, e até sobre o seu guarda-costas. Não quer saber do seu passado?

-- O passado não me interessa – Mikoto respondeu. Haku concordou.

-- É. Nossa origem não define quem nós somos.

Yasha olhou para Haku com uma incredulidade surpresa, como se aquela frase fosse a última coisa que esperava ouvir dele. Rapidamente ela se recuperou do choque e argumentou:

-- Tudo bem. Fiquem aqui, se quiserem. Talvez venha um navio para buscá-los, ou os restos daquele que os trouxe, com os restos das pessoas que estavam lá.

Mikoto avançou. Haku a segurou.

-- Ela quer te provocar para ir atrás dela.

-- Eu sei – respondeu entredentes, os punhos cerrados tremendo de raiva. Mesmo sabendo, era difícil se controlar, e Yasha percebeu isso.

-- Toquei na ferida, não é? Deve ter sido um alívio ter esse guarda-costas para tirar você de lá e a trazer para a praia sã e salva enquanto todos os seus amigos viravam carvão em brasa. Se ao menos você não tivesse trazido as outras duas miko, como eu falei, elas não precisariam ter morrido.

Quando Mikoto deu por si, estava avançando contra Yasha, a naginata golpeava enlouquecidamente, procurando desfazer aquele sorriso provocador de qualquer forma. Mas a mulher era muito ágil, e facilmente desviou das investidas.

Num instante ela cansou de se esquivar e simplesmente correu, e Mikoto teria corrido atrás dela se Haku não tivesse segurado seus ombros. Só nesse momento ela percebeu que cruzara a porta, e agora estava no mundo dos youkai.

Os dois contemplaram o ambiente. O céu era de um vermelho quase negro de tão escuro, sem nenhum sinal de sol, lua ou estrelas, a maior parte da luz vinha da porta, ali apenas uma moldura por onde se podia ver a praia. Montanhas secas e pontudas cercavam o vale onde se encontravam, também vazio e arenoso.

À frente havia uma construção, um prédio com paredes de pedra e aparência antiga e desgastada, que se parecia com um castelo mais do que qualquer outra coisa. E a visão daquele castelo deixou Mikoto muito desconfortável, uma sensação semelhante ao medo do escuro que tinha na infância; não sabia o que havia ali, mas seu instinto dizia para não chegar perto.

O Conto da Donzela do SantuárioWhere stories live. Discover now